sábado, 12 de dezembro de 2009

TITULOS DE CRÉDITO

Enquadramento histórico

Os títulos de créditos são uma invenção dos comerciantes, numa época em que ainda não existia o que hoje conhecemos como “notas”, o papel-moeda, e também numa época em que era perigoso demais transportar grandes somas de dinheiro. O sentido prático dos comerciantes impeliu-os a incorporarem os seus direitos num documento fácil de transportar.
Aí nasceu os cartulae - documentos que serviam para definir, circular, cobrar e mobilizar os direitos documentados.

Definir - definiam o direito no documento
Circular - serviam para circular os créditos, simultaneamente à circulação dos documentos - ou seja, ao transmitir-se o documento, transmitia-se o crédito (independentemente do consentimento ou até do conhecimento do devedor)
Cobrar - porque davam legitimidade ao seu portador para os cobrar, desobrigando quem pagasse ao portador do documento. Ou seja, o devedor não pode argumentar que o portador não é o credor originário, nem que o pagou a terceiro.
Mobilizar - era possível vender o documento a um terceiro, que posteriormente iria cobrar o crédito (ou também vender), e até era possível pagar uma divida.

E assim, da incorporação dos direitos de crédito em documentos, nasceram os títulos de crédito.

São características gerais dos títulos de crédito.
- Literalidade
- Autonomia
- Incorporação
- Legitimação
- Circulabilidade

Literalidade

Para melhor entender a literalidade, atente-se na:

- Lei Uniforme relativa aos cheques
OU
- Lei Uniforme das Letras e Livranças

Artigo 1º, e depois, artigo 2º


Aqui podemos concluir 2 coisas:
- O portador credor não pode exigir mais do que aquilo que consta no título
- O obrigado não pode invocar em sua defesa algo que não resulte do título

No caso de haver divergência entre o montante indicado por extenso o montante indicado em algarismos, prevalece o montante indicado por extenso. Se houver várias divergências, prevalece o montante que represente uma quantia menor. (6º Lull, 9º LUC)

A razão de ser da literalidade é, basicamente, fazer prevalecer o seu sentido objectivo sobre a vontade subjectiva das partes.


Autonomia


O direito incorporado no título é autónomo em relação ao direito que lhe deu origem. O direito incorporado no título chama-se "Direito cartular" e o direito que lhe deu origem chama-se "direito subjacente".

Por vezes este direitos são, confundidos, mas atente-se num exemplo simples.

Alguém passa um cheque a outrem.
O direito subjacente do credor é o direito à prestação que o credor lhe deve.
O direito cartular é o direito que o credor, já em posse do cheque, tem de ir ao banco levantar a quantia.
O montante mantém-se, mas muda o devedor. No entanto, a divida só se extingue quando o montante for pago pelo banco.

Também há autonomia em relação ao portador do título.

Um título de crédito é uma coisa móvel, como tal, sobre ele recaem direitos reais (propriedade, usufruto, penhor, etc.). Logo, a titularidade do título é autónoma em relação a portadores anteriores. Quando o título circula, o direito real também circula, logo é autónomo em relação ao portador.

A deve X a fulano tal, entrego-lhe um cheque e transmito-lhe também o direito real sobre ele.


Incorporação

Como já sabemos, são incorporados nos títulos de crédito direitos, o direito cartular.

Por exemplo, nos cheques, letras e livranças, esse direito tem por objecto uma prestação pecuniária.
Já nos conhecimentos de carga, conhecimentos de embarque ou conhecimentos de depósito, o título incorpora direitos reais sobre as mercadorias referidas.

A incorporação tem por objectivo a presença física do título para que possam ser exercidos os direitos cartulares, e também para que o direito possa circular.


Legitimação

A legitimação divide-se em legitimação activa e legitimação passiva.


Legitimação activa

A legitimação activa legítima o portador a exercer o direito incorporado, ou seja, a legitimidade é sempre do portador, seja ele ou não o verdadeiro titular, dispensando-o assim de provar a titularidade, não podendo esta ser contestada.

Legitimação passiva

A legitimação passiva habilita o obrigado a cumprir a obrigação ao portador, ou seja, o obrigado não precisa de investigar a verdadeira titularidade do credor, e cumprindo perante o portador, fica desonerado. Mesmo que o portador seja ilegítimo, o obrigado não tem que cumprir de novo.



Circulabilidade

Os títulos de crédito destinam-se a circular. Foi para isso que nasceram, para resolver os problemas inerentes ao transporte de dinheiro.

Os títulos de crédito circulam de acordo com a sua respectiva lei de circulação.

Os títulos podem ser, consoante o modo de circulação, nominativos, à ordem e ao portador.

Nominativos - são por exemplo as acções e as obrigações nominativas. Os títulos nominativos contêm no próprio título a identificação do seu titular.

À ordem circulam, por exemplo, os cheques, letras e livranças. A sua circulação é feita por endosso.

Ao portador circulam as acções e obrigações ao portador, e, se ainda se considerarem títulos de credito, as notas de banco. Os títulos ao portador circulam por entrega real.

Os títulos de crédito são tipicamente destinados a circular, dai esta característica da circulabilidade. Se não podem circular, não são títulos de crédito.

Há os chamados títulos impróprios - títulos aos quais lhes falta esta característica, a circulabilidade, logo não podem ser chamados de títulos de crédito.
Distinguem-se entre títulos de legitimação e comprovantes de legitimação.

Títulos de legitimação - são, por exemplo, os bilhetes de cinema, de autocarro, ou até as senhas de refeição que compramos na associação para irmos comer à cantina.

São tipicamente destinados à sua legitimação, legitimando o seu portador a exercer certos direitos, como assistir à sessão de cinema, fazer uma viagem de autocarro, ou tomar uma refeição na cantina.
A sua circulação não é proibida. (já todos viram alguém a vender bilhetes para um concerto a porta da sala de espectáculos, ou de um estádio)

Comprovantes de legitimação - também estão destinados à circulação, mas na prática não pode circular. Estes títulos identificam o seu titular, por meio de nome e até de fotografia, logo a sua circulação é impraticável. O melhor exemplo é o passe de transporte colectivo.



Estas características não são independentes umas das outras, pelo contrário, coordenam-se entre si.
A principal característica é a circulabilidade. Todas as outras se ordenam tendo em vista assegurar a circulabilidade.
A literalidade assegura que nada para além do que consta no título será cobrado, aumentando a segurança necessária para a circulação.
A autonomia, para além do que já foi referido, visa proteger o portador de boa fé. Se algum anterior portador for ilicitamente desapossado do título de crédito, o portador de boa fé está protegido pois não pode ser alvo de uma possível reivindicação por parte do anterior portador ilicitamente desapossado.
Também a incorporação defende e torna segura a circulação de um título, pois esta exprime, no aspecto prático, a própria circulação
Já a legitimação dá clara e imediatamente a conhecer a legitimidade, passiva ou activa, evitando assim os problemas decorrentes da eventual não coincidência entre o portador e o titular, atribuindo ao portador, seja ele ou não o titular, legitimidade para actuar como se fosse.
Sendo assim, o título está apto para circular para circular de maneira simples, segura e rápida, tendo em vista a natureza dos títulos de crédito, que é, como sabemos, a sua aptidão para circular.



Classificações dos títulos de crédito:

Conforme a natureza do seu emitente, podem ser públicos ou privados
Exemplos
Públicos - obrigações do Estado Português
Privados - letras livranças cheques

Os títulos públicos não são todos os títulos emitidos pelo Estado, são antes todos os títulos emitidos pelo Estado que tenham natureza pública, porque, como bem sabemos, também os há de natureza privada.


Conforme a natureza dos direitos que incorporem os títulos, os títulos podem ser propriamente ditos, representativos ou de participação.
Propriamente ditos - Incorporam direitos de crédito pecuniários. (letras, livranças, cheques)
Representativos - incorporam direitos reais sobre coisas. (conhecimentos de carga, conhecimentos de deposito)
De participação - incorporam o direito social do sócio de sociedades (acções de sociedades anónimas)


Conforme a respectiva lei de circulação - já referido - podem ser nominativos, à ordem ou ao portador. O mesmo tipo de título pode ter mais do que um regime de circulação, por exemplo, as acções podem ser nominativas ou ao portador. Já as letras e livranças são sempre à ordem.


Os títulos de crédito também podem ser individuais ou em série.
Em série os que são emitidos em massa, como as acções e obrigações.
Títulos individuais são emitidos singularmente, como as letras e livranças.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

APONTAMENTOS DIREITO COMERCIAL E TITULOS DE CREDITO

Dto Comercial

1-Introdução
1- Noção de Dto Com
O dto comercial vêm sendo tradicionalmente definido como o dto do comércio, o dto que regula as relações de comércio ,ou seja ,o conj. de regras jurídicas que regulam o comércio .Mas o dto comercial pode ser definido como o dto do comércio em sentido jurídico e o dto do comércio em sentido económico:

1.1 Comércio em sent. Económico - conj. de actividades económicas que pertencem ao chamado sector terciário da economia, são relativas à circulação de bens ,à mediação entre a produção e o consumo (oferta e procura).Têm a ver com a actividade de intermediação de bens.
Os economistas costumam dividir e classificar as actividades económicas em 3 grandes sectores:
1-Primário;engloba actividades económicas como a agricultura a silvicultura ,caça pesca e indústrias extractivas.
2-Secundário;artesanato e industrias transformadoras
3-Terciário;abrange actividades económicas das quais se destacam a prestação de serviços e o comércio--- as tais actividades de intermediação de bens.
Como se vê, o comércio constitui apenas 1 das várias actividades económicas que pertence ao sector terciário o qual por sua vez constitui apenas um dos sectores das actividades económicas em geral, ora, este não pode ser efectivamente a acepção correcta do termo “comércio” para delimitar o objecto do dto. comercial. Sem dúvida que historicamente, o Dto. Comercial teve o seu núcleo originário e o seu centro de gravidade nas actividades de intermediação (comércio em sentido económico). O Dto. comercial surge na Idade Média devido ao eclodir do comércio nas cidades costeiras do norte de Itália e da Flandres como o dto. regulador dessas actividades de intermediação. Mas, com a crescente complexificação das actividades económicas sobretudo desde a Idade Moderna e com a substituição de um capitalismo comercial por um industrial e agora no séc.xx por um capitalismo financeiro, o Dto. Comercial estendeu o seu âmbito de regulamentação mt. para além dessas activ. de intermediação. Assim, por ex. o dto. Comercial regula hoje tb. activd. económicas pertencentes à área da prestação de serviços por exemplo: seguros, transportes, hotelaria. Além disso, o dto Com. têm hoje uma intervenção reguladora em matérias do sector secundário e primário por exemplo indústrias transformadoras são hoje qualificadas como comerciais.
Mas claro que não podemos pensar que o dto. Comercial regula todas as actividades económicas, uma espécie de dto. geral da economia. De facto, há varias actividades económicas pertencentes a qq. um dos três sectores que não cabem no âmbito de aplicação do dto. Com. : no sector primário a agricultura foi expressamente excluída do dto. Comercial(230 nº1 e 464 nº2 CC) bem como o artesanato no sector secundário (230nº1 e 464 nº3).No sector terciário a actividade de prestação de serviços é regulada pelo dto civil comum.
Mas para além de não regular apenas o comercio em sentido económico ,o dto. Comercial não o regula todo.
Hoje há relações económicas privadas relativas a intermediação de bens que não são disciplinadas pelo dto. com. ,mas por ex. pelo Dto. Adm.. Em matéria relativas ao licencial industrial e ao acesso da activ. comercial.
Dto. Penal - em matéria de concorrência desleal;
Dto Fiscal - ex. IVA

CONCLUSÃO: - a acepção estrita e económica da palavra comercio para definir o âmbito do dto com. não é satisfatório.

1.2-Por isso surge a noção de comercio em sentido jurídico - formal (amplo):

Conjunto de actividades económicas a que num dado país e num dado momento se aplicam as leis comerciais. O Dto. Comercial regula potencialmente todas as actividades económicas desde que fossem chamadas pelo legislador, aqui abrangem-se não apenas as tais actividades de intermediação (o tal comercio em sentido económico) mas todas as actividades económicas que fossem objecto das normas mercantis existentes nesse país.
Esta noção de Dto. Comercial foi defendida pela doutrina portuguesa mais antiga; Veiga Beirão, onde assume importância as chamadas normas qualificadoras , que são as normas que determinam quais os actos, os aspectos ,as relações da vida económica privada a que a ordem jurídica atribui relevância jurídico - comercial. Assim, no nosso Dto. Comercial a norma qualificadora fundamental é o art. 2º do CCm o qual nos diz quais são os actos de comercio.

Criticas a esta noção: é uma definição que cai num circulo vicioso ao definir o dto. com. como ramo de dto. que regula as actividades económicas a que ele próprio se aplica.
Diz-se que o dto. comercial é aquele ramo do dto. que têm por objecto o comércio em sentido jurídico e comércio em sentido jurídico é aquele a que o dto. comercial se aplica, ou seja, é o mesmo que dizer que o objecto do dto. comercial é aquilo a que ele se aplica.
É uma definição formal porque identificando o dto. com. com a sua realidade jurídico - positiva concreta que é por natureza mutável (o que é hoje pode não ser amanhã) nada se diz sobre a unidade substancial deste ramo de dto.
Nem sequer é verdade que o dto. com. é o dto. regulador apenas do com. em sentido jurídico, regula mais do que isso (Lobo Xavier)

Conclusão: o dto. com. não é apenas o dto. regulador do comércio em sentido jurídico ,nem apenas o dto. regulador do comércio em sentido económico.

2-Situação actual:

Hoje ,as normas jurídicas mercantis não se esgotam nesse domínio, mas também se aplicam aos chamados actos formalmente comerciais(actos de comércio formais)----»actos cuja relevância jurídico comercial deriva não de própria natureza intrínseca do acto ou da capacidade de comerciante do autor mas da mera circunstância formal que é o preenchimento por alguém de 1 esquema jurídico formal pré- estabelecido pelo legislador ex. subscrição de uma letra de câmbio .Hoje as letras de câmbio podem usar-se entre não comerciantes é um instituto que nasceu do comércio ,mas que hoje se utiliza na prática corrente.
Mesmo assim a lei comercial vai regular este acto só é 1 acto formalmente comercial, basta preencher 1 formalidade para que se aplique a lei comercial ,é o caso de A e B que celebram 1ccv de 1 imóvel para efeitos de habitação e como o comprador não tinha logo ali o dinheiro para pagar, propõe ao vendedor e este aceita a emissão de 1 letra a favor deste para a quantia em dívida.

Conclusão: não há dúvida que a noção de comércio em sentido jurídico é uma noção fundamental para compreender o objecto do Dto.Com. sobretudo para efeitos de várias normas do dto. com vigente:
--para efeitos da determinação da natureza civil ou comercial de 1lei; art.2º 1ªparte do C.Com.
--para efeitos de determinação da natureza comercial ou civil dos actos dos comerciantes; art.2º 2ªparte do C.Com.
--para efeitos da atribuição da capacidade de comerciante (artº13º C.Com)já que esta depende da prática, por parte de alguém, de modo reiterado e profissional de actos de comércio.
--para efeitos do artº15ºCcom que trata da responsabilidade dos bens do casal pelas dívidas comerciais de 1 dos cônjuges, na medida em que essa responsabilidade só existe em relação a dívidas comerciais que tenham origem em actos do cônjuge comerciante e que tenham conexão com o “seu comércio”.
--para efeitos do artº1ºCSC já que as sociedades comerciais são aquelas sociedades que têm como objecto exclusivo a prática de actos do comércio. Mas não é correcto afirmar que o âmbito do Dto.Com. se esgota neste domínio, pode também regular actos que nada têm a ver com o comércio quer em sentido económico quer em sentido jurídico, caso dos actos formalmente comerciais.

Logo não há uma noção satisfatória para o Dto.Com. Podemos afinal dizer que o Dto.Com. é um dto. do comércio, mas com as limitações que assinalamos em cada uma das acepções da palavra comércio.


2- Evolução histórica do Dto. Com:

.2.1- É um ramo de formação medieval. Na antiguidade greco-romana não havia 1Dto Comercial distinto do dto. civil comum, este chegava para resolver todos os problemas.
.2.2-Foi na Idade Média que nasceu o dto.Com. como ramo independente do dto. privado. Nasceu em Itália e na Flandres onde havia uma grande actividade comercial e surgiram corporações profissionais de mercadores que tinham estatutos próprios e tribunais próprios as suas decisões baseavam-se nos estatutos e usos.
Começa a formar-se uma espécie de normas comerciais, mas é um Dto.Com. primitivo:
Profissional(dos mercadores), Corporativo(das corporações)
Autónomo do dto. civil, de origem consuetudinária e de locação internacional:
Era um dto. dos comerciantes dos mercadores.
.2.3-Com a Idade Moderna , com a centralização do poder do Estado , o dto. comercial foi perdendo as suas características, menos a da profissionalidade. Com a Revol. Francesa de 1789 , com a igualdade que preconizava não podia pactuar com a existência de 1 dto. de classes (dos mercadores e comerciantes). Assim . o Dto. Com. já não era definido como o dto. dos comerciantes mas como o dto. doa actos de comércio, independentemente de quem os praticasse, o que interessava era a natureza dos actos praticados. O CC francês de 1807 consagra isto e influencia os outros CC. da Europa. O CC alemão veio recuperar o assento subjectivista e profissional do Dto. Com.
O nosso C.Com é de 1888--» O Dto. Com trata dos actos dos comerciantes e desaparecem os actos que à partida podem ser comerciais, ou seja , se não forem levados a cabo pelo comerciante não se aplica a lei comercial.
A legisl. Italiana de 1942 têm dois aspectos: o CC alemão veio influenciá-lo mas assento tónico deixa de ser posto na figura do comerciante para passar a ser posto na figura de empresa, via o Dto.Com. como o dto. da empresa e de todos os actos que existem à volta da empresa .Este código não é comercial, é no Cod. Civil que esta disciplinado o regime do Dto. Com.
Assim, o legislador italiano manteve a característica originária fundamental o Dto. Com como um dto. profissional, só que considerava um dto. da empresa em vez de um dto. de comerciantes.

2.4-Situação actual: Genericamente o Dto.Com têm 4 aspectos fundamentais:
1-Progressiva publicização do dto.Com. Há uma crescente intervenção e ingerência dos poderes públicos na vida económica ex. basta pensar nas intervenções legislativas que existem em matérias como a da nacionalização e privatização, investimentos no estrangeiro, licenciamento industrial etc.
2-Progressiva civilização dos mecanismos ou instrumentos jurídico comerciais.Com isto pretende dizer-se que muitos institutos do Dto. Com são hoje cada vez mais utilizados por indivíduos que nada têm a ver com o comércio, para praticar actos que nada têm a ver com o comércio ex. letra de câmbio é um instrumento fundamental do Dto. Com mas cuja utilização se divulgou de tal modo que hoje é utilizado indiscriminadamente por comerciantes e não comerciantes quer para a condução de actos comerciais quer puros actos civis.
3-Retorno do Dto. Com à sua natureza originária de dto. profissional (não tanto como dto. dos comerciantes mas como dto. de empresas).
4-Declínio da ideia de codificação do Dto. Comercial .


3- Sistemas de Dto Com.:

3.1-Sistemas Subjectivos :noção e problemas

É o primeiro sistema delimitador do objecto de Dto. Com e segundo este o Dto. Com. constitui o conj. de normas que regem os actos ou as actividades dos comerciantes.
Este sist corresponde à concepção originária do Dto. Com. e foi retomado pelo C Com alemão de 1897, conhecendo adeptos sobretudo na doutrina francesa.

CRÍTICAS:

Jamais um sistema subjectivista se mostra exequível na sua pureza, sendo obrigado frequentemente a lançar mão a elementos objectivos por exemplo;
A) A determinação da capacidade do comerciante não dispensa mas pelo contrário pressupõe a definição e a prática de actos de comércio objectivos.
Para determinarmos se uma pessoa é ou não comerciante( conceito essencial dos sistemas subjectivistas),é preciso recorrer ao conceito objectivo de acto de comércio-artº13º do C. Comercial.

B)Ainda é preciso ter em conta que a capacidade ou o estatuto de comerciante constitui normalmente 1condição necessária mas não 1condição suficiente para a qualificação como comerciais dos actos por estes praticados. Depende também de outros factores de natureza objectiva ,ex. artº 2º 2ª parte do C.Com. -------para que os actos praticados pelos comerciantes sejam comerciais, é necessário para além desta condição subjectiva (capacidade de comerciante), se verifiquem ainda alguns elementos objectivos nomeadamente nomeadamente que o acto não tenha natureza exclusivamente civil e que o contrário não resulta do próprio acto.
De facto nem todos os actos jurídicos praticados por um comerciante são actos comerciais. Apenas devem ser considerados comerciais aqueles actos praticados pelo comerciante no exercício do comercio. Esta concepção na sua pureza leva-nos a considerar como comerciais os actos praticados pelo comerciante que são de natureza pessoal ou não patrimonial, ex actos relativos ao âmbito familiar ou sucessório do comerciante.

C) Mas seria absurdo também noutro aspecto, assim nem todos os actos praticados pelo comerciante são necessariamente comerciais mas também existem muitos actos que ninguém contesta a sua natureza comercial e que são praticados por simples particulares.
Tb aqui se se fosse a aceitar a concepção subjectivista na sua pureza, não restaria senão considerar certas operações cuja natureza mercantil ninguém discute , como não comerciais apenas porque os seus autores não são comerciantes. ex . uma compra efectuada para revenda por um particular (463º e ss C.Com) é evidente que a compra para revenda é um acto intrinsecamente mercantil, ninguém discute. Mas bastaria ser praticado por um não comerciante para no âmbito desta concepção subj. se excluir a sua regulação pelo Dto Com.


3.2-Sistemas objectivos: noção e problemas

Segundo estes sistemas o Dto. Com. constitui 1conj. De normas que regem os actos do comércio, independentemente de quem os pratica.
Neste sistema, aquilo que decide da natureza ou da relevância jurídico comercial de 1 acto é a própria natureza intrínseca do acto em si mesmo, independentemente do seu autor ser ou não comerciante(há um comerciante “in res” e não “in persona “ dos sistemas subjectivistas). De acordo com este sistema, o Dto. Com. abrange não só o comércio profissional (comerciantes) mas também o comércio ocasional (actos comerciais praticados esporadicamente praticados por particulares não comerciantes).
Este sistema teve a sua consagração legislativa no C.Com francês de 1807 e esteve na base do sistema de codificação europeu e americano (América latina), estando na base do nosso código.

Criticas a esta concepção:

1-O conceito central deste sistema, é o conceito da actos comerciais(é a pedra angular deste sistema). Porem, não há um conceito unitário e universal de acto de comércio (quer na doutrina quer na jurisprudência) e dificilmente poderá haver no contexto das ordens jurídico comerciais actuais, porque estas são caracterizadas por uma enorme heterogeneidade das matérias mercantis. Logo é invisível a construção de um conceito geral e abstracto capaz de abranger virtualmente todo o tipo de actividades económicas a que hoje o Dto. Com. se aplica.

Assim, não é surpreendente :
A) quer o positivismo legislativo que se atinge nesta matéria --»os O. J. Comercias da actualidade que são partidários de uma concepção objectivista do Dto .Com não definem actos comerciais em absoluto, limitando-se a dizer quais os actos que consideram ser actos do comércio Há códigos que fazem uma enumeração expressa e taxativa dos actos de comercio: por ex Cod italiano anterior ao actual. Outros prosseguem esta discriminação através de uma enumeração implícita: por ex o nosso Cod Com que no artº 2º diz expressamente quis são os actos de comércio mas depois remete para partes da lei “aqueles que se acharem especialmente regulados neste código” .esta técnica legislativa casuística não resolve o problema central da concepção objectivista.

B) quer o insucesso doutrinal--»parece então que caberia à doutrina formular esse conceito universal de acto do comercio, só que a doutrina persegue a décadas sem sucesso a tentativa de construção de um conceito unitário de ac. com.

A tentativa mais ambiciosa pertence a Rocco (italiano ) anos 30-- Act. de com. como acto de interposição entre a oferta e a procura.
Garrigues (argentino) – para quem a essência dos actos de comercio era o facto de serem actos especulativos visando o lucro.
HecK- dizia que era o facto de serem actos praticados em massa.
G.Telles-a essência dos actos de comercio era serem actos produtivos.

Critica a Rocco: por ex :acto de subscrição de 1 letra para 1 dívida
Crítica a Garrigues: Ex :revenda efectuada por 1 preço inferior ao do custo(não tem carácter especulativo ou lucrativo)
Todas estas tentativas não são bem sucedidas e exemplo disso o dto positivo qualificava como comerciais certos actos com 1 simples relação de acessoriedade com outros actos , estes sim intrinsecamente comerciais a qualificar como comerciais ,em virtude da sua mera relação de conexão com a actividade do comerciante.

2-Por outro lado, os sistemas objectivistas jamais são exequíveis na sua pureza e são obrigados frequentemente a lançar mão de elementos subjectivos.
De facto todas as legislações jurídico - comerciais que adoptaram este sistema prevêem certos actos cuja comercialidade depende também do seu autor 1º ex:366C.Com. que disciplina o contracto de transporte ,apesar de este ctt ser considerado 1 acto objectivamente comercial , a sua comercialidade está dependente da própria capacidade das partes contratantes para algum dos seus efeitos.2ºex:artº18C.Com. que trata das obrigações específicas dos comerciantes.
Levada até às últimas consequências , esta concepção de Dto Com pode não só romper com a raiz histórica deste ramo do dto (que nasceu como 1 dto profissional, 1 dto dos comerciantes)mas também diluir as fronteiras entre o DtoCom e o D6to Civil ,em relação ao qual se autonomizou. Porquê? É que a progressiva expansão do DtoCom no sentido de tb abranger os actos de comércio praticados por simples particulares , podia fazer perder de vista as razões que levaram historicamente à autonomização do próprio DtoCom, que tem a ver com o comércio profissional e não com o ocasional e poderia mesmo dar razão aqueles autores que pretendem a unificação do DtoCom e do DtoCivil.

.3.3-Sistemas Mistos

De facto, não existem sistemas exclusivamente baseados no conceito de actos comerciais nem sistemas baseados no conceito de comerciante, o que existe é uma combinação em graus diferentes de elementos objectivos e subjectivos na construção do DtoCom(não podem existir sistemas puros):

RAZÃO TEÓRICA- estes 2 conceitos(act com, e comerciante) são 2 faces de uma mesma moeda, ou seja, são conceitos que acabam por remeter reciprocamente um para outro : o conceito de comerciante pressupõe o act. com. e vice versa. Assim é inevitável, na construção dos sistemas de Dto Com. puros e fenómeno do círculo vicioso de elementos obj. e subjectivos.
RAZÂO PRÁTICA- os sistemas subjectivistas não conseguem definir o que é comerciante sem recorrer ao conceito de acto comercial (CodCom alemão); inversamente os sistemas objectivistas, nomeadamente o seu expoente(C.Com .francês)jamais se limitam à ideia de comércio, atribuída também relevância em muitas disposições à própria capacidade do comerciante.
Daí que as legislações jurídico comerciais têm um carácter misto, há uma combinação de elementos objectivos e subjectivos. Depois, cada O.J. comercial propende mais para o sist. objectivista ou para o sist.subj.


CONCLUSÂO:

Na prática o único aspecto que diferencia estes 2 sistemas acaba por se resumir ao chamado comercio ocasional. Enquanto nos sist. subj. apenas são comerciais os actos praticados pelos comerciantes no exercício do seu comércio nos sist. objectivos tb se qualificam como mercantis, os actos de comercio isolados que são praticados ocasionalmente por simples particulares (comércio ocasional).

4- Problema da autonomia do Dto. Com.:

Deve ou não ser um ramo de dto autónomo? Se se considerar 1 ramo de dto priv. especial as normas especiais não se confundem com a norma excepcional-»aqui não pode haver aplic. analógica.

1-Teoria da unificação:
Foi desencadeada no séc. passado por 1 sector mt relevante da doutrina italiano e veio ser adoptada no início deste século por parte da dout. portuguesa, nomeadamente Guilherme Oliveira, Barbosa Magalhães etc. esta teoria defendia a supressão do Dto Com e a unificação da disciplina jurídica de dadas relações jurídicas privadas (civis e comerciais).As razões por eles adoptadas era aquilo a que se chamava progressiva nivelação da zona privatística, ou seja tinha a ver com a progressiva sobreposição do Dto Com e do Dto Civil.
Como sintomas desta progressiva nivelação , estes autores apontavam vários aspectos:
-Comercialização do dto civil; chamava-se atenção para a existência de um fenómeno de progressiva comercialização do Dto Civil, ou seja para a progressiva infiltração no dto civil (principalmente no dto das obrigações e no dto dos ctts) de certos princípios tradicionalmente mercantis ex. pensa-se na generalização do processo falimentar na pp liberdade de forma que teve a sua origem no Dto Com.
-Civilização do Dto Com.; por outro lado ,apontava-se inversamente, um fenómeno de civilização do Dto Com, ou melhor, de certos institutos jurídico comerciais. Chamava-se a atenção para o fenómeno da crescente utilização por não comerciantes de institutos que foram criados para os comerciantes e para o exercício profissional do comércio, passando assim a ser parte comum do dto privado ex letras de cambio, vendas a crédito (a prestações), sociedades (os sócios não são obrigatoriamente comerciantes).
-Para alem disso esta uniformização já tinha provas dadas, nomeadamente no âmbito dos sistemas saxónicos(quer o dto americano quer o inglês não conhecem um Dto Com autónomo e mesmo em certos países europeus como a Suíça e a Itália tem um cod civil que regula simultaneamente dadas relações privadas.
Estes autores consideravam O dto com como uma categoria histórica e transitória, abrindo caminho a uma uniformização do Dto Com estava condenado a desaparecer e a ser reabsorvido pelo dto civil.

l2- Teoria da autonomização (Teoria da autonomia)
Em rigor, deverá falar-se em teorias de autonomia porque foram varias as tentativas doutrinais que visaram recuperar essa autonomia e justifica-la . Existem 3 teses principais :
- A Tese de Rocco ( acto de comercio):
Provém das concepções objectivistas do dtº. comc. . A tese da reacção defendia que os actos comerciais encontram a sua essência no facto de serem actos de interposição entre a oferta e a procura. Esta teoria não vingou porque este entendimento doutrinal esta à partida votado ao fracasso, em face da enorme heterogeneidade dos materiais mercantis . O conceito base é um conceito falível. Além disso , o sistema objectivo transporta em si mesmo , o gérmen da própria destruição do dtº comercial.
Vantagem: chama a atenção para a necessidade de defender a autonomia do dtº cmc. e de reorientar a Doutrina para outras bases Constitucionais do Dtº Cmc.
- A Tese de Heck ( actos em massa ) :
Surge a seguir e procurou refutar a autonomia do Dtº Comercial. Para ela aquilo que verdadeiramente poderia refutar a autonomia do Dtº Comercial seria o facto de este ramo conter a disciplina para a realização de actos mercantis em massa , ou seja , de actos mercantis integrados numa serie e não de actos mercantis isolados . Era esta a razão da autonomia do próprio Dtº. Comc. . É evidente que sendo a pratica de actos mercantis em massa , obra dos comerciantes, ou seja, de quem exerce a profissão de comercio, o dtº comercial encontraria o se reduto ultimo no facto de ser 1 dtº dos comerciantes. O Dtº. Cmc justificaria a sua autonomia por ser 1 dtº dos comerciantes. Não esquecer que esta teoria proveio do sector subjectivista.
-A tese das Empresas (Mossa,Garrigues )
Teoria defendida por Mossa em Itália, Vivand. na Alemanha, Garrigues em Espanha. Concebe a autonomia do dtº cmc. no facto de constituir um dtº da empresa.
Esta teoria sublinhava correctamente que a realização de actos mercantis em massa (de que falava Heck) está cada vez menos ligado à pessoa individual e esta cada vez mais inserida no âmbito de uma organização especifica e complexa de factores produtivos (trabalho, gestão etc...) que é justamente a empresa, seja esta explorada por 1 PS ou por PC. Neste sentido, o dtº Cmc. deveria ser considerado como um dtº especial da empresa.

VANTAGENS:
1) Esta teoria ultrapassa os riscos que são próprios do sistema objectivo, ou seja, ao apontar a empresa como o objecto do Dtº C. , ela permite encontrar um um novo factor de unidade para o Dtº C. e permite sobretudo , evitar aquele aspecto, dissolvido neste ramo, que era quase como que constitutivo dos sistemas objectivistas, que viam neste uma espécie de ramo disciplinador de actos mercantis individuais.
2) Esta teoria permite também, superar as deficiências do sistema subjectivo, porque ao deslocar o ênfase da figura do comerciante individual para a figura da empresa, permite o preconceito de que o dtº C. era um dtº privativo de uma classe ( um dtº corporativo) para passar a ser visto como um dtº vocacionado para disciplinar uma organização, uma instituição especifica : a empresa.
3) Com esta teoria, o dtº comercial já não ficaria exposta à critica da teoria da unificação que falava de uma homogeneidade da zona privatística, ou seja, de uma sobreposição do dtº civil e do dtº Cmc.. Sendo o dtº comercial visto como um dtº das empresas, jamais se podia conceber que o dtº civil se «empresalizasse» ou que o próprio dtº das empresas se pudesse civilizar, porque o dtº civil baseia-se na figura da pessoa.


DESVANTAGENS:

1)Esta teoria apoia-se num conceito de difícil definição, pois não existe um conceito unitário de empresa, há conceitos diferentes para, o dtº, para a economia etc... . Logo não ha um conceito de empresa suficientemente abrangente e universal para constituir a base deste ramo de dtº.
2)Esta teoria acabaria por deixar de fora algumas operações e instituições que muito embora tendo a sua origem na actividade comercial e sendo forçosamente, ainda hoje utilizadas pelas empresas desde há muito ultrapassaram este domínio e caíram no uso geral, ex. títulos de credito (letras de câmbio). Também ficavam de fora certas instituições, que não obstante constituírem uma parte jurídica da organização da empresa, também desde ha muito ultrapassaram o estrito domínio do Dtº C. ex. Sociedades Cooperativas e nacionalizadas que podem não prosseguir fins comerciais. Existem alguns países onde as sociedades podem prosseguir finalidades não lucrativos ex. Sociedades de Capitais na Alemanha.
3) Finalmente, o dtº C. como ramo de dtº privado que é, jamais poderia pretender regular exaustivamente a empresa enquanto complexo de factores produtivos, porque a disciplina jurídica da empresa abrange normas dos mais variados ramos do dtº, como Fiscal, Trabalho, Administrativo ,etc...
Dai que a alternativa para esta teoria seja:
-ou o DC deixava de ser um ramo de Dtº Privado e passava a ser um ramo heterogéneo, interdisciplinar , perdendo a sua matriz ,
-ou, para pretender continuar a ser um ramo de Dtº privado, dai em diante passaria a regular apenas um sector muito especifico dentro dos aspectos relevantes para a vida da empresa, mas só daqueles que teriam uma incidência juridico-privatistica.
Quais seriam esses aspectos ?
Aspecto regulador do Estatuto do Empresário (individual ou colectivo), tutela da empresa, actividade externa da empresa. O DC assim visto um âmbito reduzido a estes 3 aspectos:
CONCLUSÃO- O DC, quando muito, pode definir-se como sendo aquele ramo de dtº privado que centrando-se na empresa ou dela irradiando, abrange ainda todos aqueles domínios em que se faça sentir a necessidade de uma regulamentação autónoma em face dos princípios gerais do dtº Civil.



3-Entre nós, defende-se a autonomia do DC com base em 5 caracteristicas e tendências do DC

1) - Tutela e reforço do crédito:
O recurso ao credito constitui um elemento essencial e vital da vida económica. O Comerciante precisa de um credito , sem credito não vive. ex. se A comerciante fosse obrigado a esperar pelo pagamento do preço dos produtos para poder repor os seus stocks, ou para comprar matérias-primas para produzir novos bens, é evidente que isso lhe causaria intermitências insustentáveis na sua actividade e no tráfego económico em geral. Tutelar o credito é dar condição aos credores para que eles não tenham medo de dar credito aos comerciantes. Proteger o credor para ele calmamente conceder o crédito.
Daí que o DC visa evitar as intermitências e assegurar a continuidade económica. Isto transparece em varias normas e institutos: ex. Títulos de credito; vendas a credito ou a prestações; conta corrente.

2)- Celeridade das transacções :

a)- Simplificação do formalismo - isto facilita obviamente as transacções económicas, de facto no DC não há grandes excepções ao Principio da Liberdade de Forma, ao contrario do que acontece no dtº civil; ex.- empréstimo mercantil- 396º CC. prova-se por qualquer forma: testemunhal, etc... No dtº civil até 1 dado valor é escrito particular e acima desse valor é escritura publica - 1143ºcc
b)- Simplificação dos regimes probatórios - 44º Ccm - estabelece 1 regime especial de prova entre os comerciantes, onde se atribui uma especial força probatória à escrituração mercantil de cada comerciante. A manutenção de uma escrituração mercantil actualizada é obrigatória.
c)- Simplificação dos regimes jurisdicionais : há um crescente recurso à arbitragem;
Por outro lado, ha actividades mercantis onde se sente a necessidade do ressurgimento de um certo formalismo  pode ser de índole juridico-privada, ou seja, resulta da própria vontade das partes, ex: ctts. de Adesão ou de índole legislativo, ou seja, resulta da própria vontade do legislador: títulos de credito, soc. comerciais.
É precisamente o interesse em promover a rápida circulação dos títulos de credito e o interesse em promover a eficiência das sociedades comerciais que leva o legislador a reforçar o formalismo nesta área, ainda que seja um formalismo diferente do Dcivil. Ex: nas letras de cambio vigora o princípio da literalidade, ou seja, o que conta não é a vontade real das partes, mas as declarações objectivas constituintes do titulo, ou seja, a vontade declarada.


3) Segurança das transacções :
É o reverso da medalha do reforço do credito. Dispondo os comerciantes de vários institutos e mecanismos que lhes concedem facilidades no dominio do credito, têm que haver meios de protecção dos credores, para que eles concedam o crédito:
• Solidariedade passiva (100º Ccom) - assim reforça-se a segurança e a garantia das transacções. Ao passo que no dtº civil a solidariedade passiva não se presume, pois o regime geral é o da conjunção (protege-se o devedor), no dtº Cm. a solidariedade passiva presume-se iuris tantum, só pode ser elidida se as partes convencionarem o contrario  protege-se o credor.
• Obrigações que recaem sobre os comtes. visando a segurança e a publicidade da sua actividade (18º Ccom)  ex. inscrição dos comerciantes no registo comercial, a existência de 1 escrituração mercantil etc... O não cumprimento destes deveres têm 1 regime sancionatório especial (penal / fiscal)
• 471ºCcm mesmo no caso de incumprimento ou cumprimento defeituoso o ctt. ficará perfeito se o comprador não reclamar no prazo de 8 dias.
O regime de bens do casal que responde pelas dividas do comerciante.

4) Vocação pioneira : o DC têm uma vocação pioneira face ao dtº civil. Enquanto no dtº civil não se assiste a isto, no DC usa o ctt. Franchising, ctt. de Concessão Comercial e estes ctts. não estão regulados na lei. Temos também o ctt. de Leasing, que esta regulado à meia dúzia de anos, mas já se recorre a ele à muito tempo. Como vigora no DC o principio da Liberdade Contratual , uma das vontades è celebrar 1 ctt. mesmo que este não esteja previsto na lei. De facto quem usa mais estes contratos que muitas vezes não há legislação é o DC.

5) Vocação universalista: (ou internacional)
Há muitos sectores do DC que deixaram de ser regulados pelo Dtº interno e passaram a ser por convenção: Conv. DtºInt de 1930 sobre o regime aplicável às letras e livranças (Genebra) e Conv. de 1931 sobre o regime aplicável aos cheques  são leis uniformes, ou seja, o regime é o mesmo para todos os Estados que ratificarem a Convenção. Isto serve para evitar muitos conflitos de Dtº Int. Privado. Em termos europeus, isto ainda é mais evidenciado pela U.E. . No DC têm havido uma grande uniformização. Em 1966 legislou-se sobre o ctt. de agência, mas depois surgiu uma directiva sobre isso e o nosso legislador teve que adaptar o nosso regime legal ao regulamento consagrado na directiva. O dtº Comunitário também regulamenta em matéria de Sociedades Comerciais, Concorrência e no campo do Dtº Financeiro. Também há Conv. Intern. em matéria da propriedade industrial, transportes, operações bancarias, etc...
Além disso as empresas e os comerciantes a fim de limitar a incerteza que podia surgir da aplicação dos vários o. j. comerciais, submetem os litígios a instâncias internacionais de arbitragem.


Vasco Xavier, diz que isto são 5 tendências evolutivas do Dtº Com. face ao dtº civil.
Conclusão: entre nós, o dtº com. merece autonomia.

5-Dtº NO CONTEXTO DA ORDEM JURIDICA

O dtº Com. têm sido tradicionalmente entendido como um dtº privado especial. É preciso delimitar a posição do DC face às outras normas jurídicas privadas.
I ) Dtº Cmc. e Dtº Civil  o dtº civil é um dtº privado geral e comum: conjunto de normas que regulam de um modo geral as relações entre os sujeitos privados. O Cmc. seria 1 dtº privado especial porque apenas regularia uma certa classe especifica dessas relações entre os sujeitos privados. É de notar, que dtº excepcional é aquele que estabelece um regime em oposição ao regime geral, ao regime regra. Assim o Dtº Com. têm uma natureza especial e não excepcional face ao dtº civil Isto é importante porque se as n. j. comerciais fossem n. excepcionais , estaria vedada a sua aplicação analógica por força do 11º cc e quando muito seria apenas possível a interpretação extensiva. Ora, de facto é possível a analogia em DtºCom. Assim, se há 1 lacuna de DCom, não se pode falar de lacuna porque temos 1 ramo geral: dtº civil.


Aspectos em que se concretiza a sua autonomia face ao dtº civil:

1) Autonomia formal  As leis do DtºCmc estão á parte das do dtº civil. Mas, em Itália e na Suiça não existe esta autonomia.
2) Autonomia substancial  ou material, do Dcmc devido àquelas 5 características do DtºComc
3) Autonomia jurisdicional já não existe desde 1932, porque nesta data os tribs. de comércio foram extintos. Hoje propõe-se 1 acção num tribunal civel.
4)Autonomia cientifica ou didáctica é esta autonomia que não se mistura com o dtº civil e têm mesmo dado origem a desmembramentos : Dtºdos Seguros ; Dtº Concorrência ; Dtº Bancário ;Dtº Propriedade industrial, etc...

II) Dtº Cmc. e Dtº de trabalho :
Hoje, a actividade mercantil é uma actividade praticada em massa e sobretudo, têm uma dimensão empresarial, resultante da organização de vários factores produtivos : trabalho, capital e gestão. Assim envolve cada vez mais o recurso ao factor trabalho, originando ligações entre as questões laborais e as questões mercantis, ex: o ctt. prevê a concessão de poderes especiais para a pratica do Acto Comercial (5º/3 LCCT). Por sua vez a lei comercial regula figuras de cariz laboral: caixeiros, auxiliares do comercio. A própria jurisprudência têm qualificado regularmente como comerciais certos ctts. de trabalho, apenas pelo facto de terem sido celebrados entre comerciantes.

III ) Dtº Cmc. e Dtº I PRIVADO :
As relações juridico-mercantis têm hoje, cada vez mais uma dimensão internacional estando em contacto com vários O. J. (3ºe4º CSC ; 4º, 7ºe 12º Ccmc e 65º e 1034º cpc)

DTº Cmc. e DTº PUBLICO


O DC é um dtº privado especial, mas isto começa a ser posto em causa devido ao intervencionismo económico do Estado. Há sectores do DC que são regulados por normas do dtº publico. Assiste-se a 1 “comercialização” do Dtº Publico . Quanto ao Dtº Constitucional, há princípios que estão consagrados na CRP- concorrência, liberdade de iniciativa económica, etc. Quanto ao Dtº Admn. , também existe uma uma intervenção quer da Admn. Central, quer da Admn. Local na actividade mercantil : normas que regulam o licenciamento da actividade industrial; normas de autorização para o exercício da actividade comercial.


Dtº FISCAL : Hoje a actividade comercial está sujeita a tributação, nomeadamente em IRC para as Sociedades Comerciais, e em IRS para os comerciantes em nome individual.

DtºPENAL : Pode haver responsabilidade Penal nos casos de falência dolosa, concorrência desleal, ou normas referentes aos ilícitos juridico-sociatários previstos no Título VII do CSC.


Dtº INT. PUBLICO : Há varias Conv. Internacionais ( BRUXELAS etc...) que estão no mesmo objecto da actividade de algumas organizações internacionais, através de grupos de trabalho ( OCDE, ONU , etc..)

6-Interpretação e integração do dto comercial

6.1-INTERPRETAÇÃO DO DTº COMERCIAL
As regras de interpretação da lei comercial são , fundamentalmente as mesmas regras gerais aplicáveis à interpretação das leis em geral : 9ºcc e 3ºCcmc. Apenas se refere a dois elementos hermenêuticos de interpretação : elemento literal e teológico : são só estes elementos que contam. Ignora-se o elemento histórico, mas não são de excluir os elementos interpretativos do dtº civil. É de notar que os interesses subjacentes ás normas juridico-comerciais são de mais difícil apreensão do que os interesses subjacentes às norma juridico-civis, porque os interesses comerciais são mais mutáveis.


6.2INTEGRAÇÃO DO DIREITO COMERCIAL

As regras de integração e preenchimento de lacunas da lei comercial reflectem muitas especialidades em face das regras aplicáveis em geral, na integração das leis: 10º CCiv – o julgador não pode abster-se de julgar:
- primeiro deve recorrer à analogia: norma onde esteja subjacente um interesse do mesmo género;
- se isto não for possível, o legislador elabora uma norma had hoc.


Regra geral da integração : 3º CCom
Manda em 1º lugar interpretar (elemento literal, teleológico-finalista); se não for possível recorre-se a casos análogos da Lei Comercial, procura-se uma analogia no direito civil: ou seja aplicação analógica das normas juridico-comerciais ou, por fim, uma aplicação analógica da normas juridicas civis. Logo, há uma ordem de precedência que deve ser observada.

Regras específicas da integração :
Surgem para certos sectores particulares do Direito Comercial. Por vezes, estas regras específicas vêm confirmar o sentido da regra geral do 3º CCom (ex: 482º CCom – quanto ao contrato de aluguer).


Mas, outras vezes, a lei não vêm confirmar o sentido da regra geral, mas alterar esse sentido de acordo com os seus próprios fins: surge então a regra especifica. Ex: o art 2º CSC diz que, para os casos de omissão, são regulados segundo a norma desta lei aplicável aos casos análogos, e na falta desta, segundo as normas de direito civil sobre o contrato de Sociedade, no que não seja contrario, nem aos princípios gerais desta lei, nem aos princípios informadores do tipo adoptado.”

Assim surgindo uma lacuna de regulação sobre uma relação juridico-societaria, são as seguintes as vias de integração (diferentes das vias gerais) :
1º Aplicação analógica das normas do CSC;
2º Aplicação analógica Subsidiaria das normas de dtº civil, com 2 restrições:
- apenas das normas do direito civil relativas ao contrato de sociedade (990º e sgs.) e por extensão, as normas gerais relativas à declaração negocial (217º ss) e às pessoas colectivas (157º ss).
- só se aplicam se não forem contrárias aos princípios gerais da Lei Societária e aos princípios informadores do tipo de sociedade adoptada (anónima; por quotas; em nome colectivo; em comandita).

Lacunas de qualificação e de regulação :
A distinção destes 2 tipos de lacunas surge devido à necessidade de recorrer à integração analógica no Direito Comercial em 2 momentos diferentes:
1) quando se trata de determinar qual a natureza de uma dada relação juridico-privada (civil ou comercial)  lacuna de qualificação
2) uma vez determinada a natureza comercial de uma dada rrelação jurídica, põe-se o problema de saber qual o regime jurídico aplicável a essa relação jurídica (civil ou comercial)  lacuna de regulação.

Quanto às lacunas de qualificação:

Temos aqui um problema da admissibilidade ou não do recurso à analogia para qualificar uma dada relação jurídica como civil ou comercial, o art. 3ºCCom nada diz sobre isto, porque parte do princípio de que o problema da qualificação de um dado contrato ou operação, como comercial, já esta resolvido – “se as questões sobre direitos e obrigações comerciais....” .Cabe por isso à doutrina resolver este problema.

A doutrina maioritária diz que esta questão não se colocaria dado que não existem lacunas de qualificação, porque o Direito Comercial regula um sector especial de Relações Jurídicas Privadas, donde uma relação jurídico-privada não contemplada pelo Direito Comercial seria uma relaçao jurídica de direito civil.
èCRITICA: Esta posição não pode ser aceite porque esquece a contiguidade dos sistemas de Direito Comercial e do Direito Civil; não anula o problema das lacunas de qualificação, porque a contiguidade dos sistemas não dá resposta a estes problemas. Logo, o problema da analogia tem sentido porque o problema das lacunas de qualificação também têm sentido.
å para resolver este problema, temos de interpretar as normas qualificadoras ou delimitadoras, ou seja, a que delimita o objecto do Direito Comercial, art. 2º CCom, suscitando-se o problema de saber se são ou não admissíveis actos de comércio por analogia.


Temos duas posições fundamentais :

é Maioritária: nega a possiblidade de recurso à analogia, embora admitindo a existência de lacunas de qualificação.

é Minoritária: defende a possiblidade de recurso à analogia na qualificação das relações jurídicas como comerciais, em certos casos. Esta analogia é uma analogia especifica, ou seja, corresponde a uma analogia legis e não a uma analogia iuris.

ò Lacunas de Regulação

A norma do art. 3º CCom é uma norma geral em matéria de integração deste tipo de lacunas e enumera três tipos de vias integrativas:

1. Elementos literal e teleológico;

2. Aplicação analógica do Direito Comercial;

3. Aplicação analógica do Direito Civil.

Ora, conclui-se que é possível o recurso à analogia, e o problema que se coloca é o de saber se o art. 3º estabelece ou não uma ordem de precedência entre as várias vias de integração nele referidas.

Doutrina maioritária (Oliveira Ascensão) – dizem que sim, que são sucessivas as vias de integração;
Doutrina minoritária (Lobo Xavier) – dizem que não, que elas estão em pé de igualdade. Logo, o problema do preenchimento de uma lacuna de regulação no direito comercial devia obedecer, não a um critério formal e geral, mas a um critério substancial e casuístico, tendo em conta a afinidade teleológica-substancial da relação jurídica com uma dada norma, independentemente da sua natureza ser civil ou comercial.

Conclusão
À primeira vista, a letra do 3º CCom induz a ideia de que existe a tal ordem de precedência, de tal forma que as normas civis só seriam aplicadas quando se esgotassem as possiblidades de aplicação analógica das normas juridico-comerciais análogas.

è MAS, muitos casos que pareceriam ser de omissão, não passam de falsos casos omissos. É que muitas vezes o Direito Civil é chamado a regular aspectos de uma relação jurídica comercial que a Lei Comercial não regulou, por entender que esses aspectos já se encontravam suficientemente disciplinados na lei civil geral – ex: art. 463ºss CCom trata do contrato de compra e venda mercantil; não fala da noção e característica de contrato de compra e venda porque isto já esta regulado no 874º CCiv. Também é o caso do art. 1º CSC, que define o que é uma sociedade comercial, mas a noção de contrato de sociedade deixa para o direito civil (988º CCiv).
Aqui há uma intervenção do Direito Civil, não para preencher um caso omisso, mas para completar aspectos que o próprio Direito Comercial deixou para o Direito Civil.

Isto está ligado à natureza fragmentária do Direito Comercial: como só regula aspectos ligados às relações jurídico-comerciais, deixa muitos espaços em branco – casos que voluntariamente a lei comercial deixa à lei civil geral, não podendo falar-se sequer em verdadeiras lacunas de regulação. Ora, as vendas a prestações (etc..) não estão previstas na lei comercial; mesmo assim devem ser qualificadas de comerciais, sempre que estas vendas são afectadas por revenda (artº 463 ss), ou sempre que uma situação cabe no artº 2 CCom.

Embora estas relações sejam comerciais, a sua regulação é feita pela lei civil (934º ss), não havendo necessidade de normas jurídico-comerciais especificas. No entanto, pode existir uma verdadeira lacuna de regulação quando, uma dada relação jurídica já qualificada de comercial, não encontra um regime nem na lei civil nem na lei comercial. Vale aqui a posição segundo a qual o art. 3º CCom não estabelece uma ordem de precedência, ou seja, o Direito Comercial está a par do Direito Civil. A escolha da norma analogicamente aplicável faz-se atendendo à afinidade substancial da norma com o caso omisso e não de acordo com o critério formal da natureza da norma (civil ou comercial).

7-Aplicação da Lei Comercial no Tempo

Aplica-se as regras gerais do artº 5, 7º,12º e 13º CCiv, porque aqui existem regras especiais. O art. 7º/3 CCiv resolve o problema.
Ex: temos uma lei comercial sobre um dado regime que é diferente da lei civil; mais tarde surge uma lei nova civil que fixa um regime diferente para esse aspecto. Será que a lei nova civil revoga a lei comercial? Não, porque a lei geral não revoga a lei especial, logo, esta lei nova civil não revoga a lei comercial, a não ser que, outra seja a intenção do legislador.

7- Aplicação da Lei Comercial no Espaço

Existem muitos problemas, tanto assim que alguns países já têm uma disciplina autónoma denominada de Direito Comercial Internacional. Cada vez há mais problemas neste campo, porque as relações jurídicas comerciais estão cada vez a intensificar-se mais e estão em contacto com vários ordenamentos jurídicos. A regulamentação destas situações compete ao Direito Internacional Privado, 14º e 65º CCiv, mas também há normas contidas por exemplo no arts. 3º,4º, 481º CSC.

8-Fontes do DC

1. enorme dispersão legislativa e sistemática
2. enorme heterogeneidade material
3. complexidade da sua hierarquia – o regime da hierarquia das fontes do Direito Comercial não obedece sempre às regras gerais: há regras específicas. Para alguns, essas normas estão contidas no 3º CCom. Elaborados por certos sectores do Direito Comercial e em diplomas concretos – vd. art. 2º CSC.


INTERNACIONAIS

Fontes Internacionais gerais

As mais importantes são as Convenções Internacionais ratificadas pelo nosso Estado e que, por isso, vigoram entre nós:

- Convenção de Genebra de 1930, que aprovou a LULL;

- Convenções no âmbito dos transportes, propriedade industrial, compra e venda internacionais, “trusts”, etc.

- deliberações das Organizações Internacionais, vinculativas nos termos da carta organizativa.

- Costume também é importante, dado que cada vez mais normas são elaboradas por associações internacionais de comércio (“lex mercadora”) e os agentes comerciais incorporam essas regras, recorrem a elas, explícita ou implicitamente, no âmbito das suas relações. São normas que visam uma interpretação uniforme da terminologia comercial. Não são fonte imediata de Direito, mas simples direito dispositivo, para o qual as partes contraentes podem remeter a regulamentação das respectivas relações comerciais.


Fontes internacionais particulares

- Direito Comunitário. De facto, a maior parte das normas da U.E. incidem sobre o domínio económico e comercial e em virtude dos princípios do primado do Dto Comunitário e da sua aplicabilidade directa faz com que as suas normas sejam directamente aplicáveis no Ordenamento Jurídico português. Neste âmbito temos os regulamentos comunitários directamente aplicáveis no ordenamento jurídico, as directivas, que exigem a sua transposição para ordenamento jurídico, dando ao legislador português uma certa liberdade quanto aos meios e formas dessa transposição.

INTERNAS

- CRP -- Lei Constitucional tem algumas normas pragmáticas, de resto pouca coisa diz.

- Lei Ordinária

Código Comercial, de Veiga Beirão(1888) dividido em quatro partes:
Livro I -- Do comércio em geral
Livro II -- Dos contratos especiais de comércio
Livro III -- Do comércio marítimo
LivroIV -- Das falências
NB: O Código já foi amplamente revogado no que diz respeito a falências, contratos de sociedades, etc.

- Legislação extravagante (fonte de direito interno mais importante do Direito Comercial:
EIRC
CSC
Código do Registo Comercial
Registo Nacional de Pessoas Colectivas
CMVM
CPI
Leis avulsas sobre Comércio, Agência, Franchising, Leasing, Regulamentos Administrativos, etc.

- Costume: é apenas fonte mediata, mas exerceu um papel importante no nascimento e desenvolvimento do Direito Comercial. Consiste numa prática social mais ou menos generalizada e constante por parte dos sujeitos de Direito.
Há que distinguir os casos dos usos mercantis de direito (quando apenas há observância generalizada e uniforme de um padrão de conduta), dos costumes mercantis de direito, (onde, para além da prática reiterada desse padrão de conduta, existia ainda a convicção subjectiva por parte dos sujeitos da obrigatoriedade dessa conduta, como se de uma norma legal se tratasse).
O costume é fonte mediata, porque o art. 3º CCom não fala dele; por outro lado, o facto da lei comercial nalgumas das suas normas se referir ou remeter para o costume, fá-lo apenas por razões de técnica legislativa, simplicidade, comodidade e por economia legislativa.

- Jurisprudência e Doutrina: há assentos do STJ que uniformizaram a jurisprudência, mas estas deixaram de ter força obrigatória geral. A Doutrina não é fonte de Direito Comercial mas tem muito impacto nos quer nos tribunais, quer na construção do Direito Comercial.


Cap. II-Actos Jurídico-Comerciais

1.Noção,Estrutura e Relevo

O art.1º CCom diz que “a lei comercial rege os actos de comércio, sejam ou não comerciantes as pessoas que neles intervêm” e o art. 2º preceitua que “serão actos de comércio todos aqueles que se acharem especialmente regulados neste Código e, além deles, todos aqueles que se acharem especialmente regulados neste Código e além deles, todos os contratos e obrigações dos comerciantes, que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário do próprio acto não resultar”: isto significa que é preciso definir acto comercial, para se delimitar o âmbito do Direito Comercial. No entanto o legislador português não consagrou a definição de acto de comércio; pelo contrário, é dada uma mera noção substantiva, que se limita a enunciar quais os actos comerciais, remetendo para os vários pontos da lei onde os actos aparecem qualificados como tal. Houve várias tentativas na doutrina para definir acto comercial; a mais conhecida foi elaborada por Rocco, nos anos 30, que pretendeu encontrar a essência do acto comercial na circunstância de esta ser um acto de interposição entre a oferta e a procura.

Crítica: esta definição peca por defeito, porque há actos que não envolvem qualquer interposição entre a oferta e a procura. Ex: a letra de câmbio; as empresas transformadoras (são, por força do art. 230º CCom, qualificadas como empresas comerciais; ora se o produtor vender directamente os seus produtos ao consumidor, o acto praticado por esta empresa é um acto comercial e no entanto não há qualquer acto de interposição): também peca por excesso porque também há actos civis que envolvem uma interposição entre a oferta e a procura. Ex: mandato sem representação.

A doutrina de Garrigues afirma que a essência do acto de comércio se encontra no facto de ser um acto com intuito lucrativo ou especulativo, mas, em bom rigor, há actos de comércio que podem não ter finalidade lucrativa (subscrição de uma letra de câmbio; um dado operador económico vende um produto abaixo do preço de custo apenas para eliminar um concorrente), ou ter apenas uma finalidade lucrativa mediata (ex: art. 6º CSC – prática das sociedades que oferecem brindes aos clientes por promoção de um dado produto). Inversamente há actos civis que prosseguem fins lucrativos. Ex: contrato de sociedade (art. 980º CCom), pressupõe que os associados prossigam uma finalidade lucrativa; além disso, as sociedades agrícolas estão excluídas do Direito Comercial por força do art. 230º CCom, mas visam o lucro.
Para Hock, o que caracteriza os actos de comércio é o facto de serem praticados em massa; mas a verdade é que há actos de comércio praticados esporadicamente ou ocasionalmente por particulares.
Galvão Telles define acto de comércio como um contrato produtivo; mas isto não é suficiente para o conceito de acto de comércio, porque há actos comerciais que não são negócios jurídicos bilaterais (contratos) e há outros que nem sequer são negócios jurídicos – ex: os negócios cambiários em geral. Além disso, há contratos civis que podem caracterizar-se como contratos produtivos: contrato de trabalho, contrato de empreitada, etc.

Oliveira Ascensão define o acto de comércio como um acto empresarial; a sua ideia centra-se sobretudo no factor capital. No entanto há actos de comércio que não têm qualquer conexão com a actividade empresarial (ex: compra para revenda), assim como há actos civis que são praticados no âmbito de uma actividade empresarial (ex: empresas agrícolas).


A importância da noção de acto comercial tem uma dupla dimensão: teórica e prática.

A importância teórica resulta da leitura do art. 1º do CCom, dado que o nosso legislador associou a delimitação do âmbito do Direito Comercial à própria noção de acto comercial.

A importância prática resulta por sua vez, do facto dos actos comerciais estarem ligados a um regime jurídico especial, diferente do regime jurídico geral aplicável em regra aos actos de direito privado. Este regime jurídico é especial quer a nível processual quer a nível substantivo. A nível processual porque em vários países e em Portugal até 1930 havia os tribunais de comércio e havia o código de processo comercial que desapareceu com a entrada em vigor do C.P.Civil. A nível substantivo porque os actos de comércio estão sujeitos a regras especiais em várias matérias: liberdade de forma (96ºe 97ºC.Com), solidariedade passiva, responsabilidade dos bens do casal por dívidas emergentes dos actos de comércio praticados por um dos cônjuges, juros legais das obrigações comerciais, prescrição das obrigações comerciais.

A qualificação de acto jurídico privado com comercial também é importante para a (1) atribuição da natureza comercial a contratos que são de direito civil comum, regulados pela lei geral mas que se forem associados à prática de um acto comercial, passam a ter natureza mercantil: mandato, penhor, fiança, empréstimo comercial, etc. Também é importante para (2) efeitos de atribuição da qualidade de comerciante , dado que o art. 13º/1 CCom estipula que a prática reiterada e sistemática de actos de comécio faz atribui a qualidade de comerciante a quem os pratica.

1.2-Estrutura do acto comercial

O acto comercial encarado do ponto de vista de um facto jurídico, em sentido amplo, engloba várias modalidades
:
1. os factos jurídico-comerciais em sentido estrito: serão todos aqueles actos involuntários ou naturais. Podem derivar, do decurso do tempo – o decurso do tempo é um elemento fundamental desta figura – ex: prazos de prescrição dos direitos cambiários, prazos de prescrição jurídico-sociatários; destruição do objecto segurado nos casos fortuitos e de força maior (art. 439º CCom).
2. Os actos jurídicos podem ser lícitos ou ilícitos
Lícitos – a inversão art. 47º CPI, a interpelação dos accionistas em mora.
Ilícitos – uso ilegal da firma (665º CCiv)
3. Os negócios jurídicos podem ser unilaterais e bilaterais:
Bilaterais – compra e venda mercantil (463ºCCom), mandato mercantil (231ºCCom)
Unilaterais – obrigações cambiárias, subscrição de uma letra de câmbio (art. 1º LULL) constituição de uma sociedade unipessoal (488º CSC)

2. Classificação dos actos comerciais

Actos comerciais objectivos e subjectivos (esta distinção precede do art. 2º CCom)

actos de comércio objectivos – são aqueles cuja relevância jurídico-comercial deriva do seu conteúdo objectivo, independentemente do autor do acto. Trata-se de uma comercialidade in re. Ex: realização esporádica, ocasional, de uma compra para revenda feita por um particular (a sua comercialidade resulta do art. 463º CCom).

actos de comércio subjectivos – são aqueles cuja relevância jurídico-comercial deriva, não do seu conteúdo objectivo, mas da pessoa que os pratica. Trata-se de uma comercialidade in persona. Logo, todos os actos de natureza patrimonial praticados por um comerciante presumem-se comerciais – são actos subjectivamente comerciais, cuja comercialidade deriva da qualidade do comerciante do autor do acto. Esta classificação tem alguma importância prática, para efeitos de aquisição da qualidade de comerciante (de acordo com o art. 13º CCom) e para efeitos de constituição de sociedades comerciais, já que só serão comerciais aquelas que pratiquem actos de comércio objectivos (art. 1º/2 CSC).

Críticas feitas a esta distinção:
a) existem muitos actos de comércio objectivos cuja relevância jurídico-comercial depende também da qualidade de comerciante do seu autor, caso do contrato de transporte, que está no artº366 C.Com – constitui um acto cuja comercialidade não reside apenas apenas no facto de estar previsto na lei comercial, mas também depende de uma condição subjectiva: a própria lei requer que as partes contraentes sejam comerciantes.
b) A relevância jurídico-comercial dos actos de comércio subjectivos depende da sua própria natureza ou conteúdo objectivo dos próprios actos ex. a 2ª parte do artº2 C.Com diz que serão considerados a.c, os actos praticados por comerciantes, para além condição subjectiva, exige ainda que o acto não tenha uma natureza exclusivamente civil e que o contrário não resulta do próprio acto.

Conclusão: Esta classificação é apenas tendêncial, porque não há actos de comércio objectivamente puros, nem actos de comércio subjectivamente puros. A propósito desta distinção coloca-se a questão de saber o alcance do art. 230º, artigo que atribui natureza comercial às empresas que aí são enumeradas; o problema está em saber se se trata de um actos de comércio subjectivo ou objectivo.
2 teses:
a) de acordo com a posição mais antiga (Cunha Gonçalves), qualquer das empresas aí enumeradas são um actos de comércio objectivo porque as empresas comerciais seriam um actos de comércio como os outros: mercado mercantil, conta de participação, conta corrente, etc. É de recusar, porque a empresa constitui uma organização complexa cuja actividade se multiplica numa multiplicidade de actos, desde a sua constituição até à sua dissolução, faltando dizer quais de todos esses actos seriam actos de comércio objectivos, o que não seria respondido.
b) Vasco Lobo Xavier considera que, o que aqui haveria, seria uma multiplicidade de actos comerciais objectivos. Ex: quando se diz no art. 230º/4 que se deve considerar como uma empresa comercial aquela que explora quaisquer espectáculos públicos, o que se pretende dizer é que serão actos de comércio todos os actos que o empresário pratique no desenvolvimento da respectiva empresa (contratos, actos jurídicos lícitos ou ilícitos e os factos jurídicos seriam todos eles actos de comércio individualmente objectivos.
c) José Tavares considera que o que o legislador pretendeu aqui atribuir a qualidade de comerciante ao empresário, ou seja, o legislador não pretendeu qualificar todos e cada um dos actos praticados pelo empresário como actos comerciais objectivos, mas antes atribuir a qualidade de comerciante ao empresário.

Pouca é a diferença entre estas duas últimas teses, porque ambas chegam ao mesmo resultado – reconhecer relevância jurídico-comercial a todos os actos que sejam praticados no contexto dessa actividade empresarial. A única diferença é que Vasco Lobo Xavier considera que os actos são objectivamente comercias, e, para José Tavares, os actos serão subjectivamente comerciais. A mais sensata parece ser a de Vasco Lobo Xavier, pois o empresário acaba por adquirir a qualidade de comerciante por praticar esses actos de uma forma constante e sistemática.

Actos comerciais absolutos e Actos comerciais relativos ou acessórios (esta classificação teve origem na jurisprudência francesa)

actos de comércio absolutos – são aqueles cuja relevância jurídico-comercial deriva da sua natureza intrínseca, a sua comercialidade radica no próprio acto – ex: conta-corrente (artº344 CCom), compra e venda mercantil (art. 463º CCom), reporte (art. 477º CCom), troca mercantil (art. 480º CCom).

actos de comercio relativos – são aqueles cuja relevância jurídico-comercial resulta da sua conexão ou acessoriedade com um acto de comércio absoluto. A sua comercialidade resulta da conexão com uma actividade mercantil ou com o comércio em geral – ex: fiança mercantil (art. 101º CCom), mandato mercantil (art. 231º CCom), penhor mercantil art. (397º CCom), empréstimo mercantil (art. 394º CCom), depósito mercantil (art. 403º CCom). Estes actos foram qualificados como comerciais pelo legislador, devido à sua conexão com outros actos de comércio, esses sim, actos absolutos.

Na sequência desta classificação surgiu a teoria do acessório, desenvolvida sobretudo pela doutrina e jurisprudência francesa, e importa ter em conta dois aspectos:
a) a teoria do acessório assemelha-se à classificação de actos de comércio objectivos e subjectivos e como que leva às últimas consequências a lógica dos actos comerciais acessórios (que serão os actos conexos com toda a actividade mercantil por mais residual que este seja). Esta teoria defende que são comerciais quaisquer actos, desde que conexos com a actividade mercantil, alargando assim, o âmbito do Direito Comercial.

b) os actos acessórios não se podem confundir com os actos de comércio qualificados pela teoria do acessório. A comercialidade destes últimos, resulta de uma pura extensão doutrinal e não da própria lei, ao passo que, em relação aos actos comerciais acessórios é a própria lei que diz que se trata de um acto de comércio.


Para a doutrina dominante (Ferrer Correia), esta classificação tem relevância para a atribuição da qualidade de comerciante (art.13º CCom). Estes autores dizem que só pode adquirir a qualidade de comerciante aquela pessoa que pratica de modo reiterado e sistemático actos de comércio absolutos e já não actos de comércio relativos.

No entanto Vasco Lobo Xavier entende que parece não haver razões fortes para que, pelo menos em certas circunstâncias, a prática reiterada e sistemática dos actos comerciais relativos não possa ser suficiente para atribuir ao seu autor a qualidade de comerciante. De facto, não é de recusar a qualidade de comerciante a quem possui um armazém destinado a depósito de mercadorias, sendo estes para revenda. Há uma presunção de acessoriedade subjectiva porque se presume que todos os actos do comerciante são actos de comércio porque conexos com a sua actividade. Quanto à acessoriedade objectiva não há nenhuma presunção, só existe nos casos expressamente previstos pelo legislador.


Actos formais e substanciais (materiais)

actos de comércio formais – actos cuja relevância juridico-comercial reside na sua simples realização, independentemente do objecto de operação subjacente a esse acto, do fim da operação que lhe esteja subjacente, ou da pessoa que pratica esse acto.
A lei comercial regulou certos institutos jurídicos que podem ser utilizados por qualquer pessoa, comerciante ou não, e para a realização das mais variadas operações, quer de carácter civil quer de carácter mercantil – ex: letra de câmbio (dois indivíduos particulares, celebram um contrato de compra e venda de um automóvel que é destinado ao uso particular do comprador e da sua família; como não foi logo pago, acordaram que a dívida fosse titulada por uma letra de câmbio, subscrita pelo comprador a favor do vendedor; a subscrição desta letra de câmbio é um acto comercial formal).

O simples preenchimento do esquema formal da lei (que é a subscrição da letra) é suficiente para qualificar o acto como comercial, ainda que os autores nada tenham a ver com o comércio (são simples particulares) e ainda que a operação subjacente a esta subscrição da letra nada tenha a ver com o comércio: o contrato destina-se a fins particulares. Noutros países (como na França) as sociedades comerciais são actos comerciais formais, ou seja, nesses países para que a sociedade seja comercial basta que ela adopte uma forma comercial, ou seja, um daqueles tipos especialmente previstos na lei.

Em Portugal, além da forma exige-se o requisito relativo ao objecto, isto é, que a sociedade tenha por objecto a prática a prática de actos de comércio. Assim nos países em que não se exige este requisito relativo ao objecto, a sociedade comercial é um acto comercial formal porque a sua utilização pode ser feita por simples particulares, até mesmo para a prática de actos civis, que nada têm a ver com o comércio.

actos de comércio materiais ou substantivos – são actos cuja relevância jurídico-comercial reside na natureza intrínsecamente comercial do objecto ou da finalidade subjacente ao acto. Ex: suponhamos que subjacente à subscrição de uma letra de câmbio está uma operação de carácter mercantil: contrato de compra e venda de um automóvel realizado entre um particular e um stand de automóveis. Neste caso, é uma operação de carácter mercantil, pelo menos do lado do comprador, e como ele tinha adquirido o automóvel para revenda (art. 463º CCom) é um acto de comércio material.

Relevância jurídica desta distinção manifesta-se em 2 aspectos:
a) Para efeitos de atribuição da qualidade de comerciante nos termos do art. 13º CCom. Só adquire a qualidade de comerciante aquele que pratica de uma forma reiterada e sistemática a.c materiais, não adquirindo esta qualidade quem pratica, ainda de uma forma reiterada e sistemática a.c formais ex. quem subscreva de um modo regular e sistemático letras, não adquire por isso, a qualidade de comerciante.

b) Para efeitos de aplicação do artº10 C.Com a propósito das dívidas emergentes de actos de comércio. O artº 10 estabelece um regime excepcional em relação ao regime geral fixado na lei civil em matéria de possível agressão ou não agressão dos bens ou da obrigação do casal por dívidas emergentes de um acto de comércio. Este regime excepcional traduz-se na matéria fixada no artº 1696º/1CCiv. O artº 10 diz que não há lugar ao regime geral quando for de exigir de qualquer dos cônjuges o cumprimento de uma obrigação derivada do comércio, ainda que o seja só relativamente a uma das partes. O artº 10 só se aplica quanto a dívidas emergentes de actos de comércio materiais e não a dívidas emergentes de actos de comércio formais.

Actos de comércio puros e mistos
actos de comércio puros ou bilaterais – são actos bilateralmente comerciais, ou seja, actos que revestem uma natureza comercial relativamente a qualquer um dos sujeitos nele intervenientes, tanto o sujeito activo como o passivo.
actos de comércio mistos ou unilaterais – são actos unilateralmente comerciantes, ou seja, actos que revestem natureza mercantil apenas para uma das partes que nele intervêm, e não para ambas. Ex: um particular adquire, para fins particulares, um automóvel – é um acto de comécio misto, porque este contrato de compra e venda tem natureza comercial relativamente ao vendedor (stand) dado que este adquire automóveis para revenda (e por força do art. 463º/1 e 3 é um actos de comércio. Mas esta compra e venda, na perspectiva do comprador, é um acto meramente civil, porque este adquiriu o automóvel para uso particular, logo, de acordo com o 464º/1, esta compra e venda é considerada não comercial.

Conclusão: este contrato de compra e venda é um acto de comércio misto – comercial para uma das partes (vendedor) e civil para a outra (comprador).

A relevância desta classificação, tem sobretudo a ver com o regime jurídico aplicável. Que aos actos puros se aplica a lei comercial, não suscita quaisquer dúvidas; a questão coloca-se apenas em relação aos actos mistos. Aplica-se a lei civil, a lei comercial ou ambas?
É de notar que esta discussão não é de moral teórica, também tem uma grande importância prática, porque o regime da lei comercial é diverso do regime da lei civil.

Ex: 2 agricultores vendem parte da sua colheita a 2 comerciantes – é um acto de comércio misto, é civil pela parte dos vendedores (agricultores), por força do art. 464º,2 e por outro lado, é comercial pela parte dos compradores (comerciantes), por força do art. 463,1.
Este último caso seria, relativamente aos compradores, desde logo comercial – por força da qualidade de comerciante do autor; seria por isso subjectivamente comercial (e materialmente comercial).

Logo, não é indiferente um ou outro regime:
- se o regime aplicável for o da lei civil, então a obrigação dos agricultores (vendedores) que consiste na entrega dos produtos, é uma obrigação conjunta; o regime regra das obrigações civis plurais é a conjunção (art. 513º C.Civil)
- se o regime aplicável for a lei comercial, a obrigação dos vendedores será uma obrigação
solidária, porque o regime regra das obrigações comerciais, por força do art. 100º CCom é a solidariedade passiva. Significa isto que, se a lei civil for a lei aplicável, os comerciantes só poderão exigir de cada um dos agricultores a quota parte que lhes cabe no débito; se for comercial, os comerciantes poderão exigir de qualquer um dos agricultores a totalidade do débito em causa.

São 2 as soluções que se podem adiantar quanto ao regime jurídico aplicável:
- sistema da cisão: é vigente em França e consiste em aplicar simultaneamente o regime da lei comercial à parte relativamente à qual o acto tem natureza comercial e o regime da lei civil àquela parte para a qual o acto é civil.
- Sistema da unidade: sujeita os actos comerciais mistos a um único regime jurídico em relação a ambas as partes. A maioria dos países que adoptaram o sistema da unidade aplicam o regime da lei comercial .

- Sistema português: adoptou-se um sistema da unidade mitigada. O preceito fundamental nesta matéria é o art. 99º CCom que estabelece uma regra base e várias excepções. A regra é a de que os Actos Comerciais mistos estarão sujeitos às disposições da lei comercial em relação a ambas as partes. A excepção diz respeito àquelas disposições da lei comercial que só sejam aplicáveis à parte em relação à qual o acto é comercial – “salvo os que só forem aplicáveis àqueles por cujo respeito o acto é o mesmo “.

São 2 os principais grupos de normas da lei comercial que só são aplicáveis aos sujeitos relativamente aos quais o acto tem natureza exclusivamente comercial:

a) disposições da lei comercial q estão associadas ao estatuto de comerciante. Ex: o art.18º CCom que fixa as obrigações dos comerciantes, como a adopção de firma, escrituração mercantil, etc; as normas que estabelecem regimes probatórios especiais para os comerciantes, tais como o art. 396º e 400º CCom.
b) normas que expressamente auto-delimitam o seu campo de aplicação à parte relativamente à qual o acto é comercial. Ex: art.100º CCom que estabelece como regra a solidariedade passiva das obrigações comerciais. As normas do art. 475º e 473º relativas à compra e venda mercantil fixam certas regras particulares que apenas são aplicadas a comprador ou vendedor mercantil. Outro exemplo é o caso de certas normas em matéria de juros que vencem créditos das empresas comerciais.


ACTOS DE COMÉRCIO CAUSAIS E ABSTRACTOS

Actos de comércio causais:
São aqueles actos de comercio que estão vocacionados para a realização de uma determinada e especifica operação mercantil. Ex: a compra e venda mercantil consagrada no art. 463º. Este artigo visa uma causa especifica, uma dada operação mercantil perfeitamente definida, que é a alienação da propriedade d uma coisa a troco d um preço.

Actos de comércio abstractos:
São aqueles actos de comércio que são idóneos para realizar, não uma dada operação mercantil especifica, mas sim uma pluralidade d operações mercantis – ou seja, uma pluralidade de causas atípicas. Ex: subscrição de uma letra e câmbio, que pode ter subjacente operações económico-mercantis ou operações civis da mais variada natureza.


3. o art. 2º CCom

O art. 2º CCom – diz que serão considerados actos de comércio todos aqueles que se acharem especialmente regulados neste código e além deles todos os contratos e obrigações dos comerciantes que não forem d natureza exclusivamente civil, se o contrario não resultar do próprio acto.
A importância deste artigo resulta, desde logo, do art. 1º CCom segundo o qual a lei comercial rege os actos comerciais, pois o art. 2º tem por função delimitar quais são os actos de comércio e, como tal, delimitar o próprio objecto do direito comercial português. Este art. 2º CCom é um preceito complexo: tem um carácter híbrido, pois possui dois pontos distintos a que correspondem dois critérios distintos da qualificação da comercialidade dos actos.

3.1 - a 1ª parte do art. 2º do CCom:

3.1.1 - Considerações gerais e âmbito:
Dá-nos um critério de acordo com o qual “serão considerados actos de comércio todos aqueles que se acharem especialmente regulados neste código”.
A determinação do que seja um acto de comércio pode ser feita através de três técnicas:
1. Sistema da definição: a lei diz em abstracto (em absoluto) o que considera um acto de comércio.
2. Sistema da enumeração expressa: tanto pode ser taxativa como exemplificativa, consoante consistir num numerus clausus ou num elenco aberto de actos comerciais (o código francês, p. ex., tem um elenco aberto de actos de comércio.
3.
4. Sistema de enumeração implícita: o legislador não diz directamente quais são os actos que considera comerciais, mas fà-lo indirectamente através de uma norma de remissão.
É este o sistema adoptado pelo legislador português. O art. 2º CCom é uma norma remissiva, pois não diz quais são os actos de comércio, remetendo para outros pontos da mesma lei.

Quais são os actos especificamente regulados no Código Comercial?

São 4 as fundamentais categorias de actos de comércio que se poderiam englobar nesta expressão do art. 2º CCom:

1. Actos exclusivamente regulados no CCom – conta corrente, contrato d transporte, seguros, reporte, etc. Esta categoria não suscita dúvidas.

2. Actos não exclusivamente previstos na lei comercial – isto é, actos não só regulados na lei comercial mas também na lei civil (actos simultaneamente regulados no Código Civil e no Código Comercial.
Ex: fiança, mandato, penhor, empréstimo, depósitos.

Isto não suscita dúvidas, devido ao carácter subsidiário do direito civil face ao direito comercial e sua natureza fragmentária.

3.Actos regulados em legislação comercial avulsa e posterior ao Código Comercial – actos relativos a títulos de crédito regulados na LULL; actos relativos às Sociedades Comerciais (regulados no C.S.C.); a locação financeira (leasing), regulado no DL 171/79; associação com participação; contrato de consórcio (DL 231/81); contrato d agência (DL 178/86).

Estes actos são de incluir na 1ª parte do art. 2º CCom. De acordo com uma interpretação literal do art. 2º CCom, os actos regulados no Código Comercial são actos de comérciomas já não o serão todos aqueles que são regulados em legislação avulsa, posterior ao código; logo, esta categoria de actos não constituiriam actos de comércio.
Isto não se pode aceitar e, como tal, temos que fazer uma interpretação actualizada da legislação de 1888: são actos de comércio todos os actos regulados na lei comercial (cf. necessidades do comércio). Esta interpretação é confirmada pelo art. 4º da Carta da Lei do Comércio, de 29/06/1888. Este preceito demonstra com clareza a vontade do legislador de 1888 em abranger, não só os actos previstos no Código Comercial, mas também todos aqueles que viessem a ser consagrados por preceitos jurídico-comerciais posteriores, e que só por vontade alheia ao legislador não viriam a ser consagrados em lugar próprio. P. ex., normas de Sociedades Comerciais, ou as referentes aos títulos de crédito estão hoje reguladas em diplomas especiais que só não foram introduzidos em lugar próprio no CCom, por razões alheias à vontade do legislador.

Questão: quando é que uma dada lei avulsa e posterior ao CCom deverá ser considerada comercial para o efeito de qualificar o acto regulado nessa lei como um acto comercial nos termos do art. 2ºCCom (1ªparte)?

Por via de regra a própria lei classificar-se-á a si própria como civil ou comercial. O problema existe quando a lei nada diz.

a) Há autores que consideram que sempre que uma lei não se qualifique a si própria como comercial, dever-se-á qualificar necessariamente como de direito civil.

b) Outros autores consideram admissível a qualificação como comercial de uma dada lei que não se auto-qualifica como comercial. Estes autores propõem um critério teleológico, ou seja assente na tentativa de descobrir os interesses subjacentes a essa lei, isto é, descobrir se os interesses que essa lei visa proteger são relativos ao comércio. Se se concluir afirmativamente, essa será uma lei comercial; senão será uma lei civil.
Ex: art.115º RAU q se refere ao trespasse do estabelecimento comercial ou industrial. Esta norma visa permitir ao comerciante desvincular- se do Estabelecimento Comercial sem ter de o desmembrar; faz a transmissão do estabelecimento no seu todo (mesas, cadernos, etc.). O interesse subjacente é o comercial, por isso a norma do art.115º deve ser considerada uma norma comercial.

5. Actos inominados – não estão regulados nem na lei civil nem na lei comercial. Saber se poderão ser considerados como actos comercias depende da posição que se tomar em relação à admissão da analogia no direito comercial no que se refere à qualificação dos actos de comércio.

3.1.2 - O problema da analogia na qualificação dos AC:

Há lacunas de qualificação (não sabemos a natureza do acto) e de regulação (não sabemos qual o regime aplicável).

O problema da analogia surge apenas quanto às lacunas d qualificação.

Deve entender-se ou não, q o art. 2º (1ª parte) CCom permite ou veda a qualificação de um certo acto como acto comercial, por analogia?
Ex: compra e venda de imóveis para locação. Não é um acto especialmente regulado no código; é um acto inominado. Mas, há dois actos análogos que o são: a compra d móveis para aluguer (art.463º,1 C.Com.) e a compra de imóveis para revenda (art. 463º/4 CCom). Será possível qualificar a compra e venda d imóveis para locação como comercial através da analogia que este artigo possui com aqueles dois preceitos comerciais, expressamente qualificados na lei comercial?

Duas posições na doutrina qto ao problema da analogia:

A) posição dominante (Pinto Coelho Brito Correia, Oliveira Ascenção) nega a admissibilidade da analogia na qualificação dos actos de comércio:

1. Argumento de ordem lógica: o problema da analogia não se pode colocar em direito comercial, porque neste ramo do direito nem sequer existem lacunas de qualificação. Isto porque, sendo o Direito Comercial um dto privado especial face ao direito civil, e regulando este direito uma classe específica da relação jurídico-privada cuja disciplina geral pertence ao direito civil, toda a relação jurídico-privada que não seja contemplada na lei especial será uma relação civil. Os dois ramos do Direito são perfeitamente contíguos; logo, não há lugar a casos omissos no Direito Comercial, porque uma relação que não é comercial só pode ser civil.

2. Argumento literal: o art. 2º CCom apenas reconhece a relevância jurídico-comercial dos actos comerciais objectivos (especialmente regulados na lei) e dos actos comerciais subjectivos (dos contratos e obrigações dos comerciantes), não referindo nenhuma 3ª categoria que seria a dos actos comerciais objectivos por analogia.

3. Argumento de ordem positiva: se a lei diz que apenas são actos de comércio os especialmente regulados no Código Comercial, então seria absurdo admitir a qualificação de certos actos por analogia.

4. Argumento histórico: baseado no facto do Código Comercial Espanhol, que foi uma das fontes do nosso Código Comercial, consagrar expressamente uma categoria de actos comerciais por analogia. A omissão desta referência no nosso art. 2º só pode significar que constitui efectivamente vontade do legislador de 1888 excluir a possibilidade de recurso à analogia.

5. Argumento de segurança e certeza jurídica: o recurso à analogia seria incompatível com as exigências de certeza jurídica que devem rodear a qualificação dos actos comerciais.
Sendo o regime substantivo aplicável aos actos de comércio diferente daquele que vigora para o direito civil, a possibilidade dos actos comerciais serem qualificados por analogia conduziria a uma insegurança jurídica insustentável. Nunca se saberia bem qual o regime jurídico substantivo aplicável, nem qual a via processual própria para apreciar litigios emergentes desses actos. Sendo o estatuto do comerciante derivado da prática reiterada e sistemática de actos de comércio, é evidente que a admissibilidade da qualificação de actos de comércio por analogia vai também introduzir na qualificação dos comerciantes uma certa insegurança.
Por outro lado não se deveria admitir a qulificação de actos comerciais por analogia, uma vez mais por razões de segurança jurídica, dado que não existe uma noção unitária do que seja acto de comercio.

B) Doutrina minoritária (Lobo Xavier, B. de Magalhães) admite o recurso à analogia na qualificação dos actos de comércio, mas apenas em certas circunstâncias. Estes autores defendem uma solução mitigada e fazem-no quer pela positiva, quer pela negativa.

Pela negativa: consideram inaceitável o formalismo de alguns dos argumentos defendidos pela posição contrária.
1. Quanto ao argumento de ordem lógica – a contiguidade dos sistemas de Direito Comercial e Direito Civil não exclui, de modo algum, o problema das lacunas de qualificação e, por isso, há problema de recurso à analogia. Posto isto, põe-se a questão de saber onde se deve situar a linha de fronteira entre o sistema de Direito Comercial e o sistema de Direito Civil. Como a resposta é dada caso a caso, o problema das lacunas também surge caso a caso.

2. Quanto ao argumento literal, este dá por demonstrado aquilo q justamente se pretende demonstrar. É obvio q o art. 2º C.Com. só refere AC objectivos e subjectivos; a questão está precisamente em saber se para além desses 2 tipos essenciais haverá lugar a uma 3ª categoria ( os AC objectivos por analogia).

3. Quanto ao argumento de ordem positiva, estes autores dizem tratar-se mais propriamente de um trocadilho lógico do que de um verdadeiro argumento. É evidente que o problema da analogia não é aqui referido formalmente nos casos especialmente regulados no código, mas sim materialmente à altura de se saber se poderão haver actos que se qualifiquem como comerciais em razão dos interesses ou necessidades pertinentes a esses mesmos actos.

Pela positiva: a questão a dar à admissibilidade ou inadmissbilidade da analogia deve ser resolvida de acordo com as vantagens e desvantagens práticas de cada uma das soluções existentes.

Estes autores reconhecem alguma verdade aos argumentos históricos e de segurança juridical, embora tais argumentos não tenham a força que à primeira vista poderia parecer:
- a vontade do legislador histórico é histórica, tem mais de um século e não é uma vontade muito importante;
- o argumento de segurança jurídica encontra-se hoje um pouco desvalorizado em face da abolição dos tribunais de comércio.

Posto isto, não aceitam a posição que nega a analogia, senão todos os instrumentos jurídicos criados devido à expansão das actividades económicas ao longo do tempo poderiam vir a ser consideradas matéria civil e ser reguladas exclusivamente pela lei civil, pelo simples facto do legislador não ter o cuidado de os qualificar expressamente como comerciais. Contudo, estes autores não propõem a admissibilidade de toda a analogia, mas sim uma solução intermédia ou mitigada, que consiste na admissibilidade da chamada “analogia legis” e recusa da “analogia iuris”.

Analogia legis: é de admitir. È a analogia referida a casos normativos concretos, ou seja, admite-se a qualificação de um acto pela analogia que esse acto tem com a hipótese legal concreta de uma dada norma jurídico-comercial.
Analogia iuris: não é de admitir. Não é admissível proceder-se à qualificação de um dado acto como comercial mediante o recurso à analogia como um conceito geral e abstracto de actos de comércio, com os princípios gerais informadores de direito comercial ou até de um sector do direito comercial.
Ex: princípios informadores das sociedades comerciais para qualificar um acto como comercial.

Limite à analogia legis: A analogia legis não poderá ser aplicada em relação àqueles tipos de actividades económicas que o legislador histórico quis expressamente excluir do domínio da legislação comercial.
Ex: as actividades agrícolas, o art.230º parag 1ª e 2º exclui as empresas agrícolas do domínio mercantil.

Conclusão: esta é a posição mais aceitável, ainda que minoritária, porque não exclui liminarmente o recurso à analogia para o preenchimento das chamadas lacunas de qualificação.
Esta directiva metodológica pode ser concretizada na prática, por ex., no contexto das empresas comerciais através do art. 230º. Ora, este preceito tem mais de um século e o seu elenco de empresas comerciais é extremamente restritivo. Desde a publicação do Código Comercial até aos nossos dias que se tem assistido não só ao desenvolvimento e expansão das actividades empresariais que o art. 230º refere, mas também ao aparecimento de novas actividades empresariais que nele não estão contidas. È evidente que também estas se devem qualificar como comerciais.
Nalguns casos faz-se uma interpretação declarativa ou extensiva dos números pertinentes do art.230º.

Exemplos:
1- As empresas distribuidoras de água, gás, electricidade, telefone, TV cabo, etc, podem ser consideradas empresas comerciais através de uma interpretação extensiva do 230º/2 segundo o qual “haver-se-ão por comerciais as empresas comerciais, singulares ou colectivas, que se propuserem fornecer em épocas diferentes, géneros, quer a particulares, quer ao estado, mediante preço convencionado”. Através de uma interpretação extensiva pode considerar-se que estes bens constituem “géneros” no sentido deste preceito.
2- As empresas de transporte aéreo não poderão deixar de ser classificadas como comerciais pela interpretação extensiva do 230º/7. Este fala apenas em transporte por água ou por terra, pelo simples facto de, na altura em que foi elaborado, não ser ainda conhecido o transporte por ar.

Para qualificar como comerciais as empresas de serviços, não chega a interpretação extensiva, é preciso a integração analógica, pois o 230º/2 fala em géneros e os serviços não são bens corpóreos. Mas há no 230º/2 uma base para a analogia legis. Esta posição defende que, para se saber se é possivel a qualificação como comercial de um acto por analogia, é necessário ver se existe uma analogia substancial dos interesses que estão subjacentes no acto que se quer qualificar por analogia, e ao acto que serve de base à operação analogical.

Qual a razão ou fundamento teleológico de ser do 230º2CCom?
A razão de ser da qualificação comercial das empresas aí referidas parece ser a existência de um factor de risco proveniente do facto de existir um certo período de tempo que medeia neste tipo de actividades comerciais, entre o momento de fixação do preço pela empresa e o momento dos sucessivos fornecimentos dos bens em causa.
Então, há base para analogicamente se qualificar também como comerciais as empresas de prestação de serviços, uma vez que também nestas está presente o tal factor de risco que advém da intermediação temporal entre o momento da fixação do preço e o momento dos sucessivos actos de fornecimento desses serviços. Logo, deve qualificar-se como comercial a maioria das empresas de serviços. Logo, deve qualificar-se como comerciais a maioria das empresas de prestação de serviços: agências de turismo e de viagens, empresas de publicidade, empresas transitórias, empresas de gestão de bens, empresas hoteleiras, empresas funerárias, etc...
É de notar que o contrato de agência tem, hoje, uma qualificação expressamente comercial: DL 178/86. Mas, mesmo antes disso, não se deveria recusar a sua qualificação dada a analogia que este negócio juridico possui com dois actos comerciais expressamente regulados no Código Comercial: mandato mercantil (231º) e comissão (266º). Um outro exemplo poderia ser o chamado “leasing”, contrato de locação financeira, que hoje está expressamente qualificado como comercial pelo DL 171/79, mas que anteriormente podia ser já qualificado como comercial, mediante uma analogia substancial dos interesses que visa proteger com uma figura expressamente regulada na lei comercial: o aluguer mercantil (481º CCom).


3.1.3. O PROBLEMA DA TEORIA DO ACESSÓRIO:

Foi dessenvolvida sobretudo pela doutrina e jurisprudência francesas. De acordo com ela, seria de atribuir relevância jurídico-comercial aos actos praticados pelos comerciantes que fossem acessórios da respectiva actividade mercantile (acessoriedade subjectiva) e ainda aos actos praticados por não comerciantes acessórios de um acto de comércio objectivo, absoluto e singular, isolado ou esporádico (acessoriedade objectiva).

Os actos qualificados pela lei comercial são de 2 tipos:
1- actos comerciais objectivos
2- actos comerciais subjectivos

Será que o dto português acolheu esta teoria em todo o seu alcance? Há que distinguir consoante se trate de acessoriedade subjectiva ou acessoriedade objectiva, pode dizer-se que a acessoriedade subjectiva foi totalmente acolhida no art. 2º/ 2ª parte CCom – consideram-se comerciais todos os actos praticados por comerciantes, em conexão com o seu comércio.

Ex: se um comerciante adquirisse uma frota de camiões para transportar mercadorias, este seria um acto de comércio.
Há uma presunção legal de que os actos praticados por comerciantes são actos inerentes à sua actividade.

Problema da acessoriedade objectiva: por ex,1 particular compra roupas para revenda. Temos um acto objectivo e absoluto, nos termos do 463 cc. Este particular resolve alugar 1 carro a 1 amigo seu para este transportar as roupas. A acessoriedade. objectiva defende q o aluguer do carro é 1 acto com. por ser acessório de 1 ac absoluto, singular e esporadicamente praticado por um particular.

3 razões q nos levam a negar a acessoriedade objectiva:
1-Uma coisa é atribuir relevância jurídico-comercial a um acto q se encontra conexo com 1 actividade mercantil profissional, pois nesse caso o estado de comerciante de quem pratica esse acto e a natureza comercial do contexto em q esse acto se integra fazem presumir a conexão do acto com a actividade mercantil, a comercialidade do acto.
Outra coisa é querer atribuir relevância juridico-comercial a 1 acto que se encontra acessório de 1 simples acto objectivo singular e isoladamente praticado por 1 não comerciante. Aqui a natureza particular do autor do acto e o carácter esporádico da sua prática não permitem presumir, por si só, a natureza mercantil do acto.

2-A aceitação de 1 acessoriedade objectiva geral pela qual todos os actos acessórios de 1 acto objectivo seriam comerciais, acabaria por contradizer o fundamento dos chamados actos comerciais acessórios abordados no contexto da distinção entre ac absolutos e relativos.
De facto, a legislação aceita a comercialidade de certos actos em homenagem a certas conexões: o mandato, o empréstimo, o penhor, o depósito, etc. Se se destinam ao comércio, o legislador presume aqui uma ligação destes actos (q são genuinamente civis) com 1 actividade mercantil profissional. Se aceitássemos a teoria do acessório, a intervenção do legislador perderia sentido pq a teoria considera os actos acessórios como comerciais, desde que integrados numa actividade mercantil esporádica, n exigindo como o nosso legislador q estejam conexos com 1 actividade mercantil profissional.

3- A elevação da aceesoriedade objectiva a um fundamento geral da comercialidade de certos actos, introduziria uma analogia “iuris”, em todos os seus intervenientes: insegurança e incerteza jurídica na qualificação dos AC, o que é inadmissível. Os casos em que a aceesoriedade objectiva foi relevante foram expressamente indicados pelo legislador e, se os fosse dizer que para além destes casos, seriam relevantes todos os outros, bastando que existisse uma relação de acessoriedade, tal acabaria por significar que se viriam a qualificar como comerciais muitos actos que de acordo com a analogia legis jamais seriam de qualificar como tal.

SOLUÇÃO A ADOPTAR: A acessoriedade de um dado acto comercial um acto de comércio objectivo e absoluto não constituí por si só fundamento genérico para a sua qualificação como um AC (exclusão da analogia “iuris”), nem inversamente para a sua negação total. Há que indagar no caso concreto se o acto acessório possui uma analogia substancial com um AC acessório tipificado na lei (analogia “legis”).

3.2-A 2º parte do Art. 2º do Código Comercial
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3.2.1Sentido e âmbito

“Serão considerados AC... todos os cttos e obrigações dos comerciantes que não forem de natureza exclusivamente civil, se o contrário não resultar do próprio acto”. Aqui, na 2º parte do art. 2º o legislador atribuir também natureza comercial e certos actos, mas agora em homenagem ao estatuto da qualidade de comerciante do respectivo credor. O sentido geral subjacente a esta 2º parte do Art. 2º reside na presunção legal de que os actos praticados por um comerciante estão, via de regra, conexos com a respectiva actividade mercantil, ou seja, integrados no exercício da respectivo comércio. Serão considerados comerciais até prova em contrário a o próprio legislador diz quais os casos em que essa presunção pode ser ilídida. A comercialidade dos actos praticados pelos comerciantes está dependente de duas circunstâncias:
• Que o acto não seja de natureza exclusivamente civil;
• Que o contrário não resulte do próprio acto.



A lei fala “todos os contratos e obrigações dos comerciantes “ e abrange todos os tipos de actos ou factos relativos à actividade do comerciante- factos jurídicos em sentido amplo: Nos negócios jurídicos bilaterais e unilaterais, actos jurídicos lícitos e ilícitos.



3.2.2-Natureza exclusivamente civil- 2 posições:

1-Doutrina tradicional- Veiga Beirão, Guilherme Moreira, Pinto Coelho, Fernando Olavo- seriam os regulados na lei comercial ou regulados na lei comercial e na lei civil, mas não os actos regulados na lei civil (estes seriam actos de natureza exclusivamente civil).

Crítica: Esta interdepência não parece aceitável porque é necessário ter em conta que existem muitos AC objectivos, que só estão regulados no CCom ou na lei Cívil (estes seriam actos de natureza exclusivamente civil). É o caso de trespasse e da cessão da exploração do EC - 110º e ss do RAU e da prescrição dos créditos comerciais; 317º/7 b). Muitos actos regulados somente no CC devem considerar-se AC subjectivos, se tiverem sidos praticados pelos comerciantes no contexto da sua actividade mercantil profissional. EX.:a doação vem regulada no CC 940º ss, mas a doação é usada para fins mercantis, nomeadamente para fins publicitários: 6 nº2CSC.As doações aqui são AC ex.: ofertas dos brindes aos clientes. Outro ex.: é a gestão de negócios. Também aqui, o uso deste instituto não pode deixar de corresponder a um a AC, quando feito por comerciantes no exercício do respectivo comércio. Aliás, aplicar a posição da teoria dominante levaria a um resultado bizarro- é que a gestão constituiria um acto civil correspondente a um mandato e o mandato é um acto regulado quer na lei comercial quer na lei civil.

O que for dito em relação à doação e à gestão de negócios deve-se dizer de todos os actos que impliquem a criação, modificação, extinção ou garantia de obrigações que estejam exclusivamente regulados na lei civil, mas que tenham sidos praticados por comerciantes no exercício do seu comércio.

2- Doutrina preferível- B. Magalhães, e F. Correia- a expressão deveria ser interpretada no sentido que o preceito paralelo na lei italiana refere ao falar em “natureza essencialmente civil”, ou seja, por actos de natureza exclusivamente civil deve entender-se aqueles actos cuja a essência é civil, ou seja, actos que pela sua própria natureza, não possuem nem podem possuir qualquer conexão com o exercício do comércio por um comerciante Ex.: actos do Direito da Família (casamento, divórcio do comerciante); actos de direito sucessório (testamento do comerciante); e os actos de carácter não patrimonial, ou seja, de carácter pessoal.
Esta doutrina, centra a questão em torno da própria natureza do acto( independentemente alarga extraordinariamente o âmbito dos AC: São também comerciais os actos exclusivamente regulados na lei civil desde que estes possuem em abstracto uma ligação à actividade mercantil. Este entendimento parece ser o que melhor coaduna com o sentido subjacente ao Art. 2º/2 parte do Ccom, que é o que a lei assenta na presunção de que há uma conexão da actividade jurídico-privada geral do comerciante com o seu comércio e isto no duplo sentido:
Sentido negativo: se a comercialidade subjectiva assenta nessa presunção , é natural que se rejeitem actos que à partida não tenham qualquer conexão com a sua actividade, ou seja, actos que em abstracto não possam ir de nenhum modo uma conexão com o comércio do comerciante.
Sentido positivo: são comerciais aqueles actos dos comerciantes que em abstracto possam possuir a tal conexão com o comércio o seu comércio, e isto independentemente de estarmos a indagar se esses mesmos actos estão regulados na lei civil, ou comercial, ou numa outra simultaneamente.



3.2.3- “Se o contrário não resultar do próprio acto”

Doutrina tradicional- esta expressão que equivale a dizer que uma acto de um comerciante será AC subjectivo se desse mesmo acto não resulte que ele é um AC objectivo (AC especialmente regulado na lei comercial) ex.: na compra e venda é um acto civil mas também pode ser um AC(463ºCcom); passa a ser um AC quando a compra seja efectuada para revenda e não para consumo dos bens comprados - compra e venda mercantil. Aplicada esta interpretação a este ex. significa que uma compra e venda efectuada por um comerciante só será um acto comercial se dele não resultar que é o contrário de uma compra e venda mercantil.


CRÍTICAS: É uma posição desconcertada, seríamos levados ao absurdo de rejeitar a natureza comercial integrada aquelas compras integradas pelos comerciantes na sua actividade mercantil, ainda que não para revenda. Um ex.: um comerciante compra mobiliário de escritório a um camião para transportar os seus produtos, etc... Para esta posição seriam actos meramente civis logo acolhendo esta posição não seriam havidos como comerciais todas as aquisições que o comerciante, individual ou colectivamente efectuasse para manter e organizar materialmente a actividade da respectiva empresa.

OUTRA POSIÇÃO: interpretação da expressão seria que o acto do comerciante será uma acto comercial se deles não resultar que não possui qualquer conexão efectiva com o exercício do comércio do respectivo autor.

Ex.: se A proprietário de um stand de automóveis, compra um carro para oferecer à mulher, este acto não tem qualquer conexão com o comércio.

Certas precisões para delimitar o âmbito desta posição:

1- Esta posição identifica a contrario do que a lei fala com o própria comercialidade subjectiva e não com a comercialidade objectiva desses actos. Os actos praticados por um comerciante serão comerciais, deles não resultar que não correspondem a Ac subjectivos (e não se deles não resultar que não correspondem a Ac objectivos).
2- Quando o legislador refere que o acto será comercial se o contrário naõ resultar do próprio acto, parece ter adoptado uma posição restritiva face aos meios de prova da relação de conexão entre o acto praticado pelo comerciante e o ser comerciante. Esta relação deve ser determinada com base nos elementos pertencentes ao próprio acto. De facto, essa concreta conexão está de acordo com o comerciante e a respectiva actividade mercantil, não poderá ser estabelecida através de prova testemunhal ou através de circunstâncias que eram desconhecidas no momento da respectiva prática.
O Dr. Engrácia não vê razões para não aplicação da doutrina geral do Art. 236º /1 do C.C. Significa que se deverá atender por aquelas circunstâncias do próprio acto em si mesmo (formais), quer ás circunstâncias cognoscíveis do declaratário. Assim um acto praticado por um comerciante se as circunstâncias conhecidas ou cognoscíveis se fosse aferir que o acto não tenha nada de comercial.

Sintetizando os resultados desta interpretação do Art. 2º C Com.. Diremos que este artigo qualifica como actos comerciais:

1-Todos os actos praticados por comerciantes ou não comerciantes, isoladamente ou integrados na actividade mercantil, que se encontram regulados, exclusiva ou simultaneamente , na lei comercial e ainda todos os outros actos que com um destes actos possuem concretamente uma analogia substancial.


2- Todos os actos praticados pelos comerciantes, desde que não possuem um natureza intrinsecamente civil, ou seja , desde que não constituam actos que por definição e em abstracto são insusceptíveis de terem qualquer conexão com o exercício do comércio geral, e ainda desde que a contrario resulte desses mesmos actos, isto é, não constituam desde que resulte, no caso concreto, serem alheios ao exercício do comércio do respectivo autor.
4. Regime jurídico especial dos Actos do Comércio

4.1-A Forma do Actos jurídico comerciais

O princípio da consensualidade ou da liberdade de forma, previsto no Art. 219ºCC, assume no domínio das relações jurídicas comerciais uma particular importância. O legislador promoveu um simplificação das formas de transacções comerciais em comparação com o regime civil (celeridade das transacções comerciais). Isto vê-se nas disposições comparadas: Art. 96º CCom que derroga o art. 365º CCiv. O art. 96º CCom admite a validade dos títulos em língua estrangeira, ao contrário do regime previsto na lei civil geral (365ºCC) que não reconhece essa validade.
O art. 97º CCom, que afasta o 379º CCiv que trata da admissibilidade da correspondência telegráfica como um documento particular nas relações comerciais em sede de AC que também civis. Ex.: empréstimo mercantil (396º Ccom e 1143º CC) ; penhor (art.400º CCom e 669ºCCiv).

Contudo, há situações em que se exige um certo formalismo por razões de segurança jurídica. Estes formalismos têm diferentes origens:
Formalismo jurídico-voluntário (vontade das partes) – ex: contrato de adesão
Formalismo jurídico-imperativo (imposto por lei) – ex: títulos de crédito, onde vigora o princípio da literalidade: o conteúdo de um direito cambiário terá a extensão e alcance da letra do documento, e não o que as partes pensaram ou disseram. Atende-se à vontade declarada e não à vontade real, isto é, para fomentar a celeridade, a certeza e segurança jurídicas. Existe também um formalismo específico quanto às sociedades comerciais, dado o interesse que o legislador tem em reduzir ao mínimo, as causas de invalidade das sociedades comerciais, dado que por trás de uma sociedade está uma empresa, e anular a sua actividade pela invalidade do contrato seria particularmente grave.

CONCLUSÃO: o formalismo comercial é de tipo diferente do da lei civil no sentido de sacrificar a realidade à aparência.
Ex: obrigações cambiarias resultam de uma de assinatura, ainda que a dívida não exista (emerge da simples aposição de um acto inválido). A letra é na mesma válida.

4.2-Obrigações jurídico-comerciais: solidariedade, prescrição, juros

A) Solidariedade: o regime geral das obrigações cívis plurais é o regime da conjunção. A solidariedade não se presume, só vale quando as partes ou a lei estipula. No Direito Comercial vale a solidariedade como regime regra → presunção iuris tantum (Art.100º). A solidariedade passiva só não se aplica às obrigações emergentes dos actos de comércio unilaterais ou mistos (não se aplica àquela em que o acto é civil). Assim, o legislador civil protege o devedor e o Direito Comercial protege mais o credor, dado o interesse de reforço e tutela do crédito.

Este objectivo subjaz a outras normas para além do Art. 100º CCom: desde logo o Art. 101º (relações fiador, afiançado, credor). No Direito Comercial, fiador ou afiançado respondem solidariamente. Também o sacador e o endossante de uma letra respondem solidariamente face ao portador do título (Art.15ºLULL). Também o avalista e o avalizado de ua letra respondem solidariamente (Art.32º LULL).

B) Prescrição: Nas obrigações civis o prazo de prescrição ordinária é de 20 anos: art. 303º CCiv. Nas obrigações comerciais, os créditos comerciais prescrevem no prazo de 2 anos.: art. 317ºb) CCiv → trata-se de uma prescrição presuntiva dos créditos dos comerciantes que tenham origem em vendas:
• Efectuadas a particulares
• Efectuadas a comerciantes, para fins não comerciais; a contrario, os créditos que tenham origem diferente desta estão sujeitos aos prazos comuns: 2 anos.

C) Juros: Enquanto no Direito Civil vigora a liberdade de carácter oneroso ou gratuito dos negócios jurídicos, no Direito Comercial vigora o princípio da onerosidade → à prestação de uma parte deve corresponder uma outra prestação da contraparte. Isto reflecte-se muito no art.102º CCom – regras relativas à contagem dos juros das obrigações comerciais.
• JUROS LEGAIS: estipulados por lei
• JUROS CONVENCIONAIS: resultam da vontade das partes
• JUROS COMPENSATÓRIOS: constituem mera compensação pela fruição de soma pecuniária ou de bem pecuniariamente avaliado.
• JUROS MORATÓRIOS: visam indemnizar o credor pela mora do devedor (art. 806ºCCiv)

Juros legais – o regime de juros legais aplicáveis às obrigações comerciais vigorará quando houver lugar à contagem de juros (sejam compensatórios ou moratórios) e sempre que as partes nada tenham convencionado. Este regime varia consoante a natureza dos comerciantes que são credores da obrigação.
O regime geral está previsto no art. 102º/2 CCom e art. 559ºA e 1146º CCiv. A taxa de juros legais neste momento é de 7%. O regime especial, só aplicável aos juros moratórios de créditos de empresas comerciais singulares e colectivos: 102º CCom, 3º parágrafo. É uma taxa especial fixada pela portaria 262/99 de 12 Abril veio fixar um taxa de juro para certas empresas de 12%. No Dto civíl , os juros civis são de 7% . É mais alta no caso dos comerciantes porque o $ é muito importante para eles, o $ é descapitalizado, logo vai-se ter que indemnizar os comerciantes para que estes sofram um prejuízo menor do que não comerciante. Para os juros serem de 12%, o credor tem de ser comerciante.


Posso convencionar uma taxa de juro superior a 12%? Posso, aplica-se o 559ºCC por remissão do Art. 2º/2º parágrafo Ccom- remete para o 559º e 559ºA e 1146ºCC. Pode-se fixar uma taxa superior a 12% se por escrito. Só posso ultrapassar a taxa legal em 3% a 5%, consoante exista ou não garantia real, sob pena de um negócio jurídico ser considerado usurário. Se já tem uma garantia real, quase de certeza poderá cobrir o seu crédito. Logo, a taxa de juro convencionada não deverá exceder em mais de 3% a taxa legal.

NB: A lei fala em empresas singulares ou colectivas – sociedades comerciais e comerciantes em nome individual conexos com a exploração do respectivo negócio estão abrangidos por esta disposição. Ficam de fora os créditos dos comerciantes individuais originários em actos alheios à exploração da respectiva empresa.

No domínio dos juros legais, há uma grande controvérsia quanto à taxa aplicável aos juros moratórios de créditos comerciais titulados por letras, livranças ou cheques. O art. 48º e 49º LULL, e 45º a 46º LUCheque estabelecem uma taxa de mora de 6%. A LULL e LUC foram introduzidas em 1934. Esta taxa de mora de 6% acabou por ficar desactualizada. Isto veio premiar os devedores que tinham as suas dívidas tituladas por letras de crédito e a paralisar os credores. O art.4º DL 262/83 permite que estes credores exijam, em caso do devedor estar em mora, uma taxa equivalente à do regime geral: 7% ou especial 12%. Mas há tribunais que consideram esta norma inconstitucional por violar o Art. 8º CRP: as normas do LULL e LUC são normas do Direito Internacional. De facto, isso vai contra uma directiva comunitária, ou seja, há uma violação do Direito Comunitário e, consequentemente, do art. 2º CRP.

Juros convencionais – vigora o princípio da liberdade da fixação, mas com algumas restrições:
- é obrigatória a forma escrita para a fixação e modificação dos juros (102º/1ºparágrafo CCom);
- são proibidos os juros convencionais usuários (art. 559ºA e 1146º CCiv), por remissão do art. 102º/2º parágrafo do CCom;
- é de notar a proibição do anatocismo: 560ºCCiv – não há juros sobre juros; não é possível convencionar a capitalização dos juros no momento da constituição das obrigações, mas só depois de vencidas; o art. 560º/3 permite que estas restrições à prática do anatocismo sejam afastadas se forem prática ou uso de certo sector da actividade económica.


CAP.III - Sujeitos jurídico-comerciais

3.1- Os comerciantes

O Direito Comercial português constitui um sistema misto de Direito Comercial, porque combina os elementos dos dois tipos de sitemas de Direito Comercial: objectivista e subjectivista.
Por um lado, o art. 1º e 2º (1ªparte) CCom parecem relevar um sistema objectivista – o Direito Comercial rege os actos de comércio. Por outro lado, o legislador não perdeu completamente de vista a figura do comerciante, para temperar o pendor objectivista do catálogo.

Igualmente quanto ao conceito de comerciante, pode dizer-se que legislador optou por uma técnica legislativa semelhante à usada nos actos de comércio: sistema de enumeração. Mas, enquanto que, quanto aos actos comerciais, essa enumeração é implícita, já quanto ao conceito de comerciante a enumeração é expressa e taxativa: art.13º CCom.

3.1.2. a qualidade de comerciante→ o art. 13º CCom não tem definição geral e abstracta do que seja o comerciante, mas limita-se a determinar quais os sujeitos a quem se atribui tal qualidade. De acordo com o Art. 13ºCCom:
nº 1 - são comerciantes as pessoas que, tendo capacidade para praticar actos de comércio, fazem dessa pratica a sua profissão;
nº 2 - as sociedades comerciais.

Então, as duas categorias fundamentais de comerciantes são:

1-Pessoas singulares, mas apenas aquelas que reúnem as condições e os requisitos do Art. 13º Ccom.
2-Pessoas colectivas, mas apenas de um círculo específico deles, ou seja, as organizadas sob a forma de sociedades comerciais.

O legislador comercial consagrou um conceito jurídico de comerciante e não um conceito económico. Para o legislador comercial, comerciante não é apenas, nem de todo, aquele que exerce uma actividade de intermediação, de troca de bens. Isto pode encontrar-se quer pela positiva, quer pela negativa:
• Pela positiva – consiste na circunstância de existirem muitos comerciantes que desenvolvem uma actividade que transborda a pura actividade de intermediação. Ex: comerciantes que exercem outras actividades ligadas ao sector secundário, como por exemplo as empresas transformadoras, que são empresas comerciais por força do art. 230º, e também dentro do sector primário, como é o caso das industrias extractivas que, também por força do 230º são consideradas comerciantes.
• Pela negativa – existem certos empresários que desenvolvam uma actividade de intermediação, ou seja, exercem o tal comércio em sentido económico, mas nem por isso são considerados como comerciantes. Ex: caso das cooperativas e empresas públicas – que não são comerciantes.


3.2.1-Relevo jurídico e prático dessa atribuição

A qualificação de um dado sujeito jurídico-privado como comerciante é importante, pois os comerciantes estão sujeitos a um regime jurídico especial. Existem regras particulares relativamente a:
• Capacidade jurídico-comercial – cuja regra geral está no art. 7º CCom, existência de certas indisponibilidades e certos impedimentos que só se aplicam aos comerciantes.
• Certos deveres especiais dos comerciantes – os importantes são os referidos no Art. 18º CCom – adoptar uma firma, ter uma escrituração mercantil, dar balanço e prestar contas no fim de cada período, fazer inscrição no registo comercial.
• Certos regimes que são especiais, exclusivos dos comerciantes – ex: responsabilidade dos bens do casal pelas dívidas comerciais de um dos cônjuges (10º e 13º)

3.2-Condições de aquisição da qualidade de comerciante

Ora, o art.13º apenas nos diz quem poderá ser comerciante; falta saber quais são as condições para a aquisição da qualidade de comerciante.

1- condições específicas (particulares de cada uma das categorias)
2- condições gerais ou comuns às duas categorias – ex: o registo

3.2.1-Condições específicas:

3.2.1.1 Pessoas singulares – requisitos positivos e negativos.

3.2.1.1.1- Requisitos positivos - capacidade, natureza da prática dos actos: profissionalidade e natureza dos próprios actos em si.

1- Capacidade: A situação dos menores e interditos – o 1º requisito é a capacidade da pessoa singular. Mas há que fazer uma distinção entre a capacidade jurídico-civil e a capacidade jurídico-comercial.
A) Capacidade jurídica civil – o problema de saber se o legislador no art.13º se referiu à capacidade de gozo ou à capacidade de exercício de direitos.

Para uns (Ferrer Correia) dizem que se refere à capacidade de gozo, ou seja, à susceptibilidade de um dado sujeito ser titular de dtos e deveres. Assim, apenas de gozo estaria vedado o exercício do comércio e actos praticados por um incapaz de gozo são nulos. Mas, já o incapaz de exercício de dtos, aquele que possui a capacidade de gozo, mas está inibido de exercer pessoalmente os seus dtos e deveres, poderia exercer o comércio e adquirir a qualidade de comerciante, através do seu representante: é o caso nomeadamente dos menores e dos interditos.

Para outros (Lobo Xavier), a lei comercial quis referir a capacidade de exercício de dtos e explicam isto quer pela positiva quer pela negativa:
• Pela negativa: na lei comercial não se conhecem incapacidades de gozo específicas. Logo, não faria sentido que o legislador tivesse planeado de referir aqui a capacidade de gozo sob pena de o preceito não ter qualquer fundamento na prática.
• Pela positiva: compreendia-se melhor que o legislador tivesse aqui querido referir-se à capacidade de exercício porque faz sentido que a lei repugne que uma criança ou um demente por anomalia psíquica possam exercer profissionalmente o comércio, uma profissão que pressupõe uma actividade jurídica sistemática e abrangente. Esta parece ser a interpretação mais conforme com os próprios objectivos gerais que estão a subjacentes ao instituto dos incapacidades: o de proteger quer o incapaz, quer a família, dos perigos que poderiam advir da possibilidade deste poder dispor livre e pessoalmente dos seus bens. Ora, esses riscos agravar-se-iam se um incapaz exercesse a actividade mercantil.

Daqui resultaria que menores e interditos não poderiam exercer o comércio nem adquirir a qualidade do comerciante.

Esta solução seria demasiado rígida, por ex. no caso de um menor ou um interdito ser proprietário de um estabelecimento comercial, temos duas hipóteses :

1º Hip: ou nunca poderia ser explorado por conta e/ou em nome do incapaz de exercício, embora se tutele a protecção dos terceiros e do trafego comercial em geral, deixa completamente desprotegidos os interesses do próprio incapaz, ex. se o incapaz herda um estabelecimento comercial, só lhe resta vende-lo ou liquida-lo. A própria lei civil afasta esta posição, porque prevê que os responsáveis legais do incapaz possam, mediante autorização judicial, prosseguir à exploração do estabelecimento comercial, que o incapaz haja recebido por sucessão ou até mesmo adquiri-lo por conta do incapaz.

2º Hip: ou admitia-se que a exploração se fizesse em nome do incapaz de exercício mas sem que isso importasse a aquisição da qualidade de comerciante pelo incapaz. Aqui, embora se proteja totalmente os interesses do incapaz em explorar autonomamente o estabelecimento comercial, acabaria por deixar completamente desacautelados os interesses dos terceiros e do trafego geral, pois admitia-se a existência de estabelecimento comercial a que não corresponderia um comerciante. Assim, o incapaz estaria a beneficiar do estatuto de comerciante, sem que tivesse sujeito às respectivas obrigações juridico-comerciais.

Conclusão: estas soluções não são de aceitar. O nosso legislador faculta aos pais e tutor, com a devida autorização judicial, a possibilidade de explorarem o estabelecimento comercial em nome do incapaz: art. 1889º e 1938º do CC, logo, o incapaz pode explorar o estabelecimento comercial
( através do seu representante legal ) e pode adquirir a qualidade de comerciante. Assim, só não serão comerciantes :
- os incapazes que exerçam o comercio em nome próprio (arts 125º e 148 do CC, os actos são anuláveis)
- os incapazes em nome de quem o comercio é exercido fora dos termos em que a lei o permite : comercio exercido, mas não pelo representante legal; comercio exercido pelo representante legal mas sem a autorização judicial. Os actos são anuláveis de acordo com o art. 189 CC.

- capacidade juridica-comercial : o principio geral está no art. 7º CCOM. A lei estabelece um principio de equiparação entre a capacidade juridico-civil e a capacidade juridico-comercial. Mas, a lei comercial veio estabelecer algumas inibições a indivíduos capazes do ponto de vista juridico-civil, proibições legais de exercício do comercio expressas relativamente ao falido. Não são verdadeiras incapacidades, mas impedimentos ou indisponibilidades de certas pessoas para o exercício do comercio.



3.1.1.2) natureza da pratica dos actos : profissionalidade
Este requisito envolve a observância de três elementos :
1- elemento material : a aquisição da qualidade de comerciante supões que essa pessoa pratique actos de comercio de forma sistemática e reiterada. È necessário, que exista uma regularidade da pratica de actos de comércio que permita concluir pela sua habitualidade. Não adquirem essa qualidade quem pratique actos de comercio pontuais, ainda que vários.

2- elemento intencional : é necessário que a prática regular de acto de comercio represente um modo de subsistência para o seu autor. Mas, já não é necessário que a profissão de comerciante seja a única e principal, três hipóteses a considerar :

i) a profissão de comerciante é a principal, exercendo o indivíduo outras actividades ; ex. um retalhista que se dedica à agricultura fora do expediente.
ii) a profissão de comerciante é secundária mas independente da profissão civil, ex. um professor de equitação que oferece serviços de alojamento aos seus alunos.
iii)a profissão comercial é secundária mas não independente da profissão civil, ex. um dentista compra aparelhos de correcção para os revender aos seus pacientes, não é comerciante. Geralmente, o exercício habitual e sistemático do acto comercio envolve sempre uma organização de factores produtivos, por mínimo que esta seja, ou seja, hoje o exercício profissional do comércio faz-se nos quadros de uma empresa, excepções : vendedor ambulante ou especulador da bolsa (melhor indicio). Outro indicio é a inscrição (matricula) no registo comercial.

3-elemento jurídico : o exercício do comercio deve ser levado a cabo em nome próprio e não em nome alheio. Estão excluídos todos aqueles indivíduos que praticam de uma forma regular sistemática e habitual actos de comercio, mas na qualidade de representantes ( legais ou voluntários ) de outrém.
Neste caso, a actividade mercantil vai ser imputada na esfera jurídica do representado.

Assim, não são comerciantes :
i) os trabalhadores e assalariados de uma empresa mesmo aqueles que estão investidos de poderes especiais para a prática de actos de comercio como por exemplo os gerentes de comercio, os caixeiros, os auxiliares, etc.
ii) os membros dos órgãos de administração das sociedades comerciais : gerentes das sociedades por quotas, administradores e directores das sociedades anónimas. Há aqui uma representação orgânica, praticam actos comerciais em nome da sociedade, ver art. 252,260,408,409 CSC.
Por outro lado a lei exige que a prática de actos de comércio seja feita em nome próprio, mas já não que sejam praticados por conta própria. Temos que distinguir entre :
- mandato com representação –uma pessoa age por conta e em nome de outrem. O mandatário não pode ser comerciante.
- mandato sem representação – uma pessoa age por conta de outrem mas em nome próprio. O mandatário pode ser comerciante, ex. comissários, poderão ser considerados comerciantes.

3.1.1.3 Natureza dos actos em si
Este requisito tem a ver com a natureza dos próprios actos. É que de acordo com autores, não bastaria a prática de actos de comercio mesmo que habitual, profissional e em nome próprio, seria também necessário que estes actos fossem actos de comercio objectivos, absolutos e materiais. Assim, estariam desde logo excluídos os actos de comercio subjectivos, formais e relativos (ou acessórios).
Excluem-se os actos de comercio subjectivos porque estes supõem a qualidade de comerciante; bem como os formais cuja comercialidade resulta do puro preenchimento do mecanismo formal previsto na lei., subjacente a estes actos, podem estar operações do mais variado tipo e mesmo operações que nada tenham a ver com o comercio. Logo, parece que a prática ainda que reiterada e habitual destes actos, seja insuficiente para atribuir a qualidade de comerciante ao seu autor, ex. quem subscreve letras de uma forma regular e sistemática, não se torna comerciante.
Também se excluiria os actos de comercio relativos porque eles vêem a sua natureza comercial ligada a um certo acto absolutamente comercial, ex. o penhor é mercantil quando a coisa penhorada cabe a um comerciante. Ora, a qualidade de comerciante postula uma actividade mercantil directa e não uma actividade mercantil puramente acessória.
Mas, há uma parte da doutrina (Vasco Xavier)que acha que não é bem assim porque não faz muito sentido recusar a qualidade de comerciante a quem por ex. pratica em termos regulares um depósito mercantil. Logo deveria ser estudado caso a caso a atribuição ou não da qualidade de comerciante para o autor deste tipo de actos.

3.1.2-REQUISITOS NEGATIVOS:
São derivados da existência de algumas restrições previstas na lei quanto ao exercício do comercio por pessoas singulares. Temos duas espécies de requisitos negativos:
1- Impedimentos legais :art.º 14nº 2 Ccom, é a norma central nesta matéria. O fundamento desta norma reside na particular natureza das funções designadas por certos indivíduos, que se mostram incompatíveis com o exercício do comercio, funções políticas, razões éticas, razões funcionais. Não estamos perante uma incapacidade, porque esta limita o indivíduo face as suas características pessoais. Estes impedimentos podem ser de dois tipos:
a) Impedimentos de direito público- tratam-se de normas que vedam o exercício do comercio a indivíduos que fazem parte do aparelho estadual como os juizes, magistrados do ministério público, funcionários das secretarias judiciais, oficiais das forças armadas, outras categorias de funcionários públicos. Existem também impedimentos específicos para gestores de empresas públicas e para membros de conselhos fiscais de empresas públicas.
b) Impedimentos de direito privado- sócios de sociedades em nome colectivo e das sociedades em comandita, não podem exercer uma actividade concorrente à da sua sociedade, por conta própria ou alheia; nem ser sócios de uma outra sociedade de outro tipo (de responsabilidade limitada).
Gerente das sociedades por quotas não podem exercer actividade concorrente com a da sociedade, por conta própria ou alheia, salvo autorização expressa dos sócios. Caso a façam sem autorização, podem ser destituídos por justa causa, além de incorrer em responsabilidade pelos prejuízos causados à sociedade.
Membros do conselho da administração e do conselho geral das sociedades anónimas, todos estes membros não podem negociar com a própria sociedade com quem esta esteja numa relação de grupo ou de domínio. Logo, não podem comprar nem vender bens à sociedade ou à sociedade com quem estejam em relação de domínio ou de grupo, salvo autorização, sob pena de nulidade dos negócios.
Para além disto, os directores das sociedades anónimas não podem exercer qualquer actividade comercial por conta própria ou alheia, nem ser membros da direcção ou do órgão fiscalizador de outra sociedade.

PROBLEMA: A proibição geral do art.º 14 n.º 2 Ccom gera o problema da comercialidade de facto, isto é, saber se os actos comerciais praticados por um destes indivíduos ,em violação do impedimento legal, poderá ou não atribuir a qualidade de comerciante ao seu autor. Duas posições doutrinais a considerar:
Doutrina tradicional: considera que os indivíduos que, violando estas disposições legais, praticam actos de comércio não deixem por isso de ser considerados comerciantes.
Argumentos:
 tem a ver com o tipo de sanções ligadas às várias situações de impedimento. As consequências jurídicas que a lei estabelece não consistem na nulidade dos actos praticados, mas por exemplo responsabilidade disciplinar (funcionários públicos), responsabilidade orgânica (gerentes das sociedades por quotas), responsabilidade civil extracontratual (obrigação de indemnizar os sócios. Ora, permanecendo estes actos válidos, porque não atribuir a qualidade de comerciantes aos sujeitos?
 Argumento da segurança jurídica: há que acautelar os interesses de terceiros que contrataram com os infractores.
 Argumentos que têm a ver com o princípio do “venire contra factum proprium”, estabelecendo a lei estas normas no interesse geral seria estranho permitir ao infractor que viesse invocar a nulidade dos actos a que ele próprio deu origem.

Outra posição: O Dr. Engrácia Antunes entende que isto não é suficiente. A verdadeira questão é a da consciência profissional; o que subjaz é a suspeita que sempre existirá que a duplicação de funções possa conduzir ao desempenho medíocre de um deles. Por outro lado, a lei entende que certos actos são nulos; é evidente que da prática de actos nulos nunca poderá o seu autor retirar a qualidade de comerciante. Logo, a doutrina tradicional pode aceitar-se com certas restrições (pois falha em certos casos pontuais havendo sempre que, caso a caso, averiguar qual o tipo de sanção que a lei faz associar à violação da proibição legal.

2. Indisponibilidades legais: art.º147.º/6 e 148.º DL 132/93 de 23/4 (?), DL 315/98 de 20/10. Art.º 147.º- inibição do falido de praticar actos ou dispôr de bens da massa falida. Art.º148.º- proibição de exercício do comércio.
A doutrina dominante classifica a inibição do falido no que concerne à disposição de bens da massa falida como uma situação de indisponibilidade. Os actos que o falido haja praticado contra tal inibição, civis ou comerciais (esporádicos ou profissionais) são ineficazes em relação à massa falida e válidos face a terceiros. Esses actos ineficazes em relação à massa falida jamais atribuiriam a qualidade de comerciante.

3.1.1-Situações duvidosas: tratam-se de situações que pelo seu regime particular podem suscitar dúvidas da qualidade de comerciantes dos sujeitos.

Gerentes de comércio, auxiliares e caixeiros : art.º 248.º Ccom. Estas três figuras correspondem à figura do mandatário comercial. Logo, o gerente actua em nome e por conta de outrem; os actos imputam-se na esfera jurídica do mandante. Os mandantes é que são comerciantes. Aos gerentes falta um requisito para a aquisição da qualidade de comerciante: praticar os actos em nome próprio e não em nome de outrem. O gerente pode por vezes exercer o comércio em nome próprio sem autorização do mandante- art.ºs 250.º e 253.º Ccom. Se o gerente violar a disposição, o acto não é nulo, mas o mandante pode chamar a si os actos praticados pelo gerente em nome próprio e tem ainda o direito de ser indemnizado. É de notar que o gerente pratica um acto de comércio objectivo-o mandato 231.º Ccom. Se existirem várias situações de mandato, então talvez possa adquirir a qualidade de comerciante.

Comissários: 266.º e ss Ccom- comissários constituem mandatários mercantis que actuam sem representação (em nome próprio por conta do mandante). Ora, só releva para a aquisição da qualidade de comerciante que se pratiquem actos de comércio em nome próprio.

Correctores de bolsa: são intermediários oficiais das operações realizadas nas Bolsas de Valores. As operações realizadas nas bolsas de valores constituem actos de comércio objectivos e absolutos. Daí, parecem reunidos em relação a estes sujeitos as condições de que depende a qualidade de comerciante.
Parece estar preenchido o requisito de profissionalidade prática dos actos destes sujeitos. De facto, a actividade destes sujeitos é uma actividade profissional. Por outro lado, os correctores praticam actos quer em nome próprio, quer em nome alheio, ou seja, como mandatários sem poderes de representação. Também por este aspecto parece estar preenchido o requisito da tal prática em nome próprio de que depende a qualidade de comerciante, pelo sujeito autor desses actos, ainda que esse requisito só se verifique em relação a certos actos e não relativamente a todos os actos que ele pratica.

Agentes de comércio e mediadores: esta figura tem duas excepções fundamentais. Aparece associada a um contrato de cessação ou distribuição; o agente exerce em nome próprio e por conta própria a actividade de distribuir produtos de outrem. Não há dúvida de que são comerciantes.
Aparece ligada ao contrato de agência ou de representação comercial (DL 178//86). Agente é o que promove por conta de outrem ( o “principal”) a celebração de certos contratos por uma dada zona geográfica e clientela, mediante uma retribuição no caso do contrato de agência. Há que distinguir três situações possíveis:
1- art.º22.º do DL 178/86- a agente celebra contratos em nome e por conta do principal. Tem poderes de representação directa (não age em nome próprio) e por isso não é comerciante.
2- O agente tem apenas poderes de representação indirecta (age por conta do principal, mas já em nome próprio. Neste caso, a situação é equivalente à de um comissário- o gente é comerciante se se verificarem os restantes requisitos da qualidade de comerciante.
3- O agente é sempre comerciante desde que intervenha simultânea e paralelamente em vários contratos de agência (a actividade de agência é exercida de forma sistemática) pois desenvolve uma actividade empresarial tida como comercial, de acordo com o art.º230.º/3 Ccom.
Quanto aos mediadores: são os indivíduos que mediante remjuneração intervêm na fase de preparação e negociação de um contrato entre duas pessoas. O exemplo típico é o de mediadores de seguros.

Membros dos órgãos da administração social: trata-se dos gerentes, administradores e directores das sociedades, que praticam actos de comércio em nome e por conta das sociedades que representam. Todos eles não são comerciantes ao passo que os comerciantes actuam em virtude de representação voluntária, os directores e administradores actuam em virtude de representação orgânica. Logo, nenhum deles é comerciante, nenhum deles actua em nome próprio.

Sócios de responsabilidade ilimitada: são os sócios das sociedades em nome colectivo os sócios comanditados das sociedades em comandita. Estes respondem pessoal, ilimitada e solidariamente entre eles e subsidiariamente face à sociedade. Mas não devem existir dúvidas que estes sócios não são comerciantes porque comerciante é a respectiva sociedade. Porém, alguma doutrina entende que os sócios de responsabilidade ilimitada seriam comerciantes. Argumentos:
a) a) Nestas sociedades não existe uma verdadeira separação entre o património dos sócios e o património da sociedade. Logo, a sociedade não teria personalidade jurídica independente e comerciantes seriam os sócios. Mas a nossa lei entende que a sociedade comercial adquire personalidade jurídica após o registo. Por outro lado, não se pode falar em confusão do património dos sócios e do património da sociedade.
b) O CPC dizia que a sentença que declarasse a falência destas sociedades, declararia falidos a título pessoal os sócios. Então, sendo a falência privativa dos comerciantes, estes sócios de responsabilidade ilimitada seriam necessariamente comerciantes. Hoje, isto não faz sentido porque a falência estende-se aos devedores civis. Antes era apenas para os devedores comerciais, já que para os devedores comerciais existia a insolvência. Hoje, os devedores civis e comerciais estão sujeitos à falência.
c) Os sócios são os protagonistas de facto da actividade económica da sociedade que só é uma base jurídico-formal. Do ponto de vista material tudo se passa como se os actos comerciais fossem pessoais. Tendo em conta o art.º 5.º do Csc só vigoraria este argumento se descobríssemos a personalidade jurídica da sociedade.

Sócios de sociedades irregulares: a designação “sociedade irregular” não existe no nosso direito positivo---São aqueles cujo procedimento constitutivo está incompleto mas já iniciaram a sua actividade externa, as suas relações com terceiros- não se observaram as formalidades exigidas por lei: escritura pública + registo comercial + publicações.
A sociedade comercial irregular, ela própria não é comerciante porque ainda não é uma pessoa jurídica (faltam-lhe os elementos do seu processo constitutivo) e os seus actos não lhe podem ser imputados pois se a sociedade nem sequer existe, então nem sequer há esse centro de imputação no qual esses actos seriam imputados ou adjudicados. Logo, os sócios também não seriam comerciantes pois os actos praticados por estes são-no em nome e por conta da sociedade, ou seja, em nome alheio e não em nome próprio.
Isto poderia fazer parecer que os interesses de terceiros ficariam desacautelados, uma vez que nem a sociedade irregular em si, nem os seus sócios seriam considerados comerciantes. Mas isto não é bem assim:
Os interesses dos terceiros encontram-se já suficientemente acautelados pelo art.º 36.º e ss Csc, que fixam um regime de responsabilidade pessoal e ilimitada dos sócios das sociedades irregulares.
Por outro lado, considerar os sócio das sociedades irregulares comerciantes seria conceder a terceiros uma tutela inesperada já que estes quando contrataram fizeram-no na convicção de estarem a contratar com a sociedade e não jamais que esses sócios tivessem a qualidade de comerciantes.

1.2-Pessoas colectivas: as sociedades comerciais- quanto a estas o legislador não estabeleceu os requisitos particulares de que depende a aquisição da qualidade de comerciante. Esses requisitos têm de ser encontrados naqueles actos específicos da comercialidade de uma sociedade- art.º 1.º/2 Csc; requisito de fundo: as sociedades comerciais são constituídas para a prática de actos comerciais; tem de ter um objecto comercial; requisito de forma: devem ser constituídas sob um dos tipos expressamente previstos na lei- por quotas, por comandita, em nome colectivo, anónima. Tudo isto, além de preencher os requisitos do 980.º Cciv.: Sociedade civil + uma das quatro formas + registo e que tenham um objecto comercial. Compreende-se que para além destes requisitos gerais da comercialidade de uma sociedade, não haja requisitos específicos porque, ao contrário das pessoas colectivas que podem ser ou não comerciantes, já as sociedades comerciais são comerciantes natos. Constituem-se exclusivamente para a prática de actos comerciais. O art.º 13.º/2 Csc diz que são comerciantes as sociedades comerciais.

Outras pessoas colectivas: problema de saber se a aquisição da qualidade de comerciante por pessoas colectivas se limita aos casos da lei ou se outros tipos de pessoas colectivas que desenvolvem a actividade económica podem adquirir essa qualidade.
O princípio geral nesta matéria é o do não admissibilidade- da aquisição da qualidade de comerciante por outras pessoas colectivas que não as sociedades comerciais. Só as sociedades comerciais podem ser comerciantes. Mas há um sector da doutrina que defende o contrário com base em dois argumentos:
• O art.º13.º/1 Ccom fala em “pessoas” o que pode abranger pessoas singulares e colectivas;
• O legislador estabeleceu certas proibições do exercício do comércio relativamente a certas pessoas colectivas que não sejam sociedades comerciais (.º 14.º e 17.º Ccom) . Ora, se o legislador quisesse excluir que outras pessoas colectivas para além das sociedades comerciais adquirissem a qualidade de comerciantes, não precisava de fazer isto.

Segundo o Dr. Engrácia Antunes esta posição não é de aceitar::
1. uma interpretação histórica do 13.º1 Ccom leva a concluir que efectivamente a intenção do legislador comercial português de 1888 terá sido a de excluir as pessoas colectivas. De facto, o preceito homólogo do Cód. Comercial Italiano, onde o nosso legislador se baseou, referia-se a pessoas, mas só pessoas físicas.
2. não é correcto afirmar que o 14.º/6 e o 17.º Ccom não teriam sentido útil, porque o sentido do art.º 14/6 e do 17.º não pretendem demonstrar implicitamente que certas pessoas, que não as sociedades comerciais possam adquirir a qualidade de comerciantes. Trata-se de regular uma situação jurídico-comercial daquelas pessoas colectivas que se hajam dedicado de facto ao comércio que lhes estava vedado.
3. as pessoas colectivas de fim ideal nunca poderiam ser consideradas comerciantes porque nunca poderiam dar cumprimento a uma das obrigações dos comerciantes é a inscrição no registo comercial. O elenco dos sujeitos ao registo comercial não refere as pessoas colectivas de fim ideal. Os art.ºs 14.º/6 e 17.º Ccom. Prevê um número de pessoas colectivas a quem está vedado o exercício do comércio. Mas, estes nomes não parecem obedecer a uma lógica coerente porque misturam pessoas colectivas diferentes e acabem por omitir outras, as quais não se compreende porque razão não deveria ser aplicável um regime idêntico.

Assim, são sujeitos destas proibições legais as seguintes pessoas:
 certas pessoas colectivas de direito de direito público: estado e autarquias locais e pessoas colectivas de direito eclesiástico (igreja, paróquias)- 17.ºCcom.
 certas pessoas colectivas de direito privado: pessoas colectivas de fim ideal e altruístico, que sã as fundações e associações que prossigam interesses não económicos em benefício da comuinidade em geral- art.º 14.º/6 e 17.º Ccom; pessoas colectivas de fim ideal e egoístico porque são aquelas que prosseguem interesses não económicos, mas em benefícios doss seuss próprios membros ex: associações recreativas, desportivas, etc... 14.º/1; não parecem estar aqui abrangidas as pessoas colectivas de fim económico não lucrativo-são as fundações e associações que visam obter certas vantagens patrimoniais que não lucro para os seus próprios membros ex: associação de socorros mútuos, associações patronais e sindicais, etc...

Para alguns autores, o sentido destas proibições seria de implicitamente vir demonstrar a admissibilidade da qualidade de comerciante por outras pessoas colectivas que não as sociedades comerciais. De facto, se só os sócios comerciais pudessem ser comerciantes estas disposições seriam supérfluo. Dr. Engrácia Antunes defende que o sentido destes preceitos seria o de prevenir e de regular as situações em que certas pessoas colectivas se deedicavam ao comércio (de facto) que lhes estava vedado.

Problema de saber se estas pessoas colectivas adquirem ou não a qualidade de comerciantes em consequência do comércio que lhes estava vedado. Se forem pessoas colectivas de direito público, direito eclesiástico e de direito privado de fim ideal altruístico a própria lei dá resposta e diz que não são comerciantes- art.º17.º Ccom. A finalidade da lei foi apenas a de, tendo em conta os interesses de terceiros com os quais as pessoas colectivas negociou ou praticou actos de comércio, submeter esses actos ao regime da lei comercial e não de atribuir a qualidade de comerciantes a essa mesma pessoa colectiva . Se forem pessoas colectivas de direito privado de fim ideal egoístico a lei não diz nada- art.º 14.º/1 Ccom.
Aqui temos duas hipóteses essenciais:
1. Essas pessoas colectivas praticam actos de comércio ocasionais ou isolados, com vista nomeadamente a angariar fundos para a prossecução do seu próprio fim estatutário. Ex: uma associação recreativa que compra bandeiras, emblemas, etc... para vender aos seus sócios. Essa actividade comercial é meramente secundária, ocasional, logo não se preenche o requisito da profissionalidade exigido para as sociedades comerciais, jamais esta PC adquiria a qualidade de comerciante .
2. Se estas PC’s exercessem o comércio em moldes profissionais, isto violaria o próprio princípio da especialidade do fim. Consequência: nulidade dos próprios actos + estas PC’s extinguir-se-iam por decisão judicial sempre haja antagonismos entre o obrigado estatutário e o objecto real.
No período anterior à declaração judicial de extinção. Neste caso, a situação da PC seria a de uma sociedade irregular que também não é um comerciante.

Situações duvidosas: este princípio de que só as sociedades comerciais adquirem a qualidade de comerciantes não exclui situações duvidosas.

Sociedades Civis em nome comercial: serão ou não comerciantes? Estão no art.º 1.º /4 do Csc, são sociedades que tendo um objecto civil (são criadas para a prática de actos civis) revestiram uma forma comercial ( quatro tipos). Estão algures a meio do caminho entre sociedades civis puras e sociedade civil pura. Ex: caso das empresas agrícolas de uma dada dimensão de natureza civil, maas com uma daas formas comerciais. A doutrina tradicional sempre negou a qualidade de comerciantes a estas sociedades civis sob a forma comercial. Entende-se que o art.º13.º/2 Ccom está apenas a referir-se àquelas sociedades comerciais que são comerciais no seu todo, aquelas que respeitam os doiss requisitos de comercialidade: adopção de uma forma comercial + objecto comercial, conclui-se que o 13.º Ccom não abrange este tipo híbrido de sociedades.
E hoje? O art.º3.º do CRegCom veio sujeitar estas sociedades ao registo comercial. Como o registo comercial é uma obrigação especial dos comerciantes (18.º/3 Ccom) algumas pessoas dizem que estas sociedades deviam também ser consideradas comerciantes.
Crítica: talvez esta não seja a posição mais razoável. O argumento parece basear-se numa falsa premissa: a de que o registo comercial é um instituto privativo dos comerciantes quando isso não se verifica. Hoje, estão sujeitos ao regime comercial, não só os comerciantes em nome individual e as sociedades comerciais, mas também um conjunto de outros afins completamente diferentes : as empresas públicas, cooperativas, ACE. E mesmo que fosse um instituto privativo dos comerciantes, o facto de elas estarem sujeitas ao registo comercial tem a ver com o facto de estarem sujeitos aao regime das sociedades comerciais por força do art.º1.º/4 Csc.

O próprio legislador do Csc parece dar a entender que não quis alterar a posição dominante no direito anterior, e podemoss ver issto em dois pontos essenciais:
1. nos trabalhoss prepaaratórios do Csc houve quem propusesse que a comercialidade das sociedades comerciais dependesse apenas da forma (tipo legal) e não do fundo (objecto comercial), Ora, isto não vingou e por isso o legislador distinguiu as sociedades comerciais das sociedades civis sob a forma comercial. Logo, apenas as sociedades com forma e objecto comercial são as que o legislador quis abranger no art.º 13.º/1 Ccom.
2. No preâmbulo do Csc, o legislador veio dizer-nos que as sociedades civis sob a forma comercial embora sujeitas ao registo ccomercial continuam a não ser comerciantes.


Empresas Públicas: São organizações empresariais explorados por capitais públicos a título exclusivo ou a título maioritário, que desenvolvem activiaades de carácter comercial e industrial. Professor Lobo Xavier diz que sempre que estas empresas desenvolvem uma activiade comercial em sentido jurídico, se deveria considerá-los como comerciais, a fim de que os actos por eles praticados pudessem ser qualificados como actos comerciais subjectivos à luz do art.º 2.º - 2.ª parte Ccom e a fim de que estas empresas pudessem beneficiar de certas vantagens como por exemplo o art.º 10.º Ccom- quanto à execução dos devedores.
Fundamento: o facto de o estatuto das empresas públicas sujeitá-los ao registo comercial (art.º 5.º CregCom) e o facto de os vários diplomas e o facto de v´rios diplomas que regulam aspectos da sua actividade se referiam às empresas públicas como comerciais. Quanto ao modo da qualificação ads empresas públicas como comerciantes, estes autores sugerem vários meios.
- Ou através do enquadramento destes no art.º13.º/1 Ccom.
- Ou através do seu enquadramento no art.º230.º Ccom.
- Ou mesmo através de uma pura aplicação analógica do art.º 13.º em bloco.

Há porém autores que pensam em sentido contrário:
O legislador não qualificou estas em empresas como comerciantes, podendo fazê-lo.
O legislador especificou que as empresas públicas estão sujeitas a certas obrigações específicas de comerciantes como por exemplo o uso de denominação (art.º5.º), posse da escrituração própria (art.º17.º), estão sujeitos à apresentação de balanço e contas (art.º 28.º), registo comercial (art.º47.º) . Se o legislador quisesse qualificá-los como comerciantes teria feito e não fez.
A sujeição destas empresas ao registo comercial não muita importância . É um argumento pouco sólido. O registo comercial deixou de ser um instituto privativo dos comerciantes, hoje é aplicável a muitos outros afins. De facto, o diploma que que regula o registo comercial das empresas públicas diz que as empresas públicas não estão sujeitas àquelas normas cujo conteúdo pressupõe a qualidade de comerciante.
A própria natureza das empresas públicas: são pessoas colectivas de direito público que só mediatamente podem prosseguir um fim lucrativo. Têm uma finalidade associada ao interesse público e só acessoriamente visam o lucro.
Se o interesse da primeira posição era sujeitar as empresas públicas ao regime comercial, havia outra forma de o fazer sem ser através da atribuição da qualidade de comerciante: permitindo qualificar os actos das empresas públicas como actos subjectivamente comerciais. Logo, a qualificação dos actos praticados pelas empresas públicas como actos de comércio subjectivos não implica a atribuição da qualidade de comerciante.

Agrupamentos complementares de empresas (ACE)
São associações de empresas individuais ou colectivas (pessoas singulares ou colectivas) cujo objectivo principal é melhorar a rentabilidade das actividades comerciais dos seus membros e apenas como finalidade acessória é que admitem a realização e partilha de lucros entre os seus membros. Estes ACE’s revestem eles próprios perssonalidade jurídica.

Para a qualificação dos ACE’s como comerciantes, temos de distinguir duas situações:
• O ACE exerce a título principal ou a título exclusivo uma actividade económica não lucrativo. Esta é a situação normal e apesar de a lei 4/73 impôr obrigações especiais muito semelhantes ás obrigações a que estão sujeitos os comerciantes: dever de adoptar a firma, de eleborar o seu balanço de contas, estão sujeitos ao registo comercial, não são comerciantes devido à natureza não lucrativa dos ACE.
• O ACE exerce a título principal ou a título acessório uma actividade lucrativa, mas sem autorização do respectivo estatuto, do respectivo acto constitutivo do ACE. É uma situação de ilegalidade porque os ACE só permitem a obtenção do lucro como uma fianalidade acessória e apenas quando estiver autorizado pelos estatutos. Nestes casos, o legislador veio declarar que os ACE (em situação de ilegalidade) possam ser regulados pelo regime das sociedades em nome colectivo (15.º do DL 430/73) o que qquer dizer que os ACE ficam equiparados a uma verdadeira sociedade comercial e por isso, devem ser qualificados como comerciantes à luz da art.º13.º/23 Ccom.

Condições comuns: ao lado das condições específicas para a atribuição da qualidade de comerciante, existem condições comuns para essa messma atribuição, às duas categorias de pessoas (singulares e colectivas):

1. registo: a inscrição do comerciante no registo comercial é uma das condições comuns exrtremamente importantes. Também se designa por matrícula esta inscrição e é necessário que quer para os comerciantes em nome individual, quer para as sociedades comerciais.

Sistemas de registo no Dto. Comparado:

4 grandes sistemas possíveis, relativamente à forma assumida pelo registo:
a) O registo é condição necessária e suficiente para a atribuição da qualidade de comerciante. Só é comerciante e será sempre comerciante quem estiver inscrito no registo.
b) O registo é condição necessária, mas não suficiente para a aquisição da qualidade de comerciante.. Só será comerciante aquele que estiver inscrito como tal no registo, muito embora isso não baste pois são necessários outros requisitos.
c) O registo é condição suficiente mas não é necessária da aquisição da qualidade de comerciante. Será comerciante aquele que estiver matriculado como tal no registo, mas também será comerciante aquele que não estiver matriculado, desde que observe outro tipo de requisitos.
d) Registo não é condição suficiente nem necessária- o registo desempenha outra função, como por exemplo tem o valor de uma simples presunção legal dessa qualidade de comerciante ou mesmo o valor de um mero formalismo sem significado jurídico.

Sistema Português: as sociedades comerciais

O registo das Scom é 1condição
necessária e suficiente
Necessária: por força do art.º 5º do C.S.C., de acordo com o qual, as sociedades comerciais só passam a ter personalidade jurídica a partir da data do registo definitivo do ctt pelo qual se constituem. Se não houver registo, trata- se de uma sociedade irregular – não são comerciantes.
Suficiente: pq não se exigem outros requisitos que não a observância das condições especificas, ou seja, requisito de fundo e o requisito da forma de que depende a existência da pp sociedade comercial. Com o registo, a sociedade passa logo a existir como sociedade comercial.

2.1.3-Sistema Português; Comerciantes em nome individual

O registo de comerciante em nome individual é apenas uma presunção relativa “iuris tantum”. O legislador, apesar de considerar obrigatória a inscrição no registo comercial para os comerciantes em nome individual, não estabeleceu sanções no caso deste não cumprir, apenas limitando algumas vantagens, como por ex.: não poderá obter o cartão de empresário em nome individual. Assim, a matricula é um simples ónus e não um verdadeiro dever jurídico. Se o fosse, a consequência do não cumprimento dessa obrigação legal seria não ser considerado comerciante.
Logo, para que uma pessoa singular adquira a qualidade de comerciante basta que exerça em termos profissionais ou em nome próprio uma actividade comercial. O registo não é condição necessária nem suficiente da aquisição da qualidade de comerciante em nome individual. A matricula por parte de uma pessoa singular apenas é relevante em matéria de distribuição do ónus da prova dessa mesma qualidade de comerciante. Um comerciante matriculado, que pretenda fazer valer o seu estatuto perante um terceiro, não terá que provar que é comerciante bastando- lhe a presunção legal do registo. Um terceiro que pretenda contestar a qualidade de comerciante contra esse indivíduo, não está impedido de o fazer dado que a presunção é relativa, ou seja, é ilidível. Neste caso, o terceiro poderá provar que, muito embora o comerciante esteja matriculado, não exerce profissionalmente, em termos sistemáticos e em nome próprio, uma actividade comercial, ou seja, poderá provar que ele não é comerciante.

2.2-Condicionamentos administrativos

São condicionamentos de carácter jurídico – público e de carácter jurídico- administrativo de acesso à qualidade de comerciante e do exercício de actividades mercantis:

a) Registo Nacional de Pessoas Colectivas (está regulado no D.L. 144/ 83 alterado pelo D.L. 42/ 89).
É um instituto público que tem as seguintes finalidades:
• Tem competência para identificar todas as pc´s ;
• Tem competência para a inscrição dos factos principais relativos às pc´s: constituição, modificação ou dissolução das pc´s no ficheiro central do registo nacional;
• Verificar os certificados de admissibilidade das firmas e denominações, sem as quais não é possível a matricula das ps´s nem é permitida a constituição das sociedades comerciais ou outras pc´s.
A inscrição no registo nacional de pc´s quer de uma pessoa singular ou pessoa colectiva que exerça uma actividade comercial, depende de certos requisitos:


- Ter capacidade comercial;
- As ps´s, uma vez que são pessoas que representam as pc´s, têm que ter habilitações literárias mínimas;
- Têm que provar que não estão inibidas do exercício do comércio por força de qualquer sentença transitada em julgado, ex.: falência.

b)Lei de delimitação dos sectores esta lei veio limitar certas áreas de actividade económica, que são vedadas às empresas privadas. Assim, existem desde logo certas áreas que estão absolutamente vedadas às empresas privadas: saneamento básico, comunicações, transportes ferroviários. Noutras, em que o seu exercício é relativamente vedado às indústrias de ?? , área das telecomunicações. E ainda outras áreas cujo acesso é permitido às empresas privadas através de uma autorização ou concessão: actividades bancárias e seguradoras, exploração de recursos materiais ou indústrias extractivas.

c)Lei geral de acesso à actividade industrial: consagra a liberdade de acesso à actividade industrial, mas estabelece restrições:

- relativas à higiene e segurança no local de trabalho;
- matéria de protecção do ambiente e estrutura do território;
- registo obrigatório do cadastro industrial das instalações – encerramento abertura dos mesmos.

d)Lei de acesso a sectores específicos: existem certas áreas da actividade comercial cujo acesso está condicionado por regulamentos específicos, existindo vários D.L. a este respeito. Actividades de prestação de serviços de segurança privada, actividades de agencia de viagens e turismo, actividades de transporte ferroviário, aéreo e marítimo, actividades de mediação de seguros, actividades feirante.

3- Efeitos da aquisição da qualidade de comerciante

1-O estatuto jurídico especial do comerciante

2-Estatuto activo: alguns exemplos

O estatuto activo dos comerciantes corresponde ao conjunto de direitos a favor dos comerciantes, que são direitos especiais em face daqueles que assistem aos particulares em geral, ex.: a escrituração mercantil possui um valor probatório especial ( art.º 44º C. Com.); existe um regime mais favorável quanto à prescrição dos créditos dos comerciantes: art.º 317º b) do C. Civ.; existem certos acórdãos que exigem a qualidade de comerciante do respectivo autor, ex.: ctt de transporte art.º 366º do C Com.; os comerciantes beneficiam de várias disposições que consagram a simplificação das formas relativas àquilo que é consagrado em via geral pelo direito civil, ex.: a propósito do empréstimo mercantil, art.º 394º a 397º do C Com., em que o regime é muito mais favorável do que aquele que encontramos para a figura geral do empréstimo e do penhor.
Estes direitos especiais são de carácter pontual e encontramo-los, não no diploma particular, mas através de uma análise mais ou menos exaustiva dos vários pontos em que a lei comercial se afasta do regime geral da lei civil.


3-Estatuto passivo:
Trata-se aqui de obrigações especiais a que estão sujeitos os comerciantes mas já não os particulares. Tais obrigações especiais constam do art.º 18º do C. Com.
a) Firma: o comerciante é obrigado a adoptar uma firma. É um sinal identificador do comerciante( o nosso legislador adoptou uma concepção subjectiva da firma ).
b) Escrituração mercantil: os comerciantes são obrigados a ter escrituração mercantil. Esta, consiste no registo (...) que podem influir nas operações do comerciante ( operações comerciais ) e na sua situação patrimonial. Esta obrigação de escrituração mercantil decorre da necessidade de proteger uma série de interesses: dos comerciantes mas também de terceiros, em particular, os interesses dos credores e do pp Estado: o fisco.

Escrituração mercantil distingue- se de contabilidade. A contabilidade representa apenas uma fracção da escrituração mercantil:
Contabilidade: consiste na técnica de compilação e registo das operações comerciais por forma a dar uma imagem numérica e a fazer-se uma análise pecuniária da situação patrimonial do comerciante num dado momento.
Escrituração mercantil: vai muito para além disso, constituindo no conjunto dos livros do comerciante dentro dos quais se enquadram, naturalmente, os livros da contabilidade, mas tb muitos outros como actas, contratos, correspondência a toda a restante documentação do comerciante atinente ao exercício do comércio.

O comerciante pode ter os livros que quiser, mas há um conjunto de livros que são obrigatórios: art.º 30º e 31º do C. Com.
Os livros obrigatórios comuns, quer para os comerciantes em nome individual, quer para as sociedades comerciais são:

- Inventário e balanços: o inventário e o balanço consistem no arrolamento, por parte do comerciante, de todo o seu activo e passivo e ainda na determinação da diferença ( art.º 33º C. Com.). Este livro tem de ser legalizado (art.º 32º ).

- Diário: é o livro onde se registam, segundo critérios cronológicos, todas as operações em que o comerciante intervém no exercício do comércio e que possa afectar a sua situação patrimonial. Muito embora o (...) ou o registo destas operações deva ser diária, há excepções: art.º 34º do C.Com.


- Razão: no fundo, é um diário mas em que o critério do registo não é o cronológico. O registo das operações do comerciante é feito através de critérios de crédito e débito: “a dever” e “a haver”, art.º 35º. Tb este livro tem que ser devidamente legalizado.

- Copiador: é o livro onde o comerciante regista ou arquiva toda a correspondência que expediu e recebeu ( art.º 36º do C. Com. ). Hoje, isto foi substituído por base da dados ou dossiers informáticos devido ao enorme volume de correspondência dos comerciantes mas tb por razões fiscais.

Dois livros específicos das sociedades comerciais:
- Livro de actas: todas as sociedades deverão possuir um livro de actas ( art.º 31º do C. Com. e art.º 63º n.º4 do C.S.C. ), onde se registam as deliberações dos órgãos sociais.
- Livro de registo das acções: certas sociedades comerciais devem ter obrigatoriamente este livro. É o caso das sociedades anónimas e das sociedades em comandita por acções.

Notas:
- O comerciante está obrigado a reter a escrituração mercantil durante o prazo de dez anos, posterior à data de arquivamento desses mesmos livros (art.º 40º do C.Com.).
- O carácter secreto da escrituração mercantil (art.º 41º do C.Com.) sofre cada vez mais excepções em atenção ao direito de informação dos sócios.

a) Balanço e prestação de contas: o balanço constitui uma síntese da situação patrimonial do comerciante num dado momento, através da indicação sumária dos elementos do activo e do passivo do comerciante com a indicação dos respectivos valores pecuniários e da sua situação líquida. O comerciante está sempre obrigado, quer seja individual, quer seja uma sociedade comercial, a elaborar uma balança anual referido a 31 de Dezembro de cada ano civil, devendo ser apresentado nos três primeiros meses do ano imediatamente subsequente (art.º 62º do C.Com.).
Ao lado deste balanço anual pode haver lugar a “balancetes intercalares”. Estes poderão ter lugar sempre que, à empresa do comerciante individual ou à sociedade comercial, sobrevenham situações especiais, como por ex.: fusão, cisão, a pp liquidação ou outras situações ou vicissitudes na vida da empresa. Os métodos de elaboração dos balanços constam, hoje, do Plano Oficial de Contabilidade.

O dever de prestação de contas consta do art.º 63º do C.Com. Os comerciantes são obrigados à prestação de contas: nas negociações, no fim de cada uma; no ctt de conta- corrente, ao tempo do encerramento. Este dever tem muita importância nas sociedades comerciais pq permite proceder à verificação anual da situação da sociedade.

b) Registo Comercial: está regulado no C.R.C. A função do registo comercial consiste em dar publicidade à situação jurídica dos comerciantes, tendo em vista a segurança do comércio jurídico.
Quanto ao âmbito de aplicação, há que distinguir:
- âmbito pessoal: o registo comercial, hoje, não pode ser tido como um instituto privativo dos comerciantes já que abrange muitas outras pessoas singulares e colectivas, para além de comerciantes em nome individual e sociedades comerciais, ex.: soc. civis sob forma comercial; cooperativas e empresas públicas ( vide arts. 3º, 4º e 5º respectivamente); ACE art.º 6ºCSC; agrupamentos de interesse económico que venham a ser instituídos na nossa ordem jurídica interna (art.º 7º do C.R.C.) e E.I.R.L. (art.º 8º do C.R.C.).
- âmbito material: é obviamente impossível enumerar todos os factos sujeitos a registo comercial, mas podemos destacar os seguintes:
o A matricula das ps´s e das pc´s que estão sujeitas a registo ( a matricula consiste no registo do início da actividade de um comerciante);
II. Depósito de documentos de cada entidade registada corresponde a uma pasta onde são arquivados os documentos a ela atinentes
III. As publicações legais, uma vez que passaram a ser promovidas oficiosamente pelas conservatórias do registo comercial
.

Quanto à realização do registo comercial, a ideia geral é a de que, neste domínio vigora o principio da instância, ou seja , a realização do registo é feita, não oficiosamente, mas antes a requerimento dos próprios interessados (art.º 28º do C.R.C.). Quanto à competência territorial, as Conservatórias do Registo Comercial apenas existem no Porto, Coimbra , Lisboa e Funchal. Nas restantes zonas essa competência é exercida pelas Conservatórias do Registo Predial.

Efeitos do registo: Pode dizer-se que o registo é fundamentalmente “facultativo” pq o registo constitui uma condição de eficácia/ oponibilidade a terceiros dos factos a ele sujeitos, embora sejam perfeitamente válidos “inter partes”, cfr. art.º 13º e 14º do C.R.C.).

Notas importantes quanto aos efeitos do registo: em 1º lugar, há muitos casos em que a publicação tb se tornou condição de oponibilidade a terceiros dos factos, ou seja, na maior parte dos casos, é o registo + publicação que se deve ter em conta para efeitos de oponibilidade a terceiros dos factos sujeitos a registo. Em 2º lugar, ao registo corresponde uma presunção “iuris tantum” da existência e validade dos factos registados (art.º 11º do C.R.C. = a presunção pode ser ilidida mediante prova em contrário).

Consequências da falta de registo:
- A inoponibilidade a terceiros dos factos sujeitos a registo;
- Deposita o ónus da prova da existência dos factos sujeitos a registo sobre o indivíduo obrigado a proceder ao registo desse facto;
- Sanções do tipo contravencional (art.º 17º do C.R.C.).

Excepção: no caso das sociedades comerciais, o registo é absolutamente obrigatório e tem eficácia constitutiva. Aqui, o registo não é apenas uma condição necessária e suficiente da aquisição da qualidade de comerciante, mas é uma condição necessária e suficiente da pp aquisição da personalidade jurídica.


4. Responsabilidade dos bens do casal pelas dividas comerciais de um dos cônjuges

A qualidade do comerciante tem também importância para efeitos de responsabilização dos bens do casal, sempre que o comerciante for casado. Existem 2 hipóteses:
I. Dívidas comuns: são aquelas que muito embora contraídas pelo cônjuge comerciante se devem considerar da responsabilidade comum de ambos os cônjuges.
II. Dívidas próprias: são aquelas dívidas contraídas pelo cônjuge comerciante que são da sua exclusiva responsabilidade.


Dividas da responsabilidade de ambos os cônjuges contraídas pelo cônjuge comerciante :

O regime do art. 1691º d) CCiv e o seu fundamento: da responsabilidade de ambos os cônjuges, a norma fundamental é a do art. 1691 n.º 1 d) CCiv.
Uma dívida contraída pelo cônjuge comerciante será comum se se preencherem três pressupostos fundamentais:
I. Que não vigore entre os cônjuges o regime da separação de bens. Isto é evidente, pois se vigora o regime da separação de bens o problema não se põe, porque não existem bens comuns; logo responderiam só e imediatamente os bens próprios.
II. Que a dívida tenha sido contraída pelo cônjuge comerciante no exercício do comércio. Mais adiante vamos desenvolver esta ideia.
III. Que a dívida tenha sido contraída em proveito comum do casal.

Refira-se a este propósito:

A. Quando se fala em proveito comum está a abranger-se não só um proveito de natureza económica, mas também de razões de natureza moral ou intelectual.
B. O proveito deve ser apreciado mais em razão do fim subjacente à operação realizada do que propriamente em função do resultado efectivo que advenha dessa operação
C. Exige-se uma certa relação de proporcionalidade entre este fim da operação realizada e os próprios meios utilizados. Esta conexão entre o fim e os meios deve aferir-se de acordo com o critério de 1 pessoa normal e diligente.

O art. 1695º diz quais os bens que respondem por este tipo de dívidas: primeiro os bens comuns do casal, e na falta ou insuficiência destes, subsidiária e solidariamente os bens próprios de qualquer dos cônjuges.

É de notar que raramente se terá de facto de provar que a dívida contraída pelo cônjuge no exercício do seu comércio não foi em proveito do casal, pois é normal que o comércio de um dos cônjuges seja sempre exercido em benefício da família.

Uma excepção a esta regra, ou seja, em que poderá não haver proveito comum do casal, será o caso do comércio exercido pelo cônjuge separado de facto -- mas, mesmo aqui, não é completamente linear que se possa dizer à partida, que não há proveito comum do casal. Não basta a separação de facto em si, para que se afirme a inexistência do proveito comum do casal, sendo necessária o concurso de outras circunstâncias. Nomeadamente, existirá proveito comum se o cônjuge continuar a contribuir com o proveito do seu comércio para o sustento do outro cônjugue.

Mas também não será certa a opinião dos autores que dizem que há sempre proveito comum do casal mesmo nas situações de separação de facto porque os proveitos realizados pelo cônjuge separado de facto no exercício do seu comércio serão sempre susceptíveis de contribuir para aumentar a meação nos bens comuns do casal do outro cônjuge.
Crítica: certos autores vão demasiado longe porque para se aferir o proveito comum do casal não basta a possibilidade teórica e longínqua de um dos cônjuges vir a usufruir dos proveitos que advirão do comércio do cônjuge comerciante: É preciso uma relativa proximidade (mesmo uma proximidade temporal).
Mas, em regra, não será fácil provar que as dívidas contraídas pelo cônjuge comerciante no exercício do seu comércio não são em proveito comum do casal.

Fundamento do 1691 d) CC: o fim do regime legal do 1691 d) CCiv é claramente a tutela do crédito, ou seja, o que a lei aqui visou proteger foram os interesses dos credores do cônjuge comerciante. Isto não quer dizer que a lei não tenha tomado em consideração aos interesses do cônjuge do devedor comerciante da família. A prova disso é que exige que a dívida tenha sido contraída em proveito comum do casal para que se possa considerar da responsabilidade de ambos os cônjuges. Mas, em primeira linha quis proteger os interesses dos credores do devedor comerciante (tutela do crédito).
À primeira vista poderia dizer-se que o regime contido no 1691 nº1 d) não traria nenhuma vantagem em especial para os credores do devedor comerciante porque se chegaria ao mesmo resultado do art. 1691 nº1 c). Mas, há aqui uma diferença de fundo que é a inversão do ónus da prova que se verifica na alínea c).
Alínea c): o credor do cônjuge que contrai a dívida é que tem de provar que esta foi contraída em proveito comum do casal, para que a dívida possa ser contraída da responsabilidade de ambos os cônjuges e que por possam responder os bens comuns do casal.
Alínea d): é ao cônjuge do devedor comerciante que cumpre provar que a dívida não foi contraída em proveito comum do casal para poder fazer escapar, à resposta por essa dívida, os bens comuns do casal.

O “exercício do comércio” e a presunção do art. 15º CC:
Ao preceito do art. 1691 nº1 d) CC acresce a do art. 15º CC que diz que a as dívidas comerciais do cônjuge comerciante presumem-se contraídas no exercício do seu comércio. Logo, não correspondem a um acto comercial isolado ou a uma dívida moral civil.
Uma condição para a responsabilização dos bens comuns do casal de acordo com o art. 1691 nº1 d) era de que a dívida tivesse sido contraída por qualquer um dos cônjuges no exercício do comércio.

O que é que isto significa?
O que a lei pretende abranger são as dívidas contraídas pelo cônjuge comerciante no exercício da sua actividade mercantil profissional, no sentido da prática reiterada e profissional, em nome próprio, do acto comercial. Não são abrangidas aqui as dívidas correspondentes a actos comerciais isolados ou esporádicos. Ex: um dos cônjuges compra um apartamento para revenda, para aproveitar uma oportunidade de investimento que lhe foi sugerido por um amigo. Trata-se de 1 acto comercial objectivo, mas não lhe faz adquirir a qualidade do comerciante, não se aplica o art. 1691 nº1 d).

Por outro lado as dívidas aqui abrangidas são as contraídas pelo cônjuge comerciante no exercício do seu comércio, o que significa que nem todas as dívidas do cônjuge comerciante são necessariamente abrangidas por este preceito mas apenas as dívidas que se integram no exercício profissional da sua actividade mercantil, já não, por exemplo, as suas dívidas civis.

É neste âmbito que entra o art. 15º CC que estabelece uma presunção que vem reforçar ainda mais a protecção do credor do devedor cônjuge comerciante.
O art. 15º visa facilitar aos credores o recurso ao 1691º/1 d). De facto, se existisse apenas o 1691º/1 d), o credor que quisesse responsabilizar os bens comuns do casal pela dívida contraída pelo cônjuge comerciante teria de provar duas coisas:
I. Que a dívida seja comercial (ou seja, que advenha de um acto de comércio objectivo ou formal)
II. E que, para além disso, que essa dívida tenha sido contraída pelo cônjuge no exercício profissional do seu comércio. Essa dívida não devia resultar de um acto esporádico, mas devia integrar-se numa actividade mercantil exercida em termos profissionais.
Ora, o art. 15º vem ajudar o credor porque presume que as dívidas comerciais contraídas pelo cônjuge comerciante foram contraídas no exercício do seu comércio. Há uma inversão do ónus da prova, o credor apenas terá de provar que a dívida contraída pelo cônjuge é comercial. Dispensa portanto o credor de provar o 2º elemento.

Deste modo, será ao devedor ou ao cônjuge do devedor comerciante que cumprirá ilidir a presunção, ou seja, provar que a dívida, muito embora emergente de um acto de comércio, não se integra no exercício profissional do comércio --- para que consiga subtrair à responsabilidade da dívida a sua meação nos bens comuns do casal.

Isto é importante face a dois tipos de dívidas:
I. Dívidas cambiárias (dívidas que são tituladas por letras) e que constituem um acto de comércio objectivo ou formal.
Ex: A, comerciante de móveis, casado com B compra um imóvel a C e, não tendo pago o preço, subscreve a letra em favor de C. C, que é o credor cambiário, para poder responsabilizar os bens comuns do casal por esta dívida contraída por A, apenas terá de provar a existência da letra, pois desse modo prova que a dívida é comercial. Não tem de provar, para beneficiar do 1691º que essa dívida se integrava no exercício profissional de comércio de A (por ex. que o imóvel se destinava à revenda e não, por ex., ao uso pessoal). Será a B que cumprirá ilidir a presunção do 15º CC, provando que a dívida, muito embora comercial porque se tratava de uma dívida cambiária, não se integrava no exercício do comércio de A.

II. Dívidas provenientes da prática de actos de comércio subjectivos

Ex. A, comerciante de automóveis, casado com B compra um automóvel a C que não se destina a revenda, mas a uso particular. O acto é subjectivamente comercial. Ao credor C, bastará provar que A é comerciante, provando com isso que o acto é comercial, não sendo necessário provar que o automóvel tenha sido adquirido para revenda ( em virtude da presunção do art.15º). Será a B que cumprirá provar que o acto não se integra no contexto da actividade profissional de A para fazer escapar a sua meação nos bens comuns, ao pagamento da dívida em questão.

Muitas vezes, de nada vale ao cônjuge do devedor comerciante ilidir a presunção do art.15º, provando que a dívida nada tem a ver com o exercício do comércio do seu autor porque terá de alegar factos que demonstrarão ao mesmo tempo o proveito comum do casal, o que leva a que a dívida passe a caber nas alíneas b) e c) do art. 1691º CCiv.
EX: retomando o exemplo do comerciante de móveis, vimos que é ao cônjuge do devedor comerciante que cabe provar que o móvel não se destinava a revenda, para ilidir a presunção do art. 15º CCom. Mas, para fazer isso teria de provar, por ex., que o destino do imóvel era para uso familiar. Com isso, cairia na c) do art.1691º.

Assim, muitas vezes a ilação da presunção do art.15º CCom permite escapar ao dispositivo do 1691º d), mas acaba por cair noutras alíneas que igualmente responsabilizam os bens comuns do casal.


Dívidas comerciais da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges
A moratória do 1696º/1 CCiv e sua exclusão na hipótese do art. 10º C.Com. Aqui, o preceito fundamental é o 1696ºCCiv.

Este artigo diz quais são os bens que respondem pelas dívidas que são da exclusiva responsabilidade de um deles: os bens próprios do cônjuge devedor e subsidiariamente a sua meação dos bens comuns.

Mas, o 1696º estabelecia neste caso que o cumprimento só é exigível depois de dissolvido, declarado nulo ou anulado o casamento, ou depois de decretada a separação judicial de pessoas e bens ou a simples separação judicial de bens. O 1696º CCiv estabelece uma moratória quanto à execução da meação nos bens comuns do cônjuge devedor.
Assim, os credores apenas podem fazer-se pagar à custa dos bens próprios desse cônjuge e da respectiva meação nos bens comuns, mas com respeito desta moratória, ou seja, só após dissolvido o casamento ou após a separação judicial de bens.
A razão de ser desta moratória é clara: os bens comuns estão afectados às necessidades da família e, por isso, só depois da dissolução desta é que faz sentido que os credores possam executar a meação nos bens comuns, ou seja quando os bens comuns deixarem de o ser, passarem a ser bens próprios. Excepção à moratória do 1696º: as dívidas provenientes de acidentes de viação, de acidentes de trabalho e as custas judiciais.

Dívidas compreendidas no art.10º CCom:
Estabelece-se uma excepção à moratória para o caso de dívidas contraídas por um dos cônjuges que sejam dívidas comerciais, mesmo quando o sejam apenas relativamente a uma das partes, ou seja, quando o acto comercial pelo qual se contraiu essa dívida seja um acto de comércio meramente unilateral. Assim, são abrangidas pela excepção da moratória prevista no art. 10º CCom:
- dívidas próprias -- ou seja dívidas que sejam da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges. São as dívidas que caiem fora do âmbito do 1691º/ 1 d) -- e podem estar aqui dívidas em que o cônjuge ilidiu o art. 15º CCom;
- dívidas provenientes de actos de comércio unilaterais ou bilaterais, quer a unilateralidade do comércio se verifique do lado do credor ou do devedor.

Temos que distinguir três hipóteses diferentes:

1. Dívidas provenientes de um acto bilateral (acto comercial puro).
Ex: A, não comerciante, compra a B, comerciante, roupas para revenda. É um acto comercial bilateral. A praticou um acto comercial objectivo (roupas para revenda) e B era comerciante (o acto é subjectivamente comercial).

2. Dívidas provenientes de acto de comércio unilaterais (acto de comércio mistos):

a) a comercialidade deriva do acto do devedor.
Ex.: A, casado, não comerciante, compra a B, também ele não comerciante, roupas para revenda. Temos um acto praticado pelo cônjuge em que a comercialidade resulta do seu lado, já que praticou um acto de comércio objectivo.


b) a comercialidade deriva do lado do credor.
Ex: A, cônjuge não comerciante compra a B, comerciante, uns sapatos para dar ao filho. Temos um acto que é unilateralmente comercial, mas cuja comercialidade deriva apenas do lado do credor, ou seja, trata-se de um acto subjectivamente comercial do lado do credor. Do lado do cônjuge devedor é um acto meramente civil.

O art. 10º C.Com. tem um alcance muito vasto, pois abrange qualquer um destes 3 tipos de actos, mas nem sempre foi assim. Antes da reforma d 1977, o art. 10º não abrangia este terceiro tipo de actos, ou seja, os actos praticados pelo cônjuge em que a comercialidade deriva do lado do credor. Dizia-se que o afastamento da moratória do 1696º apenas deveria ocorrer quanto àqueles actos que fossem actos comerciais bilaterais ou unilaterais, mas em que a comercialidade proviesse do lado do cônjuge devedor.

Esta tutela deve estender-se aos credores comerciantes de dívidas particulares. Se não fosse assim havia uma discriminação: os credores comerciantes e titulares de créditos sobre cônjuge comerciantes poderiam afastar a moratória; mas os credores comerciantes titulares de créditos sobre cônjuge não comerciantes teriam de ficar sujeitos à moratória. Acabaria por se retirar protecção aqueles que mais a necessitariam, porque o caso normal é de credores comerciantes titulares de créditos sobre simples particulares.

O preceito do art.10º tem sido objecto de uma interpretação restritiva, de tal modo que há um tipo de dívidas comerciais que não estão abrangidas por esta excepção à moratória: as dívidas cambiárias.

São as dívidas provenientes da subscrição de um título de crédito: letra ou livrança. Trata-se de um acto objectivo regulado na LULL, sendo certo que segundo o art. 2º são considerados actos todos aqueles regulados na lei comercial. Trata-se também de um acto formal: a sua relevância jurídico-comercial reside na sua simples realização, qualquer que seja o credor do acto ou o fim da operação que lhe está subjacente.
Um caso típico – subscrição de uma letra de câmbio.
Ex. A, não comerciante, compra a B, não comerciante, um automóvel que se destina a uso particular do comprador e convenciona-se que o pagamento é feito através da subscrição de uma letra.

O Assento 4/78 vem exigir a comercialidade substancial da dívida, ou seja, vem exigir que, para além da comercialidade formal, a operação subjacente à obrigação cambiária seja ela própria de natureza mercantil. Na doutrina distingue-se :
- obrigação cambiária: subscrição da letra, acto sempre formalmente comercial.
- obrigação subjacente ou fundamental: no exemplo dado é o contrato d compra e venda, a ap partir do qual a obrigação será comercial ou civil, conforme a natureza do acto de onde deriva – o negócio jurídico fundamental.

Assim, o que o assento do STJ diz é que o credor da dívida cambiaria para se valer do art.10º CCom carece d provar que a relação jurídica fundamental é também comercial, por exemplo, que o carro fora comprado para revenda.
Para proteger o comércio, o regime do art. 10º, há-de aplicar-se apenas às dívidas provenientes de actos que constituam operações economicamente mercantis. Ora, a letra cambiária é usada em relações estranhas ao comércio e aplicar aqui o art.10º seria trair o seu espirito. Por outro lado, o legislador também protegeu os interesses da família, e estes só devem ceder naquilo que seja estritamente necessário para dar alguma protecção ao comércio.


Quem tem o ónus d provar a natureza comercial substancial da dívida?

Antes do assento, a doutrina dominante defendia que o ónus cabia ao devedor ou ao seu cônjugue. Eles é que tinham que provar que a dívida não era substancialmente comercial. O credor cambiário teria apenas provar que a dívida era formalmente comercial. O assento defendia a solução oposta: o credor cambiário é que tem o ónus da prova. Esta solução parece ser a mais correcta:
- A comercialidade substancial da dívida é um facto constitutivo do direto alegado pelo credor. De acordo com o art. 342º CCiv, àquele que invoca um direito cabe-lhe fazer a prova dos factos constitutivos desse direito.
- Parece ser mais justo do que fazer recair o ónus da prova sobre o sujeito que menos conexão tem aos elementos em relação aos quais se pode presumir a natureza substancial da dívida. Pelo contrário, o credor tem acesso privilegiado aos elementos que lhe permitem fazer prova da comercilidade substancial da dívida.

Além disso, o assento 4/78 veio estabelecer que a exigência da natureza comercial da obrigação fundamental vale tanto no domínio das relações imediatas como no domínio das relações mediatas.

Porém, Guilherme Moreira defendia que no domínio das relações mediatas não se devia exigir a comercialidade substancial da dívida, com base no art. 17º LULL. É o princípio da autonomia no domínio das relações mediatas: o direito do portador de uma letra é totalmente autónomo em relação aos anteriores portadores da letra e não pode ser afastado pelas excepções que o devedor cambiário possa opôr aos anteriores portadores. Contudo, este argumento não é correcto dado que tem em vista excepções que podem invalidar a obrigação cambiária e que não são oponíveis ao actual portador da letra. Ora, a intenção do assento é excluir (?) dívidas do âmbito do art.10º e não a invalidade da obrigação cambiaria. Guilherme Moreira pensou bem, mas argumentou mal.

O Professor critica o assento por 2 razões :
1. Ignora a especificidade do art.10º CCom. Este artigo visa atribuir ao comerciante um regime mais favorável: protege os interesses dos comerciantes, de certa forma, em detrimento dos interesses da família. Ora, a doutrina do assento parece retirar ao art.10º a sua utilidade, ao deslocar o ónus da prova para o portador da letra.
2. Faz tábua rasa do regime específico aplicado as letras de câmbio (LULL). Este regime foi pensado para facilitar a rápida circulação dos títulos. Ora, a doutrina do assento acaba por retirar o valor de garantia que vai associado às letras de câmbio e contribui, neste modo, para o desuso destes títulos.
3. A única maneira do portador d uma letra se proteger contra os riscos inerentes a doutrina do assento nas relações mediatas, é fazer com q na letra figure a assinatura de ambos os cônjuges.

N.B: hoje, a moratória já não existe. O art. 1696º foi alterado desaparecendo a moratória tb desaparece o sentido útil da excepção do art.10º CCom.



IV.
OS BENS JURÍDICO-COMERCIAIS: O ESTABELECIMENTO COMERCIAL

1-Noção e elementos
O DC não se esgota nos AC nem nos sujeitos comerciais. Ele abrange certos bens q constituem o património dos comerciantes, entre esses bens o + importante é o estabelecimento comercial. Mas, existem outros : a propriedade individual, os valores mobiliários, etc.

1.1-o estabelecimento comercial; acepções

O estabelecimento comercial constitui uma organização d bens corpóreos, incorpóreos e situações fáctico - económicas juridicamente relevantes, através das quais os comerciantes (individuais ou colectivos) realizam a sua actividade mercantil. Muitas vezes confunde-se a empresa com o EC. Qdo mto o EC possui um dos aspectos possíveis do conceito de empresa : não há uma noção d empresa, não há uma noção universal.

Mas, há 3 grandes aspectos para o conceito d empresa :
1. acepção subjectiva: a empresa aparece concebida como uma nova entidade, um novo sujeito de direitos. Ao lado das pessoas singulares e colectivas que são titulares ou exploradores da empresa, a própria empresa surge como uma entidade autónoma, dotada de personalidade jurídica própria, distinta dos seus titulares. Esta ideia tem vindo a estabelecer-se no direito positivo: o direito da falência considera como destinatário daquelas normas a empresa. O CSC ao lado da empresa fala das empresas pluriassociatárias, isto é, exploradas por um conjunto de sociedades comerciais. Esta figura, não sendo sujeito de direitos, tem efeitos jurídicos próprios. A lei protege o grupo, já que fala em “responsabilidade de grupo”.

2. Acepção objectiva: a empresa é um objecto de direitos e não um sujeito de direitos. Encara a empresa de uma perspectiva objectivista e patrimonial; a empresa é uma organização mercantil do comerciante: o conjunto de pessoas e bens de que o comerciante é titular, com vista ao exercício da sua actividade mercantil. É esta a acepção que corresponde à noção de Estabelecimento Comercial no nosso direito (organização comercial do comerciante), conjunto de elementos através dos quais o comerciante leva a cabo uma actividade mercantil.

3. Acepção funcional: a expressão empresa designará a própria actividade económica desenvolvida pelo empresário para a realização do fim da produção ou intermediação de bens. Foi nesse sentido que o legislador fixou alguns pontos da acepção de empresa: art. 118º/3 CPI, art. 89º k Código Notariado, etc.

2-Elementos do EC:

2.1-Bens:
Há dois grandes grupos de elementos do Estabelecimento Comercial:

1. Bens corpóreos:
a) Imóveis: todos os prédios que estão afectos à exploração do Estabelecimento Comercial. Não é relevante a que título o empresário utiliza esses prédios (proprietário ou arrendatário).
b) Móveis: conjunto de máquinas ou equipamentos afectos à exploração do estabelecimento comercial. Assim como as mercadorias e matérias primas (bens destinados à produção ou venda) e ainda o dinheiro.

2. Bens incorpóreos: dtos, obrigações e outros elementos.

a) Direitos: são os mais importantes (situação jurídica activa de que é titular o estabelecimento comercial).

À cabeça destes direitos surge o

- direito de arrendamento. É um direito fundamental porque assegura a estabilidade da exploração do Estabelecimento Comercial. Por isso, a lei estabelece um regime jurídico especial para os casos de arrendamento de imóveis destinados ao exercício de uma actividade comercial ou industrial (art. 110º a 116º RAU).

3 aspectos deste regime especial :
1. Ao passo que nos casos normais o direito de arrendamento caduca com a morte do arrendatário, no caso do prédio arrendado estar afecto à exploração de um Estabelecimento Comercial, o arrendamento não caduca em caso de morte da pessoa física que era titular do Estabelecimento Comercial (112º RAU), nem caduca com a dissolução da sociedade.
2. Se o arrendamento cessar por qualquer motivo de caducidade ou por denúncia do senhorio, o arrendatário tem direito a uma indemnização e também a uma compensação pecuniária sempre que o prédio arrendado haja sido aumentado no seu valor locativo devido ao facto de ali ter sido explorado um Estabelecimento Comercial com um valor máximo de 10 vezes o valor da renda anual (113º,2 RAU). A denúncia do senhorio é uma situação excepcional (68º RAU).
3. Ao contrário do que acontece nos arrendamentos em geral, em que o arrendatário apenas pode ceder a sua posição jurídica contratual com autorização do senhorio, nos arrendamentos para comércio e indústria o arrendatário pode transmitir livremente a sua posição sem autorização do senhorio, sempre que pretenda negociar a transmissão do Estabelecimento Comercial – trespasse (115º RAU). Razão: tutela do Estabelecimento Comercial enquanto unidade objectiva.

Ao lado do dto de arrendamento, há ainda outros direitos:

Direitos de crédito – podem resultar de vendas, empréstimos, da celebração de contratos especificamente mercantis ( agência, locação mercantil) .

Dtos de propriedade industrial – direitos sobre marcas, patentes, modelos.

Clientela: conjunto de relações jurídicas e fácticas com as pessoas que adquirem os bens ou serviços do Estabelecimento Comercial; constituem um elemento essencial do Estabelecimento Comercial, pois sem ela o Estabelecimento Comercial não pode escoar os seus bens ou serviços.

Características da clientela:
- deve ser comercial;
- deve ser individualizada (não o será se o Estabelecimento Comercial estiver integrado num complexo mais vasto ou se o Estabelecimento Comercial fizer revenda de produtos de uma dada marca);
- deve ser actual (não virtual).

Entre nós tem-se negado que a clientela possa ser objecto de direitos. A clientela não é algo que possa ser propriamente de alguém. Sobre a clientela existem meras expectativas jurídicas. Mas existem algumas indicações contratuais e legais que podem levar a pensar o contrário, ou seja, que a clientela possa ser objecto autónomo de direitos.

Existem casos de direitos convencionais (contratuais) de clientela, por exemplo, se o Estabelecimento Comercial possui contratos de exclusividade ou qualquer tipo de relações contratuais duradouras – ex: fornecimento. Aqui há um direito convencional – ex: casos de trespasse do Estabelecimento Comercial e da cessão da exploração do Estabelecimento Comercial.

Existindo um destes negócios sobre o Estabelecimento Comercial, tende a existir uma cláusula contratual implícita nesses contratos, consagradora de uma obrigação de não concorrência a cargo do trespassante ou do cedente do Estabelecimento Comercial. Este obriga-se a não desenvolver uma actividade económica semelhante à do Estabelecimento Comercial trespassado ou cedido, de forma a não prejudicar os interesses do novo titular do Estabelecimento Comercial. Mesmo quando as partes não providenciaram uma cláusula nesse sentido, essa existe implicitamente. Existem também normas legais que protegem especificamente a clientela – ex: art.118º III CPI, 212º e ss. CPI – protecção da integridade da clientela duma empresa relativamente aos actos de concorrência desleal.
O art. 33º do DL do contrato de agência preconiza que o agente tem direito a receber da agência uma indemnização em virtude da clientela que haja perdido.

B) Obrigações: em principio, estão abrangidas pelo Estabelecimento Comercial as obrigações, quer do titular do Estabelecimento Comercial, quer as respeitantes à própria exploração do Estabelecimento Comercial em si (dívidas aos fornecedores, ao fisco, aos bancos).
No nosso direito, é muito duvidoso que os elementos jurídicos passivos devam ser considerados como elementos do próprio Estabelecimento Comercial porque as obrigações não se transmitem com o trespasse do Estabelecimento Comercial, salvo se as partes o acordarem (âmbito convenconal).

C) Outros elementos incorpóreos: o EC engloba ainda licenças ou autorizações administrativas q surgem para o benefício de numerosas actividades comerciais. Estas licenças, em princípio, revestem uma natureza pessoal e não devem ser objecto de negociação (não são transmissíveis). Na prática, a Administração tende a reconhecer automaticamente as pessoas que pedem estas licenças, daí que passem a ter um valor autónomo.

2.2 Pessoas

2.3. Capacidade de realização do lucro (aviamento)

O valor de um Estabelecimento Comercial, enquanto conjunto de bens e pessoas, não é igual à mera soma do valor desses bens e pessoas (soma dos valores individuais).
Por isso é que, quando um Estabelecimento Comercial é objecto de uma venda ou de outro contrato que o visa como um todo, ex. trespasse, o valor do Estabelecimento Comercial ultrapassa em muito o valor da mera soma contabilistica dos elementos que o compõem. Esta mais-valia resulta da organização particular dada a esses componentes. A cada mais-valia económico-funcional (eficiência lucrativa do EC como um todo) dá-se o nome de aviamento ou “goodwill”.
Não é bem um elemento, é uma qualidade do EC.
O aviamento não se pode confundir com um conjunto de relações fáctico-económicas que, quanto muito, constituem meros indícios da sua existência. Ex. o aviamento é diferente das relações do Estabelecimento Comercial com os seus credores; também é diferente das relações do Estabelecimento Comercial com a sua clientela.

2-Natureza jurídica

Este problema consiste em como traduzir na linguagem jurídica esta actividade económica (4 teorias):

1. Teoria do sujeito de direito: defende q o Estabelecimento Comercial constitui um novo sujeito de direitos, uma nova pessoa jurídica. O Estabelecimento Comercial deveria ser dotado de uma personalidade jurídica própria e distinta, surgindo ao lado do comerciante individual (pessoa física ou singular) ou da pessoa colectiva titular do Estabelecimento Comercial.

Crítica: uma das consequências da atribuição da personalidade jurídica é a existência de um património autónomo. Se o Estabelecimento Comercial fosse uma pessoa juridicamente distinta do seu titular, então os bens afectos ao Estabelecimento Comercial deviam responder apenas pelas respectivas dívidas. Mas, não é isso que acontece: os credores civis (pessoais) do empresário podem agredir todos os bens desse indivíduo, não só os que estão afectos à actividade comercial mas também os que não estão afectos. Ex. se A compra a B uma casa, B pode-se fazer pagar quer pelos bens pessoais do A quer pelos seus bens afectos ao Estabelecimento Comercial.
Por outro lado, uma das consequências da atribuição de personalidade jurídica é também a existência de uma autonomia organizacional. Ora, o seu titular pode livremente, a qualquer momento, liquidar ou vender o Estabelecimento Comercial. Logo, o Estabelecimento Comercial não é um sujeito de direitos. Só pode ser, quando muito, objecto de dtos.

2. Teoria do património autónomo: o EC seria um património autónomo ou separado (um património de afectação). Uma pessoa física, em princípio, só tem um património. Mas, em certos casos, a lei permite que na titularidade da mesma pessoa exista ao lado de seu património geral, uma ou várias massas patrimoniais específicas, sujeitas a um regime especial.

A figura do património autónomo visa traduzir a existência de massas patrimoniais que, não possuindo personalidade jurídica própria, possuem, no entanto, uma individualidade jurídico-passiva em virtude dos fins particulares para que forem criadas.
Ex: o Estabelecimento Comercial é uma massa de bens porque está afecta a um fim particular, só responde pelas dívidas dessa mesma massa, e só na medida do património afecto.
Ex: de patrimónios autónomos: massa falida (só para pagar aos credores do falido); herança; divisa; património de Pessoa Colectiva dissolvida mas ainda não liquidada.

Esta teoria foi também sustentada por autores italianos que se baseavam numa norma segundo a qual, em caso de trespasse ou em caso de cessação da exploração do Estabelecimento Comercial, as dívidas contraídas na exploração do Estabelecimento Comercial transmitir-se-iam para o adquirente desse Estabelecimento Comercial. Passaria, assim, a haver dois devedores.

Crítica: A regra geral aplicável no Direito Comercial Português é o princípio da indivisibilidade ou unidade do património dos particulares, logo tb dos comerciantes – art. 601º CCiv. Esse princípio tem algumas excepções, mas entre elas não se encontra o Estabelecimento Comercial. Para que o Estabelecimento Comercial fosse um património autónomo era necessário que os bens patrimoniais afectos à sua exploração respondessem apenas pelas respectivas dívidas (o que não acontece, pois os bens afectos ao Estabelecimento Comercial respondem quer pelas dívidas comerciais quer pela dívidas civis), e que pelas dívidas contraídas por esse Estabelecimento Comercial respondessem apenas os bens do Estabelecimento Comercial (o que também não se verifica, pois os credores podem fazer-se pagar indistintamente por qualquer tipo de bem do titular do Estabelecimento Comercial. O Estabelecimento Comercial é apenas um tipo desses bens.

O titular do Estabelecimento Comercial goza de um direito de disposição absoluta dos bens afectos ao Estabelecimento Comercial. Além disso, no direito português também não existe uma norma semelhante à do direito italiano.
Entre nós, em caso de trespasse, por ex., o passivo do Estabelecimento Comercial não se transmite automaticamente para o adquirente do Estabelecimento Comercial. As dívidas do trespassante permanecem na respectiva titularidade e só se transmitem para o adquirente se os credores dessas dívidas nisso consentirem: arts. 858ºss e 595º CCiv.

Se fosse um património autónomo, não era preciso o consentimento do credor. Por essas dívidas respondem solidariamente o alienante e o adquirente. 
Mas existe no nosso direito uma situação em que o legislador se aproximou deste modelo (o Estabelecimento Comercial aparece com as características de um património autónomo): caso do EIRL

É um Estabelecimento Comercial que funciona como um património autónomo. Por força dos arts. 10º e 11º, estabeleceu-se que os bens afectos à exploração desse EIRL respondem apenas pelas dívidas do EIRL. O legislador quis dar aos empresários em nome individual o benefício da responsabilidade limitada: está a salvo da agressão pelos credores, do seu património pessoal. Mas, conjugando o 10º e 11º com os 23º e 25º vemos que os primeiros artigos sofrem algumas excepções.

3. Teoria da Universalidade: B. Magalhães, Brito Correia.
O Estabelecimento Comercial deveria ser concebido como uma universalidade, como um complexo de coisas jurídicas pertencentes a um mesmo sujeito, tendentes a um mesmo fim que a ordem jurídica reconhece e trata como uma coisa jurídica una – ex: um rebanho. As universalidades são, para o nosso direito civil, coisas móveis ainda que os elementos que integram esse complexo possam ser imóveis. O Estabelecimento Comercial constitui, de facto, um aglomerado de coisas que possuem um fim económico comum.

Depois, houve 2 versões festa teoria:
- Para uns era uma universalidade atomística  esta universalidade era apenas a soma das várias coisas que a compõem.
- Para outros era uma universalidade unitária  essa universalidade pode ser tratada pela ordem jurídica como tendo uma existência separada, autónoma. Logo, eu posso constituir relações jurídicas sobre essa coisa unitária.

4- Teoria do bem imaterial: Orlando de Carvalho.
Afirma que o Estabelecimento Comercial é uma coisa unitária de natureza imaterial. Esta concepção parte da ideia do Estabelecimento Comercial como organização: o que caracteriza o Estabelecimento Comercial não são os vários bens (corpóreos, incorpóreos) que o integram ou as várias pessoas que aí trabalham, mas sim uma certa organização apta a criar lucro. É esta organização que constitui o cerne decisivo do Estabelecimento Comercial, que tem um valor imaterial e autónomo em relação aos elementos que compõem o substracto da organização.

Argumentos: podem existir EC que, embora não tendo quase nenhuns bens materiais, tenham uma finalidade de lucro – ex: Agências de mediação, etc.
Inversamente, o Estabelecimento Comercial não pode existir sem uma organização, o que prova que o Estabelecimento Comercial encontra o seu cerne distintivo na ideia de organização. O valor do Estabelecimento Comercial determina-se sobretudo pela sua capacidade de aviamento da sua capacidade organizativa.


3-Posição adoptada no Dto Positivo:
Parece que a verdade estará com as 2 últimas teorias. O Estabelecimento Comercial constitui uma unidade jurídica objectiva, no sentido em que representa algo mais e algo diferente das coisas que o constituem e a forma como o Direito reconhece o valor autónomo desse Estabelecimento Comercial deve constituir-se como objecto unitário e autónomo da RJ e não como sujeito de direitos.

Há 3 situações fundamentais em que o legislador português reconheceu o EC como unidade jurídica objectiva:
I. trespasse,
II. cessão de exploração,
III. instituto da concorrência desleal

Trespasse: Art.115º do RAU. É todo e qualquer negócio jurídico pelo qual se realiza a transferência definitiva e por acto inter vivos da titularidade de um Estabelecimento Comercial. Pode consistir numa venda, doação, realização de uma entrada para uma sociedade, troca, dação em cumprimento, etc.
Exclui-se da caracterização do trespasse os negócios jurídicos que importem a transmissão temporária do Estabelecimento Comercial (o que não acontece na cessão de exploração do EC). Também não é prevista a transmissão mortis causa. Finalmente, a natureza onerosa ou gratuita não é relevante.

O trespasse deve ser celebrado por documento particular: 115º do RAU (DL 64-A/2000) e 89ºK do Código do Notariado. O trespasse consiste na transferência global e unitária do EC  transmite-se a fruição da unidade organizativa apta a dar o lucro e não os vários bens (= elementos que compõem o Estabelecimento Comercial).
Em caso de trespasse, o trespassante arrendatário deve transmitir o Estabelecimento Comercial como um todo. Logo, também poderá fazê-lo sem o consentimento do senhorio, ainda que este tenha um direito de preferência sobre a transferência onerosa (vd. 116º RAU). Esta excepção às regras gerais visa acautelar que aquilo que é transmitido seja a fruição de uma unidade organizatória, dotada de uma actividade lucrativa.

Para que haja trespasse é preciso que aquilo que se transmite seja um todo organizacional, dotado de uma autonomia própria.
A lei diz que não há trespasse nos casos do 115º/2 a) e b) RAU porque nestes casos não é transmitido o conjunto de elementos que constituem o EC ou porque lhes seja dado outro destino.
O 37º/2 LCT considera que, no caso de qualquer acto que envolva a transferência da empresa, há uma transmissão da posição contratual da entidade patronal  estas 2 situações são reflexo da visão unitária.

Existe uma obrigação por parte dos trespassantes de não exercerem uma actividade comercial idêntica à que desenvolvia o Estabelecimento Comercial transmitido, actividade essa que, pela sua proximidade espacial e temporal com o Estabelecimento Comercial transmitido, possa prejudicar a fruição da sua clientela. Trata-se de uma cláusula contratual que consagra a obrigação de não concorrência ou obrigação de garantia (esta cláusula vale mesmo no silêncio da lei). 
Há quem entenda que o vendedor deve permitir a fruição completa da coisa vendida ao comprador (vd. 913º CCiv) também nos casos de transmissão do Estabelecimento Comercial.
A violação desta obrigação de garantia acarreta responsabilidade civil contratual e mesmo uma sanção pecuniária compulsória. Há sempre lugar à apreciação da proximidade espacial e temporal das actividades concorrentes, tendo em conta os elementos temporais e espaciais. 
O art.115º/2 prevê uma situação de “falso trespasse” e visa acautelar o uso desta figura por aqueles que pretendem fugir às regras gerais que exigem a autorização do senhorio para ceder o arrendamento de um imóvel.
No entanto, não podemos aplicar à letra os dois pontos do 115º/2, temos que fazer uma interpretação restritiva:
IV. na alínea b) exige-se o conluio das partes (no sentido de mudança do ramo);
V. na alínea a) não se pode dizer que para haver trespasse tem que se transmitir todos os objectos singulares do Estabelecimento Comercial, mas apenas o núcleo essencial desses bens.

Com o trespasse também se transmitem as respectivas dívidas?
Ao transmitirem-se os direitos, também se transmitem as obrigações (o passivo)?
Não, os elementos passivos não se transmitem com o trespasse. Para que assim seja é necessário o consentimento dos credores do contraente trespassante – 595ºss e 825º CCiv.

Cessão de exploração do EC: locação do Estabelecimento Comercial.
Consiste num negócio jurídico através do qual o titular de um Estabelecimento Comercial transmite a outrem, a título oneroso e temporário, a fruição desse Estabelecimento Comercial.
O transmitente dessa fruição ou gozo continua a ser titular desse Estabelecimento Comercial (cedente ou locador) e o seu parceiro é o cessionário ou locatário.
C.Abreu: não se deve referir este negócio jurídico como cessão de exploração
 mas sim a locação do EC  1022º CCiv
A transmissão do Estabelecimento Comercial deve ser sempre temporária. Se for definitiva estamos na figura do trespasse.
No caso da cessão é sempre um negócio jurídico oneroso.
A forma exigida para a cessão é o documento particular – 111º RAU (DL 64-A/2000).
O cessionário poderá usufruir dos lucros mas, como contrapartida, terá sempre que pagar ao cedente.
A lei estabelece no 111º/1 que o contrato de cessão comercial não é havido como arrendamento. Logo, uma das consequências importantes é a não aplicação do 68º/1 do RAU, segundo o qual o arrendatário pode impedir a renovação automática do contrato.

Só haverá cessão, se essa cessão do Estabelecimento Comercial for como um todo, for cedida na globalidade dos seus elementos e não seja para exercer um outro tipo de ramo. Pretende-se prevenir as “falsas cessões de exploração”. Haverá arrendamento se apenas se puser à disposição do locatário as quatro paredes. Já não haverá cessão de exploração se o imóvel não for cedido juntamente com os materiais e bens indispensáveis ao arranque do EC.

O arrendamento é sempre celebrado por períodos de 1 ano e é automaticamente renovável; o arrendatário é que pode renunciar o contrato e não o senhorio: 68º RAU
A cessão de exploração é temporária. Não faz sentido pedir a autorização ao senhorio. A lei que permite a transmissão definitiva sem autorização, também permite a transmissão temporária sem ela  ou seja, a lei que permite o mais tb permite o menos – argumento por maioria de razão (interpretação enunciativa).
O art.111º/2 manda aplicar o 115º/2 RAU.
Também existe a obrigação de não concorrência  1031º b) e 1037º/1 C.Civil: o locador não pode praticar actos que impeçam ou diminuam o gozo da coisa pelo locatário durante todo o contrato. Não há limites temporais, há limites espaciais.


Concorrência desleal:
É um instituto que visa proteger os comerciantes contra os actos desleais dos seus concorrentes.
Vigora o princípio da liberdade de concorrência entre os comerciantes, mas com limites: quem exerce a sua actividade comercial de forma desleal actua abusivamente, estando sujeito a sanções penais e civis.

No Direito Português os actos de concorrência desleal estão regulados no CPI (212ºss)  delitos contra a propriedade industrial.
O 212º é uma cláusula geral em que cabem outros actos que não são violadores dos direitos aí previstos. Ex: A, comerciante, morre e deixa dois filhos (B e C). Em partilhas, o Estabelecimento Comercial coube a B. Posteriormente, C decidiu abrir na mesma cidade um Estabelecimento Comercial, com nome diferente, mas anunciando que o outro Estabelecimento Comercial havia mudado de lugar. É um acto de concorrência desleal, sempre que esteja a violar o 212º CPI. C incorre em responsabilidade civil e penal.

art. 483º CCiv (responsabilidade civil extracontratual)  há violação de um direito de outrem ou de um interesse juridicamente protegido (= interesse do comerciante na conservação da capacidade lucrativa do Estabelecimento Comercial de que é titular).

O instituto da concorrência desleal visa proteger o Estabelecimento Comercial como um todo, na sua globalidade, enquanto organização comercial apta a dar lucro.
A tutela do Estabelecimento Comercial realiza-se em dois planos:
I. através de normas que visam proteger, na sua individualidade específica, os elementos que integram o Estabelecimento Comercial (objectos individuais);
II. através de normas que protejam o Estabelecimento Comercial em si mesmo, e que funcionem como tutela geral ou complementar das anteriores normas.

Ver tb art.260º CPI.


EC  objecto de dtos reais
O nosso dto concebe o Estabelecimento Comercial como objecto de direitos. Mas objecto de que direitos? Direito de propriedade, direitos de crédito.

Qt aos dtos reais:
A doutrina divide-se

 Antunes Varela defende que não:
- o 1302º CCiv não inclui o Estabelecimento Comercial.
- o direito de propriedade só pode incidir sobre coisas corpóreas.

 a maioria da doutrina (O.Carvalho, F.Correia) defende que sim.
- o Estabelecimento Comercial, enquanto tal, pode ser objecto de direitos reais menores.
Trata-se da melhor opinião, pois é o próprio Código Civil que admite o direito de propriedade sobre coisas imateriais  dtos de autor, dto de propriedade industrial: 1303º CCiv.

Há também a possibilidade de um Estabelecimento Comercial ser objecto de um direito de usufruto (opinião pacífica na doutrina). A posição jurídico-real de um usufrutuário sobre um Estabelecimento Comercial também vem definida por essa concepção unitária de Estabelecimento Comercial. O usufrutuário deve assegurar a continuidade do Esumtabelecimento Comercial e a sua manutenção como todo, como uma unidade. Será essa unidade que o usufrutuário deverá devolver quando cesse o usufruto.
Mas, o usufrutuário está impedido de tomar atitudes de gestão que possam trazer perigo à capacidade lucrativa do Estabelecimento Comercial. Também não pode fechar nem liquidar o Estabelecimento Comercial.

Possibilidade de o Estabelecimento Comercial ser objecto de acção de reivindicação da propriedade, da posse e de acção de reivindicação da posse.

É porque se concebe o Estabelecimento Comercial como um todo que se permite uma acção de reivindicação da propriedade ou acção possessória, caso contrário, seriam necessárias tantas acções quantos os elementos que constituem o Estabelecimento Comercial.

4. EIRL (estabelecimento individual de resposabilidade limitada) DL 248/86, de 25 de Agosto

O art. 601º  regra geral que consagra o princípio da indivisibilidade do património comercial. Cada comerciante apenas pode ter um único património que responde por todas as dívidas.

Excepção: o EIRL

É uma figura jurídica (= massa de bens que têm individualidade jurídica, em homenagem aos particulares fins económicos respectivos). Esta figura tem subjacente uma velha aspiração dos comerciantes, que é a limitação da sua responsabilidade, porque a própria lei limita já a responsabilidade dos comerciantes em nome colectivo.

Razões:
I. invocam a natureza do comércio;
II. invocam o regime de responsabilidade dos bens do casal pelas dívidas do comerciante;
III. a limitação da responsabilidade não implica necessariamente um prejuízo para os credores porque, embora a estes fosse impossível fazerem-se pagar à custa dos bens pessoais do comerciante, sempre poderão fazer-se pagar com preferência, dos bens afectos à exploração comercial, em relação aos credores civis.

Mas isto não é bem assim, porque o comerciante pode fazer transferências dos seus bens comerciais para o seu património pessoal, conforme lhe aprouver e vice-versa. 

O comerciante de um EIRL tem dificuldade em recorrer ao crédito. Mesmo que se negue a responsabilidade limitada ao comerciante, a prática tem engendrado outros expedientes que conduzem ao mesmo resultado  Sociedades fictícias.
Assim, afigura-se melhor permitir aos comerciantes a possibilidade do Estabelecimento Comercial em nome individual e com responsabilidade limitada para não se correr o risco de proliferarem as sociedades fictícias.

-Modelos fundamentais de construção jurídica desta limitação de responsabilidade

I. Modelo de carácter jurídico-societário (modelo alemão)

O legislador alemão obteve esta limitação de responsabilidade através da permissão da criação de sociedades comerciais unipessoais (sociedade de responsabilidade limitada com base unipessoal – SA ou sociedade por quotas com um único sócio)

II. Modelo de carácter jurídico-privatístico (modelo francês)
Renunciou-se à criação de uma nova pessoa jurídica (1 novo titular de dtos) e recorreu-se à figura do património autónomo ou de afectação.
Para obter aquela limitação bastaria criar, ao lado do património geral do comerciante, uma massa patrimonial específica exclusivamente afecta à actividade comercial do comerciante (cf. EIRL).

Foi este o caminho que o legislador português seguiu nos arts.10º e 11º do DL EIRL  consagra-se uma autonomia patrimonial perfeita.

O legislador não seguiu o caminho da constituição de uma sociedade unipessoal porque a doutrina deu sempre por adquirido que a sociedade tem um paradigma contratualista. Como um contrato exige sempre duas pessoas, uma sociedade constituída por uma pessoa é algo “inconcebível”.

Constituição do EIRL

Sujeitos: um EIRL apenas pode ser constituído por uma pessoa física ou singular. Essa pessoa pode já ser comerciante ou não. Não sendo, com a constituição do EIRL, o seu titular passa a ser comerciante, com os dtos e obrigações inerentes a essa qualidade: (art.1º). O EIRL não é sujeito de direitos, não tem personalidade jurídica. É apenas objecto de direitos. O sujeito de dtos é o comerciante.

O comerciante só pode ser titular de um único EIRL, caso contrário a aquisição será nula, se uma pessoa adquiriu o EIRL por acto inter vivos. Há uma obrigatoriedade de alienação se ele lhe chegar às mãos mortis causa. Está vedada a possibilidade de uma pessoa colectiva ser titular de mais de um EIRL.

Forma: o EIRL deve ser constituído por documento particular, salvo se forem efectudas entrdas em bens para os quais a lei exija escritura pública (deve ter as menções previstas no art.2º do DL). As alterações tambem estão sujeitas a registo.
Registo: a lei não atribui eficácia constitutiva ao registo do EIRL. Aplicam-se as regras gerais (eficácia declarativa). Aqui, o registo constitui condição de oponibilidade face a terceiros, embora os actos sejam válidos inter partes (vd. arts. 5º e 6º).
Capital: é de 5 000 €, dos quais 2/3 têm de ser em numerário. O capital deve estar totalmente liberado no momento da constituição do EIRL.

Intangibilidade do capital do EIRL  em que momento é possível a distribuição dos lucros ou quantias provenientes da actividade do EIRL? Temos que distinguir:

I. lucros líquidos do exercício: é admissível a sua desafectação do EIRL, qualquer que seja o destino a dar a esses lucros. Se as quantias desafectadas excederem o valor dos lucros líquidos, o titular tem a obrigação de as restituir. Quanto a esse excesso, tem a responsabilidade ilimitada (14º/2).
II. Todas as restantes quantias: como não são lucros líquidos, dá a ideia absurda de que, no 14º/1, apenas se proíbe tais desafectações caso o destino a dar a essas quantias seja estranho ao EIRL. Logo, a contrario parece possível, se se destinar ao fim do EIRL.

Funcionamento do EIRL
Cabe exclusivamente ao respectivo titular:

Art. 8º - administração do EIRL
pode ser gratuita/onerosa
Sendo onerosa, a remuneração nunca pode ser superior ao equivalente a 3 salários mínimos nacionais. Se assim não fosse, estaria aberta uma via legal para transferir do património do EIRL para o património pessoal, sem que a lei o pudesse impedir.

Publicidade do EIRL  tem que elaborar um balanço (orçamento) anual sujeito a parecer do revisor oficial de contas. A violação desta formalidade implica implica resp. contravencional.

Apreciação crítica do regime legal  Pode haver dúvidas, se existe coordenação entre o legislador do EIRL e o legislador do CSC. As duas figuras, EIRL e sociedades individuais de responsabilidade limitada, visam atingir a mesma finalidade  limitar a responsabilidade para o comerciante em nome individual.

A justificação fundamental para basear a construção do EIRL na figura do património autónomo, assenta no paradigma contratualista que fazia com que a sociedade unipessoal fosse algo de inconcebível. Isto desapareceu porque, em quase todos os países da Europa, a sociedade unipessoal é uma realidade jurídica admissível. O próprio legislador português reconhece a legitimidade dele (488º CSC).


EIRL / Estabelecimento Comercial

O EIRL não constitui necessariamente um Estabelecimento Comercial por duas razões:

I. A natureza jurídica do Estabelecimento Comercial é a de uma universalidade (coisa incorpórea), enquanto que a do EIRL é a de um património autónomo.
II. O EIRL não implica necessariamente a existência de um Estabelecimento Comercial e implica necessariamente a existência de apenas um Estabelecimento Comercial.
No momento da constituição do EIRL não existe ainda, normalmente, um conjunto de base de situações factícias económicas aptas a gerar lucro (Estabelecimento Comercial).

EIRL / Autonomia patrimonial
Na generalidade das legislações atribui-se uma autonomia patrimonial imperfeita ao EIRL, ou seja, o património geral do comerciante não responde pelas dívidas do EIRL, muito embora o património do EIRL possa responder não só pelas dívidas do EIRL, mas também pelas dívidas pessoais do titular. Mas, há preferência dos credores do EIRL em relação aos outros.

No direito português, dá ideia que temos uma autonomia patrimonial perfeita:
Art.11º  pelas dívidas do EIRL respondem apenas os bens do EIRL (e não os bens pessoais).
Art.10º  o património do EIRL está exclusivamente afecto ao pagamento das dívidas do EIRL (e não das dívidas pessoais do seu titular).
Isto não está correcto. Tal autonomia patrimonial perfeita, a ser consagrada, não é admissível. Mesmo nas sociedades comerciais de responsabilidade limitada (S.A. e sociedades por quotas) o sócio não beneficia de uma autonomia patrimonial perfeita. Mesmo nas S.A. o sócio responde só até ao valor da sua entrada. Os arts. 10º e 11º estabelecem excepções, de tal modo que não se pode falar de uma autonomia patrimonial perfeita.
Art.10º  o património responde apenas pelas dívidas desse mm património.
“sem prejuízo do disposto no art. 22º”  permite que se penhore o património do EIRL, por dívidas alheias à respectiva exploração, sempre que os credores civis do titular do EIRL provem a insuficiência dos bens no património comum desse comerciante devedor.

Opinião: o que é o mesmo que dizer que não há autonomia patrimonial, porque isto é fácil de provar. Os credores só podem penhorar o património do EIRL como um todo.

Art.11º  estão também previstas excepções nos nº 2 e 3 do art.11º:
Art.11º/2  sempre que o comerciante seja declarado falido e se verifique que na administração do EIRL não foram observados os princípios de uma gestão criteriosa.
Ex. apurar a transferência de bens do património para o património pessoal, entende-se que deve ser recusado o benefício da responsabilidade limitada. Há duas massas patrimoniais distintas e sempre que a autonomia dessas massas não seja respeitada, a lei retira o benefício da responsabilidade. limitada. Pode-se perguntar se será correcta a limitação do benefício da responsabilidade limitada nos casos em que existe falência.
Ora, admite-se que os titulares possam desviar bens do património do EIRL para o seu património pessoal. O que não se admite é que essa operação conduza à situação de falência.

Questão: Será que o legislador não deveria ser mais rigoroso / preventivo?
Na prática isto permite que se operem transferências, o que obriga a que o titular do EC cuide que o passivo não seja superior ao activo, o que acaba por conduzir a manobras contabilísticas. Estas, sim, retiram garantias aos credores e podem levar à falência. Daí que a lei devia ser mais rigorosa com vista a prevenir o risco de falência.

Âmbito mínimo, natural e convencional no trespasse do Estabelecimento Comercial

Mínimo: conjunto de elementos indispensáveis para que se possa falar na transmissão do Estabelecimento Comercial. São as bases essenciais e necessárias para identificar a empresa que foi objecto do negócio jurídico. Se for desrespeitado, não há trespasse mas apenas transmissão de bens singulares. Mas, não é possível ver a priori qual o àmbito mínimo do Estabelecimento Comercial. Tem que se ver em cada caso concreto. Isto já resultava da ideia restritiva do (art. 115º/2 a). O âmbito mínimo é aquele que tem sempre que existir.
Natural: Nos casos de um negócio jurídico sobre o estabelecimento não indicar quais os elementos que concretamente se incluem na transmissão (no silêncio do negócio jurídico), coloca-se a questão de saber quais são os elementos que se transferem – são os que fazem parte do âmbito natural (no caso de silêncio das partes).
Ex: sinais distintivos do próprio Estabelecimento Comercial: nome, insígnia, logotipo, marca... Pelo menos o nome e a insígnia têm que integrar um certo numero de transmissões. Para além destes, também se inclui todos os elementos necessários para o desencadeamento da actividade comercial do Estabelecimento Comercial. Ex: mercadorias, máquinas, mobiliário, matérias primas...

bens imóveis?

Quando o Estabelecimento Comercial funciona em imóvel que é propriedade do seu titular, no silêncio das partes, há ou não transmissão do direito de propriedade sobre o estabelecimento? Há quem diga que sim e que não: depende do tipo de actividade desenvolvida e da importância que o prédio tem para desenvolver essa actividade.
Ex: Se o EC é um Hotel, o espaço é essencial, neste caso ia considerar-se que faz parte do âmbito natural, logo também há transmissão da propriedade do edifício.
Outro Ex: propriedade dos automóveis privados, aqui a transmissão também pressupõe a transmissão do espaço, porque é essencial para o desenvolvimento da actividade transportadora.
Há imóveis que não são incorporados para o desenvolvimento da actividade Ex: prestação de serviços. Aqui, é mais importante é a carteira de clientes do que o espaço onde se encontra o serviço.

Mas, na maior parte das situações, o Estabelecimento Comercial funciona em locais arrendados, e o contrato de arrendamento é considerado também âmbito natural da transmissão do Estabelecimento Comercial. O art.115º/1 salvaguarda que possa não ser transmitido, mas, no silêncio das partes, há também a transmissão da posição de arrendatário (está integrada no âmbito natural).

Além disso, os contratos de trabalho também acompanham a transmissão do Estabelecimento Comercial (art. 318º CT) também podem fazer parte do âmbito natural. Sempre que há transmissão do Estabelecimento Comercial, há naturalmente a transmissão dos contratos de trabalho, a não ser que haja acordo noutro sentido.

Quanto aos contratos de locação financeira, o DL 149/95 equipara a transmissão de locatário à transmissão da posição de arrendatário, não é preciso o consentimento da empresa de locação financeira (do locador). Aplica-se o regime que vale para o arrendamento. Logo, no silêncio das partes, faz parte do âmbito natural (contratos de locação financeira).

NB: Todos estes elementos se transmitem naturalmente com o Estabelecimento Comercial, salvo se asua trasferência for excluída pelo clausulado do negócio jurídico.

Convencional: são elementos que só são transmitidos se houver acordo entre o trespassante e o trespassário.

Firma do trespassante: este tem uma firma mas, em princípio ela não é transmitida, a não ser que haja acordo. A firma identifica o comerciantee não o Estabelecimento Comercial, ao contrário da insígnia que identifica o Estabelecimento Comercial.

Créditos da Estabelecimento Comercial: também se podem transmitir, mas apenas mediante acordo, porque se aplica aqui a cessão de créditos regulado no Código Civil, e que não prevê qualquer norma que estabeleça a transmissão automática dos créditos com a transmissão do Estabelecimento Comercial. Logo, aplica-se o regime geral da lei civil art. 577º ss CCiv é preciso acordo entre trespassante e trespassário, não é preciso o consentimento dos devedores, apenas há a sua notificação (art. 583ºCCiv). Isto para os devedores saberem a quem devem fazer a prestação em dívida até à data do vencimento.

Dívidas do EC (do passivo): exige um acordo entre trespassante e trespassário, mas isto não basta. É preciso uma ratificação dos credores, ou seja, que estes consintam a transmissão – art. 595ºnº1 a) e nº2 CCiv.
Se os credores se limitarem a consentir a transmissão, A e B, trespassante e trespassado, respondem solidariamente pelas dívidas, salvo se por convenção expressa se exonere o antigo devedor. Senão, há responsabilidade solidária entre A e B. Isto porque um estabelecimento comercial não tem autonomia patrimonial. Logo, pelas dívidas do Estabelecimento Comercial respondem todos os bens de A, e os credores não podem ficar desprotegidos face às dívidas que eles não autorizem a transmissão: por isso é preciso consentimento. Para os credores é melhor a responsabilidade solidária.


Cap. V – Os instrumentos jurídicos da actividade comercial

5.1-Sinais distintivos do comércio:

São os instrumentos jurídicos da actividade comercial. São sinais distintivos aqueles que servem para individualizar ou identificar no mercado, determinados sujeitos jurídico-comerciais nomeadamente o comerciante, o EC ou seus produtos e os serviços desse EC.
Os três principais são:
I. a firma (sinal identificador do comerciante)
II. nome e insígnia (sinal identificador do EC)
III. marca (sinal identificador dos produtos ou serviços do EC)

Todos este sinais possuem algumas características comuns:
IV. todos estão protegidos por direitos absolutos (conferem ao seu titular um direito do uso exclusivo, “erga omnes”)
V. todos são de uso facultativo (salvo a firma)
VI. são de carácter acessório, embora constituam em si mesmos bases jurídicas que a lei protege autonomamente, têm uma função meramente instrumental em relação ao sujeito que individualizam, não sendo susceptíveis de uma fruição independente do sujeito ou objecto embora a lei permita que, em certos casos se possa alienar o sinal distintivo de um sujeito ou objecto.

1-A Firma: (Há duas acepções diferentes)

1.1-Generalidades
VII. concepção objectiva (países anglo-saxónicos) a firma é um sinal distintivo do próprio EC o que tem como conseqüência que:
Pode ser constituída livremente;
Pode ser livremente transmitida, sem necessidade de qualquer acordo expresso;
O comerciante apenas poderá utilizar na sua actividade mercantil o seu nome civil.

VIII. Concepção subjectiva (direito alemão) a firma é um sinal distintivo do titular do EC ( do comerciante ). É uma designação nominativa utilizada pelo comerciante no exercício da sua actividade mercantil. A firma identifica o indivíduo, na sua individualidade económica, assim, como o nome civil identifica o indivíduo na sua individualidade civil, o que sinifica que:
IX. A firma não pode ser livremente composta porque tem que partir do nome civil do comerciante
X. Como está intrinsecamente ligada à pessoa do comerciante, a firma não é, em princípio livremente transmissível. Na prática, a firma é mais um sinal identificador da empresa do que do comerciante. Por isso, a legislação tem permitido que a firma possa ser transmitida juntamente com o EC para que seja preservada a clientela do EC, não prejudicando assim o trespassário do EC.

A concepção da legislação portuguesa é a subjectiva, o que já resultava do art.18º CCom, mas também se chega a essa conclusão através do DL 129/98, de 13 Maio, relativo ao regime de registo nacional de pessoas colectivas art.8ºss.

1.2-Regras da constituição da firma:

Há que distinguir:
- Constituição da firma do comerciante em nome individual
- Constituição da firma da sociedade comercial

A) Contudo, há aspectos gerais da composição das firmas que valem para todas:

1. a firma é um sinal de uso obrigatório; isto vale quer para o comerciante em nome individual, quer para a sociedade comercial. A consequência jurídica que decorre da omissão deste dever:
a) nas sociedades comerciais, uma vez que a sua constituição exige a exibição perante o notário de um certificado prévio da admissibilidade, a inexistência da firma implica um obstáculo à constituição do Estabelecimento Comercial – porque a exibição desse certificado é prévio à escritura pública da constituição.
b) no comerciante em nome individual, a inobservância da firma tem sanções meramente contra-ordenacionais, já que os actos praticados por um comerciante em nome individual sob o seu nome civil são válidos.

2. a firma é um sinal de uso nominativo; deverá sempre consistir na expressão verbal, com exclusão de todos os elementos figurativos ou emblemáticos.

Regras: a firma tem que ser redigida em língua portuguesa embora possa haver palavras estrangeiras; não pode ser ofensiva aos bons costumes ou incompatível com ideologias. Não pode conter trespónimos. Enquanto sinal nominativo, a firma pode ser constituída apenas com o nome de uma pessoa ou várias pessoas e temos então: “firma – nome” ou “firma – denominação”, que é composta a partir de uma expressão relativa ao ramo que exerce, e ainda a “firma – mista” que engloba na sua formação ambos os elementos.

3. o registo tem eficácia constitutiva;
O direito à firma, como direito exclusivo que é “erga omnes”, só nasce para o respectivo titular a partir da data do respectivo registo definitivo. O certificado da admissibilidade é uma nova presunção “iuris tantum” de que a pessoa é titular do direito e, enquanto tal, sujeitos a prova em contrário. A necessidade da prova deixa de existir a partir do registo. Mas, também as alterações subsequentes dessa firma estão sujeitas a registo definitivo.

B - Aspectos específicos da firma:

1. Comerciante em nome individual
art. 38º DL – A firma dos comerciantes em nome individual deve basear-se no respectivo nome civil. Este nome poderá sofrer algumas alterações (nome completo ou abreviado) e poderá conter ou não um aditamento qualitativo relativamente à actividade mercantil concreta que o comerciante exerce, ou até uma expressão de fantasia.
Mas, o núcleo é sempre o nome civil. Está vedado que a firma possa ser composta na base de uma simples expressão de fantasia.

Ex: pode adoptar a firma “João o pescador”, mas não a firma “o pescador”.

Isto tem a ver com o regime da responsabilidade a que estão sujeitos estes comerciantes e a necessidade de salvaguardar os seus credores. Como respondem com todo o seu património (afectos ao Estabelecimento Comercial e pessoal) pelas dívidas do Estabelecimento Comercial, é importante para os respectivos credores saber a identidade do comerciante.

Excepção: Para os comerciantes em nome individual titulares de uma EIRL, a firma deve ser constituída pelo nome, mas deve conter um aditamento obrigatório (= sigla “EIRL”) continua tb a valer as regras de um aditamento facultativo art.40 DL. Aqui, é um sinal identificador da EIRL e não do comerciante


3. Sociedades comerciais

art 37º/1 DL – Varia consoante o tipo de sociedade em causa. Há quatro tipos de sociedades comerciais:

a) Sociedade em nome colectivo: a firma deve ser obrigatoriamente composta a partir do nome dos respectivos sócios “firma-nome” art.37 do DL e 177º CSC. Isto, na base do nome dos sócios, de alguns dos sócios ou de apenas um dos sócios. Só quando não está incluído o nome de todos os sócios é que se deve acrescentar à firma um aditamento obrigatório: “e Companhia”. Há a possibilidade de um terceiro não sócio autorizar que o seu nome figure na sociedade. Passa o terceiro a responder solidária e individualmente pelas dívidas da sociedade, embora subsidiariamente. A firma também pode ser uma “firma mista” que inclua uma menção ao objecto da sociedade (actividade) e ao nome civil: isto é possível.

c) Sociedade em comandita: art.37ºDL e 467º CSC

Regra: A firma é sempre uma “firma nome”.
Especialidade: a firma destas sociedades terá de incluir, pelo menos, o nome de um sócio comanditado. Nestas sociedades, existem os sócios comanditados (respondem ilimitadamente) e os sócios comanditários (respondem limitadamente); a firma tem que incluir também o aditamento obrigatório “em comandita” ou “& comandita” ou “ Comandita por acções” .

A firma deste tipo de sociedade pode incluir o nome de um sócio comanditário ou até um terceiro, mas neste caso, quer um quer outro ficam sujeitos a uma responsabilidade a que estão sujeitos os sócios comanditados. Também aqui, há quem defenda a admissibilidade de uma “firma mista”. A razão para que as sociedades de pessoas tenham uma firma que seja obrigatoriamente composta pelo nome civil dos respectivos sócios, liga-se à responsabilidade destes sócios. Os terceiros que negoceiam com a sociedade têm que saber quem são os sócios, porque as garantias dos créditos não dependem apenas do património social, mas também do património pessoal dos sócios, para saber se eles oferecem garantias de cumprimento. Isto não acontece nas sociedades de capitais: o máximo que os credores podem exigir é o capital social. Logo, já não é necessário saber a identidade dos sócios, porque o capital social é que é relevante e não o pessoal.

d) Sociedade por Quotas – art 37º DL e 200ºCSC –

A firma pode ser uma “firma nome “ (nome dos sócios), “firma denominação” (expressão relativa ao objecto da sociedade) ou constar elementos de ambos “firma mista”. Em qualquer caso, deve conter o aditamento obrigatório relativo ao tipo de sociedade “& LDA” ou “& Limitada”.

Especificidade: pode-se falar em firma denominação ou firma mista (quando não incluem ou só incluem parcialmente o nome dos sócios); só se admitem excepções relativas ao objecto social e não expressões de fantasia. Quando se diz que elas se têm de referir ao objecto social (firma mista ou firma denominação) estamos a falar do objecto social estatutária.

Se uma sociedade com um determinado objecto social estatutário passar a exercer outro tipo de actividade que não este previsto nos estatutos, a lei prevê obrigatoriamente uma alteração da firma e dos estatutos conforme a nova situação (para incluir um novo objecto que a sociedade vai desenvolver) art 200º/2 CSC. A lei não é clara, mas parece que não é de admitir a possibilidade de composição de uma firma-nome nestas sociedades, a partir do nome civil de terceiros não sócios.

e) Sociedade Anónima art.37º DL e 275ºCSC –

As regras de composição são essencialmente as mesmas. A firma pode ser: “firma-nome”, “firma-denominação” ou “firma-mista”. Tem que incluir o aditamento obrigatório “S.A.” ou “sociedade anónima”. Valem aqui as especificidades atrás referidas. Só pode haver expressões relativas ao objecto social estatutário.
XI. Alteração da firma aquando da alteração do objecto
XII. Também não pode ser composta por nome de terceiro não sócio.



1.3-Problema da transmissão da firma ou firma adquirida art. 44 DL

Embora a legislação portuguesa tenha adoptado a concepção subjectiva da firma, e como tal, a firma deve ser intransmissível, isso veio ser temperado pelas exigências práticas.

Se não fosse possível a transmissão da firma do Estabelecimento Comercial, era amputado um dos elementos mais importantes: a clientela – que está sempre muito ligado ao nome e ao comerciante que explora o Estabelecimento Comercial.

Para evitar este resultado, as legislações que adoptaram uma concepção subjectiva tiveram que consagrar uma imposição prevista no art. 44ºDL – fala-se aqui em firma adquirida.

A transmissão não é, porém, livre. Está sujeita a determinados requisitos:

1. Só se pode transmitir se houver a transição do Estabelecimento Comercial em cuja exploração a firma é utilizada (art. 44º/4). Tem em vista a proteção dos interesses de terceiro, credores do Estabelecimento Comercial, porque poderiam ter a ilusão de continuar a ser titular do Estabelecimento Comercial o anterior proprietário, quando de facto já não é.
2. Exige-se um acordo expresso, por escrito no sentido da transmissão (art.44º/1).

Se se tratar de uma transmissão do Estabelecimento Comercial inter vivos, há duas hipóteses:

a) transmissão de um EC que pertence a um comerciante em nome individual: a exigência de acordo expresso baseia-se numa autorização por escrito do comerciante em nome individual.

b) Se o transmitente for uma Soc. Comercial e figurem o nome de um ou mais sócios, exige-se autorização desse ou desses sócios.

Se é transmissível por mortis causa, a firma do antigo titular só poderá ser utilizada com a concordância dos seus herdeiros.

3. Exige-se um aditamento expresso da sucessão na firma art.38ºnº2. Se adquirente for um comerciante em nome individual deverá aditar à firma originária a expressão “sucessor de”ou “herdeiros” (consoante a transmissão seja inter vivos ou mortis causa), à qual se seguirá a firma do anterior titular. Se o adquirente for uma sociedade comercial, à firma da sociedade adquirida deverá aditar-se a expressão “sucessores” à qual se seguirá um aditamento ao tipo de sociedade (“sucessores, SA “, “Sucessores, Lda”) seguido da firma adquirida do anterior titular.

1.4 - Princípios básicos do regime legal da firma:

1. Princípio da Verdade: art.32ºDL A firma deverá corresponder à situação real a que respeita, não podendo constar elementos susceptíveis de falsear essa realidade de forma a provocar confusão no público (terceiro em geral), quer quanto à identidade do empresário ou objecto da sua actividade comercial (no caso do comerciante em nome individual), quer quanto ao tipo de sociedade, à identidade dos sócios ou à natureza do objecto que ela desenvolve (caso das sociedades comerciais).

Fundamento do Princípio: preocupação em salvaguardar a permanente adesão da firma à realidade e evitar qualquer confusão quanto ao âmbito da responsabilidade por dívidas das pessoas que exploram a empresa.

Uma grande parte das normas que regem a constituição da firma (firma originária) e a transmissão da mesma (firma adquirida) baseiam-se naquela finalidade de evitar que o público seja induzido em erro. A lei prevê no art. 33º/3 que se o sócio de uma Pessoa Colectiva deixa de o ser, tenha o prazo de um ano para tirar o seu nome da firma.

Princ. Da Novidade ou da Exclusividade: art.33º a 35º As firmas deverão ser distintas para que não se confundam com as outras firmas anteriores já registadas. A firma confere ao respectivo titular um direito exclusivo do uso . O Estado quer assim garantir a função da firma, que é uma função individualizadora do sujeito jurídico-comercial. Traduz-se numa inequívoca identificação por terceiros do sinal que se quer distinguir, assim como numa exclusiva utilização pelo seu titular.

Critérios da Aferição da novidade:
Atendendo ao objecto subjacente a este princ. Não se exige que as firmas não contenham elementos comuns e entre firmas já registadas. O que se exige é que uma firma não possa ser confundida de um modo global com outras firmas – impossibilidade do seu conteúdo global. Isto traduz a novidade, mas há que saber qual o critério da inconfundibilidade da firma – diligência do homem médio. Para se saber se uma firma é ou não nova, há que recorrer ao homem normal, se esta podia ou não ser confundida com outra firma. Logo, não se atende aos critérios da inconfundibilidade subjectiva. Mas, a lei consagrou critérios auxiliares desta aparição da novidade: tipo de pessoa, afinidade, domicílio, âmbito territorial…

Assim, pode-se apreciar a novidade em termos mais objectivos.
A novidade da firma é aferida, não só relativamente a outras firmas anteriormente registadas, mas também se têm em conta outros sinais distintivos do comércio, de outro tipo (marca, sinais, signas). Desta forma, alarga-se o âmbito da inconfundibilidade. Uma das modalidades da firma é “firma nome”. Este tipo de firma que é admitido, e que equivale a dizer que nos casos da homonímia são mais vezes admitidos, dado que se fazem aditamentos relativamente ao objecto da exploração da mesma firma ( e estes sim são inconfundíveis a novas).

Em relação aos comerciantes que exerçam simultaneamente vários ramos do comércio, também é duvidoso admitir-se como lícita a utilização por esse comerciante de firmas distintas ou, pelo contrário, questiona-se se seria necessário exigir ao comerciante o uso da mesma firma.

No direito anterior, a doutrina dominante (F. Correia) ia pela primeira posição, até o próprio uso da mesma firma podia gerar confusão e podia limitar a liberdade dos comerciantes a exercer outras actividades.

Hoje é adoptada a segunda posição: uma só firma para cada comeciante.

Quando no aspecto do exclusivismo, pretende significar que a firma atribui ao seu titular um uso exclusivo, delimitando o âmbito territorial de protecção. O âmbito de protecção territorial varia:
a) para as firmas dos comerciantes em nome individual, o âmbito territorial corresponde ao âmbito da competência da conservatória do registo comercial competente art. 38º/4. Seria uma grave limitação imposta por lei, ao funcionamento do mercado, impedir que o comerciante tenha uma protecção além do seu âmbito territorial. Assim, o comerciante deve pedir um aditamento alusivo ao seu comércio, mediante a solicitação da aparição da novidade da firma a nível nacional;
b) para as sociedades comerciais, art. 37º/2, o âmbito territorial de protecção da firma é todo o território nacional. Só após o registo definitivo é que a exclusividade que a firma atribui ao comerciante opera.

4. Princípio da Unidade: art.38º/1 Significa que uma pessoa ou uma sociedade comercial apenas pode ser titular de uma única firma.

Fundamento: Salvaguarda do interesse da segurança do tráfico comercial. Quanto às Sociedades Comerciais, a firma está para eles como o nome civil está para cada um de nós. Trata-se de um sinal identificador pelo que só deve haver um.

A existência de mais do que uma firma podia levar à ilusão dos credores de que existia mais do que uma sociedade comercial.

EXCEPÇÂO: caso da transmissão da firma.
Uma sociedade comercial passa a explorar duas empresas: a empresa originária e a empresa que adquire, sob uma única firma.
Outra excepção: A sociedade passa a explorar duas empresas, cada uma com a sua firma (=excepção ao princípio da unidade).

Quanto ao comerciante em nome individual, as dúvidas acerca do princípio da unidade, neste domínio, desaparecem.

Uma excepção ao principio da unidade: comerciante em nome individual que seja titular de uma EIRL e simultaneamente titular de outro Estabelecimento Comercial.
Neste caso, o comerciante é titular da respectiva firma e da firma da EIRL (será sempre uma firma necessariamente distinta).


Caracterização do direito à firma: (Há vários entendimentos)

I. Segundo o princípio da exclusividade, o direito à firma é um direito absoluto, oponível erga omnes.

II. Alguns autores dizem que é um direito de personalidade, com carácter puramente material. Constitui uma variedade do direito ao nome.

III. Outros entendem que se trata de um direito real, como bem imaterial que seria o sinal distintivo do comércio – a firma.

IV. Há ainda quem entenda que esta questão não tem relevância prática.

Mas tem relevância porque dependendo da qualificação que adoptarmos, podemos considerar ou não o direito à firma um sujeito autónomo das relações jurídicas (penhor, etc).

O titular de uma firma é titular de um dto absoluto oponível erga omnes com as condições daí decorrentes: registo, âmbito territorial.


Meios de defesa contra a violação do dto à firma:

Art. 62 DL + art. 483 CCiv + art 227 CPI

O titular tem dto de proibir o uso ilegítimo das firmas a um terceiro. Este direito pode ser exigido quer judicial quer extra judicialmente (mesmo que o uso da firma seja meramente parcial).

Não tem que se provar a existência de qualquer dano, já que nem sequer se exige que haja dano. Se existirem danos, o titular pode exigir uma indemnização por perdas e danos (483ºCCiv). Também pode haver lugar à aplicação de sanções penais no caso de uso doloso: art.212 e 227 CPI.

A validade destas garantias está sujeita a vários aspectos:
- As garantias valem para as firmas constituidas em Portugal; como para as firmas dos países signatários do acordo de Paris sobre a propriedade industrial.
- As garantias valem apenas para as firmas registadas.

Sempre que o uso do direito à firma por terceiros possa ser considerado como um acto de concorrência desleal, poderá o titular da firma não registada ter alguma protecção, por força da aplicação das normas da concorrência desleal: sanções penais e civis.


Extinção da firma:

Art. 62ºss DL

Os sinais distintivos são bens protegidos autonomamente, pelo que a extinção da empresa a que estes estão adstritos não implica a extinção dos sinais. Mas, sempre que a lei seja omissa, a cessação da actividade mercantil, revela a cessação dos sinais utilizados na respectiva exploração.

Causas de Extinção:

Gerais: (comuns) Existe sentença judicial que declara a sua extinção e a sua revogação; por declaração da perda decretada pelo registo nacional das PsCs – artº60 ss DL

Requisitos de que depende a declaração da perda:
[O titular da firma poderá conseguir um prazo para regular a situação do preenchimento dos requisitos]

Específicos:

1. Dos comerciantes em nome individual:
- falência do comerciante.
- Cessação da actividade desse comerciante, que seja seguida da liquidação da empresa ou da sua transmissão, sem transmissão da firma.
- Morte do comerciante, seguida da liquidação da empresa em seguida da respectiva exploração, mas com existência à respectiva firma.

2. Das sociedades comerciais:
- dissolução ou liquidação da sociedade art. 146 nº3 CSC


2- O nome e a insignia do Estabelecimento Comercia:

(sinais identificadores do Estabelecimento comercial) art. 228º a 245º CPI

A firma distingue-se do nome e insígnia do Estabelecimento Comercial em relação a 2 aspectos:

Quanto à função:

A firma é um sinal distintivo do comerciante (subjectiva)
O nome e a insígnia são um sinal distintivo do EC (objectivo)

A lei vedou a possibilidade de um nome ser composto com base apenas na firma do respectivo titular, embora também possa ser utilizada.

Quanto à sanção:

- Firma é de uso obrigatório
- Nome e insígnia são de uso facultativo.

O nome também se distingue da insígnia: ambos são sinais objectivos -- nome é um sinal nominativo (palavras); insígnia é um sinal figurativo (imagens) art. 228º a 245º CPI

Constituição do nome e insígnia:

Vigora o princípio da liberdade de constituição do sinal distintivo (diferente de firma). Por isso, a lei regula a composição do nome e insígnia pela negativa (não aquilo que não pode constituir nome e insígnia) - 231º CPI

O nome pode ser composto exclusivamente por expressão de fantasia (diferente de firma), assim como pode ser constituído por pseudónimo ou tb por nomes históricos desde que do seu emprego não resulte opressão. Além disso, pode utilizar a firma, mas não exclusivamente.
A insígnia pode ser constituída por palavras, mas tem que ter algum caracter figurativo (230ºCPS).

Princípios Informadores do nome e da insígnia:

1. Princípio da Verdade , art.189º nº1b) por remissão do 231ºnº1 a). Podem-se adaptar expressões da fantasia, mas não erróneos quanto às características dos comércio a que se encontram adstritas.
2. Princípio da Novidade: esta sociedade tem um âmbito mais alargado. Não tem apenas como referência os nomes e insígnias do mesmo tipo já registados, mas tem que ser também distintiva de qualquer outro sinal distintivo do Comércio: firma ou marca.
3. Princípio da Unidade: art. 283CPI Só é válido o registo de um nome e insígnia para cada E.C. logo, o mesmo comerciante pode possuir vários Estabelecimento Comercial e pode cada um ter um nome e insígnia distintos.
4. Princípio da Eficácia distintiva: também vale para o nome e insígnia. Deve ser assegurada uma eficácia distintiva destes sinais, por forma a distinguir esses Estabelecimento Comercial em relação a outros Estabelecimento Comercial. Ex: não pode ser “restaurante”.

Transmissão do nome e insígnia: art. 157 e 243 CPS

(tem de haver acordo expresso por parte do anterior titular)

Pode ser: gratuita/onerosa
Inter vivos/mortis causa

Mas, em qualquer dos casos só podem ser transmitidos em conjunto com a transmissão do respectivo E.C.. Excepção: quando haja convenção em contrário, quando o nome e a insígnia envolvam tb a firma do comerciante: exige-se acordo expresso por parte do anterior titular. Vale no caso do trespasse, como no caso de exploração, do usufruto, etc. As regras de excepção operam em qq destes casos. A validade e eficácia da transmissão do nome e da insígnia depende da sua elaboração por escritura pública e de ser averbamento, nos termos do art.158ºCPI.

Caracterização do dto ao nome: art. 242º/245º CPI

O direito ao nome e insígnia é um direito real dos proprietários sobre um bem industrial, que confere ao respectivo titular um direito de uso exclusivo. Trata-se de um direito temporário: 2 anos (242º) com limites especiais (232º) e o registo aqui também tem eficácia constitutiva.
Excepção: art. 2º Conv União de Paris – vale também para as firmas. Todas as firmas que foram constituidas de acordo com a ordem jurídica do país de origem (signatários da União de Paris), são automaticamente válidos em Portugal, independentemente de estarem aqui registadas.

Está aqui patente o Princípio da Equiparação art.3º CPI. Esses direitos que estão aqui reconhecidos, estão sujeitos às mesmas regras dos que são constituidos em Portugal e, como tal, estão sujeitos à caducidade por não uso, se a pessoa não usar o nome durante 5 anos, caduca o seu direito ao mesmo, Art.245ºCPI os direitos são válidos, mas estão submetidos às mesmas regras dos direitos registados em Portugal.

Meios de tutela do nome e da insígnia:
Todos os meios de defesa próprios de um direito de propriedade (1311º ss CSC). Sempre que alguém constata a existência de um nome ou insígnia que já está registado na sua titularidade, pode pedir a anulação do registo já feito ou opor-se à constituição desse registo. Pode ainda solicitar sanções penais e civis do titular : 260º CPI (caso desleal) e 268º e 275ºCPI

Extinção do nome e insígnia:

V. Caducidade (245º CPI)
VI. Anulação por sentença judicial (244º CPI)

A liquidação de um Estabelecimento Comercial não determina automaticamente a extinção do nome e insígnia. A lei permite que o comerciante titular os utilize na actividade que venha a exercer.

Trespasse: (5 aspectos)
A. Faz parte do âmbito natural a transmissão de certos contratos: contrato de trabalho, arrendamento, da posição do beneficiário de doação financeira.

1.Contratos de arrendamento: art.115º RAU. Havendo uma transmissão definitiva do Estabelecimento Comercial, ocorre também a transmissão da posição do arrendatário, sem necessidade de do consentimento do senhorio. Este não se pode opor, mas o art.116º estabelece um direito de preferência atribuído ao senhorio em casos de venda ou dação ou cumprimento do Estabelecimento Comercial. Tem direito de preferência quanto à aquisição do Estabelecimento Comercial.
2. Contratos de locação financeira: art.11º nº2 DL 149/95: O art. 11º nº1 diz que a transmissão da posição do locatário é feita nos mesmos termos da posição do arrendatário, é dispensado o consentimento do locador. Mas, o 11nº2 estabelece um limite a essa transmissão: a transmissão da posição do locatário não se dá quando a empresa locadora se opõe, mas a empresa locadora tem que provar que o trespassário não oferece garantias bastantes de Execuçaõ do contrato.
3. Obrigação de não concorrência: é uma clausula implícita de todo e qualquer negócio jurídico pelo qual se opera a transmissão definitiva do Estabelecimento Comercial. Essa obrigação tem um dado destinatário: o trespassante, mas é possível em algumas situações estender a obrigação a outros sujeitos.

Além do trespassado, pode estender-se a: cônjuge e filhos do trespassado, desde que se considere que o cônjugue beneficie dos conhecimentos do trespassado quanto à exploração daquele Estabelecimento Comercial, nomeadamente nas suas relações com fornecedores, clientes, bancos. Se abrisse um Estabelecimento Comercial podia fazer uma concorrência diferenciada ao Estabelecimento Comercial do trespassário. Esta hipótese põe-se quando o Estabelecimento Comercial é um bem próprio do trespassante. Se é um bem comum do casal, são trespassantes os dois cônjuges – ambos são partes num negócio jurídico de transmissão e aqui já está abrangido pela obrigação de não concorrência. Se é uma obrigação própria, ele é o único trespassante no negócio jurídico, na transmissão, e o cônjuge faria uma concorrência qualificada face ao trespassário. O mesmo se passa com os filhos – concorrência diferenciada se têm conhecimentos dos clientes, fornecedores, bancos... Se o Estabelecimento Comercial é propriedade de uma sociedade comercial, se esta efectuar o trespasse, é a própria sociedade que fica inibida de exercer a concorrência no Estabelecimento Comercial trespassado, que pode incidir sobre os sócios da sociedade, se são administradores ou garantes de sociedade ou no caso de serem sócios maioritários, dado que só eles têm o poder de dirigir a sociedade. O trespassado é a sociedade e não os sócios, mas a obrigação incide sobre estes.

4. Obrigação da não concorrência - Se o titular do Estabelecimento Comercial que a trespassa for proprietário de outros Estabelecimento Comercial do mesmo ramo, quanto a estes Estabelecimento Comercial não tem a obrigação de não concorrência, o que eles não podem é abria um Estabelecimento Comercial novo que faça concorrência ao trespassário. Aqui, a obrigação vale para o futuro.

5. Obrigação de não concorrência – é inderrogável, é implícita. Justifica-se a sua inderrogabilidade porque se pretende assim proteger o trespassário. Não pode ser afastada pela vontade das partes.

C.Abreu - Defende que ela pode ser livremente afastada por vontade do trespassante e trespassário porque o sujeito do interesse patrimonial que resulta do contrato pode livremente dispor desses mesmos interesses, ou seja, ela pode ser afastada pelo titular desses mesmos interesses – trespassário está relacionado com a ideia de mercado da livre concorrência. Logo, para ele a obrigação da não concorrência é uma cláusula derrogável

N.B.
Limites especiais: Meio de acção do Estabelecimento Comercial, que pode captar a clientela, tem que se ver em cada caso concreto.
Limites temporais: tempo necessário para o trespassário consolidar os valores da organização do Estabelecimento Comercial – fixação de clientela – despesas do tipo de actividade.

5.2-Títulos de Crédito

1-Noções gerais e classificação

2-Letra de Câmbio:

É uma AC formal. A doutrina é unânime no sentido de que a prática de AC formais, não leva a atribuir a qualidade da conta.

Títulos de Crédito: Letra, livrança e cheque.
O título de crédito é um documento necessário para exercitar o direito literal e autónomo nele contido, é um direito que incorpora um crédito, daí ser um título de crédito. O seu portador tem nas suas mãos um documento que lhe permite exigir algo, a satisfação de um crédito. São documentos onde se verifica um fenómeno da incorporação do direito nesse documento, por isso se chama um direito cautelar , porque está incorporado num documento, o direito está incorporado no papel.

1-É um documento especial: é um documento que só encontra na dação especial com o direito neles incorporado. O documento constitui um elemento indispensável para a existência, o exercício, a transferência do direito. Ao contrário dos documentos com mera função probatória, o documento tem aqui uma função constitutiva do direito. Ao contrário dos documentos constitutivos normais a título de crédito, é indispensável não só para a constituição do direito, mas tb para sua transição

2-Caracteriza-se pelo fenómeno da incorporação (do dto no documento). Daí fala-se em direitos cartelares ( do dto ao documento). Daí falar-se em direito cartelar (incorporados em carta). Esta incorporação é relevante em dois sentidos:
A posse do documento habilita o seu portador a exercer o dto nele contido ainda que esse portador não seja o verdadeiro titular do direito.
O verdadeiro titular do direito está impossibilitado de o exercer enquanto não estiver na posse do documento, é preciso que seja uma posse legítima e de boa fé.

3-Incorpora um direito literal: a letra (o teor literal do documento é que vai determinar o conteúdo do direito ( os seus contornos)).

4-O direito incorporado é um dto autónomo; o portador do título adquire originalmente o direito cartular. A titularidade dos portadores anteriores ( ex: os seus vícios) não são oponíveis nem aproveitam ao novo portador. É um direito que passa “ex novo” na pessoa do portador.

Estes são princípios que contrastam com o regime geral do dto civil: a incorporação do direito no documento contrasta com a função acessória dos documentos negociáveis no dto civil; a titularidade contrasta com as regras gerais da declaração da vontade, a autonomia contrasta com as regras em matéria da cessação de créditos em que se afasta à pessoa dos credores anteriores (vícios que prejudicam o credor actual).

Explicação da disciplina jurídica especial:

1-Defesa dos interesses de 3ºs de boa fé ( os adquirentes de um título de crédito devem cumprir esse título).

2-Proteger o valor da circulação dos títulos de crédito. Se se aplicassem as razões civis comuns, isso não era positivo: ou se arranja uma forma de confiar nos TC ou eles não servem para nada. Logo, tem que se proteger muito bem o direito contido nesse papel.

Classificação dos TC:

Critério do conteúdo cartular (dto contido no documento)
1-Títulos de participação: conferem ao seu titular o estatuto do membro de uma determinada actividade. Ex: acções de uma AS.
2-Títulos representativos de mercadorias: podem conferir ao seu titular quer um direito de crédito, quer um direito real. Ex: guia de transporte.
3-Títulos que incorporam um direito a uma prestação pecuniária: letras, livranças, cheques – quem os tem pode pedir a quantia ali indicada.

Critério do modo de circulação do próprio documento:

1-Títulos nominativos: aqueles que são endereçados pelo emitente do título a uma dada pessoa cuja transmissão exija intervenção quer do emitente do título quer do portador do mesmo. Ex: acções nominativas.
2-Títulos à ordem: Aqueles que são endereçados pelo emitente do título em favor de uma dada pessoa, mas há uma diferença em relação aos títulos nominativos, no regime de transmissão: aqui exige-se apenas a intervenção do portador do título na sua transmissão, bastando que o endosse.
O endosso é uma ordem de pagamento dado pelo portador do título em favor de uma terceira pessoa “ en dos” ( nas costas). O endosso é feito mediante a aposição da assinatura do endossante nas costa do título.
3-Títulos ao portador: estes títulos não fazem menção a uma pessoa, têm apenas um número da ordem. Transmitem-se por simples entrega aos titulares que são sempre os respectivos portadores.

Letra de Câmbio: quanto ao conteúdo, incorpora uma prestação pecuniária. Quanto ao modo da circulação, é um título à ordem.
Formato:
Porto, ......
Em _________ , pagará V.Exª por via desta letra a _______(por credores) ao Sr. _________ (tomador), ou à ordem desta.
Ao Sr. ________ (sacado).
__________ (sacador)




Tomador: a pessoa em favor da qual é dada a ordem de pagamento. O tomador pode endossar a letra a outra pessoa.
Aquando do saque da letra há 3 intervenientes ( relação triangular) :
Sacador ( quem emite a letra)
Tomador (em favor de quem é emitida a letra)
Sacado ( quem paga a letra)

A letra de câmbio é um título de crédito de formação sucessiva: incorpora várias obrigações cambiárias, com um carácter idêntico, é uma prestação pecuniária. Existe uma operação jurídica inicial (que se chama saque) e uma relação jurídica tb inicial, que é a obrigação do sacador ( emitentes do título). O sacador dá ordem de pagamento a uma terceira pessoa (sacado) em favor de uma outra (tomador).

Saque: ordem de pagamento dada pelo sacador ao sacado. A obrigação do sacador é uma obrigação de garantia própria. Ele próprio promete ao tomador que o sacado pagará a quantia cambiária na data e local estabelecido e se o sacado não paga, o próprio sacador pagará. É uma obrigação de garantia em dois sentidos:
1.pela aceitação da letra ( por parte do sacado);
2.do pagamento (se o sacado não paga, o próprio sacador pagará)

A LC é endossável: o tomador (B) pode esperar pela data de vencimento da letra e receber a quantia cambiária ou a endossar a uma terceira pessoa (este pode fazer o mesmo a outra pessoa e assim sucessivamente).
A –B—D—E—(...)
| /
C
A obrigação do tomador e dos sucessivos endossados é tb uma garantia (tal como a obrigação do sacador). A única diferença entre o sacador e os sucessivos portadores é que o sacador garante todos os sucessivos portadores da letra e os posteriores portadores da letra só garantem os que estão para a frente dessa relação cambiária.
É de notar que a obrigação jurídica cambiária principal (que é a obrigação do sacado) e a operação jurídica que lhe está associada é:aceite.
O sacado só se obriga jurídico-cambiariamente com o aceite. É necessário que o portador da letra (tomador) apresente a letra ao aceite do sacado, e este só fica obrigado ao seu pagamento, quando a aceitar designando-se como “aceitante” a partir desse momento.

Protesto: consiste na falta de aceite ou na recusa de pagar por parte do sacado. A letra tem que ser apresentada ao aceite do sacado e este pode recusar ou pode aceitar, mas recusa o pagamento. Este acto de recusa deve ser compensado pelo tomador, que se chama protesto. Só assim é que o tomador se pode dirigir ao sacador da letra e exigir o seu pagamento.

Aval: ( obrigação cambiária) é uma operação pela qual um terceiro vem garantir o pagamento da letra por parte de um dos subscritores cambiários.





Letra de câmbio e figuras afins:

LC vs Livrança: é um título de crédito à ordem ( tal como a letra), mas não é uma ordem de pagamento de uma pessoa a outra, em favor de um terceiro, é antes uma promessa de pagamento directa (subscritor/tomador).
LC vs Cheque: título de crédito que anuncia um pagamento (= letra; diferente livrança), mas é uma ordem de pagamento dirigida a uma instituição bancária onde o emitente do título possui uma provisão.

Regime da letra de câmbio conducente “não à ordem”
A LC é um título de crédito à ordem, que se transmite por endosso. O endosso é nulo, se não constar a assinatura do endossante no local destinado a esse efeito (nas costas da letra). Assim, sempre que a LC nada diga, vale o regime geral, a letra é transmitida por endosso (art.11ºLULL) . Só uma clausula expressa em sentido contrário é que a letra de câmbio é transmissível de outro modo, que é o caso da cláusula “não à ordem”.

Regime da cláusula “não à ordem”: ( regime da cessão de créditos)
1-o próprio sacador apôs a cláusula
2-a letra foi emitida à ordem, mas a cláusula foi aposta por um endossante da letra.

1-Neste caso, o regime jurídico é o previsto no art.11º: é o regime da cessão ordinária do crédito (art.577º ss cc).
Quanto à forma, é necessária a notificação da cessão ao devedor (sacado), ou então é necessária a aceitação desta para que a cessão produza efeitos art 583º cc. Logo, a cessão só é eficaz aquando da sua notificação ao devedor. Ex: significa que o endosso do B de uma letra sacada “não à ordem” deve ser notificada ao sacado C, ou aceite por este, senão C, o sacado, libera-se da dívida pagando ao tomador, podendo apor o seu pagamento a D (cessionário, portador da letra). Na situação normal, se D viesse exigir o pagamento da letra a C, este teria que lhe pagar, mas como não foi notificado, C libera-se da obrigação pagando ao tomador.
Quanto aos efeitos, são os mesmos de uma cessão ordinária de créditos, representa-se:
A) Na posição do tomador: cedente B ou seja, quando o tomador cedente que haja endossado uma letra “não à ordem” a um 3º esse tomador cedente assegura uma mera responsabilidade pela existência e exigibilidade do crédito (587º) e já não assume as obrigações de um endossado normal, portanto D (obrig. da garantia pela aceitação e pagamento da letra).

B) Na posição do endossado – cessionário D, ou seja, quando o endossado cessionário a 3º portador da letra, ele aparece investido na posição de um mero cessionário e não de um endossado. Se fosse endossada, D seria titular de um direito autônoma, independente das vicissitudes dos portadores anteriores. Ao contrário, como cessionário, D é titular do mesmo direito que o cedente. Logo, a D são oponíveis pelo devedor, dadas as excepções pessoais em causa, ie, que pudessem ser opostas ao próprio cedente. Art.585 cc.
C) Na posição de sacador (A) ou seja, foi ele próprio que emitiu a letra no regime não à ordem é igual a endosso proibido. O sacador não à ordem continua a ter para com o devedor da letra uma responsabilidade cambiária normal (resp. pela aceitação e pagamento da letra). Mas, quanto aos posteriores portadores da letra a quem o tomador tenha transmitido a letra, o sacador tem uma responsabilidade cambiária normal, mas




pode apor a esses portadores, dadas as excepções pessoais e causais, que podia apor ao tomador B.

Esta cláusula tb pode ser aposta quando o endossante de letra ( nomeadamente o tomador), nesta situação, aplica-se o art.15º.
Suponhamos que B endossa a letra à ordem de D, apondo a cláusula não à ordem, suponha-se que D a transmite a C e este a outro, etc.

Regime : Por um lado, os efeitos da exclusão da responsabilidade cambiária do regresso do endossante B, só se verificam quando esses endossantes mediatos. B continua a ter resp. cambiária normal perante D, mas os efeitos da cláusula não à ordem só se vão produzir em relação aos portadores mediatos e não em relação ao portador imediato, quando a responsabilidade cambiária é normal. Quanto aos portadores mediatos, os endossos que vierem a ser realizados operam como uma mera cessão de créditos, pelo que B entra como um mero cedente “responde pela mera exigência”. A exigibilidade do crédito ou efeitos da aposição desta cláusula só aproveitam ao endossante que a apôs (B) e não aos endossantes posteriores da letra (mediatos ou imediatos). Nas relações D/E e E/F, .... tudo se passa como se estivéssemos perante uma letra em que nenhuma cláusula existe ( resp. cambiária normal).

Função económica das letras de Câmbio:

1.Função de garantia do crédito: a existência da vida comercial está na protecção do crédito e na celeridade das suas transações. Ex: o industria A vende os seus produtos a B. B não dispõe de liquidez suficiente para lhe pagar no momento em que o produto lhe é entregue. Só adquirindo essa liquidez quando vender os produtos que comprou. A letra é um meio de conciliar estes interesses: B emite uma letra em favor de A pelo pagamento do dinheiro em dívida, em dado local e numa dada data.

2.Função do meio de pagamento: Mas, A ainda não realizou o que verdadeiramente lhe interessa, pois através da letra recebeu uma mera promessa de pagamento. Mas não é bem assim porque A pode realizar novas operações com a letra, com os seus credores ( endossa-lhes a letra como meio de pagamento dos créditos em dívida) e assim tb farão certos credores para pagar aos seus próprios credores, etc.

O portador da letra pode nem ter que esperar pela altura do seu vencimento para realizar a quantia em dívida descontando a letra a um banco.
Desconto: Quantia que banca vai pagar ao portador da letra em troca do endosso da mesma. É a soma cambiária deduzida da importância cartular que corresponde aos juros (normalmente altos) que medeiam entra a data do pagamento e a data do vencimento da letra. ( aposta na mesma).

3.Função do instrumento do crédito: própria soma para compensar o crédito. A deve $ a B, mas A tem um crédito sobre C e manda este C pagar a B. Resolve o seu débito com o crédito num direito só (compensação do débito e crédito).





Fontes do direito cambiário: LULL Resulta da Conv. De Genebra de 1930 foi ratificada em 1934 por Portugal.

Caracteres gerais da LC:

1.Incorporação: Relação muito especial entre o dto cambiário e o documento onde esse dto está contido. O dto e a obrigação cambiária estão incorporados no documento, por isso se diz que o dto do crédito cambiário é um dto cautelar. O documento é necessário para o exercício do direito. A posse do documento é que decide da titularidade do direito, este carácter é um princípio jurídico enformador do regime geral das LC.

A posse legítima de uma LC é condição necessária suficiente para o exercício e transmissão do direito cambiário (14º, 21º, 38º, 50º, 51ºLULL).
Em casos de conflito entre o possuidor actual da letra e um anterior portador que dela foi injustamente desempossado, prevalece o direito da segunda, salvo culpa grave ou má fé da segunda.
O direito de crédito cambiário não se extingue com o pagamento do sacado – aceitante, se o título continuar em circulação. Todo o aceitante que pagou a letra ao seu portador, deve reter a própria letra, porque se não o fizer, pode ver-se obrigado a pagar normalmente a dado portador de boa fé que lhe apresente a letra, que tenha sido transmitida pelo portador de má fé. ( sujeita-se a pagar novamente).

2.Literalidade: o conteúdo e extensão do dto cambiário é o que resulta do teor literal ou das decl. objectivas constantes no título. Há várias normas na LULL que têm subjacentes que o subscritor da letra não pode apor ao portador excepções pessoais ou causais, que não estejam constantes no teor literal do título. Consagra uma irrelevância das convenções extra Cartulares. Art.17LULL: A não pode apor a D, E, F as excepções pessoais ou causais que tenha em relação a B.
Art.11ºnº2LULL : o sacador de uma letra não pode apor a D o facto de ter convencionado com B de a letra ser emitida não à ordem se isso não resultar do próprio título
Art.6ºLULL : Se houver 2 formas de designação da quantia cambiária, prevalece a que for feita por extenso. Se elas forem contraditórias entre si (mesmo que haja uma cláusula extra entre o sacador e sacado em sentido oposto).

Se a relação cambiária tem um vício da consensualidade, por ex : coacção significa que o princípio da literalidade da declaração viciada não pode opor ao portador da letra de boa fé a nulidade da declaração cambiária. Ou significa que em vez de ser relevante o que está escrito , é a vontade real do de declarante.
F.Correia – defende a impossibilidade dos vícios da relação cambiária e dá primazia à vontade declarada face à vontade real (principio da literalidade).
S.T.J. – diz que tais vícios são oponíveis e isto não afecta o princípio da literalidade. A literalidade refere-se nos termos de uma declaração negocial (declaração constituída pelos ditames gerais da lei civil) e não pode ir tão longe ao ponto de revogar os ditames da lei civil.

3.Abstração: o dto cautelar pressupõe uma relação jurídica anterior ( e RJ fundamental). Sem a relação não se explica a existência da própria obrigação cambiária. Ex: se A emite uma letra em favor de B, para pagar uma coisa que lhe vende , a RJ fundamental é o contrato compra e venda entre A e B. A relação jurídica causal explica a necessidade da relação jurídica cambiária.

A abstração significa:
I. O NJ cambiário (a emissão ou saque de uma letra) é um modelo apto a preencher qualquer RJ (ex: CCV)
II. O NJ cambiário é independente do NJ fundamental que lhe está subjacente. A obrigação cambiária é independente da obrigação jurídica causal que antecede. São inoponíveis aos portadores mediatos de boa fé as excepções pessoais e causais derivadas da relação dos sujeitos jurídicos cambiários originários ( que corresponde à RJ fundamental). No plano das RJ imediatas, certas excepções são oponíveis. Ex: A emite uma letra em favor de B, a ser paga por C. B é credor da RJ fundamental: Compra e venda A/B. RJ cambiária: A/B.
Se o devedor da letra a endossa a D, que está de boa fé, nem o sacador nem o sacado podem apor a D as excepções pessoais ou causais derivadas da RJ fundamental (não pode por exemplo a ENC do direito ou a nulidade do NJ fundamental).

convenção executiva: convenção entre as partes da relação jurídica fundamental, com vista a ser saldada por meio de certa forma: neste caso a letra de câmbio, ou seja, saque de uma letra.

Assim temos: negócio jurídico fundamental, que é a causa remota da obrigação cambiária; convenção executiva que é a causa próxima da obrigação cambiária; e temos a obrigação cambiária por si só (ou propriamente dita).

Fundamento jurídico do princípio da abstracção: art.17º da LULL- a abstracção ou inoponibilidade só vale nas relações mediatas e não nas relações imediatas. As obrigações cambiárias são incondicionáveis, ou seja, não se podem subordinar a nenhuma condição .A consequência é nulidade (não escritas).

Dois problemas do princípio da abstracção:

A-LETRA A FAVOR: a obrigação cambiária via de regra, tem subjacente a si, uma determinada causa salvo na letra de favor que não tem subjacente à obrigação cambiária uma relação jurídica fundamental. A letra de favor consiste numa letra em que uma dada pessoa ( favorecente ), opõe a sua assinatura no documento, a fim de reforçar as garantias dadas ao tomador da letra.
ex.: A pede dinheiro emprestado ao banco B, B exige que intervenha um terceiro.
C aceita sacar uma letra em favor do banco B, a ser paga por A, a quem o
dinheiro foi emprestado. A é o favorecido e C o favorecente . O favorecente não tem intenção de pagar, mas apenas garantir as obrigações do
sacado A, em favor do devedor B. Aqui, a relação jurídica fundamental foi a
própria convenção de favor entre o favorecente e o favorecido. O favorecente não pode recusar o pagamento de uma letra ao posterior portador ( se B endossa a D ) alegando que se tratou de uma mera prestação de favor, sem “animus“ de pagamento.

Princípio de abstracção: embora tenha subscrito a letra sem intenção de a pagar, há aqui uma obrigação cambiária dentro desta, que é independente da relação jurídica fundamental que lhe deu origem (que era uma relação jurídica sem “animus” de pagamento. Logo aplica-se o regime geral da abstracção: art.17º LULL e o favorecente não pode opôr ao portador mediato as excepções pessoais ou causais resultantes da relação jurídica fundamental entre si e o favorecido.

Mas o favorecente já pode recusar o pagamento da letra ao favorecido, pelo que este é o portador da letra porque a relação entre o favorecente e o favorecido é uma relação de garantia e, em caso algum o garante responde perante o garantido. É certo que responde perante terceiros, mas apenas perante estes (funciona aqui o Pr. da abstracção).

B-NOVAÇÃO DA RELAÇÃO JURIDICA FUNDAMENTAL: a obrigação cambiária é independente da relação jurídica fundamental, mas levanta-se a questão de saber se estão lado a lado, ou a primeira extingue a segunda( novação). A importância prática prende-se com as obrigações acessórias e com os prazos de prescrição. Se se considerar que há novação ( extingue-se a obrigação causal ), extinguem-se também as obrigações acessórias à relação jurídica fundamental (nomeadamente as obrigações de garantia). Assim também os prazos de prescrição são diferentes, porque o prazo de prescrição das obrigações cambiárias é mais curto: art.70ºLULL.

Mas, deve atender-se que o nascimento de uma obrigação cambiária, não provoca a extinção da obrigação causal. Logo, não há novação. Razões:
.Assento 1936: num caso em que se queria saber se um credor de uma obrigação cambiária se poderia prevalecer dos prazos de prescrição decorrentes da relação jurídica fundamental; o assento respondeu afirmativamente( razão jurisprudencial- vários ac. do STJ).
.Art.895ºcc: a vontade de contrair uma nova obrigação em substituição de uma outra tem que ser manifestada expressamente. Logo, a extinção causal teria que ser convencionada expressamente. Entende-se que as partes ao assumirem uma obrigação cambiaria, queriam manter as obrigações acessórias à relação jurídica fundamental subjacente à obrigação cambiaria ( razão legal ).

4-INDEPENDÊNCIA RECÍPROCA: no caso de uma letra incorporar uma pluralidade da obrigação cambiaria (do sacador, do sacado, do tomador), a nulidade de uma obrigação não afecta a validade das restantes( a nulidade não se comunica às demais.
Fundamento:art.7ºLULL- tem-se em vista proteger o valor de circulação deste título de crédito e a posição do portador. Abrangem-se aqui as obrigações de todos os portadores, e inclusive a obrigação de sacado-aceitante.

Duas excepções a este princípio:

1. A validade formal da declaração do sacador é um pressuposto necessário da validade de todas as outras obrigações e declarações cambiárias. Se faltar algum dos requisitos formais da letra de câmbio ( art.1º e 2º LULL ) relativos à operação de saque, nenhuma das obrigações posteriores é válida.
ex: se o sacador apuser o nome de uma pessoa fictícia as outras declarações são nulas.
2. No caso do aval, a invalidade da obrigação do avalizado por vício de forma comunica-se à obrigação do avalista.





5- AUTONOMIA: este princípio pode ser dobrado em duas acepções diferentes, isto é a autonomia é válida nestes dois sentidos:

a)Autonomia do direito relativo às obrigações cambiarias (direito de crédito cambiário)
O direito de crédito cambiário é um direito autónomo, ou seja, o direito do portador mediato e de boa fé é um direito autónomo. As excepções provenientes quer da causa (negócio jurídico causal que subjaz à obrigação cambiária), quer de convenções extra-cartilares (que não resultam do teor literal do documento) são inoponíveis pelo devedor (sacado) ao portador da letra, que seja mediato e de boa fé. As excepções que podiam ser apostas pelo devedor ao portador imediato, são inoponíveis ao portador mediato.

Diferente plano de oponibilidade destas excepções:
art. 17º – apenas consagra esta autonomia no plano das relações mediatas. Nas relações imediatas (entre o subscritor da letra e o sujeito cambiário imediato: sacador-tomador; tomador-endossante/endossado), quer as excepções pessoais, quer as excepções fundadas em convenções extra-cartulares já são oponíveis, já que os sujeitos do negócio jurídico cambiário são aqui também os sujeitos do negócio jurídico fundamental que dão causa ao negócio.

A ------ C-----D------------ E A----------C-(morre)-------- D ------ E
? ? ?
B B F

Se C morre e lhe sucede F, vale para F o mesmo que vale para C. Todas as excepções são oponíveis ao portador no plano das relações imediatas. O princípio da autonomia significa, no fundo, o mesmo que o princípio da abstracção e o princípio da literalidade (no seu primeiro sentido). No plano das relações mediatas as excepções são inoponíveis, excepto num caso:
Art.17º “ a menos que o portador tenha agido conscientemente em detrimento do devedor.” Há que confrontar o art.17º com o art.16º que fala em culpa grave e em má fé. Pressuposto da oponibilidade do art.17º é, não apenas a má fé por parte do portador da letra (tem conhecimento da excepção), mas também que tenha agido conscientemente, sabendo que ao actuar dessa forma está a privar o devedor dos seus meios de defesa. O momento temporal relevante para se exigir a existência desse pressuposto é o momento da aquisição da letra pelo portador mediato (antes ou depois desse momento). Se tomou conhecimento da excepção (que o devedor podia opôr ao portador imediato) depois da aquisição, não é relevante.

Questão: saber se a boa fé de um dos portadores intermediários da relação cambiária pode sanar o vício da oponibilidade (se poderá tornar as excepções pessoais e causais eventualmente existentes, inoponíveis aos portadores subsequentes ).
ex: A ___ B ___ C ___ D ___ E ___ F

A endossa a letra a B para pagar uma dívida de jogo. A obrigação é inválida ( 1245ºcc ); C endossa a letra a D que está de boa fé. D endossa a letra a E, etc. A boa fé de D torna inoponível a excepção causal que A podia opôr a B, aos portadores subsequentes?
FERRER CORREIA: a boa fé de D (portador intermédio) como que sana o vício mesmo que E e F conhecessem o facto e agissem conscientemente em detrimento do devedor. A boa fé de D torna inoponíveis as excepções aos portadores posteriores.
b) Autonomia do direito em relação à letra enquanto documento
O possuidor actual da letra é titular de um direito autónomo sobre o próprio documento (título), sendo-lhe inoponível a ilegitimidade da posse de um dos endossantes intermédios por quem foi desapossado ilegitimamente dessa letra.
ex: A pretende endossar a B uma letra em branco (sem indicação do nome do beneficiário). Antes de a transmitir a B, C furta a letra e depois transmite-a a D e D a E. C endossa a letra a D com o nome de D ( beneficiário ).

Isto prende-se com a questão da posse legítima e ilegítima. Parece que E não teria qualquer direito. Se C adquiriu a letra de forma ilegítima, não adquiriu qualquer direito e por isso também não podia transmitir qualquer direito. A podia opôr ao portador actual E a ilegitimidade da posse de C.

Mas o art.16º fixou doutrina oposta: os portadores subsequentes da letra poderão reclamar os seus direitos de crédito cambiário, desde que formem uma cadeia ininterrupta de endossos válidos. O direito do portador legítimo da letra é um direito autónomo porque lhe é inoponível a ilegitimidade dos portadores cambiários. Mas também aqui há uma excepção: “salvo se adquiriu de má fé ou se adquirindo-a cometeu uma falta grave” – art.16º in fine.
O princípio da autonomia neste sentido só não valerá no caso da culpa grave (má fé) do portador actual da letra.
ex:No caso anterior, se A provar que E agiu com culpa grave ou má fé, poderá opôr-lhe a ilegitimidade da posse do C.

O que seja culpa grave ou má fé, resulta do art.16º e 17º LULL. A exigência do “animus” não é muito intensa. Basta que o portador actual da letra tenha conhecimento da ilegitimidade da posse de um dos portadores anteriores ou não tendo esse conhecimento devesse tê-lo de acordo com o critério de homem médio, normal.

Requisitos formais da letra

A letra é um título rigorosamente formal. Para que possa produzir os seus efeitos normais, tem que observar um conjunto de requisitos formais-art.1ºLULL
Os requisitos formais da letra confundem-se com os requisitos da declaração do saque.

Art.1º (requisitos essenciais)
A palavra “ letra “ inscrita no título, em língua portuguesa. Não se admite a emissão de letras partindo de equivalentes de língua portuguesa, nem se admitem expressões estrangeiras.

Art.1º/2: A letra deve conter o mandado puro e simples do pagamento. A ordem de pagamento que a letra contém é pura e simples.
A declaração cambiária é incondicionada e incondicionável. O sacador não pode condicionar a ordem de pagamento: não pode transformar a sua obrigação numa obrigação condicional, nem pode transformar a obrigação do sacado numa obrigação condicional: art.1º/2 + 2º + 26ºLULL.
“Quantia determinada”: a quantia pecuniária indicada na letra deve ser determinada; são inadmissíveis nas letras cláusulas penais (contêm uma obrigação incerta). Dependente como está do incumprimento por parte do sacado-aceitante, a obrigação sairia incerta.

“Cláusulas de juros “: art.5º
Só nas letras pagáveis à vista (no momento da sua apresentação), a lei permitiu a estipulação dos juros. Nas restantes letras, a estipulação de juros será considerada como não estipulada. A permitir-se a estipulação de juros, deverá sê-lo nas letras com data certa de vencimento, porque aí sabe-se exactamente qual o capital e qual a data certa do vencimento – logo, sabe-se a quantia de juros em vista. Nas letras à vista, seria impossível determinar o cálculo dos juros.
A legislação considerou que, nas letras com data certa de vencimento, seria desnecessário estipular juros porque as partes podiam establecer a quantia global que já abrangesse os juros. A estipulação de juros só fará sentido onde, à partida, não seria possível determinar essa quantia.
Sempre que exista uma divergência entre o montante extenso e o algarismo, prevalece o que estiver escrito por extenso.

Art.1º/3: indicação do nome do sacado. Refere-se quer ao nome (caso das pessoas particulares), quer à firma (se for um comerciante).
A oposição de um nome fictício, que resulta do exame do próprio título, acarreta nulidades. Já será válida se essa aposição fictícia não resultar do próprio título (vd. princípio da literalidade).
ex: Quando seja aposto um nome comum (art.7º), assinatura verdadeira sob um nome fictício.

No caso do sacado ser uma pessoa colectiva, a assinatura tanto pode consistir na firma da sociedade como na assinatura de um dos seus representantes (administrador), que deve indicar a sociedade que tem, sob pena de surgir ele próprio como sacado.


A letra pode ter vários sacados:
ex: No caso da letra ser um modo de pagamento de A para pagar a dívida ao B, em vírtude A (sacador) ter um crédito sobre uma pluralidade de devedores (C, D e E). Poderão ser todos sacados .

Na letra, existe sempre uma relação jurídica fundamental entre o sacador e os sacados que se encontram numa solidariedade passiva (pluralidade de devedores). Trata-se de uma relação extra-cartular: sempre que essa relação jurídica tiver uma pluralidade de devedores, pode haver uma pluralidade de sacados, mas só poderá haver um local de pagamento – art. 2º/3: se houver vários domicílios, a letra é nula.

A letra pode ainda ter como sacado o próprio sacador.
Art. 3º/2: Esta situação acontece quando uma sucursal ou agência de uma empresa saca uma letra a favor de uma outra sucursal da mesma empresa. Tudo se passa como se fosse a própria empresa a sacar uma letra sobre si próprio.

Art.1º/4: Outro requisito (não essencial à partida) é a época, data de pagamento.
Art. 2º/2: podia-se tirar daqui a ideia de que a falta de indicação da época de pagamento não tem como sanção a nulidade da letra, mas outra sanção – apenas afectaria o modo de pagamento. Mas isto não é bem assim porque o art. 33º determina taxativamente as quatro modalidades de vencimento de uma letra (época de pagamento).
O art.33º determina que se numa letra forem opostas diferentes épocas de pagamento ou uma época de pagamento em termos diferentes dos estabelecidos no art.33º, a letra é nula. Daí que o requisito da época de pagamento é essencial. A presunção do art. 2º/2 parece funcionar na falta absoluta da indicação da época dos pagamentos. Logo, esta presunção não opera quando a indicação da época de pagamento tenha sido feita de forma irregular, isto é, violando as modalidades do art. 33º.

Art.1º/5: indicação do lugar de pagamento (requisito essencial)
Pode ser indicado:
- directamente: referência expressa no próprio título do local de pagamento
- indirectamente: art.2º/3: o local designado é aposto ao lado da assinatura do sacado (geralmente é o domicílio do sacado). O local designado ao lado da assinatura do sacado será o local de pagamento. Se a indicação faltar, a letra será nula.

Podem existir vários locais de pagamento.
Esta pluralidade de locais de pagamento só será válida quando a escolha do efectivo local de pagamento couber ao portador. Já não será válida no caso contrário. Se não fosse assim, o portador tinha que ir de local em local para lavrar protesto e só depois reagir, em via de regresso, contra o sacador da letra. Isto é contra a finalidade da letra como meio de circulação.

Art.1º/6: nome do tomador é o primeiro portador da letra. Aposto a favor de quem a ordem de pagamento foi dada, e a quem deve ser paga a quantia cambiária. Valem as mesmas indicações quanto ao nome do sacado, com as seguintes especialidades: o tomador da letra pode ser o próprio sacador. O sacador pode sacar uma letra indicando-se a si mesmo como tomador ( parecido com a livrança ).

A letra pode estar a nome de vários tomadores, o que é válido. Mas o regime é diferente, consoante o tipo de indicação dessa pluralidade de tomadores:

- Conjunta: a ordem de pagamento é dada por A ( sacador ) a favor dos tomadores B e C. Os direitos pertencem em contitularidade a B e C, devendo um eventual endosso ( transmissão ) ser assinado por ambos.

- Alternativa: a letra é emitida a favor de B e C. Endossa a tomadores, que podem exercer sozinhos os direitos cambiários que essa letra lhe atribui – ex: endosso

- Sucessiva: a letra é emitida a favor de B e, na falta deste, do C. Quando a indicação vale como indicação alternativa a questão é nula: art.40º/3. A razão: é contrário ao espírito da lei cambiária, obrigar o sacado a averiguar da legitimidade material do portador da letra, para efectuar o pagamento liberatório – art.40º/3.
O sacado, para realizar o pagamento liberatório basta-lhe pagar ao portador que lhe apresentou a letra (retendo a letra). Se se entendesse que as modalidades de indicação sucessiva seriam válidas isso obrigaria o sacado a averiguar a legitimidade material do portador e de todos os restantes.

Determinação da pessoa do tomador: não são válidas indicações de pessoas indeterminadas, ainda que determináveis ex: futuro Presidente da República.

Questão: a propósito da determinabilidade da pessoa; uma coisa é a letra ao portador (letra que foi sacada ao portador) - esta é nula, porque a letra tem sempre que indicar o nome do tomador (embora possa ser endossada ao portador à ordem), outra coisa é a letra com endosso ao portador. A letra é um título à ordem que pode, no entanto, através de um endosso em branco ou ao portador funcionar como letra ao portador.




Endosso em branco: o endossante endossa a letra a um terceiro (endossado), mas em vez de indicar na letra o nome do beneficiário ( endossado ), assina apenas o seu próprio nome. - art.14º
O endossado em branco pode tomar 3 atitudes:
- ele próprio escrever o seu próprio nome como beneficiário do endosso que recebe;
- endossar a letra de novo (em branco ou com o nome do beneficiário );
- transmitir a letra sem endosso (entregá-la através de pura tradição real, isto é letra endossada ao portador)

A__________ B__________C
endossa em tradição real
branco

Tudo se passa como se a letra tivesse sido endossada em branco pelo endossante originário ao terceiro, como se a letra não tivesse passado pelas mãos do endossado em branco.
È esta a diferença entre a letra endossada ao portador (é válida) e a letra ao portador (que é nula). A letra que é posta em circulação como um mero título ao portador (acção), porque a letra não chega a nascer nestas situações. É necessário que, na letra, a indicação de beneficiário seja nominativa.

Art. 1º/7: Data e Local do saque (onde a letra é passada), que é diferente do pagamento
A data do saque justifica-se para determinar o vencimento da letra nas letras que se vencem em data determinada.
O local é necessário para se determinar a lei aplicável. Se faltar a data do saque ou se indicar uma data impossível, a letra é nula. Se faltar o lugar do saque, entende-se que o lugar é o indicado ao lado do nome do sacado ( 2º/4 ). Se este lugar não estiver indicado ao lada do nome do sacador, a letra será nula.

Art.1º/8: indicação do nome do sacador. Exige-se uma assinatura aparentemente (não realmente) autógrafa, resultante do punho do próprio sacador. Tanto pode ser o nome como a firma.

Questão: serão admissíveis assinaturas a rogo? Assinatura “do autor” a pedido do próprio sacador. A solução depende do valor das assinaturas a rogo entre nós. Ver art.373/4cc+art.2º,anexo VI à Conv. Genebra.
É admissível essa assinatura, mas não bastará o mero reconhecimento presencial das assinaturas; pelo contrário será necessário que o notário certifique na letra que leu o documento ao rogante e que este entendeu o seu conteúdo.
A assinatura por procuração é permitida – art.8º. É válida, desde que o representante declare estar a assinar em nome do representado, sob pena de ser ele próprio a assumir a obrigação cambiária.
No caso de representação sem poderes ou em excesso de poderes, vale o art.8º: é um regime diferente do regime geral em matéria de representação – o falso procurador responde ele próprio como obrigado cambiário, quer tenha agido de má fé, quer de boa fé. Esta solução só não se dará quando o próprio portador da letra tenha conhecimento desse vício (falta ou excesso de representação) – isto é, se o próprio portador estiver de má fé.



Consequência da inobservância dos requisitos da letra: art.2º

A letra nem sequer se chega a constituir. A falta de um destes requisitos essenciais faz com que o título não valha como letra (como documento cambiário). Logo, não pode constituir base legítima para o exercício do próprio direito cambiário, mas pode servir como documento probatório da existência do negócio jurídico fundamental que originou a emissão da letra – pode servir para provar que alguém deve dinheiro a uma dada pessoa.

Requisitos não essenciais: é o imposto de sêlo, fala-se há muito tempo que vai acabar, mas este imposto ainda existe.


2.4- NEGÓCIOS JURÍDICOS CAMBIÁRIOS:

I- SAQUE

Declaração jurídico cambiaria originária. Sem saque, não há letra; é graças a ele que a letra nasce. È uma declaração feita pelo emitente do título ( sacador ) a favor de um terceiro tomador e que enuncia uma ordem de pagamento a que se apresenta com uma promessa do sacador aos portadores sucessivos da letra, de que o sacado pagará a dívida cambiaria ( letra ) e caso este não pague a dívida na data de vencimento da letra ele próprio a pagará ( sacador ). Obrigação de garantia, de aceitação e de pagamento.

Via de regra, entre o sacador e sacado existe uma relação extra-cartelar que explica a emissão da letra, em virtude da qual o sacador é titular de um direito de crédito sobre o sacado: é a relação de provisão que funciona como garantia principal do aceite e do pagamento da letra pelo sacado. Ao contrário de outros negócios jurídicos o nosso não dá relevância jurídica a esta relação de proveito. A obrigação cartelar é independente da própria relação extra-cartelar existente entre os obrigados cambiários (de que a relação de provisão é um exemplo).

Consequência disto: o saque consiste numa ordem de pagamento que é dada pelo sacador ao sacado e numa garantia assumida pelo sacador de que o sacado aceitará e pagará a letra (art.9º). A imperatividade desta garantia é a seguinte: esta garantia tem duas facetas:
- é a garantia pela aceitação da letra;
- é a garantia pelo pagamento da letra;

O sacador não se pode exonerar quanto à garantia de pagamento da letra. Mostra que a lei não atribui relevância à relação de provisão porque, mesmo que esta não exista, se o sacado não pagar a letra o próprio sacador a pagará. Mas já pode exonerar-se de da garantia de aceite da letra, mediante a isenção de uma dada expressão na letra: “ letra não aceitável “ ou “ aceite proibido “ - art.9º/2

Porque é que se pode fazer isto? Que interesse pode ter isto?
O sacador pode, muitas vezes, prever que o sacado pagará a letra na data de vencimento mas pode também temer que o sacado não aceita a letra na data em que ela se apresenta ao aceite.
ex: porque a relação de provisão à data da apresentação ao aceite ainda não está concluída.

Interesse: caso essa exoneração não existisse no caso da recusa do aceite por parte do sacado, o portador poderia lavrar protesto e, com este documento, em via de regresso, o portador podia exigir o pagamento integral da letra do sacador. Todo o portador da letra, cujo aceite tenha sido recusado pode exigir de imediato o cumprimento integral dessa letra ao sacador.

Modalidades de saques:

Uma das regras é uma indemnização do pagamento feita pelo sacador à ordem de um terceiro tomador .
Mas, também existe: Saque à ordem do próprio sacador. O sacador e o tomador são a mesma pessoa. EX: A vende um objecto a B: fica titular de um direito de crédito sobre B. A saca uma letra sobre a B a favor de si próprio. INTERESSE: Este processo pode ser utilizado quando sacador não tenha interesse em negociar o crédito.

Saque efectuado sobre o próprio sacador: Sacador e sacado são a mesma pessoa. EX: A compra um objecto a B. Para saldar essa divida, em vez de pagar logo a B, saca uma letra a favor desse B, sobre si próprio. INTERESSE: Este processo pode ter a sua utilidade no caso de pagamento entre sucursais, agências ou unidades de uma mesma pessoa (como se fosse a própria empresa a sacar uma letra sobre si mesma).

Saque por ordem e por conta de terceiro: Alguém emite uma letra por ordem e por conta de um terceiro, que não figure na letra como sacador. Muito usada por comerciantes, visa evitar a má imagem que resulta de pôr em circulação muitas letras. EX: A saca uma letra a favor de B, agora paga por C, sendo o saque feito por ordem e por conta de D.

D pretende evitar surgir na letra como sacador. Este é diferente do saque por procuração (em que o verdadeiro sacador seria D, porque os efeitos jurídicos derivados da intervenção do representante de A, produziriam-se directamente na esfera jurídica do representante de D). Aqui, o emitente A está a emitir um titulo em nome próprio, embora por conta alheia. O que existe entre A e D é uma relação jurídica extra-cartular (um negócio jurídico de comissão - Art 266 CCom) O sacador é A ( 3 nº 3)


Existência de uma pluralidade de sacadores: Não está na lei. Sempre que uma letra seja um modo de saldar uma divida de uma relação jurídica onde exista uma solidariedade passiva, os vários sacadores respondem solidariamente pela obrigação cambiária. O portador da letra pode exigir o pagamento a qualquer um. As relações entre eles são extra-cartulares (não influem na obrigação cambiária) e, por isso, inoponíveis ao portador da letra, que pode exigir a qualquer um deles o pagamento da prestação. Se por exemplo um deles recusar o aceite da letra, podem apenas influir, eventualmente, em via de regresso.


II- ACEITE
O saque é uma ordem de pagamento dada pelo emitente do titulo sacado, que vale como uma promessa de pagamento (pelo sacado). O sacado não fica jurídico cambiariamente obrigado só porque alguém (sacador) prometeu que ele pagará. O sacado só se vincula pelo aceite, declaração feita no titulo pelo sacado, mediante a aposição da sua assinatura, significando que ele se obriga a pagar a letra ao portador dessa letra (pela sua apresentação). Passa a ser designado por aceitante. Se o sacado aceita a letra, fica imediatamente obrigado a pagar a quantia.
No caso de recusar o aceite da letra, se é certo que escapa a qualquer obrigação cambiária, também é certo que legitima o portador da letra a lavrar o protesto (=afirmação formal de recusado sacado em aceitar a letra) e, munido desse protesto, o portador pode, em via de regresso, accionar o sacador da letra pelo pagamento da letra – art 43º.


CARACTERISTICAS DA APRESENTAÇÃO DA LETRA AO ACEITANTE:

Prazo de apresentação - Regime do 21º, que prevê que uma letra possa ser apresentada até à sua data de vencimento. Toda a apresentação de letra que tenha lugar posterior a essa data, já não vale como apresentação ao aceite, mas como apresentação ao pagamento.
No caso de recusa, o protesto não será um protesto por falta de aceite, mas por falta de pagamento. Nesta situação fica o portador da letra legitimado a agir com o protesto, em via de regresso. Já mexe com o regime dos outros obrigados cambiários. Art. 22nº3 - O sacador pode estipular que a apresentação ao aceite só possa ser feita a partir certa data (porque sabe que se for apresentar antes, o sacador não pagará).


NATUREZA DA APRESENTAÇÃO:

REGRA: A apresentação da letra ao aceitante é facultativa. O tomador pode, mas não é obrigado a apresentar a letra ao aceite do sacado. Terá, porém, todo interesse em fazê-lo, porque obriga logo o sacado a pagar, ou, se este recusar, pode ir sobre o sacador.
Há situações, porém, que fogem a esta regra geral, são as excepções ao aceite facultativo.

A apresentação pode ser : OBRIGATÓRIA, PROIBIDA.

1) Dois casos de aceite obrigatório:

a) Obrigatoriedade convencional: a obrigação de apresentação da letra ao aceite, pode resultar da vontade dos próprios subscritores cambiários (Art 22º/1); de um endossante (Art 22º/4)

b) Obrigatoriedade legal: Letras a certo termo de vista. São letras cujo prazo do vencimento só conta a partir da data do respectivo aceite:
Emissão ------------ Apresentação ao aceite ----------- Vencimento.
( começa a contar, a partir daqui, o prazo para o
vencimento)

O aceite é obrigatório, porque, nestas letras, só se conhece a data de vencimento a partir da verificação do respectivo aceite (art. 35º). Não havendo aceite, a data a partir do qual se conta o prazo do vencimento é a data da recusa do aceite. Art 23º/1. Estas letras devem ser apresentadas ao aceite do sacado, no prazo de um ano a contar da data da respectiva emissão. O prazo do vencimento conta-se a partir da data do aceite.

Esta situação é diferente das Letras à vista: São letras que não tem uma data de vencimento e cuja apresentação vale logo como apresentação ao pagamento (Não há apresentação para aceite): Art 34º.

Estas duas situações não se confundem também, pelo prazo de um ano que é dado nas letras à vista (Art 34º). O portador tem um ano, a contar da data de emissão para apresentar a letra ao sacado para pagamento.

- Consequências da inobservância destas regras (Obrigatoriedade convencional ou legal)
• Casos de não apresentação da letra ao aceite nas hipóteses de obrigatoriedade legal:
- o portador que não apresentou, perde todos os direitos de regresso entre os obrigados (Art 53º/1).
• Casos de não apresentação da letra ao aceite nas hipóteses da obrigatoriedade convencional, há que distinguir:
a) Se a obrigatoriedade foi fixada pelo sacador, o portador perderá todos os direitos de acção relativamente ao sacador e aos posteriores obrigados.
b) Se foi aposta por um endossante, o portador perde todos os direitos de acção relativamente ao endossante em concreto: Art 53nº2 e 5.

E quando se fixa a obrigatoriedade do aceite, não se fixando o prazo? Vale a regra geral do art. 21º - a letra deve ser apresentada ao aceite até à data do vencimento. Se não for, o portador perde todos os direitos de acção.

1) Aceite Proibido; a derrogação à regra geral da apresentação facultativa da letra ao aceite. Letras não aceitáveis: Contêm uma cláusula de " aceite proibido" - Art 22nº2.
Interesse: Casos em que o sacador tema que o sacado, embora vá pagar na data do vencimento, não aceite a letra na data da apresentação.

Mas há três excepções em que a aposição da cláusula de “aceite proibido” não é permitida:
a) Letras a certo termo de vista: A data do vencimento depende da data do aceite ou do protesto ( Art 35º)
b) Letras pagáveis no domicilio de terceiros (embora a regra seja o domicílio do sacado): se se clausulasse a proibição do aceite criava obstáculos à apresentação da letra ao sacado. Nestes casos, é necessário dar possibilidade de tomar conhecimento da letra e do local, a tempo e horas.
c) Letras pagáveis em local diverso do domicilio do sacado: visa facultar ao sacado o exercício da faculdade prevista no art 27º/1.

Estas cláusulas, em principio, só podem ser apostas pelo sacador (e aproveitam a todos os subscritores cambiários posteriores, que ficam exonerados da sua obrigação de garantia). No caso de recusa do sacado, o portador não pode apresentar ao sacador.. Se tal cláusula for aposta por um endossante (um posterior portador da letra), essa cláusula equivale a uma exoneração da obrigação de garantia pela aceitação da letra por parte do sacado (Art. 15º/1)


LUGAR, DATA E CONTEUDO DO ACEITE: ART 25º E 27º

Em principio, o conteúdo do aceite corresponde ao conteúdo da ordem de pagamento dado pelo sacador – art 26º. Daí que o aceite deve ser puro e simples. O aceite feito sob condição (condicional) ou modificado em relação ao teor da letra ( data, local, etc.) equivale a uma recusa de aceite.

CONSEQUÊNCIAS:
a) O portador da letra pode lavrar logo protesto pela recusa do aceite e actuar, em via de regresso, contra os obrigados.
b) O aceitante condicional fica vinculado nos termos do seu aceite condicionado ou modificado, admitindo-se o aceite parcial relativamente a uma parte da quantia cambiária (aceite parcial ). O aceite é válido e vale quanto à parte que aceitou, e o portador da letra terá direito ao remanescente, por via de regresso, em relação ao sacador e aos outros obrigados (quanto a esta parte lavra-se protesto).

ACEITE POR INTERVENÇÂO:
Via de regra, o aceite é dado pelo sacado. Contudo, a lei admite que uma outra pessoa, excepcionalmente, intervenha, para esse fim, no lugar do sacado. Este terceiro só intervém para aceitar a letra: Art 55º.

Duas modalidades:
1) Pode resultar de incumbência expressa feita no titulo: feita por um sacador, por um endossante, por uma avalista ou qualquer obrigado cambiário em via de regresso: art. 55º/1. É relativamente frequente. Neste caso, é aposta uma cláusula de acordo com a qual a pessoa que é obrigada irá, em casos de necessidade, aceitar a letra.
Objectivo: dos obrigados em via de regresso evitarem o exercício preventivo desse direito de regresso, pelo portador da letra, cujo aceite haja sido rejeitado pelo sacado. O aceite por intervenção visa evitar, para os obrigados em via de regresso, as consequências que para estes advém da recusa de aceite por parte do sacado. A cláusula indica o terceiro a quem a letra deve ser apresentada, tal como foi apresentada ao sacado. Assim, o portador da letra não poderá dirigir, de imediato, ao sacador, em via de regresso. Antes disso, deve primeiro apresentar a letra à pessoa que foi designada como interveniente, e só munido com o protesto por falta de aceite do sacado e do protesto por falta do aceite de um interveniente, é que poderá agir em via de regresso.

2) Pode resultar independentemente dessa incumbência especial: Art 55ºnº2. Quando não resulta de incumbência especial, o portador poderá sempre recusar o aceite por intervenção: art 56º nº 3

LEGITIMIDADE ACTIVA: a intervenção pode ter lugar por incumbência feita pelo sacador, por um endossante, um avalista ou qualquer obrigado cambiário em via de regresso: art 55º nº2. O sacado que aceita (aceitante) não tem legitimidade activa para este efeito.
LEGITIMIDADE PASSIVA: Podem ser intervenientes ( 55ºnº3) – um terceiro estranho à cadeia cambiária (que seja capaz), o próprio sacado (isto pode parecer estranho, uma vez que um interveniente actua como garantia de 2ª linha perante a recusa do aceite por parte do sacado. Interesse: Resulta da diferente posição jurídica do sacado e do interveniente.
Sacado ( aceitante): É um devedor cambiário em via principal e em via directa.
Interveniente: Devedor que se substitui ao onerado (ou intervindo), ocupando a sua posição jurídica e possuí um direito de regresso contra o onerado (fica sub-rogado nos seus direitos). Daí que o próprio sacado possa ter interesse em ser interveniente: os seus deveres enquanto sacado-aceitante são muito mais amplos do que os deveres como sacado-interveniente.

NOTA 1 - O sacado-aceitante, está excluído. Não pode ser interveniente. Desaparece o interesse subjacente à figura do aceite por intervenção? é uma defesa em 2ª linha contra a falta de aceite do sacado.



NOTA 2 - Ao ocupar a posição jurídica do onerado, o interveniente torna-se um sacador cambiário em relação aos portadores posteriores da letra. É um credor cambiário em relação aos inferiores.


FORMA E NATUREZA DO ACEITE POR INTERVENÇÃO:

Art 57º nº2 - Deverá sempre indicar-se o nome do sacado (intervindo o que faz a incumbência) é sempre necessário saber quem é o sacado, porque a extensão da obrigação do interveniente é a mesma da do sacado, excepto em 2 aspectos:

a) O sacado responde perante qualquer portador da letra, o interveniente só responde perante os portadores posteriores ( ao honrado).
b) O sacado é um devedor em via principal. O interveniente ocupa a mesma posição jurídica que era ocupada pelo honrado. É um obrigado cambiário em via de regresso para todos os outros portadores posteriores da letra mas é um credor cambiário relativamente a todos os subscritores cambiários que antecedem o honrado.


- 3 efeitos principais do aceite por intervenção:

1) Excluir o exercício prematuro do direito de regresso, isto é, excluir a faculdade que normalmente assiste ao portador de uma letra cujo aceite foi recusado de accionar, em via de regresso, os restantes obrigados cambiários. Este efeito apenas aproveita ao subscritor cambiário em honra de quem é interveniente, interveio ( honrado ) e aos subscritores posteriores ( já não aproveita aos anteriores)
2) Obrigação do portador da letra a apresentar ao interveniente. Quando na letra figura uma cláusula de incumbência especial e o interveniente tenha domicilio no lugar do pagamento (52 condições), o portador é sempre obrigado a apresentar a letra a esses intervenientes. E só munido dos 2 protestos ( da recusa de aceite pelo sacado e pelo interveniente ) é que pode agir em via de regresso: art 56ºn3º. Se o interveniente não tem o domicilio no local do pagamento, o portador pode recusar o aceite por intervenção. O portador não está obrigado a apresentá-la ao interveniente, mas pode fazê-lo: Art 56º nº3.
3) Direito do interveniente que pagou a letra: O interveniente que paga uma letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes dessa letra contra o honrado e os subscritores anteriores (art63º)


III) ENDOSSO:
Declaração jurídica unilateral pela qual se realizam 3 coisas:
• Transmissão do título e dos direitos emergentes desse título - Efeito translativo ou transmissivo.
• O Endossante constitui-se na obrigação da garantia da aceitação o pagamento da letra - Efeito constitutivo.
• Legitimação da posse do endossado( portador da letra) - Efeito legitimador.



NATUREZA JURÍDICA DO ENDOSSO:

• Declaração unilateral - Tal como o saque, também o endosso é uma declaração unilateral que só produz efeitos com a entrega ( tradição real ) do documento ( Título de crédito )
• Declaração acessória relativamente à declaração cambiária originária ( Saque ). É uma nova ordem de pagamento, que é dada à mesma pessoa ( sacado ) e que tem, no fundo, o mesmo conteúdo que tinha a declaração originária ( Obrigação do sacador ). A diferença está em que o beneficiário da ordem de pagamento não é o donador , mas o endossado.


EFEITO TRANSLATIVO:

É o endosso é um meio de transmissão da letra, mas não é o único: a letra pode ser ainda transmitida " inter vivos " por cessão de créditos e " mortis causa " por sucessão. O endosso e a cessão de créditos têm regimes distintos :

a) Quanto à natureza da própria operação jurídica: Enquanto a cessão de créditos constitui um negócio jurídico bilateral ( operação que depende da vontade de ambas as partes: cedente e cessionária ) e a respectiva eficácia depende da notificação da mesma ao devedor ( art 585 cc ). O endosso é um negócio jurídico unilateral, cuja validade requer apenas a declaração do endossante e a entrega, ( tradição ) do título ( Não se exige a notificação ao devedor)

b) Quanto ao regime da responsabilidade: O endossado responde apenas pela existência e exigibilidade do crédito, mas não pelo seu pagamento ( Art 587 cc) e o endossante garante a aceitação e o pagamento da letra ( Art 15º LULL)


c) Quanto à natureza do direito do credor: O direito do endossado é um direito autónomo relativamente ao direito do endossante e aos direitos dos portadores anteriores ( não é afectado por relações extra-cartelares existentes) O direito do cessionário é o mesmo direito do cedente; ao cessionário podem ser afastadas todas as excepções que podiam ser opostas ao cedente ( art 585cc)


REQUISITOS DO ENDOSSO:


Art 13 - a declaração do endosso deve estar escrita na própria, e deve constar a assinatura do endossante.
Art 12 - a declaração do endosso ( dada a sua natureza acessória ) , tem que ser incondicional e total.
É proibido o endosso sob condição ( condicional )

Diferença em relação a ao saque: A cláusula de condição no saque é nula. A cláusula da condição no endosso, é tida como não escrita - Art 12 nº1

Tal como o saque não pode parcial, também o endosso não pode ser parcial. A consequência é a mesma: Art 12 nº 2 - o endosso parcial é nulo

Art 12 e 13 - Endosso em branco: Normalmente o endosso designa o nome do beneficiário. Mas, o endosso pode não indicar o nome do beneficiário.

Art 13ºnº2 - o endossante limita-se a opor a sua assinatura, mas não indica o nome do beneficiário ( endossado ). Deixa-o em branco.
- Regime aplicável a estas situações:

Quanto ao endossado em branco, ele constitui um portador legítimo ( Art 16ºn1º). A diferença está ao leque mais amplo das atitudes que o endossado pode tomar:
• Apresentar a letra ao aceite do sacado.
• Preencher o espaço em branco com o seu nome ( indicando-se como beneficiário ) - art 14º
• Endossar a letra a um terceiro ( ou indicando o nome do beneficiário, ou endossando também ele em branco ) - Art 14ºnº2.
• Transmitir a letra a um terceiro, tal como a receber, sem a endossa: entrega do título ( tradição real )

Nos 2 últimos casos:

* No caso de o endossado em branco endossar de novo em branco a alguém, presume-se que o endossado em branco adquiriu a letra em branco ( Art 16ºn1º) A -------- B ------------------------ C
endossado ( tradição material )
em branco
* No caso de o endossado em branco (B) transmitir a letra a C sem endossar ( por mera tradição real ) sem nela opor qualquer declaração, a letra passa a funcionar como um mero título ao portador e as transmissões manuais intermédias são ignoradas. Tudo se passa como se o endossado em branco fosse C ( como se tivesse havido endosso em branco directo de A a C )

A ------------------ B ---------------------- C ---------------------- D
Endossante endossado
Em branco em branco.

As transmissões intermédias são ignoradas ( A/B; B/C). Tudo se passa como se o portador actual da letra Ex: D passa a portador imediato.

Legitimidade activa e passiva:

Quem pode endossar a letra?

• O tomador
• Qualquer portador legitimo dessa letra ( legitimidade por uma série ininterrupta de endossos.
• Qualquer cessionário ou qualquer sucessor "mortis causa" da letra. Ex: Se C for herdeiro de B também pode endossar.

A quem pode ser endossada uma letra?

Art 11ºn3º: Não existe qualquer condicionalismo.

• Qualquer estranho à cadeia cambiária.
• O próprio sacado
• Qualquer obrigado cambiário - A cadeia de endossos retorna a um dos obrigados cambiários: Figura do reendoso: Ex - F -- endossa --- D. D já não era endossante. A particularidade do regime está no direito de regresso. Ex: F --- endosso --- D. D já não era endossante. Quando há reendosso, como que se compensam as obrigações dos que estão no meio o portador da letra só pode exigir aos subscritores anteriores a si, na cadeia cambiaria. D volta à sua posição primitiva.


EFEITOS DO ENDOSSO:

-A) Efeito translativo: O endosso transmite todos os direitos emergentes da letra: Art 14ºn1º. N prática, por dizer que o endosso vem investir o portador na posição de um credor cambiário originário. ( De um titular de um direito cambiário autónomo, relativamente às excepções pessoais e causais, que pudessem ser opostas a quem lhe endossar a letra autónoma em relação às excepções decorrentes de qualquer convenção extra cartelar Art 17. Mas, além disso, também o investe nesse direito, independentemente da ilegitimidade de um dos sujeitos da cadeia cambiária (16º). Para que este efeito translativo surja, é necessário que estejam preenchidos os pressupostos de que depende a autonomia do direito de crédito cambiário: art 16 e 17.

Ao lado do endosso próprio, há endossos impróprios: Com o endosso, apenas se transmitem certos, não todos os direitos, ou então, transmitem-se todos os direitos da letra; mas de um modo especial. São casos em que o endosso não produz a sua plena e norma eficácia translativa:

3 endossos impróprios:

1) Endosso por procuração: Consiste num tipo de endosso, que tem preferido não transmitir qualquer direitos cambiários em nome e por conta do endossante ( a exercer esses direitos em nome e por conta do endossante) Art 18. Trata-se de um mero representante de quem endossou a letra.
Neste caso, o regime jurídico é:

• O endossado não é proprietário da letra, nem é titular dos direitos contidos na letra ( é um mero representante ) . O endossado não pode transmitir o título ( endossá-lo . Se o fizer, qualquer endosso valerá como novo endosso por procuração: O novo endossado apenas está habilitado a cobrar a quantia cambiária em nome e por conta do endossante inicial ( habilita-o no mesmo direito que tinha o endossado anterior.
• Ao endossado por procuração são oponíveis todas as excepções pessoais e causais, que podiam ser afastadas ao endossante ( art 18º n 2º )
• O endossado deve prestar contas ao endossante ( Deve apresentar a letra ao aceite do sacado, deve lavrar protesto, etc.

2)Endosso em garantia: Art 19º. Pressupõe a existência de uma relação jurídica fundamental endossante e endossado ( que explica o endosso ), mas acrescenta a esta relação jurídica a existência de uma garantia creditória especial: penhor dando ao endossante a letra ao endossado para garantir a obrigação assumida na relação jurídica fundamental. A letra não funciona aqui como um novo meio de pagamento, mas como garantia do crédito. O endossante, para garantir a sua obrigação, dá a letra em crédito ( em garantia ).
Regime aplicável:

• Ao contrário do endossado por procuração, o endossado em garantia é titular de um direito autónomo. É também um credor pignoratício ( titular de uma garantia ) São-lhe inoponíveis todas as excepções que pudessem ser afastadas ao endossante: Art 19ºn2º
O endossado em garantia exerce todos os direitos emergentes da letra, em nome próprio ( inclusive o direito de cobrar a garantia cambiária ): Art 19ºn1º. LIMITAÇÃO: O endossado em garantia não é titular de todos os direitos. Não pode dispor ilimitadamente da propriedade de letra. Não pode endossar de novo a letra. Se o fizer, valerá este como mero endosso por procuração ( habilita apenas o endossante a cobrar a quantia cambiária, em nome e por conta do endossante).

3 ) Endosso posterior ao protesto por falta de pagamento – Art. 20º : distingue 2 situações:
- no caso de o endosso ter sido realizado posteriormente à data do vencimento da letra, mas antes de ter sido lavrado o protesto por falta de pagamento, o endosso produz os seus efeitos normais.
- O endosso realizado depois de ter sido confirmada a recusa do sacado em pagar (posteriormente no protesto por falta de pagamento), vale como uma mera cessão de créditos.
-
B)efeito constitutivo: constitui o endossante na obrigação de garantia pela aceitação e pagamento da letra ,perante o endossado, o endossante fica constituído na posição de uma obrigação em via de regresso perante o endossado: caso o sacado não aceite o pagamento da letra ,o pp endossante pagará a letra.

Há 4 situações especiais em que este efeito não se produz de modo normal:

1-Endosso com clausula “sem garantia” ou “sem regresso”: art.15.
o endossante ,salvo disposição em contrario ,é garante tanto da aceitação, como do pagamento da letra (efeito constitutivo normal).
Mas o endossante pode exonerar-se da obrigação da garantia do aceitação da letra , como da obrigação de garantia de de pagamento da letra consoante a extensão dada ao seu regresso. Este efeito da exoneração abrange quer o endossado imediato ,quer os endossados posteriores (válidos).
Só aproveita ,no entanto , ao endossante que após essa clausula (dos efeitos da exclusão não se podem prolongar nem ao endossado imediato nem aos portadores mediatos).

2-Endossos impróprios quanto ao efeito translativo :
a)Endosso por procuração :o endossante não assume aqui qq obrigação de garantia face ao endossado .O endossado aparece na posição de um mero representado.
b)Endosso posterior ao protesto: o endossado surge na posição de um mero comissário.
c)Endosso em garantia :o efeito constitutivo normal produz-se dado que o endosso constitui o endossante na verdadeira obrigação de garantia pela aceitação e pagamento das letra; e o endossado está apenas limitado no exercício do dto de endosso. A inexistência deste 1 dto não afecta a posição jurídica do próprio endossante: continua, perante o endossado, caso o sacado recuse, obrigado a pagar a letra (obrigado em via de regresso).

3-Endosso com clausula “não á ordem”: Numa letra ,pode ser aposta uma clausula “não á ordem” pelo sacador ,pelo devedor ou por um posterior endossante. Sempre que a clausula for aposta por um endossante não á letra que foi sacada á ordem, pode perguntar-se se isto não paralisa o efeito constitutivo normal (que é criar a obrigação da garantia).
Art15 n2 :o endossante pode proibir novo endosso, e neste caso, não garante o pagamento em relação ás pessoas a quem a letra foi endossada pelo endossado "não á “ordem”.
O efeito de uma clausula “não á ordem” é o de excluir a responsabilidade cambiária de regresso do endossante ,relativamente a todos os endossados mediatos (pelo endossado não á ordem)
Ex: Se A endossa a B uma letra sacada á ordem , apondo uma clausula “não á ordem “ B endossa a letra a C e C a D .Art 15- A constituindo um endossante com responsabilidade cambiária normal relativamente a B , já se exonera de qq responsabilidade de regresso face a todos aqueles a quem tenha sido endossado a letra.

Esta situação é diferente dos endossos “sem garantia – no endosso com clausula “não á ordem” , este endosso produz um efeito mediato da exoneração da responsabilidade cambiária (só para os portadores mediatos).No endosso “sem garantia” ,produz-se um efeito de exoneração total e imediata (relativamente a todos os portadores ;quer em relação aos portadores mediatos quer em relação aos portadores imediatos).


Relativamente ao endosso com clausula “não á ordem”-2 posições doutrinais:

1-Atende apenas á letra de lei; o efeito deste tipo de letras é o de excluir a normal obrigação de garantia pela aceitação e pagamento da letra , relativamente a todos os endossados mediatos.
Ex. Se A endossa uma letra a B , com clausula 2 não á ordem” ou “endosso proibido” e B endossa a C e C a D , A tem uma responsabilidade cambiária normal para com B , mas não tem qualquer responsabilidade para com C ,D e todos os seguintes .Isto resulta da letra do art15.

2-o Art. 15 deve ser interpretado de forma diversa .o que o endossado “não á ordem” (B) está proibido de fazer é 1 novo endosso. Mas, já nada o impede de transmitir a letra de outra forma.
E: Cessão de créditos. No caso de B ter endossado a letra (contra a proibição legal), significa que tal endosso vai converter-se numa mera cessão de créditos.
É esta a situação que corresponde á vontade hipotética das partes. O endosso realizado por um endossado “não á ordem” (B), teria por efeito não o de exonerar A da obrigação cambiária em relação aos portadores mediatos , mas um outro efeito: dado que os portadores mediatos são relativamente a A meros cessionários do endossado B, ser-lhes-iam aponiveis todas as excepções que o endossante “não à ordem” pudesse opor a este. Esta é a posição mais aceitável.

4– Endosso com cláusula “sem protesto” ou com cláusula “sem despesas”.
Art. 46º . Também produz um efeito constitutivo normal. É um endosso impróprio: tem por efeito tornar mais onerosa a garantia dada pelo endossante. Nas letras com esta cláusula, dispensa-se o portador da letra de fixar o protesto por falta do aceite ou pagamento, por parte do sacado.
a) Efeitos da legitimação: o endosso tem por efeito o de legitimar formalmente o portador. Art. 16º - estabelece a presunção de que o portador da letra é o seu portador (titular) legítimo desde que possa justificar a sua posse através da prova de uma série ininterrupta de endossos formalmente válidos. É uma presunção relativa: pode ser ilidida mediante prova em contrário.


IV- AVAL

I. Art. 30º a 32º da LULL. Acto pelo qual uma pessoa (terceiro ou subscritor cambiário), garante o pagamento da soma cambiária por parte de um dos subscritores da letra.

Natureza jurídica: constitui uma obrigação de garantia, o fim é o de garantir (caucionar) a obrigação de um certo subscritor cambiário (que é o avalizado).
O aval cambiário tem algumas semelhanças e também algumas diferenças em relação à fiança.


Semelhanças.
• Art. 31º nº 4 – a obrigação do avalista não é uma obrigação idêntica à dos outros obrigados ou subscritores cambiários. É uma obrigação que garante outra obrigação (de segunda linha). Está por detrás da obrigação de um dos subscritores cambiários e não ao lado.
• 32º nº 1 – a obrigação do avalista é uma obrigação acessória da obrigação do avalizado. O conteúdo e extensão da obrigação do avalista, determinam-se pelo conteúdo e extensão da obrigação do avalizado.
• 32º nº 3 – tal como o fiador que paga a divida tem o direito de regresso contra o devedor, também o avalista tem um direito de regresso contra o avalizado e contra os subscritores cambiários que eram devedores do avalizado.

Diferenças: Art. 32º nº 2 – a obrigação do avalista mantém mesmo no caso da obrigação do avalizado ser nula por um vicio que não seja um vicio de forma. A obrigação do avalista é materialmente autónoma: não se comunicam à obrigação do avalista eventuais invalidades, (vícios) de fundo que afectam a obrigação do avalizado. Só se comunicam vícios de forma. Na fiança, a nulidade da obrigação principal acarreta logo a nulidade da obrigação do fiador (Art.632 C.C.)
32º nº 3 – O avalista além de ter um direito de regresso contra o avalizado, tem o direito de regresso contra todos os subscritores anteriores ao avalizado (perante os quais o avalizado podia agir, em via do regresso).

Legitimidade activa e passiva. Quem pode prestar aval?

Art. 30 nº 2 – pode ser dado por um terceiro estranho à cadeia cambiária um signatário (subscritor) da letra. É de admitir que a função do aval é de fornecer mais garantias, pode ser que o aval venha a tornar a obrigação cambiária de um subscritor mais onerosa do que ela já era.
Ex.: A – B – C (C subscritor cambiário) avaliza a obrigação do sacador . Permite-se, porque se C avalizar a obrigação do sacador C responde não apenas perante os subscritores posteriores da letra, mas perante todos os subscritores da letra (anteriores também).
Assume uma obrigação de garantia da obrigação do sacador (subscritor originário).
A favor de quem o aval pode ser prestado? A favor de qualquer signatário da letra. Art. 31 nº 4 – Na falta de indicação do beneficiário do aval entende-se que o avalizado é o sacador.
Objecto do aval: admite-se o aval parcial (Art. 30 nº 1)
Forma do aval: tem que ser feita por escrito (31 nº 1).
Efeitos do aval – tem que ver com a posição jurídico-passiva do próprio avalista (responsabilidade da obrigação do avalista)

Características principais da obrigação do avalista.

• Obrigação de garantia perante os subscritores em face dos quais o avalizado é responsável.
• A obrigação acessória em termos de conteúdo e extensão (determinam-se pela obrigação do avalizado). A limitação da responsabilidade do avalizado, aproveita ao avalista, ex. se a obrigação do avalizado estiver coberta por uma cláusula “não à ordem” cobre também a obrigação do avalista.
• É uma obrigação de responsabilidade solidária (e não subsidiária), ela responde ao lado para com os demais subscritores cambiários. O portador da letra pode pedir de qualquer subscritor da letra, inclusivé do próprio avalista.
• Obrigação materialmente autónoma (Art. 32 nº2). A obrigação do avalista permanece de pé , mesmo que a obrigação do avalizado seja nula por vício de fundo. A obrigação do avalista só desaparece, caso a obrigação do avalizado seja nula por vício de forma.

Há vários cenários possíveis, consoante a posição jurídica do avalizado:
• Não são concebíveis mais situações em que a obrigação cambiária do avalizado seja nula por vício de forma, sempre que o avalizado seja o sacador. Constituindo os vários requisitos formais do saque (da declaração do avalizado – primeiro), requisitos de validade da própria letra sempre que a declaração do sacador padeça de um vício de forma, a letra nem sequer chegava a existir. É portanto uma situação inconcebível.
• São inconcebíveis situações em que a obrigação do avalizado é nula por vício de forma e isso não acarreta a nulidade da obrigação do avalista. Ex. Um endosso em branco em que o endossante não tinha aposto a sua assinatura no local exigido por lei: no verso da letra: (nulidade por vício de forma). Sendo certa a obrigação do avalizado, será certa o aval que lhe foi prestado: 32 nº 2 (a contrário).

Posição juridico-activa do avalista (direitos do avalista que paga a letra).
Art. 32 nº 3 – ele fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra, contra o avalizado (= fiança), mas tem também direito de regresso contra todos aqueles contra quem o avalizado tinha direito de regresso. Fica sub-rogado na posição jurídica do avalizado.

Vencimento e pagamento da letra.
Há 4 espécies de vencimento de letras, taxativamente previstos no 33.
1. Letras à vista: pagáveis no acto da sua apresentação: 34 LULL. O portador da letra à vista tem um ano a contar da data de emissão da letra para apresentar ao pagamento, esse prazo poderá aser aumentado ou reduzido pelo sacador ou por um endossante. O portador de uma letra à vista que não a apresente no prazo, perderá todos os direitos de regresso (53).
2.Letras a certo termo de vista: art.35. São letras cujo prazo de vencimento se conta a partir da data do aceite ou da data do protesto por falta de um aceite. Deve ser apresentada no prazo de um ano a contar da data da sua emissão. Se o portador não apresentar a letra dentro do prazo imperativo perderá todos os direitos de regresso contra todos os obrigados (53).
Art. 36 e 37. São normas supletiveis que esclarecem situações de dúvida. Art. 36 – a letra sacada a um ou mais meses da data ou da vista, como eles não põem o dia exacto mas apenas o mês, presume-se que a data do vencimento é no último dia do respectivo mês. Se a letra é sacada a 31/7 e é pagável a 3 meses da data, vai-se vencer a 31/10. Mas se é sacada a 31/11 vence-se a 28/2 (último dia do mês).



Prazos para apresentação das letras.

Pagamento: letras pagáveis em data determinada, letras q certo termo de vista ou de data:38 – são pagáveis no dia do vencimento da letra ou nos dois dias úteis subsequentes.
Letras à vista: uma vez que são pagáveis no acto da sua apresentação, a sua apresentação para pagamento efectiva-se na data. A questão não se põe porque os dias coincidem.
O sacado pode pagar toda a letra, mas também pode pagar só uma parte (39 nº2). No caso do pagamento total o sacado pode e deve exigir que lhe seja passada a quitação do pagamento e que lhe seja entregue a própria letra. Se só exigir a quitação, se a letra vier a ser transmitida a um portador de boa fé pode acontecer que o sacado seja obrigado a pagar duas vezes (pp da incorporação).

O sacado tem a obrigação de verificar a legitimidade formal do portador: para se exonerar validamente da sua obrigação de pagamento, tem apenas a obrigação de verificar a existência de uma sucessão regular de endossos que sejam extrinsecamente válidos: 40 nº3 – não é obrigatório verificar a legitimidade material dos portadores.

Acção de regresso –art 43 o portador de uma letra pode exonerar o seu dto de regresso (exigir o pagamento da quantia cambiária).

Contra o sacador os endossantes da letra ou o avalista, em duas situações:
1-na data do vencimento da letra.
2-antes do vencimento da letra, pode exigir esse pagamento em 3 hipóteses:
a)no caso de recusa total ou parcial do aceite ( pode logo agir em via de regresso, mediante comprovação formal).
b)casos de falência do sacado.
c)casos de falência de um sacador da letra não aceitável ( com clausula de “aceite proibido” - situação especifica).

Prazos para realizar o protesto por falta de pagamento do aceite e do pagamento. Consequências da emissão deste protesto (dentro dos prazos):

Art.44, 53 e 46-A recusa de aceite e do pagamento por parte do sacado é comprovada por protesto ,e só com este documento, o portador pode reagir com os obrigados cambiários. Se o portador (53) de uma letra , não faz o protesto dentro do prazo (44) ele perde todos os seus dtos de acção contra os obrigados cambiários , à excepção do aceitante ( este responde sempre).Quanto aos endossantes, sacador e avalista e desde que o portador tenha lavrado o protesto , qualquer destes obrigados cambiários é responsável pelo pagamento da letra, perante o portador (funcionando depois contra eles os dtos de regresso), obrigação solidária juntamente com o aceitante:47.

Dtos do portador :

Art.48.O art 52 refere-se a uma situação específica quanto ao dto do portador : o portador de uma letra tem o dto normal de exigir o pagamento aos obrigados. Mas, a lei faculta ao portador um meio para agir: ressaque? operação que consiste em o portador da letra em vez de exigir ,em via de regresso, a um dos obrigados cambiários, sacar uma nova letra á vista sobre um dos obrigados cambiários.

Dtos de um subscritor que haja pago a letra:49º e ss. A pessoa que pagou uma letra, pode reclamar depois esse pagamento , em via de regresso, contra aqueles que eram seus devedores cambiários ( que tb garantiram a sua obrigação).


3-Regime da livrança.

Tb é um titulo de crédito, é uma promessa de pagamento A promete pagar a B , é uma relação jurídica bilateral .não é uma ordem de pagamento ,não há aceite. A é o promitente ou subscritor e B é o beneficiário ou tomador. É um titulo que nasce á ordem do tomador e pode circular por endosso. Não há aqui a figura do sacador.
Os requisitos da livrança estão no 75 e ss LULL onde se remete para o regime das letras de câmbio . As diferenças essenciais da livrança face á letra de câmbio é que na livrança tem que tem que constar a palavra livrança , tem que enunciar uma promessa de pagamento. O regime da livrança é semelhante ao da letra , desde que as disposições não sejam contrárias á própria natureza da livrança.
As livranças a certo termo de vista estão no 78 ºn2. A livrança lavra-se á vista e se o subscritor não lavra á vista, lavra-se um protesto por falta da vista.

4-Regime civil do cheque

Tb é uma ordem de pagamento, manda-se um banqueiro pagar a outra pessoa .É uma relação tripla ,só que uma das partes é necessariamente um banqueiro .Tem que se indicar sempre o nome do banqueiro (sacado).Para dar uma ordem ao banqueiro ,supõe-se que eu tenha fundos á disposição desse banqueiro ,para o banqueiro poder pagar.

Convenção de cheque:acordo pelo qual eu posso dispor de fundos que tenho nesse banco, por meio de cheque .Tb é um titulo destinado a circular como meio de pagamento eu posso endossar um cheque indefinidamente , o cheque pode nascer em branco ou ao portador ele é transmitido ao portador , transmite-se por endosso , mas pode ser endosso de simples entrega : (art5 e 6 Lucheques).
Faltando a data , ele é pagável é apresentação é um titulo á vista :
28.O sacado é um banqueiro (3º).2 requisitos-
convenção de cheque com o sacador e a existência de fundos á disposição do sacador ( relação de posição).Quando não há dinheiro o banqueiro não paga por falta de provisão.
Se não há convenção de cheque nem fundos , isto não afecta a validade do cheque , posso exigir ao sacador ,ou seja, a quem me deu o cheque.
É proibido o aceite no banqueiro , porque não é obrigado cambiário:art 4º.
A noção de aceite considera-se não escrita. O banco não é obrigado cambiário Ele nem sequer pode avaliar o cheque ,nem endossar o cheque porque o endossante é naturalmente um obrigado cambiário e o banqueiro nunca o pode ser.

Cheque visado: visar o cheque não é aceitar o cheque. Apenas se está a garantir que o sacador tem fundos para que seja pago.

Funções do cheque- Meio de pagamento , meio de garantia e função crediticia (para conseguir crédito). Ele não pode nascer sem data.

Cheque ante datado: o cheque é um titulo á vista , pagável á apresentação :28º n2, não interessa para nada eu por uma data.
O prazo para levar o cheque á apresentação do banqueiro é 8 dias, depois ele pode recusar-se a pagar :29º. Se o banco se recusa a pagar por qq motivo deve ser lavrado protesto :40º para se poder exercer o dto de regresso face aos obrigados cambiários o tempo para exercer a acção de regresso é de 6 meses: 56º. Há a possibilidade de revogar o cheque , essa revogação só produz efeitos depois de terminado o prazo de apresentação :32º n1.
Dentro dos 8 dias , o banco tem obrigação de pagar.

Relação entre o portador do cheque e sacador (banco)-
O banco se não paga o cheque indevidamente , responde perante o sacador . Se não paga ao portador do cheque será que ele responde face ao portador ? Ora , o banco não pode ser interpelado pelo portador como um obrigado cambiário. Posso racioná-lo, mas embora noutro tipo de relação e não com base na relação cambiária –o banco não é obrigado cambiário.

3-Contratos.

1.Os ctts comerciais em geral

Á partida , há uma serie de consequências genéricas para os ctts mercantis e não civis. Há ctts que podem ser ao mesmo tempo civis e comerciais.

Ctt de locação financeira-
O seu regime jurídico foi recentemente alterado. Este ctt é tratado no dl149/95 e as sociedades leasing estão reguladas no dl72/95. Há uma relação que nasce com 3 pessoas- A encontra B que tem o bem e que pede o seu preço , mas A não paga e entao vai ter com C ao qual pede para comprar o bem a B para depois A o locar. Economicamente é uma relação triangular , trilateral. C é exclusivamente financiador .Serão celebrados em principio dois ctts – C-B ; B-A ;o proprietário é C. Existe nestes ctts uma convenção pela qual no fim do período , terminado o ctt pode a propriedade transferir-se para A através de um preço normalmente residual.

É um ctt de financiamento porque no fundo se por ex. Tenho uma actividade industrial e preciso de um dado bem, mas não tenho dinheiro para o comprar , então vou alugar o bem , retirando lucros desse bem e quando tiver dinheiro suficiente , o bem poderá ser meu. Esta característica pode ser levada ao extremo na figura “lease back”- A é comerciante praticamente falido ; tem meia dúzias de máquinas , mas não tem dinheiro para comprar máquinas a A. C paga as máquinas e depois da a A em locação financeira e por isso , verdadeiramente C nunca chega a ter as máquinas nos seus armazéns. Então ,A vai “fazer dinheiro” até que pode agrupar o suficiente para mais tendo as máquinas.
Vantagem para C – Inverte o lucro. O ctt gera então capital para todas as partes envolvidas .O locatário dirige-se ao locador com uma proposta de ctt para ele celebrar com outra pessoa.

Art 9º-A – refere-se a certa obrigação : leasing directo –Em vez de existir esta relação triangular económica , é o próprio comerciante/ locador que dá uma coisa que já é sua . Desde este dl, só uma sociedade de locação financeira ou bancos podem celebrar ctts de leasing.
Á partida esta sociedade é apenas um locador e supõe algum motivo. -ex.A deixa de pagar as rendas e o locador vê-se a braços com vários bens que são da sua propriedade :DL 72/95. Quando o locatário procura o bem ,este não foi mandado pelo locador ( não há qq interesse por parte deste) –A não é mandatário do C não age em representação do locador.

Art 22º o locador não pode ser responsabilizado pelos prejuízos decorrentes da não celebração do ctt.
B não pode responsabilizar C pelo facto de o ctt não se concluir.
Mas, pode ser responsabilizado com base no 227º- responsabilidade pré-contratual.
O locador apresenta a proposta á sociedade que aceita :compra ou ctt leasing com o locatário.

Forma: art3º- o ctt deve ser celebrado por documento particular em caso dos imóveis com reconhecimento presencial das assinaturas.
Art 8º- produz os seus efeitos imediatamente. Podem no entanto ser condicionados , ex. Tradição. Certo ctts são distintos , não estão ligados juridicamente .Art 13º. Determina que quem tem a garantia dos vícios da coisa locada não é o comprador , mas o locatário. Quem pode exercer contra o vendedor dadas as acções por incumprimento é o seu proprietário.
Este DL diz que o proprietário cede aos locatários a garantia pelos vícios da coisa do locatário. Ora, se muitas vezes o locador nem sequer vê os bens ,é ele que tem que fazer valer os seus dtos perante o vendedor. Isto foge ao regime regra. Transferência de risco do bem- em principio , corre por conta do proprietário do bem. Neste caso corre por conta do locatário: Art15º.
Publicidade no ctt : o leasing imobiliário fica sujeito a inscrição na conservatória :art 3º n3. Os dtos e deveres das partes estão associados ao ctt de locação :art 9º.
Um locador não tem a obrigação de garantia pelos vícios.
O locatário tem que pagar a renda , conservá-la ,etc ; as despesas para a manutenção da coisa ,isto porque o locador tem a obrigação de conceder o gozo da coisa, mas não de conceder a manutenção da coisa.Há uma obrigação de seguro. Findo o contrato, o locatário só não pode optar por comprar o bem, tem de devolver o bem ao locador em bom estado – obrigação fundamental.
Sendo o locador o proprietário, ele tem dto a exame para ver se o bem está a ser conservado e em bom estado.

CONTRATO DE FACTORING

O contrato de cessão de créditos está no 583º e ss. do C.C.. Por exº: temos uma empresa com vários clientes e a actividade mais complicada é cobrar as dívidas dos clientes. Enquanto não se cobra, falta capital e está-se à espera. Então, passa-se essa tarefa para as pessoas que se especializaram em ir cobrar os créditos de outrém: sociedade de factoring.

No factoring, há depois uma massiva celebração de contratos de cessão de créditos, transforma-se isto num contrato de factoring. Transmite-se para a sociedade de factoring todos os créditos. Claro que a sociedade é remunerada por isto, o que cede os créditos (cedente - ... ou cliente da sociedade de factoring) vai ceder à sociedade a cobrança dos seus créditos. Através desta cedência, este cliente vai ter vantagens: de organização, poupa tempo, trabalhos incómodos perante os clientes, porque se afasta uma tarefa ingrata.
Há um adiantamento de capital e também se transita o risco da cobrança – mas não há só vantagens. As sociedades de factoring também têm vantagem com isto: vão cobrar uma dada percentagem sobre aqueles créditos. Há uma espécie de conta corrente entre o cliente e os sócios. Este contrato está no D.L. 171/95, que vem regular as sociedades de factoring.
Os seus artºs 7º e 8º dizem que o contrato de factoring deve ser celebrado por escrito mais documentos comprovativos da dívida (crédito) – são as facturas, cheques, letras. Só as sociedades de factoring e os Bancos podem ser “factors” (aquele que vai cobrar). Normalmente, a transmissão é pro-soluto: eu sou o cedente, transmito os créditos, recebo o dinheiro e o risco corre por conta do “factor”: 587º do C.C.. Mas o factoring também pode ser pro-solvendo: 597º, nº.2 do C.C.. Transcrito o crédito e o factor é o cessionário, vai cobrar, mas a transmissão do crédito fica condicionada à sua solvabilidade. Aqui não se transmite o risco, este corra por conta do cedente. Como este contrato é pouco regulado, aplica-se o regime da cessão de créditos do C.C..

GARANTIAS PESSOAIS ATÍPICAS

Eu responsabilizo-me com todo o meu património, por isso se diz que é uma garantia pessoal. Por exº: fiança, o fiador responsabiliza-se com todo o seu património face ao afiançado; o aval é uma garantia pessoal, o avalista avaliza com todo o seu património. Ora, um contrato típico é aquele que tem regulação na lei. Mas, há liberdade contratual: 409º C.C.. Pode-se celebrar outros contratos que não estão na lei, mas há numerus clausus nos dtos reais. As garantias pessoais atípicas são aquelas que não estão reguladas na Lei: alguém se compromete a pagar uma dívida de outrém com todo o seu património. Distinguir isto da fiança: nestas garantias atípicas, o garante é geralmente uma instituição bancária – garantias bancárias, garantias à primeira solicitação (“on first demand”). Além disso, estas garantias também se chamam garantias autónomas. Ora, a característica essencial da fiança é a acessoriedade – a obrigação do fiador é a acessória da obrigação garantida. Se a obrigação principal não é válida, a fiança também não é. Também existe uma acessoriedade funcional – porque o fiador pode opor ao credor os meios de defesa que competem ao devedor, 633º do C.C.. Também há uma acessoriedade extintiva – uma vez que se extinga a obrigação principal, também se extingue a fiança. O âmbito da fiança não pode exceder o da obrigação principal. Além disso, exige-se para a fiança a mesma forma que se exige para a obrigação principal.

REGIME DAS GARANTIAS AUTÓNOMAS: são uma derrogação à regra da acessoriedade da fiança porque esta era recusada no Dto Comercial como meio de garantia. Logo, chegou a convencionar-se entre as partes contratos atípicos, inominados de garantia. Tinham que ser autónomos e independentes da obrigação garantida. Afastou-se a possibilidade de opor excepções, quanto ao âmbito, ?... de forma.

Quando se usam estas garantias?
Há garantias de manutenção da oferta na fase pré-contratual. Se não a fizer, o garante compromete-se a pagar o montante de X. Há garantias de reembolso, pagamentos antecipados, boa execução dos contratos, da manutenção de um bem, de uma obra (contrato de empreitada), garantia de pagamento de uma dívida pecuniária, ou seja, não são só garantias de pagamentos, mas também de comportamentos. Começou a convencionar-se uma cláusula de pagamento à primeira interpelação ou solicitação, “onfirst demand” – quer dizer que assim que o garante é interpelado, tem que pagar inevitavelmente, sem levantar ondas, fazer perguntas. Logo, os credores não querem outra coisa. Quem fica em má posição é aquele que é garantido.
Problema: haver conluio entre o credor e o garante, haver uma negligência do garante (Banco). Logo, muitas vezes o que acontecia é que havia uma execução abusiva ou fraudulenta da garantia autónoma à primeira solicitação. A Jurisprudência tem permitido a hipótese de o devedor paralisar a garantia para o Banco não pagar, através de um procedimento cautelar. Estas garantias autónomas, atípicas, bancárias, são cada vez mais usadas, e como tal, se recorre cada vez menos à fiança.
Os contratos de agência, contrato de concessão e contratos de franquia ou franchising são diferentes, mas têm muita coisa em comum. Apenas o contrato de agência está tipificado desde 1986, por exº, sou produtor de um dado bem com muita saída: produtos alimentares, vestuário, faço carros ou vendo na minha loja, tenho necessidade de escoar os meus produtos, abro outra loja em Lisboa, Madrid, Paris; ora isto dá muito trabalho. De facto, seria uma distribuição directa porque tenho o controlo total da comercialização dos produtos: o produtor é que implanta postos de venda. Isto não é prático e é muito dispendioso. O risco, custo e distribuição corre por conta dele – torna-se algo descabido.

Por isso, recorre-se à celebração de contratos de agência. O agente é alguém que normalmente conhece um dado território, conhece um dado mercado e vai promover a celebração de certos contratos. Vai mostrar o produto, publicitar os produtos e convencer a clientela. Mas quem celebra o contrato de compra e venda é aquele para quem o agente trabalha: o principal. Acabado o contrato de agência e agora eu, principal, vou continuar a vender os carros a esses clientes. Saber se cessando o contrato de agência devo ou não pagar ao agente uma indemnização de clientela, dar-lhe algum dinheiro, dado que vou ter lucros à custa da actividade que este vinha a desempenhar. Os contratos são celebrados pelo principal, o produtor é que corre o risco de comercialização dos bens. Se sobram produtos em stock, o prejuízo é do principal.

Surge o contrato de concessão comercial: as coisas são muito diferentes. Estamos no âmbito de uma distribuição indirecta, a distribuição é feita indirectamente pelo produtor, através do concessionário. Este, em regra, compromete-se a adquirir uma dada quota de base, que se compromete a vender no mercado. O produtor afasta aqui o risco da distribuição e o concessionário compromete-se a escoar um dado número de bens. Mas este contrato, era um grande avanço porque o produto ficava sujeito à performance do concessionário, à publicidade que ele fazia, etc.

Por isso, surge o contrato de franquia ou franchising, que é muito complexo. Eu sou produtor de bens ou de serviços e decido colocá-los no mercado. Esses bens ou serviços valem não só pelas suas características, mas também pela forma como são comercializados. Cada vez mais o que interessa é a imagem que temos do produto e da fábrica. Casos típicos de franchising de produção: Coca-Cola, McDonald´s. Também há franchising de serviços como a 5 à Sec, Holliday Inn, etc. São sociedades de tratamento de roupas, hotelaria. O franqueador tem uma empresa muito bem sucedida e consegue vender muito bem certos bens e serviços.
Este não transmite só a possibilidade de comercializar os bens e serviços, transmite também todo o suporte empresarial que acompanha esse produto ou serviço. Neste tipo de contrato transmite-se algo muito importante: know-how. A ideia é a de que tudo seja feito para que os clientes tenham a sensação de que quando bebemos uma Coca-Cola, estarmos a beber a mesma Coca-Cola em qualquer parte do mundo. Comprar aqui a Coca-Cola é igual. Exº: quanto ao vestuário, aqui o franqueado é que corre o risco, se vender vende, senão fica com o prejuízo. Mas ele vai ter que pagar ao franqueador dtos, ”royalties” – uma prestação inicial e depois continua a pagar X que vai depender do volume de negócios. É de notar que se a imagem de marca é afectada numa das lojas, por exº, intoxicação no McDonald’s do Porto, isto vai afectar outras pessoas. Além disso, o franqueador dá várias instruções, dizendo como é que o franqueado deve fazer as coisas.

Questão: de quem é a clientela, do franqueado ou do franqueador? Qual a verdadeira natureza deste contrato? Deve o franqueador dar ao franqueado X pela clientela que surgiu naquela área comercial? Isto parece esquisito, porque o franqueado usou os sinais distintivos do franqueador. Ao fim e ao cabo, o franqueador permite ao franqueado repetir, fazer uma cópia. O franqueado é que compra a área comercial, é ele que corre o risco de comercialização, o franqueado não pode colocar os produtos no mercado, em desacordo com a franquia, mesmo após a cessação do contrato, se ele ficar com bens em stock. O que fazer com este bens? Ora, o risco corre por conta do franqueado, isto é complicado.
Quando há uma ruptura, é complicado encontrar soluções porque não há legislação e as partes nada disseram, no caso de haver ruptura. Além disso, também é difícil a aplicação analógica. Conclusão: os contratos atípicos proliferam e surgem estes problemas porque não há regime jurídico.

Regime jurídico do contrato de agência: D.L.178/86

O contrato de agência, de todos os contratos de distribuição, é o único que o legislador definiu as bases essenciais do seu regime. É o contrato tipo dos contratos de distribuição e que resolve, por exº, problemas do contrato de franchising, etc. Aplica-se por analogia, se a analogia estiver presente.
O D.L. 178/86 sofreu alterações em 1993, com o D.L. 113/93. Estas alterações surgiram porque 5 meses depois da entrada em vigor do D.L. 178/86, apareceu uma directiva comunitária sobre aspectos do contrato de agência, procurando harmonizar as normas de protecção dos agentes comerciais a nível da União Europeia, foi a Directiva do Conselho.
Ao elaborar o primeiro D.L., o legislador tinha conhecimento dos projectos da Directiva que se estavam a desenvolver, a Directiva demorou mais de 12 anos a surgir porque havia regimes radicalmente diferentes nos países da União Europeia. A harmonização foi difícil, o modelo francês e alemão eram os que tinham mais contrastes, donde resultaram algumas normas que estabeleciam regimes alternativos, atendendo ao modelo francês e ao modelo alemão.

Contrato de agência: artº 1º - Contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta de outra (principal), de uma forma autónoma e estável, a celebração de contratos. Características: autonomia, estabilidade e mediante retribuição. Assunção, pelo agente, de uma obrigação de promover a celebração de contratos por conta e no interesse da outra parte. É uma actividade material, não é uma actividade jurídica. O agente não tem poderes representativos, o que este deve fazer é encontrar clientes, fazer publicidade dos bens ou serviços do principal, apresentar as condições de venda e de pagamento – aproxima ao principal os potenciais clientes. O agente não tem normalmente o encargo de concretizar ele próprio a celebração dos contratos. Ele cria, angaria clientes, mas quem celebra e conclui os contratos é o próprio principal. Pode ocorrer a atribuição de poderes representativos, mas só se for convencionado por escrito: artº 2º. Segundo o artº 3º, presume-se que o agente também tem poderes para cobrar créditos fora destes poderes.

Pode acontecer que ao agente seja atribuído um círculo de clientes em exclusivo. Também esta atribuição tem que ser convencionada expressamente por escrito: artº 4º. Há uma obrigação de promover a celebração dos contratos, e uma obrigação genérica de actuar porque 2º boa fé há uma relação de colaboração entre o agente e o principal. Depois há uma enumeração exemplificativa das obrigações do agente: comunicar, mas também há dtos do agente, por exº, dto à retribuição.
As notas da autonomia e estabilidade são as que permitem distinguir contrato de agência de contrato de trabalho. Ele tem autonomia, actuação e vinculação jurídica estrita ao principal, ele é que determina os clientes que vai visitar, a que horas, com que meios; é ele geralmente que assume as despesas relacionadas com a sua actividade. Estabilidade, duradoura, tendencialmente continuada. Os agentes são diferentes dos mediadores – destinam-se à aproximar as partes no potencial contrato de uma forma esporádica. O cargo assumido pelo agente é tendencialmente estável.

Dto à retribuição: artºs 15º e 16º - este dto está ligado aos resultados que o agente proporciona ao principal. Como o agente é autónomo e independente, este é remunerado face aos resultados obtidos. O contrato de agência é, inequivocamente, um contrato de prestação de serviços, uma vez que a retribuição depende dos resultados obtidos. Logo, a comissão é a forma normal de retribuir a actividade desenvolvida pelos agentes comerciais: comissão sobre os contratos que o principal venha a celebrar com a clientela, artº 15º. Segundo o artº 16º, nº 1, as comissões são o valor percentual sobre o volume de negócios. O agente tem dto à comissão face aos contratos por si promovidos, contratos face aos quais a actuação do agentes foi decisiva para a sua celebração e também pelos contratos celebrados com clientes por si angariados. Tendo conquistado um cliente para o principal, o agente, mesmo que não tenha uma intervenção directa para a sua celebração, tem dto a ser retribuído devido à celebração do contrato. A lei estabelece isto para evitar pretensões abusivas do principal. O cliente tendo necessidade de encomendas posteriores, falo-á directamente com o principal, e assim, todo o esforço para captar o cliente perdia significado em termos retributivos a favor do agente. Tendo havido um esforço inicial do agente, este tem dto aos frutos desse esforço inicial – comissões pelos contratos celebrados. Artº 16º, nº 2 – dto à comissão quando for atribuído ao agente um dto exclusivo. O artº 4º diz que ao celebrar-se o contrato de agência, o principal cria a favor do agente, para actuar numa dada zona ou círculo de clientes, estando o principal, assim, a garantir ao agente que não vai contratar outros para actuar nessa zona. Mas, o próprio agente também se obriga a não promover a celebração de contratos com outros principais. A actividade do dto exclusivo tem consequências em termos remuneratórios: os agentes têm dto a uma comissão por todos os contratos celebrados com clientes que pertencem à zona ou ao círculo de clientela, face aquele dto exclusivo. O principal é obrigado a pagar comissões, mesmo face a contratos em que não foram angariados os clientes, porque o agente tem um dto exclusivo. Isto é: a clientela pertence à zona de clientes face à qual o agente tem um dto exclusivo.

Problema: empresas com sucursais, filiais, com diferentes GC? – aqui a lei procurou estabelecer como base: saber se a sede da empresa se situa na zona certa. O agente tem um dto exclusivo, ora, o artº 16º, nº.2 pode conflituar com o 16º, nº.1, se o agente promove um contrato dentro da zona exclusiva de outro agente, quem vai ter dto à comissão? O que faz o esforço ou o que tem o dto exclusivo? Estas situações podem levar a que a comissão seja repartida – problema de saber se dava para usar o artº - 16º/1 ou 16º/2.
Artº 16º, nº.3 – pode complicar a situação porque o nº.1 e o nº.2 dizem respeito ao dto à comissão para contratos celebrados entre o principal e o cliente na vigência do contrato de agência. Mas, como a actuação do agente tende a produzir frutos a médio e longo prazo, o legislador fala do dto à retribuição pelos contratos celebrados depois da cessação do contrato de agência. O artº26º fala das causas da cessação destes contratos. O contrato cessa mas houve negócios preparados antes de cessar, há contratos que continuam a ser celebrados na sequência do esforço inicial do agente. Ora, o 16º/3 diz que o agente só tem dto à comissão se provar que foi ele a negociá-lo, a conclusão do contrato dá-se devido à sua actividade, à preparação feita por ele, a sua conclusão deve-se à sua decisiva intervenção e desde que os contratos sejam celebrados num prazo razoável. Põe-se a questão de saber o que é um prazo razoável: 15, 20, 30 dias. A maior parte da doutrina, como os ordenamentos jurídicos de Espanha, França, Alemanha, consideram que só em situações excepcionais possa ultrapassar os 15 dias.

I. Atribuição de uma indemnização de clientela, no fim do contrato de agência, a favor do agente: artº33º, o artº34º refere-se ao seu cálculo, estabelecendo um limite máximo: não pode ultrapassar um valor correspondente ao valor anual da comissão que o agente habitualmente auferia ou à média por ele obtida nos últimos 5 anos. A indemnização é calculada segundo a equidade.

- Pressupostos da atribuição da indemnização:
1-tenha cessado o contrato de agência;
2-ainda que seja uma cessação moral, parcial, que se tenha modificado; Exemplo: mantendo o dto exclusivo da zona, a possibilidade de agenciar e celebração de contratos face a certos bens, serviços ou ramos. Normalmente, a indemnização surge com a cessação propriamente dita.


- Pressupostos provados pelo próprio agente:

I. a) Angariado novos clientes ou tenha conseguido um aumento substancial do volume de negócios com os clientes já existentes. A indemnização quer compensar o agente pela mais valia que ele gerou na empresa do principal;
b) Provar mediante um juízo de prognose, evolução futura entre o principal e a clientela, que o principal venha a retirar benefícios consideráveis da clientela angariada ou desenvolvida pelo principal;
c) É preciso que o agente deixe de receber quaisquer comissões com os clientes referidos na alínea a) – é preciso que se verifique uma perda das comissões face ao agente. Trata-se de uma compensação por um enriquecimento injustificado. O artº33º diz que o dto surge a favor dos herdeiros do agente quando o contrato cessa por morte do agente.

artº 33º/3 – Situação em que o dto à indemnização é excluído quando o contrato cessa por razões imputáveis ao agente: ele rescinde ou não cumpre as suas obrigações (2 casos). Depois, discute-se várias situações para saber se estão em causa razões imputáveis ao agente. Se cessa, por exº, por doença, invalidez, reforma, o agente deve ter dto à indemnização, o artº 18º (a contrario) prevê isto expressamente neste caso.

Cap.VI-FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS

1-Noções Gerais; linha de evolução

O instituto da falência ou do dto falimentar é o conjunto de normas que visam regular a situação daquelas pessoas que entraram em crise do ponto de vista económico-financeiro. No moderno dto português, o dto falimentar conhece 2 fases perfeitamente distintas:

1ª fase – anterior ao DL 132/93, estava regulado por um conjunto de normas dispersas, e nesta fase o instituto da falência era privativo dos comerciantes, os particulares estavam insolventes – passivo superior ao activo. Sempre que a situação do comerciante não tinha viabilidade, declarava-se a falência e ponto final (comerciantes). Havendo falência, fecha-se a empresa, pega-se nos seus bens e paga-se aos credores, percentualmente, a todos aqueles que reclamarem os créditos no prazo devido.
Os trabalhadores que estavam nessas empresas, ficam sem o prazo e quem lhes paga é a Segurança Social, Estado, ou seja, nós! Ficam durante vários anos sem o prazo e recebiam através da Segurança Social, o que era mau para o Estado, porque estes trabalhadores já não descontavam para a Segurança Social e o Estado achou que mais valia pegar nesse dinheiro e, em vez de perder o dinheiro pagando findos os prazos durante todos os anos, mais valia, por exº, reduzir a dívida da Segurança Social, que era o credor mais importante quanto ao volume dos créditos a reclamar.

Estado: cria meios de viabilização da empresa. Surge um diploma autónomo que regulava a falência e algumas tentativas de recuperar as empresas. Mas, de facto, só com o DL de 93 é que isso acontece, quem vai ter uma palavra definitiva sobre se recuperam ou não a empresa são os credores e muitas das decisões vão ser tomadas na Assembleia de Credores e estes votam conjuntamente o volume dos seus créditos.

Hoje, a falência deixou de ser um instituto privativo dos comerciantes. A empresa não é comerciante, o próprio DL diz o que considera empresa. Já não se visa apenas saber se uma empresa está ou não na situação de ser declarada falida, mas se pode ser recuperada através de um dos quatro processos de recuperação. Só se ela não puder ser recuperada é que teremos um processo de falência: é a última das opções.

Artº1º/1 do DL 135/98 – Código dos Processos de Recuperação de Empresas e Falência: regula o processo de recuperação nos artºs 28º a 121º-ª

Quatro possíveis providências de recuperação de empresas (artº 4º):

I. concordata
II. reconstituição empresarial (desde 98 – antes chamava-se acordo de credores)
III. reestruturação financeira
IV. gestão controlada

Artº122º a 245º - trata do processo de falência e os artºs 1º a 27º são a parte geral.

2-Aspectos centrais do direito falencial

-PRESSUPOSTOS NECESSÁRIOS PARA A APLICAÇÃO DESTE DL

-Temos um pressuposto subjectivo que não é o comerciante, mas sim a empresa. Essa empresa tem que estar em situação de insolvência ou, desde 98, em situação económica difícil. Isto são coisas diferentes (pressupostos objectivos). No passado, insolvência era uma situação de um particular com um passivo maior do que o activo, hoje, falência é para todos – particulares e comerciantes, desde que estejam organizados na empresa. Hoje, insolvência e o estado da empresa que lhe vai permitir ser sujeita a um processo de recuperação ou a falência. Assim, insolvência é o diagnóstico da doença – depois: ou morre (falência) ou cura-se (recupera).
Pressuposto subjectivo: empresa, para efeitos do dto falimentar. O DL fala na empresa no artº1/2. Ora, o 230º C.Com. exclui actividade agrícola do conceito de empresa comercial. Logo, nos contratos celebrados com uma empresa agrícola, em princípio, aplica-se o direito civil. Mas do ponto de vista da falência, vai ser sujeito ao direito falimentar, dado que este processo só exige que se trate de uma empresa, mesmo que seja uma empresa não comercial – alarga-se assim o âmbito de aplicação destes processos. Um comerciante que não se organize numa empresa, não vai ser sujeito a este processo porque a lei exige que se organize em termos de empresa. Mas, o artº27º permite a todo aquele que não esteja organizado sob a forma de empresa a apresentação de uma proposta de concordata particular – de reabilitação da sua situação.

Artº 2º consagra a definição de empresa: é uma organização dos factores produtivos destinada ao exercício de uma actividade. O que se exige é que haja alguma organização subjacente, não confundir com sociedade comercial, porque a uma cooperativa pode ser sujeita a este processo.
O diploma exclui as empresas públicas, instituições de crédito e sociedades seguradoras. Assim, a empresa é um pressuposto subjectivo para que possamos aplicar este cód. O titular de empresa é que é sujeito de dtos e obrigações, quem tem personalidade jurídica é o titular da empresa. Eu exploro uma papelaria e também presto serviços de consultadoria jurídica – trata-se de uma empresa de prestação de serviços organizada. Eu posso ser titular de várias empresas e uma empresas pode ter vários titulares. Logo, o titular da empresa (empresário) é que vai ser declarado falido, mas a empresa é que é sujeita a uma providência de recuperação (artº 122º).
Há casos de falência sem falido, sempre que existam massas patrimoniais insolventes, sem personalidade jurídica: sociedades irregulares, EIRL, as associações. Estas massas não são declaradas falidas: os sócios, associados ou membros é que são declarados falidos: 125º. O caso do EIRL é especial, porque a sua falência só incide sobre o estabelecimento. Esta falência só se estende ao seu titular se o empresário não tiver respeitado a separação patrimonial.

Às vezes, a lei previu situações de falência derivada, sobretudo no artº 128º. A falência estende-se aos sócios de responsabilidade ilimitada, cooperantes de responsabilidade ilimitada e aos membros dos Agrupamentos Complementares de Empresas que sejam solidariamente responsáveis. Assim, se uma sociedade que tem destes sócios de responsabilidade ilimitada, for declarada falida, também os sócios de responsabilidade ilimitada são declarados falidos. Assim, nestes casos, a falência estende-se a outros sujeitos que não são os sujeitos passivos da declaração.

-Pressupostos objectivos: essa empresa (pressuposto subjectivo) esteja em situação de insolvência e também em situação económica difícil.
O artº 3º dá-nos o conceito de insolvência e de situação económica difícil. Artº3º/1 (noção de insolvência) + artº 8º/1 a), b) e c) – são 3 índices de que estamos perante uma situação de insolvência.
O artº 3º/1 diz que naquela medida o activo disponível não chega para pagar o passivo que já está em dívida.
O artº8º consagra 3 situações que são presunções iuris et de iure, ou seja, não podem ser ilididas mediante prova em contrário. Assim, nestas 3 situações presume-se logo que se está em situação de insolvência, o caso da alínea c) é complicado, porque é uma situação que visa iludir os credores, fazendo diminuir a empresa


Significa que o titular da empresa quer que ela fique falida e nestas situações devem os credores querer que a empresa seja declarada insolvente, senão o titular da empresa continuava a dissipar o seu património. Alguém ???que apresentar a empresa a um destes processos de recuperação ou à falência.
Desde 98, temos também a situação económica difícil: trata-se de uma doença mas que não está em estado tão grave como a insolvência – empresa com dificuldades económicas e financeiras por não cumprir as suas obrigações.

-Legitimidade activa para propor um tratamento : o próprio titular da empresa, pode ou deve, os credores, o MP, e nalguns casos o tribunal é que toma a iniciativa de dar uma solução a esta situação.

Artº8ºnº1: três índices desta situação de insolvência:

1. Artº8ºnº1/a) – falta de cumprimento de uma ou mais obrigações, que pelo seu montante ou pela circunstância do incumprimento, revela a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações:
A. não se exige uma cessação total dos pagamentos por parte da empresa devedora;
B. não basta que a empresa deixe de cumprir uma ou várias obrigações de per si. É necessário que do não cumprimento dessas obrigações se possa inferir a incapacidade financeira da empresa para cumprir a generalidade das suas obrigações;
C. se existir uma ? legal para o incumprimento, já não há insolvência. Pelo contrário, se o devedor tiver meios de cumprir e não o fizer porque não quer, já não há insolvência, bastando ao credor propor uma execução individual da dívida concreta.

Artº8ºnº1/b) – fuga do titular da empresa ou dos titulares dos seus órgãos de gestão, relacionada com a falta de liquidez do devedor ou abandono do estabelecimento em que a empresa tem a sede ou se exerce a sua administração principal. Não pode bastar qualquer ausência, ainda que prolongada, do empresário ou dos representantes da sociedade comercial (ex: doença, greve).

Artº8ºnº1/c) – dissipação ou extravio de bens, constituição fictícia de créditos ou qualquer outro procedimento anómalo que revela o propósito de o ? da empresa a colocar, voluntariamente, em situação de insolvência (o titular arruina a empresa a benefício pessoal).

Como estas provas são inilidíveis, verificados os requisitos do artº8ºnº1 deve-se considerar insolvente a empresa, sem possibilidade de prova em contrário.
O artº6º diz que a empresa insolvente, no caso do artº8ºnº1/a), deve requerer a sua declaração de falência ou optar por um requerimento de uma providência de recuperação e a lei não fala do artº8ºnº1/b) e c) porque nestes casos, ela não está interessada nisso. Logo, a lei achou que só fazia sentido falar nisto no caso do artº8ºnº1/a).
Trata-se de um dever jurídico importante, porque o pedido compete ao titular da empresa ou a um dos seus órgãos para que a empresa seja sujeita à falência ou a um processo de recuperação.
Sempre que se verifique um dos indícios do artº8º ou a empresa esteja numa situação económica difícil, podem também os credores ou o MP pedir que a empresa seja recuperada ou falida. O tribunal poderá, no decurso do processo, declarar oficiosamente a falência de uma empresa – artº 53ºnº1 e 56ºnº4.

Num processo de recuperação ou de falência, quem é que tem o poder essencial para determinar qual o futuro da empresa?
O tipo de processo requerido ao tribunal pelo empresário; depende do juízo que o próprio empresário faça da viabilidade económico-financeira da empresa insolvente. A opção que vier a ser feita pelo requerente não pode porém, determinar o decurso da instância, nem o resultado final.

Os credores têm um papel fundamental na escolha de um processo de recuperação ou falência: por um lado, essa importância resulta da figura da oposição preliminar dos credores- artº23º. A instância surge através da apresentação de um pedido – artº15º e 16º. Uma vez aberta, o juiz deverá pronunciar-se sobre o prosseguimento ou não da acção intentada. A lei permite que antes do despacho judicial, os credores representativos de 51% ou mais dos créditos aprovados, se possam opor ao prosseguimento da acção intentada, substituindo um processo de recuperação por um processo de falência, ou vice-versa.
Mesmo depois daquele despacho judicial, os credores continuam a ter uma possibilidade de intervenção grande, em dois casos:

Artº25ºnº4 – prevê que o juiz possa mandar prosseguir uma acção que foi intentada como de recuperação, como de falência; sempre que os devedores e credores representativos de 30% ou mais dos créditos, deduzam oposição no pedido de recuperação e justifiquem a inviabilidade económica da empresa insolvente. Ou, pelo contrário, que prossiga uma acção que foi intentada como de falência, como de recuperação; sempre que os mesmos deduzam oposição ou aleguem a viabilidade económica da empresa.
O juiz não é obrigado, mas pode fazer isto.

Artº53ºnº2 – prevê a situação específica de convocação de um processo de recuperação em processo de falência, sempre que, tendo a acção sido intentada sob a forma de recuperação, a assembleia de credores nada deliberar nos 6 meses seguintes ao despacho do juiz (favorável, de prosseguimento da acção); ou, antes de esgotado esse prazo de 6 meses, caso os credores representativos de 75% ou mais dos créditos, rejeitarem qualquer meio de recuperação da empresa.
Seis meses foi o prazo que o legislador considerou razoável para os credores dizerem qual o processo de recuperação a adoptar. Se nada dizem nesse prazo – processo de falência. Essa rejeição pode ser feita no âmbito da assembleia de credores ou fora.



3-Processos de recuperação da empresa:

Prevê-se quatro tipos de providências de recuperação:

I. Concordata – artº66º - redução e/ou modificação da totalidade ou de parte dos débitos da empresa, pode ser por exemplo, conceder uma moratória. Esta concordata passa mesmo pela intervenção dos credores, só eles reduzem ou modificam o tipo de débito que a empresa tem. Assim, o seu passivo será inferior, o que é bom para a empresa.
Forma: tem que ser aprovada por credores que representem pelo menos 2/3 do valor de todos os créditos aprovados, e sem o voto contrário de credores que representem 51% ou mais dos créditos atingidos pela providência.
Artº54º/1 – Aplica-se a qualquer processo de recuperação. Depois de homologada judicialmente, impõe-se a todos os credores.

II. Reconstituição empresarial – no DL 315/98 era Acordo de credores. Consiste na constituição por credores ou eventualmente terceiros, de uma ou mais sociedades destinadas à exploração de um ou mais estabelecimentos da empresa devedora – artº78º/1 e 79º/1. A constituição desta nova PC pode provocar a extinção da PC que era titular daquela empresa – artº78º/2. O capital desta nova sociedade será a soma dos créditos dos sócios.
Este meio de recuperação pode ser acusado de inconstitucional porque é uma forma ilícita de expropriação: isto porque neste processo de recuperação, os credores tomam conta da empresa e provocam a extinção da PC.

III. Reestruturação financeira – artº87º. É um meio que consiste na adopção pelos credores de uma ou mais providências destinadas a mudar o passivo da empresa ou alterar o capital, de forma a que o activo da empresa passe a ser superior ao passivo e haja um fundo de maneio positivo. Esta providência visa assegurar liquidez. As várias medidas que os credores podem adoptar são: redução do valor dos débitos da empresa, modificação do prazo de vencimento dos créditos, não vencimento dos juros dos débitos – artº 88º.
Para conseguir crédito, os credores fazem aumentar o capital social, normalmente quem faz isso são os sócios nas sociedades. Assim, neste caso, reduz-se o capital social, para com esse valor, a parte em que reduz o capital, cobre os prejuízos.

IV. Gestão controlada – artº 97º. Consiste num plano de actuação global concertado entre os credores e executado por intermédio de uma nova administração e um regime próprio de fiscalização – toma-se conta da função executiva e fiscalizadora desta sociedade. Cada plano tem uma duração fixa: máximo de 2 anos e o prazo pode ser prorrogado por mais 2 anos- artº 103º. Pode associar-se a outras modalidades relacionadas com a reestruturação financeira. Este plano é delineado pelos credores e vai ser executado por uma nova administração, a administração com funções a correr, a nova está sujeita a uma fiscalização especial.

É à assembleia de credores que cabe optar por uma destas providências – artº 54º. Todas as deliberações da assembleia de credores que tenham por objecto decidir qual a providência de recuperação a adoptar, só podem ser aprovadas se a seu favor votarem 75% ou mais dos credores, ou se contra essa deliberação não votaram 51% ou mais dos créditos que foram directamente atingidos pela providência escolhida.
Se não se puder aplicar estas providências de recuperação porque estas passam pela boa vontade dos credores ----- passa-se a um processo de falência.

4-O processo de falência

A declaração de falência é feita por meio de sentença judicial – artº128º. Uma vez transitada em julgado, esta declaração judicial da falência produz efeitos do ponto de vista dos direitos do falido (da sua posição jurídico-activa) .

A nível dos direitos do falido:
I. de natureza política: restrições após a declaração de falência, o falido perde a sua capacidade eleitoral activa para a AR, perde uma capacidade eleitoral passiva para certos cargos: deputado, P.M., membros dos órgãos das autarquias locais. Não se percebe, porém, a coerência desta discriminação.
II. de natureza social: devendo apresentação ao tribunal – artº 149º. Pode incorrer em responsabilidade penal, se se verificar o crime de insolvência dolosa, da falência não intencional e favorecimento dos credores.
III. de natureza patrimonial: restrições quanto aos negócios do falido – artº 151ºss. Vencem-se de imediato as suas dívidas, encerram as suas contas-correntes, cessação da contagem de juros, extinguem-se os privilégios creditórios públicos, perda do direito de compensação, logo que a falência tenha sido declarada. Os credores do falido não podem compensar um débito com um crédito e vice-versa. Cessam todas as acções executivas individuais, que tenham sido interpostas contra o falido. Não faria sentido que se permitisse a continuação das acções executivas individuais contra o devedor comum dos processos.
Quanto ao património do falido, devem ser tomadas todas as providências necessárias à conservação da massa falida. Esse património deve ser liquidado.


Prática do AC:

O falido fica inibido de dispor e administrar os seus bens: artº 147º - proibição de exercer, directa ou indirectamente, o comércio. É de notar, também a inibição do falido para administrar bens dos menores , só pode administrar os bens do cônjuge, dos filhos ou de terceiros, mediante mandato mercantil.
Assim, o artº 147º/1 diz que o falido está inibido de administrar e dispor dos seus bens: na administração da massa falida, o falido é substituído pelo liquidatário judicial (que guarda, administra e dispõe dos bens que foram ou possam vir a ser apreendidos para a massa falida),está inibido da prática de quaisquer actos de administração e disposição sobre os bens que tenham sido ou possam vir a ser, apreendidos para a massa falida. Mas não se trata de uma inibição absoluta –

Excepções:

I. O falido pode, legalmente, adquirir e dispor dos meios de subsistência, através do seu próprio trabalho (148º/5);
II. O falido pode receber e dispor de alimentos, a título de subsídio (artº 150º);
III. Pode dispor dos seus próprios bens impenhoráveis, salvo se os tenha entrgue voluntariamente, para a massa falida (artº 175º/1);
IV. Pode auxiliar o liquidatário judicial na administração da massa falida (artº134/2).
V.
É este sentido e o alcance da inibição.

Qual a consequência da sua violação (sanção) ?

Artº 155º - os actos que o falido haja praticado, em violação daquela inibição, são ineficazes em relação à massa falida (inoponíveis) independentemente do registo da sentença judicial da declaração de falência e da apreensão dos bens.
Só há uma excepção, se se tratar de negócio que o falido realizou com terceiro de boa fé a título oneroso, a inoponibilidade só se verifica a partir da data do registo da sentença.

Inoponibilidade dos actos significa que os actos do falido que tenham por objecto bens presentes ou futuros, da massa falida, são ineficazes em relação à massa falida, embora sejam válidos inter partes. Produzem efeitos meramente jurídico-obrigacionais, mas não produzem quaisquer outros efeitos relativamente à massa falida.
Assim, um negócio com um terceiro é válido, mas não pode ser cumprido à custa dos bens da massa falida. O terceiro terá que esperar a reabilitação do falido e que este disponha dos bens. Isto, salvo a excepção do artº155º/2: se os actos praticados pelo falido vierem a ser confirmados ou ratificados pelo liquidatário judicial (porque há interesse para a massa falida), os actos produzem todos os seus efeitos, em relação a terceiros e à massa falida.


Natureza jurídica da situação de inibição do falido:

Não parece que estejamos aqui perante uma situação de mera indisponibilidade. Se assim fosse, a sanção dos actos do falido jamais seria a invalidade desses actos. Daria origem a uma mera obrigação de indemnização a cargo do falido. Ora, não é isto que se verifica. Também não parece que se trate de uma mera incapacidade: seria necessário que a sanção dos actos do falido fosse a nulidade. Ora, a lei não prevê a nulidade dos actos do falido, senão em relação à massa falida. Os actos são válidos interpartes, estaríamos perante uma mera ilegitimidade: os bens da massa falida estão sujeitos a interesses alheios ao falido (interesses dos credores) e o falido não seria sujeito da própria relação jurídico-material subjacente a esse mesmo acto – incorrecto:

I. Não é correcto dizer-se que o falido não é sujeito da relação jurídico-material atingida. Pelo contrário, tanto o é, que permanecem válidos e eficazes os efeitos resultantes dessa relação entre o falido e o terceiro;
II. A sanção comum para os casos de ilegitimidade é a nulidade dos actos, e não uma mera invalidade relativa (como a do artº155º).

Assim, a doutrina dominante classifica a situação do falido como uma situação de indisponibilidade. O falido está privado do poder de disposição sobre os bens da massa falida, sendo os seus actos (relativos a esses bens) atingidos por uma ineficácia relativa.
Isto conjuga os vários interesses em jogo:
I. Os interesses da massa falida, porque os interesses dos credores assim o exigem (a inoponibilidade garante que o falido não possa praticar nenhum acto que possa ser eficaz em relação a esses bens da massa falida);
II. Também protege os interesses dos terceiros que hajam entrado em relação com o falido.
Esta inoponibilidade não destrói os efeitos dos compromissos anteriormente assumidos pelo falido. Dois aspectos:
--- os actos do falido podem ser sempre ratificados pelo liquidatário judicial;
--- mesmo que o não sejam, permanecem sempre válidos, até que o falido seja reabilitado para poder cumprir as obrigações assumidas.

Artº 148º - a declaração do falido implica a inibição do falido para o exercício do comércio. Também aqui existem várias teses quanto ao sentido desta proibição.
I. Lisboa: é uma situação de incapacidade. Esta posição é considerada inaceitável na perspectiva da sua conformidade com os próprios dados da lei. Os actos praticados pelo falido (a lei não distingue se civis, se comerciais) padecem apenas de uma ineficácia relativa, e não de uma invalidade absoluta. Logo, não se pode falar aqui de um vício de incapacidade. Há uma desconformidade da tese com a lei. Também não está conforme com o sentido subjacente ao instituto da incapacidade: as incapacidades têm mais a ver com as incapacidades naturais do sujeito incapaz, e têm em vista proteger o incapaz contra os efeitos negativos dos seus actos, para o seu património. Isto não é assim na situação do falido – artº148º: não tem em vista reagir a uma situação de inaptidão, nem proteger o falido, mas sim os interesses dos credores e do comércio.
II. Coimbra: esta proibição tem de entender-se no contexto geral da situação de indisponibilidade do artº147º. Segundo este artº, o falido está agravado com uma inibição que lhe afecta a prática dos actos de administração e disposição dos bens da massa falida, estragando-se actos de qualquer natureza: civil e comercial, e dentro destes últimos, sejam eles praticados de forma esporádica ou profissional.
O que a sanção específica do artº148º vem acrescentar aquela sanção geral é: os actos praticados pelo falido, que se traduzem no exercício profissional do comércio, além de ineficazes, jamais poderão atribuir ao falido que os praticou o estatuto de comerciante para qualquer efeito, devendo-lhe ser recusadas todas as vantagens que desse estatuto ele pudesse tirar, e devendo também ser retiradas todas as condições que permitam a esse mesmo sujeito o exercício do comércio (ex: licenças camarárias, licenças policiais, etc).

Cap. VII-SOCIEDADES COMERCIAIS
Introdução

1-Razões de constituição:empresa societária vs empresa individual

Constitui uma técnica jurídica da organização da empresa.
É habitual ver a sociedade tratada como um contrato, por vezes como organização, sem conceitos jurídicos que reflectem mal a razão da escolha por esta forma de organização da empresa. A empresa juridicamente, pode ser organizada de duas formas:
• Sob a forma de uma empresa individual
• Sob a forma de uma empresa colectiva ou societária

Há razões que explicam a preferência por esta última forma:
A adopção da forma societária visa responder a imperativos financeiros: o desenvolvimento da pequena e média empresa exige recursos financeiros continuados que o empresário em nome individual é incapaz de obter por si só. A sociedade comercial, sobretudo a S.A., detém a reunião de grande dos capitais: concurso das poupanças dos pequenos aforradores.
Mas as razões para que uma empresa individual dê lugar a uma empresa societária, não se ligam apenas ao aspecto financeiro. Também há vantagens jurídicas.

1. Ao nível do regime de responsabilidade: ao passo que no caso da empresa ser explorada por um comerciante em nome individual, esta suporta completamente o risco da exploração individual ( responde com todo o seu património pessoal pelas dívidas), no caso de uma empresa explorada na forma societária ( por quotas, SA ), o mesmo sócio responde limitadamente ( no limite das suas entradas), o risco de exploração da empresa é transladado para os credores. Constituindo a sociedade um ente jurídico dotado de um património autónomo, e respondendo os sócios limitadamente, o empresário encontra na sociedade um instrumento para limitar a sua responsabilidade e transladar o risco de exploração para os credores. O empresário apenas suporta o fardo da falência no limite das suas entradas.

Mas, existem empresas individuais de responsabilidade limitada e há também uma translação do risco de exploração para os credores: EIRL, art. 10º e 11º. É uma empresa em nome individual em que os bens afectos respondem pelas dívidas da empresa (e não por quaisquer outras do seu titular) e pelas dívidas de estabelecimento respondem apenas os bens que estão afectos ( e não quaisquer outros bens). Mas isto também sofre excepções, embora teoricamente consagrado, aquele efeito da limitação de responsabilidade da sociedade em benefício dos sócios, está longe de ser assegurada na prática.
Não é raro ver-se que aqueles que concedem crédito ás sociedades (grandes credores), exijam dos sócios maioritários ou administradores, prestações ou garantias suplementares, sob pena de caução ou fiança.
Por vezes, essas garantias ( aqueles sócios ou administradores garantem com todo o seu património pessoal), respondem não só pelas dívidas da sociedade, mas também pelas dívidas de uma sociedade “filha” ( a quem foi dado crédito). Em caso de falência de uma sociedade que se tenha visto reduzida é importante?.
Ex. só não morreu um sócio, o art.84º do CSC diz que o sócio único poderá responder ilimitadamente pelas dívidas sociais, se se provar que o sócio único não respeitou o princípio da separação patrimonial na gestão de sociedade.
Os administradores e os gerentes de uma sociedade comercial ( titulares dos órgãos de administração de uma sociedade), também poderão responder ilimitadamente quando violam as regras legais ou estatutárias destinadas á protecção do património da sociedade.
Nas sociedades em nome colectivo e em comandita, os sócios respondem ilimitadamente pelas dívidas sociais (embora só subsidiariamente).

2. Dissolução da empresa
Ao passo que o destino da empresa individual está indissoluvelmente ligado ao destino do seu titular ( com a morte do empresário, as mais das vezes há uma extinção da empresa); já a sociedade comercial como que goza de uma imortalidade. Por isso, a lei estabelece: art.15º CSC, se nada no contrato se dispuser em contrário, as sociedades têm uma duração ilimitada.

3. Transmissão: ao passo que a transmissão da empresa individual, não apenas mortis causa, mas também inter vivos ( só pode ser por trespasse); a transmissão da sociedade realiza-se de uma forma simples: a transmissão das partes sociais. Este mecanismo de transmissão tem duas vantagens:
• Permite ao transmissário (adquirente) a aquisição do controlo de uma empresa, sem que para isso tenha de pagar um centavo do que ela vale. No trespasse, até o avimento se paga.
• Ao passo que o trespasse está sujeito a muitas formalidades e é tributado a uma taxa significativa, a transmissão das partes sociais não está sujeita a formalidades especiais e não é tributado.


É de notar, que a escolha entre as várias formas jurídicas de organização da empresa é frequentemente função da política fiscal que é seguida pelo Estado: distribuição dos ónus, benefícios fiscais atribuídos a cada uma das formas das empresas societárias. A grande maioria são hoje exploradas sob a forma de empresas plurisocietárias: grupo de sociedades que conservam a sua personalidade própria, mas estão sujeitas a uma direcção económica comum; empresa mãe e empresas filhas, continua a reflectir uma empresa.

No séc. XVIII a empresa sob a forma individual foi a forma jurídica encontrada pelo direito, para caracterizar a actividade dos agentes económicos.
No séc.XIX- empresa societária
Nos finais do séc.XX-empresa plurisocietária
As diferenças entre a empresa individual e a empresa societária, em termos fiscais, são duas:
• Na empresa em nome individual a totalidade dos lucros realizados é tida como rendimento individual do empresário, tributado em IRS.
• Na empresa societária, os lucros são tributados em IRC, enquanto dividendos distribuídos aos sócios: fenómeno da dupla tributação que aparece, na prática atenuado. Os lucros não distribuídos aos sócios não são tributados; os lucros distribuídos aos sócios dão lugar, a favor da sociedade, a um crédito de imposto ( cerca de 50% do IRC pago). As remunerações dos titulares dos órgãos de administração são dedutíveis.

A empresa plurisocietária ( grupo de sociedades) tem que ser administrada e organizada, mas não existe um código. As práticas financeiras vão hoje no sentido desta organização. Se a grande novidade que a sociedade comercial trouxe foi a limitação da responsabilidade dos sócios, o grupo veio introduzir uma responsabilidade limitada dentro da própria responsabilidade limitada.
O grupo de sociedades é uma espécie de sociedade com uma personalidade jurídica distinta.? Mas, em si, não constitui uma PC, é uma forma de empresa, organizada de uma forma mais sofisticada que a sociedade comercial.

2-FONTES DO DIREITO SOCIETÁRIO PORTUGUÊS

O CSC foi aprovado em 86 e veio a ser alvo de várias alterações, das quais se destacam uma alteração em 87, quando se introduziu um novo título ao Código “Disposições contravencionais”
Estrutura do CSC, dividido em oito partes fundamentais:
• Título I Parte Geral 1º a 147º ( princípios gerais)
• Título II a V quatro tipos de sociedade comercial: SNC, SQ, SA, Scomandita
• Título VI Sociedades coligadas ( relações entre sociedades e grupos de sociedades)
• Título VII Disposições penais e contravencionais
• Título VIII Disposições transitórias

O CSC veio revogar uma legislação marcada pela sua antiguidade e dispersão. O texto do actual código segue de perto o projecto do CSC que foi elaborado pelo Ministério da Justiça ( Dr. Raúl Ventura).
No seu conjunto, a disciplina jurídica introduzida no código caracteriza-se por alguns aspectos fundamentais:

1. Codificação do direito das sociedades comerciais
A regulamentação das sociedades comerciais não tinha autonomia formal. O legislador comunitário vem anualmente, nos direitos comerciais nacionais, elaborar directivas. A maior parte já foi transposta para o direito interno português.

2. Protecção dos credores e dos terceiros em geral.
Vários aspectos. Redução dos casos de nulidade das sociedades comerciais ( hoje são muito poucos), para evitar pôr em causa boa fé de terceiros.
Limitação da doutrina “ ultra vires” ( para além do seu poder), o princípio que hoje vigora no direito português é o da inoponibilidade a terceiros de cláusulas contraditórias. Em muitos países ( Inglaterra), o objecto social definia os limites dos poderes da administração e da capacidade da sociedade. A sociedade não podia praticar actos para além dos seus poderes. Poderia a sociedade opôr aos terceiros a invalidade dessas cláusulas, com base na limitação do objecto.
Hoje a regra é a inoponibilidade.
Certas regras de protecção do capital social e da publicidade.

3. Interesse dos sócios minoritários e do próprio sócio individual
Lavra um reforço da tutela da minoria; foram atribuídos direitos de informação e de fiscalização da actividade da sociedade

4. Reforço das disposições penais e contravencionais, que é importante na prática das sociedades comerciais.

5. Flexibilização das estruturas organizativas
Modelos organizativos alternativos aos modelos tradicionais ( mais elaborados)

Hoje, no domínio das sociedades comerciais é difícil conhecer o direito português sem conhecer o que a legislação comunitária está a fazer neste domínio. Assim, há directivas sobre: constituição da sociedade, capital social ( sua protecção), cisões de sociedades, fiscalização de sociedades, participação dos trabalhadores na sociedade, fusões, operações bancárias das sociedades, sociedade unipessoal.
O DL das sociedades unipessoais como o EIRL foi-nos imposto pela UE. O DL 257/96 de 3 de Dez. introduziu a sociedade unipessoal por quadros, só há um sócio, 270º A e ss.

NB: A separação patrimonial dos responsáveis nem sempre é respeitada. Há poucos mecanismos para fiscalizar sobre esta separação patrimonial. A jurisprudência estrangeira tem defendido que sempre que a sociedade não pode continuar a sua função e se percebe que os sócios não respeitaram a separação patrimonial, o juíz decidiria que não há motivos para respeitar a separação patrimonial quando os próprios sócios não a respeitaram.
É o juíz que vai decidir se os sócios são chamados a responder. Isto é uma situação lícita, mas a nossa jurisprudência por vezes já a defende. A tendência é cada vez mais para ter cuidado com os sócios, mas o nosso CSC ainda não foi tão longe quanto o desejável, porque ainda não há tutela para certas situações, o juiz é que pode fazê-lo.

1-O conceito da sociedade comercial

1.1-NATUREZA JURÍDICA DAS SOCIEDADES COMERCIAIS

Tradicionalmente a sociedade comercial tem sido entendida como um fenómeno jurídico a meio caminho entre o contrato (negócio jurídico bilateral ou multilateral com um objecto que se diferencia dos restantes) e a organização ( negócio jurídico que dá origem a um novo sujeito de direitos, uma nova pessoa jurídica, com personalidade jurídica própria e distinta das pessoas que constituem a organização).
Segundo o art.980º e ss do CC, a lei portuguesa clarifica a sociedade como um contrato, “ contrato de sociedade”, também nos arts.7º e ss tem o capítulo “ contrato de sociedade”. Esse contrato dá origem a uma pessoa jurídica autónoma dos sócios que celebram o acto, sujeito a uma disciplina própria e imperativa.
Esta natureza associativa resulta dos artigos 157º e ss do CC, aplica as regras das pessoas colectivas ás sociedades, e a regulamentação do CSC.
Esta natureza híbrida é uma característica que atravessa de ponta a ponta a história das sociedades. No direito romano, o conceito de sociedade era o de simples negócio jurídico, pelo qual duas ou mais pessoas constituíam um fundo comum, com vista ao desenvolvimento de uma actividade. Só no séc. XIX, com a invasão da PC, a sociedade passou a ter elementos organizacionais.

2-O conceito da sociedade comercial e os seus elementos definidores

2.1 Elementos Gerais: o conceito geral de sociedade do art.980cc

O art.1º n 2 CSC, o legislador fala em “ prática de actos de comercio” e “ que adoptem uma certa forma”, ou seja, não nos diz o que é uma sociedade, remetendo para a noção geral de sociedade do art.980º do CC. Da conjugação destas duas normas, resulta que o conceito de sociedade comercial tem elementos gerais e específicos.

1.Gerais
Constituindo a sociedade comercial uma espécie do género geral “ sociedade”, tal como está regulada no direito civil, é natural que faça apelo aos elementos definidores gerais de sociedade, que são de três ordens: pessoal, patrimonial ( bens ou serviços) e causal.
Dentro deste último temos:
• O fim imediato- exercício de uma certa actividade económica que não seja de mera fruição.Mas não é este o fim último que as partes visam;
• O fim mediato- o fim último é a repartição dos lucros resultantes dessa actividade.

Elementos especificos o art.1º n2 do CSC

São os que a lei comercial acrescenta á lei civil, que individualizam e distinguem a sociedade comercial.

1 –Relativo ao objecto da Sociedade : uma Sociedade para ser comercial, nasce para a prática de actos de comércio; 2 - Um relativo à forma da Sociedade : a adopção dos tipos legais referidos na lei :  quatro tipos

Substrato pessoal da Sociedade : o Art.º 980 C.Civ. define Sociedade como " contrato pelo qual duas ou mais pessoas ", a Sociedade é definida por um lado, como negócio jurídico e por outro lado, como um negócio jurídico bilateral ou plurilateral. Este elemento sofre hoje várias excepções :
1 - Caracteristícas do negócio jurídico : hoje está em crise a concepção de sociedade como um puro produto de autonomia das partes, hoje há sociedades que não são produto da vontade das partes, hoje há muitas sociedades criadas por D.L., por exemplo Sociedades de capitais públicos, IPG. Mais importante é a progressiva desvalorização da autonomia privada na constituição das Sociedades. Uma das linhas de força do direito contemporâneo, tem sido a substituição de um direito dispositivo por um direito de natureza imperativa - o direito das Sociedades impõe-se à vontade das partes. O relevo da vontade dos sócios, está hoje confinado quase ao momento da constituição das Sociedades. Isto vê-se em vários aspectos :
* os sócios estão obrigados a adoptar um dos tipos legais de Sociedade previstos na lei. Art.º 1.º do C.S.C. Não podem criar tipos atípicos
* a liberdade de modificação dos tipos legais está hoje muito limitada aos sócios, o que limita a sua possibilidade de alterar os estatutos.

Hoje, a lei regula cada tipo de Sociedade comercial, como tipos legais que constituem modelos pré-estabelecidos para o nascimento, a vida e a morte de uma Sociedade Comercial. Aos sócios é só permitido afastar-se desse modelo em certos ponto quase de natureza secundária. Tudo isto explica-se pela necessidade de proteger os sócios minoritários, os credores sociais e o público em geral. Este primeiro aspecto de negócio jurídico encontra-se pois, um bocado em crise.

2 - Bilateralidade ou plurilateralidade, este aspecto também está em crise. A lei define taxativamente " um contrato pelo qual duas ou mais pessoas "
Antes do C.S.C., era doutrina pacífica que a constituição de uma Sociedade exigia, pelo menos a intervenção de duas pessoas. A Sociedade unipessoal era algo inconcebível. Se a Sociedade é um contrato, a intervenção de duas pessoas é exigida. Se a Sociedade é uma PC, tem que haver um aglomerado de pessoas, pelo menos na sua constituição. Ora, não se pode considerar pacífica esta noção de Sociedade como um contrato. É certo que a lei comercial vem reafirmar a regra geral ( princípio contratualista ) ao dizer que o número mínimo de partes do contrato de Sociedade é de duas. Há até Sociedades que exigem um numero mínimo  SA Art.º 273.º número mínimo de cinco sócios. Mas a lei veio mesmo passar a admitir que a Sociedade possa ter a sua origem num negócio jurídico unilateral - Art.º 7.º n.º 2. " excepto quando a lei permite que a Sociedade seja constituida por uma só pessoa " no Art.º 488 C.S.C. a lei preve a figura da Sociedade unipessoal. Permite que uma SA possa ser constituída ab initio por uma outra sociedade que terá a totalidade do capital. exp. caso das filiais a 100 %, são filiais que logo na sua constituição são dominadas a 100 % pela sociedade criadora; a constituição da sociedade por cisão ( cisão - constituição ou cisão - simples ) Art.º 118 .º C.S.C.; constituição da sociedade por transformação novatória Art.º 130.º C.S.C..
Isto está relacionado com a problemática da sociedade unipessoal. A sociedade unipessoal veio adquirindo progressivamente forma legal. A doutrina tradicional, assente no paradigma contratualista recusava a possibilidade de uma sociedade poder nascer e viver com menos de duas pessoas ( sempre recusou a possibilidade das sociedades unipessoais originárias e supervenientes ) . A situação alterou-se e em meados dos anos 40 começou-se a admitir entre nós a possibilidade das sociedades que se constituíram com dois ou mais sócios, poderem subsistir mesmo após verem as suas partes reduzidas a não mais de um único sócio ( sobrevivência das sociedades unipessoais supervenientes ) o que não se admitia era que uma sociedade unipessoal se pudesse constituir logo à partida por uma só pessoa. Hoje a unipessoalidade admitida é não só superveniente mas também originária. A razão está com o legislador. Isto vem demonstrar o que alguns vêm a defender : a sociedade comercial não é um contrato, não é uma pessoa colectiva, é sobretudo uma técnica jurídica da organização da actividade da empresa ( alternativa às existentes ). À luz desta concepção, passa a admitir-se que existem não só sociedades pluripessoais mas também unipessoais. A sociedade unipessoal é hoje consagrada por quase todas as legislações europeias. A atribuição e a proposta da unipessoalidade ( originária ) verifica-se mais no domínio das pessoas colectivas do que no domínio das pessoas singulares. Há ainda quem defenda no nosso direito que o paradigma contratualista continua a ser o principal, mas não é esse o caminho.

Elemento patrimonial - supõe a formação de um substracto patrimonial. o Art.º 980.º fala em " se obrigam a contribuir com bens ou serviços ". Esta obrigação é designada por obrigação de entrada. A entrada é uma obrigação imperativa que existe a cargo de todo e qualquer sócio e pode consistir em bens de vária ordem ( dinheiro, coisas, serviços ) em contrapartida do qual o sócio recebe as partes sociais ( acções, quotas, partes ).
Constitui uma obrigação imperativa : sem as entradas torna-se impossível reunir aquela base patrimonial, sem a qual a sociedade não pode iniciar a sua actividade. Sem entrada não há sociedade. A não realização das entradas ( ou a não realização tempestiva ou a realização fictícia das entradas ) acarreta a nulidade da sociedade.
Verifica-se a nulidade da sociedade sempre que o sócio entra para a sociedade com um bem de que não é proprietário, sempre que a disposição do bem esteja dependente da autorização de um terceiro; sempre que entra com um bem cujo passivo é superior ao activo, exp. um EIRL ; se o bem é contrário à lei ou à ordem pública exp. entra com uma promessa de apoio político.
As entradas podem consistir em :

1 - prestações pecuniárias : dinheiro
2 - prestações em espécie : a lei impõe que esses bens ( imóveis ou móveis ) sejam descritos no próprio contrato social por forma a determinar a sua natureza e o seu valor. Esses bens têm que ser susceptiveis de penhora ( não podem ser bens relativa ou absolutamente impenhoráveis ). Os bens tanto podem ser transmitidos à sociedade pelo sócio , em propriedade como a qualquer outro título : usufruto, outro direito real menor, empréstimo, cessão de exploração.
3 - prestação de serviços : sempre que a entrada de um sócio consiste em serviços ele designa-se por sócio da indústria. Estes só são admissíveis nas sociedades em nome colectivo e nas sociedades em comandita. Não é admissível que o sócio de uma sociedade por quotas ou de uma sociedade anónima entre para a sociedade com serviços.

Momento da realização das entradas

1.- Sociedades civis : as entradas dos sócios não tem que ser obrigatoriamente realizadas no momento da constituição da sociedade. Podem ser realizadas antes, no momento ou após a constituição.
2.- Sociedades comerciais : à que distinguir consoante o tipo de entrada : as entradas em dinheiro podem ser diferidas para um momento posterior à conclusão do contrato; as entradas em espécie têm de ser realizadas antes ou até ao momento da celebração do contrato de sociedade.

N.B. O diferimento das entradas em dinheiro só é permitido para uma certa parte das entradas, com limites temporais : Art.os 26.º, 202.º, 203.º e 277.º

Efeitos das entradas

I. Em face da sociedade : a entrada constitui o limite das obrigações dos sócios. Logo que o sócio realiza a entrada, não pode ser obrigado a realizar qualquer outra prestação durante a vida da sociedade. Mesmo que a sociedade venha a aumentar o seu capital, o sócio não está obrigado a subscrever. Excepções : o contrato pode prever obrigações acessórias ou prestações suplementares de capital mas aqui o próprio sócio assumiu essas obrigações.

II. Em face de terceiros : a entrada já não limita necessariamente as obrigações dos sócios. À que distinguir os tipos legais de sociedades. Os tipos legais em que a entrada limita totalmente a responsabilidade dos sócios, nas SA os sócios respondem apenas no limite das suas entradas. Noutros tipos legais a entrada dos sócios limita, não totalmente mas significativamente as suas obrigações, nas sociedades por quotas o sócio goza de uma responsabilidade sui generis, responde pelo valor da sua entrada mas ainda pelo valor das entradas dos outros sócios que não foram cumpridas : o sócio responde pela integração do capital social. Há sociedades onde as entradas não limitam de todo em todo a responsabilidade dos sócios ( sociedades em nome colectivo, em comandita simples : os sócios respondem ilimitadamente, embora subsidiariamente pelas dívidas da sociedade )


3. Elemento causal : o Art.º 980.º determina que no âmbito de uma sociedade os sócios exercem em comum uma certa actividade económica que não seja de mera fruição, com vista à repartição dos lucros daí resultantes. Este é o elemento causal do contrato de sociedade. Dentro deste elemento, à que distinguir :
causa imediata : o exercício em comum de uma certa actividade económica que não seja de mera fruição.
causa mediata : realização e distribuição de lucros ( que é aquilo que na realidade as partes querem).

Causa imediata : " actividade económica " advém da tradição dos países latinos, no nosso direito delimita a figura das sociedades da figura das associações pela natureza do objecto que essas pessoas colectivas desenvolvem. As sociedades são pessoas colectivas cujo objecto consiste numa actividade económica. As associações são colectividade que levam a cabo actividades de qualquer outra natureza, ou seja, de natureza ideal : creativa, cientifica, religiosa. A linha de fronteira entre uma actividade económica e não económica é difícil delimitar. Assim como é difícil saber se uma colectividade que desempenha simultaneamente actividades económicas e não económicas, é ou não uma sociedade. Para a existência de uma sociedade não é suficiente o propósito dos sócios exercerem uma qualquer actividade económica em geral, sendo necessário uma concretização ?

O artº 11 do C.S.C estatui que deverão ser indicadas no contrato de sociedade ,as actividades que em concreto os sócios se propõem desenvolver .São por isso nulas as cláusulas do pacto de sociedade que fixam o seu objecto em termos genéricos.

“Exercício em comum dessa actividade”: A actividade económica tem que ser exercida em comum. Qual o sentido útil desta exigência? O sentido útil é indicar que a actividade deve ser exercida de forma a garantir que todos os sócios possam directa ou indirectamente intervir no governo social.
Este elemento permite fazer linha de fronteira entre a sociedade por um lado e o consórcio e associação em participação por outro .O consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas se obrigam a realizar uma certa actividade ,tal como na sociedade, mas de uma forma concertada Ao passo que na sociedade as partes se vinculam a exercer essa actividade de forma comum., no consórcio as partes levam a cabo a sua actividade especifica, em colaboração com outras pessoas mas não de forma comum. O objecto do consórcio é limitado aos casos taxativamente previstos na lei. Pelo contrário, o objecto da sociedade é aberto(não há principio da taxatividade).Na sociedade é imperativa a existência de um fundo patrimonial comum. No consórcio a formação de um fundo deste tipo está vedada.
A associação em participação é um contrato através do qual uma pessoa se associa a actividade económica exercida por outra pessoa, ficando a 1ª a participar nos lucros e nas perdas resultantes dessa actividade. A associação em participação reflecte uma mera figura do financiamento- permite aos empresários atrair novos meios financeiros, sem por em risco o controlo e gestão da sua empresa. O associado é um mero fornecedor de capitais não interferindo na actividade empresarial .N associação em participação não há o elemento do exercício em comum da actividade que caracteriza a sociedade .As formas e graus de participação dos sócios nessa actividade comum variam consoante a natureza civil ou comercial da sociedade, e dentro desta consoante o tipo de actividade em que estejamos.
Em certos tipos de sociedades, nomeadamente na S.A, o sentido originário do exercício comum dessa actividade perdeu-se um pouco: Os sócios das S.A não detém quaisquer prerrogativas em matéria de gestão, tem apenas o direito de intervir sobre matérias fundamentais das sociedades(dissolução ou fusão da sociedade) e não sobre matérias de gestão corrente. Pode dizer-se para contrapor que são os sócios que elegem os gestores, mas nem sempre isso se verifica. Pode ser que a S.A tenha adoptado uma estrutura complexa e nesse caso é o Conselho Geral que elege os membros da direcção. A Assembleia Geral elege o Conselho Geral e este elege a direcção; e também temos o revisor oficial de contas(R.O.C).Nestes caso os sócios só podem eleger os membros do Conselho Geral e este elege os membros da direcção.
“Actividade que não seja de mera fruição” A actividade desenvolvida não pode ser de mera fruição. Este aspecto permite distinguir a figura da sociedade da figura da comunhão e da compropriedade.
A comunhão reflecte uma situação estática, de mero desfrute das coisas postas em comum exp:.2 indivíduos herdam um pomar e vendem os frutos desse pomar, o mesmo se passa se herdarem um estabelecimento comercial. Nestes casos os indivíduos limitam-se a percepção da utilidade normal das coisas postas em comum.
Na sociedade a actividade económica corresponde a uma situação não estática mas dinâmica de produção de novas utilidades ou exploração activa de coisas comuns .Exp :se os herdeiros resolvem explorar directamente o estabelecimento comercial que herdaram. Via de regra a sociedade implica uma actividade que consiste no processo de produção ou distribuição de bens ou serviços. O carácter dinâmico da actividade de uma sociedade não significa que ela tenha que estar em actividade permanente.
A inactividade de uma sociedade só será causa de dissolução dessa sociedade em certos casos e essa dissolução tem que ser jurídica e diferida. Exemplo prático deste tipo de situações são as sociedades dormentes ,que com vista a ultrapassar os obstáculos burocráticos que a constituição de uma sociedade implica, ficam “na prateleira” A espera da oportunidade do negócio.
Em matéria de disposição das quotas-partes do fundo comum: o comproprietário pode dispor da sua quota-parte se o consentimento dos restantes. Já o sócio de uma sociedade não pode dispor da sua quota social sem o consentimento dos restantes.
Em matéria de disposição do próprio fundo patrimonial comum: o comproprietário pode exigir a divisão da coisa comum e não pode convencionar-se a indivisão por prazo superior a 5 anos. Relativamente aos sócios a dissolução só pode ser deliberada pelo conjunto dos sócios e requer naturalmente uma maioria qualificada.
Em matéria de autonomia jurídica desse fundo patrimonial comum: na compropriedade não há qualquer autonomia patrimonial: as quotas dos comproprietários respondem por quaisquer dividas dos seus proprietários. A sociedade goza de autonomia patrimonial: os bens postos em comum apenas respondem pelas dividas da sociedade e não pelas dividas pessoais dos sócios.
Causa Mediata é a obtenção e repartição dos lucros. Este elemento do conceito de sociedade comercial explica que não sejam consideradas sociedades todas aquelas entidades associativas cujos associados visam realizar vantagens económicas de outra ordem que não lucrativas. exp: cooperativas de consumo A.C.E’S. As cooperativas de consumo são entidades cuja actividade consiste na revenda aos membros da cooperativa ,dos bens adquiridos ao grossista ou ao produtor. ,por um preço que engloba o preço de custo, mais as despesas mínimas de transacção.
Estas cooperativas não visam realizar o lucro, o que elas visam é permitir realizar aos membros da cooperativa um fundo patrimonial no seu património pessoal. As A..C.E’s são pessoas colectivas que reúnem um conjunto de empresários.(individuais ou colectivos) e que visa proporcionar aos membros agrupados uma maior rentabilidade individual. as respectivas empresas. Não se visa a realização de lucro mas permitir a cada uma das empresas agrupadas ,a realização de um fundo patrimonial no respectivo património.
A extensão deste requisito legal(realização e distribuição de lucro) do conceito de sociedade ao domínio das sociedades comerciais tem sido alvo de várias criticas na doutrina.
Dever-se-ia adoptar um conceito amplo de sociedade, qualificando como sociedade aquelas entidades que tem não um escopo lucrativo, mas um qualquer escopo económico(mesmo que não lucrativo)Esta tese foi defendida por Ferrer Correia.
Mas foi o próprio legislador das sociedades que determinou que estas tem que ter um lucro distribuivel. Por outro lado, as cooperativas e A.C.E’s sui generis, reguladas em diploma especifico e que o legislador afastou do domínio das sociedades comerciais.
As cooperativas estavam reguladas no C.S.C como sociedades comerciais. Hoje estão num diploma especifico, em cujo preambulo se decretou que não tem natureza de uma verdadeira sociedade comercial. .As cooperativas nem sempre se propõem desenvolver uma actividade económica mas sim a prover a necessidades sociais ou culturais. Mesmo naqueles casos em que a cooperativa se propõe desenvolver uma actividade económica, não se pode afirmar um escopo lucrativo mas um escopo materialista.
É certo que há determinadas cooperativas que exercem uma actividade económica com a finalidade de realizar lucro ou com a finalidade de provocar algum incremento patrimonial favorável aos respectivos sócios ex. cooperativas de pesca de artesanato etc.
Há também A.C.E’s que sã entidades constituídas por empresas, para melhorar as condições de exploração dessas empresas agrupadas ex. há um conjunto de empresas transformadoras de minério que podem formar 1 A C.E .para criar uma rede de transportes para a matéria-prima a qual é utilizada por todas as empresas associadas do grupo. Excepcionalmente, os diplomas permitem que uma AC.E tenha por fim a realização e partilha de lucros, mas esta é uma situação marginal e que só pode ter lugar quando se verificarem condições muito especiais.
Outra critica dirigida a este requisito legal(realização e distribuição do lucro),diz respeito a´ desvalorização do escopo lucrativo na prática das sociedades, seja quanto a repartição de lucros seja quanto a sua transferencia para o património dos sócios

.Há duas espécies de lucros:

I. Lucros Periódicos, registados no final de cada exercício social(ano);
II. Lucros Finais, saldo de liquidação que cabe a cada sócio quando a sociedade se dissolve.
Qualquer destes tipos de lucros se comporta de maneira estranha. Quanto aos lucros periódicos tendem a ser subtraídos a distribuição dos sócios , ou por motivos de ordem contabilistica ou por motivos de ordem financeira. ou até por motivos fiscais para evitar a dupla tributação. Quanto aos lucros finais dificilmente entrarão nas expectativas dos sócios porque as sociedades possuem uma duração superior a do respectivo substracto social.
É preciso ter em conta que o escopo lucrativo das sociedades tende hoje a ser substituído por um outro escopo a que a lei não dá relevo, mas que na prática é a finalidade que leva o sócio a participar na sociedade: a concentração do poder económico-financeiro. Particularmente a sociedade anónima e se, deixou de constituir um fim em si mesma e passou mais a ser um meio para estas organizarem o controlo económico.
Começou a verificar-se que em termos sociológicos , os sócios de uma sociedade não são todos do mesmo tipo:
I. Há sociedades investidoras(aforradoras) , que entram para a sociedade para rentabilizar o capital que investiram.
II. Há também sociedades controladoras , que investem o capital na sociedade para adquirir o controlo dessa sociedade. Para estes sócios a sociedade não é vista como um fim em si mesmo mas como um meio para atingir outros fins , nomeadamente para atingir fins meramente organizacionais. Assim constituem uma rede de sociedades submetidas a um controlo único.
Isto não quer dizer que o escopo lucrativo tenha desaparecido. Ele continua a existir mas sob outras formas. Assim por exp. , os lucros periódicos não chegam as mãos dos sócios porque não são distribuídos. Mas mesmo os lucros não distribuídos podem de alguma maneira incrementar os patrimónios pessoais dos sócios. Por exp. , se o lucro não distribuído é investido na própria sociedade, isso origina um aumento do valor do capital da sociedade e por isso permite aos sócios um ganho indirecto (aumento do valor das partes sociais dos sócios , que se torna directo com a transacção das partes sociais. Por outro lado pode suceder que os lucros não distribuídos venham a ser incorporados na própria sociedade , mas no capital da própria sociedade , ou seja ,a sociedade aumenta o seu capital , os sócios detentores das várias fracções de capital vêem as suas participações sociais aumentadas proporcionalmente ao aumento de capital realizado.
Conclusão: o escopo lucrativo tradicional não é totalmente incompatível com a não distribuição de lucros.
Ultima nota: a actividade social , se bem que vise o lucro , pode resultar em perdas que absorvam o fundo patrimonial comum ( os sócios não podem recuperar as suas entradas).As perdas podem mesmo ultrapassar este fundo patrimonial comum- os sócios passam a responder pessoalmente pelas dividas da sociedade. Aqui o risco é o outro lado do lucro ( lucro risco ).

-Elementos específicos
Os elementos específicos do conceito de sociedade comercial , são aqueles que a lei comercial acrescenta a lei civil. São dois os elementos específicos:

1-Elemento substancial: diz respeito ao objecto da sociedade comercial. Tal como acontecia no direito anterior , para que uma sociedade seja comercial , exige-se que ela tenha como objecto a prática de actos de comércio artº1 nº2 C.S.C. Houve no direito português uma proposta de acordo com a qual a comercialidade de uma sociedade dependeria apenas da adopção pela sociedade de uma das formas previstas na lei, independentemente do seu objecto .A averiguação do objecto de uma sociedade faz-se por referencia ao seu objecto estatutário , não se faz por referencia ao seu objecto real. Para que uma sociedade seja comercial , basta que estejam referidas no seu objecto estatutário um conjunto de actividades económicas que lhe conferem natureza comercial .A exigência da prática de actos de comércio não significa que não sejam admitidas sociedades comerciais com um objecto misto.( Actos de comércio e actos civis).o que se tem que analisar é a própria especialidade do fim artº160 C.Civ. e6º C.S.C. Uma sociedade civil poderá praticar actos de comércio sempre que isso resulte dos seus fins estatutários mesmo acontece com as sociedades comerciais que poderão eventualmente praticar actos civis sempre que isso resulte dos seus fins estatutários.
Questão: será possível a constituição de uma sociedade comercial para a prática de um só acto de comércio? No artº 104 do C.com. admitia-se isso. Hoje a lei das sociedades comerciais utiliza a expressão “actos de comércio” no plural. Tem-se entendido que não se alterou o direito anterior. Exp: vários indivíduos associam-se para concorrer a 1OPA sobre as acções de outra sociedade.

2-Elemento formal: forma ou tipo de sociedade. Refere-se a forma que a sociedade adopta. Só será comercial a sociedade que adopta um dos 4 tipos sociais ai referidos:artº1 nº2 C.S.C. No direito anterior levantavam-se duvidas quanto a questão de saber se são ou não comerciais um certo tipo de sociedades:artº1 nº4-Sociedades civis em forma comercial. São sociedades que embora explorando um objecto civil, são empresas com uma dimensão negocial e onde faz sentido recorrer a este tipo de organização juridica. Essas sociedades estão sujeitas a lei societária
.A questão que se colocava antes era saber se estando estas sociedades sujeitas as normas das sociedades comerciais, serão-lhes aplicáveis as normas da falencia? As duvidas surgiram quando surgiu o código da falência .Um argumento para aquela posição anterior: Houve uma proposta de que uma sociedade seria considerada comercial apenas pela sua forma.( comercial ).Esta proposta não foi adoptada. Então é porque o legislador quis considerar civis estas sociedades. Todo este raciocínio desaparece com a entrada em vigor do código das falências , que vem tomar como sujeito dos processos a empresa. Passaram também a estar potencialmente abrangidas as sociedades civis em forma comercial , desde que tenham subjacente uma organização de factores produtivos: empresa.

3-Tipos de sociedades : Class. Legais e doutrinais

3.1-Em matéria de sociedades vigora o principio da tipicidade “numerus clausus”. Só se podem constituir sociedades comerciais que adoptem um dos tipos taxativamente previstos na lei Não se podem adoptar tipos atipicos , não previstos.; nem tipos mistos, que resultam da combinação dos tipos legais existentes. – artº1 nº2 C.S.C.
O principio da tipicidade que vem restringir o principio geral do artº405 C.Civ. manifesta-se :
-No momento da escolha do tipo: as partes são livres apenas de optar por uma das modalidades do elenco restrito previsto na lei. , e mesmo assim nem sempre Há diplomas que exigem que certas sociedades sejam constituídas num modelo determinado. Exp: em S.A , em sociedades por quotas , em sociedades de património.
No momento da conformação do tipo legal: os tipos legais constituem modelos pré-estabelecidos para se organizar o nascimento , a vida , e a morte da sociedade comercial Contém normas sobre a constituição , a administração , o financiamento , a fiscalização ,etc. Estes tipos oferecem alguma margem de manobra as partes., que poderão conformar o modelo nos estatutos da sociedade., mas essa margem de manobra é limitada. As normas cada vez mais se impõe as partes. E cada vez menos podem ser afastadas.

Fundamento do principio da tipicidade: tem que ver com a segurança do trafico jurídico. E importante garantir aos terceiros que negoceiam com a sociedade, saber quais são as características integrais do modelo adoptado pela empresa com quem negociou., porque é difícil saber quais são os estatutos concretos dessa empresa assim como isso não lhes será exigível.
Dentro dos tipos há duas classificações:

3.2-Tipos Legais.
Podemos distinguir:
a- Os que tem uma vocação geral-tipos legais comuns
b-Os que correspondem a sociedades especiais- visa responder a necessidades concretas , com normas especificas :Tipos especiais- tipos de sociedade previstos na lei e que tem uma regulamentação especifica e divergente da contida no C.S.C., porque visam regular sociedades que tem um objecto especifico ou uma necessidade de regulação especifica.
3.2.1-São 4 os tipos legais comuns:
-S.N.C:175º a 196º
-S.Q:197º a 270º
-S.A:271º a 464º
-S.C:465º a 490º
Semelhanças :Todos estes tipos correspondem a pessoas colectivas , todos são comerciantes , todos devem possuir uma firma. Que tem que conter um aditamento relativo ao respectivo tipo.
Diferenças:

I. de ordem formal -tem que ver com a regulamentação em si mesmo. As S.N.C e S.C são reguladas por poucas normas. As S.Q são reguladas com mais minúcia e as S.A são o tipo mais complexo.;

II. de ordem substancial:


1-Quanto ao regime de responsabilidade dos sócios: Nas S.N.C ,os sócios possuem uma responsabilidade pessoal , ilimitada , solidária e subsidiária pelas obrigações sociais. O sócio responde até ao montante da sua entrada , subsidiariamente face a sociedade.(os credores sociais só podem agredir o património dos sócios ,depois de executado o património social se houver ainda obrigações), e solidariamente com os outros sócios –uma vez executado o património social e subsistindo obrigações sociais , os credores sociais podem exigir integralmente a divida a qualquer um dos sócios. Esta autonomia patrimonial é imperfeita.: os bens da sociedade respondem apenas pelas dividas da sociedade, mas pelas dividas da sociedade não respondem apenas os bens sociais., também podem responder os bens dos sócios. Isto abrange também os sócios de industria Estes podem responder nas relações externas ; um credor social pode agredir directamente o património pessoal do sócio de industria , o que ele terá é, no plano da sociedade um direito de regresso entre os restantes sócios.
Nas S.Q , o sócio tem uma responsabilidade Solidária pela realização integral do capital social. Cada sócio além de responder pela sua entrada individual ( pelo valor da sua quota) responde ainda pelo cumprimento das entradas dos outros sócios, que não tenham sido realizadas.( que não tenham sido tempestivamente realizadas),solidariamente E uma responsabilidade limitada e indirecta. Para com a própria sociedade –os credores não podem agredir directamente o património da sociedade.
Esta é a responsabilidade legal mas isto não impede que um sócio possa assumir , por via negocial responsabilidades acrescidas. quer uma responsabilidade pessoal pelas obrigações sociais , quer a realização de prestações suplementares de capital.. Um sócio pode obrigar-se a uma responsabilidade pessoal e directa perante os credores sociais, até um dado montante.(1989). Pode assumir a posição de um sócio em nome colectivo, com uma diferença: desde que se estabeleça no contrato o montante máximo dessa responsabilidade. O sócio pode também assumir uma obrigação de prestação suplementar de capital -visam fazer face a situações de descapitalização ou dificuldades financeiras.
Nas S.A , o sócio (accionista) tem uma responsabilidade limitada ao montante da sua entrada individual. Neste tipo de sociedade cada sócio apenas responde pelo valor da sua parte social , podendo por todo o restante património pessoal a salvo da agressão dos credores sociais.
Mas, perante o silêncio da lei, parece que não será lícito essa irresponsabilidade por via negocial. Às SQ e SA corresponde uma autonomia patrimonial perfeita: os bens da sociedade respondem pelas dívidas da sociedade e, pelas dívidas da sociedade respondem os bens da sociedade.

Nas SC existem 2 regimes de responsabilidade:
Há 2 categorias de sócios;
1) Comanditados: têm uma responsabilidade ilimitada, estão na situação semelhante à de um sócio de uma sociedade em nome colectivo;
2) Comanditário: têm uma responsabilidade limitada ao valor da sua entrada individual à semelhança de um accionista de uma SA.

2) Qto ao capital e participações sociais
Nas SNC: têm o seu capital social dividido em partes sociais. A lei não fixou um valor mínimo, seja para o capital seja para as partes e podem ter uma valor qq.
A contrapartida da subscrição das partes pode consistir em bens, dinheiro ou serviços, podendo ser desiguais , mas não podem ser representadas em títulos de crédito (documento).
As partes só podem ser transmitidas inter vivos por escritura pública e requer-se o consentimento expresso dos restantes sócios porque é importante para estes, saberem quem são os seus novos consócios (resp. ilimitada).
Nas SQ: têm quem que ter um capital mínimo de 5000 euros (art. 201º).
As fracções aqui tomam o nome de quotas.
As quotas têm obrigatoriamente de resultar da entradas realizadas em bens, dinheiro ou em serviços.
As quotas podem ter um valor desigual, mas têm de ter um valor mínimo, não podem ter valor inferior a “X” euros e também não podem ser representadas por títulos.
A sua transmissão também está sujeita a regras especiais: só podem ser transmitidas inter vivos por escritura pública e só é preciso o consentimento da Assembleia dos Sócios - bastará que a maioria dos sócios vote a favor da cessão.
Nas SA: têm o capital dividido em acções.
Quer o capital quer as acções têm de ter um capital mínimo: Capital - 50.000 euros; Acções - 1.000$00.
Como acontece nas SQ, as entradas devem sempre consistir em bens ($ ou prestações em espécie), mas não em prestação de serviços.
As acções têm de ter entre si um valor nominal idêntico e todas elas têm de estar representadas em títulos. Excepção: surgiram as acções escriturárias as quais não são representadas em títulos.
Na transmissão vigora o princº da livre transmissibilidade das acções, o qual só pode sofrer desvios em situações excepcionais.
Nas Soc. em Comandita o capital não está dividido em partes (sociedades em comandita simples) ou em acções (sociedades em comandita por acções).

3) Diferenças quanto á organização (estrutura organizatória):
Há, antes de mais, uma semelhança: todos os tipos legais possuem uma estrutura organizatória interna semelhante a um Estado democrático - uma repartição dos poderes deliberativos (Conselho Geral), executivos (Conselho de Administração ou Direcção nas SA , Gerência nas SQ e SNC) e fiscalizadores (Conselho Fiscal e Revisores Oficiais de Contas nas SNC).
Diferenças: As SNC possuem uma estrutura organizatória interna muito primária ou simplificada.
Os sócios têm um papel fundamental e exclusivo: a eles competem as funções deliberativas - Conselho geral e executivas, salvo estipulação em contrário. O art. 191º diz que “todos os sócios são gerentes e, todos os gerentes têm que ser sócios, não podendo ser escolhido entre terceiros”.
Cabe ainda na competência dos sócios poderes de fiscalização na falta de um órgão específico. A fiscalização acaba por recair sobre esse órgão que tem um papel residual - a Assembleia Geral onde estão representados todos os sócios.
Todos os sócios possuem um poder igual na decisão dos assuntos. Vigora o princº “um sócio, um voto”, não sendo relevante a proporção de cada um dos sócios no capital social.
As SA têm uma estrutura mais complexa.
Temos a Assembleia Geral, órgão dotado de competências gerais, estando o elenco das suas competências previsto no art. 246º.
Os poderes executivos estão concentrados na Gerência - possui competências gerais de administração e representação exclusiva da Sociedade ( só pode ser representada pelos seus gerentes). Mas, para mostrar que o poder pessoal é importante, a Assembleia Geral pode dar instruções aos gerentes e estes estão obrigados a acatá-las, mesmo que respeitem à administração da Sociedade. Aqui, os gerentes podem ser terceiros que não sejam sócios da Sociedade.
A fiscalização: é da Competência da Assembleia Geral, excepto quando se tenha previsto um órgão específico de fiscalização - quando tenham de possuir um Conselho Fiscal, quando a SQ ultrapassa determinados valores mínimos.
Embora esteja garantida a participação dos sócios , em determinadas actividades a sua participação não é tão democrática como nas SNC porque depende do montante da sua participação social.
Vigora o princº censitário: é o valor da parte de cada sócio que determina o grau da sua participação e intervenção na actividade social ( sobretudo na Assembleia Geral).
SA- tem uma estrutura organizatória mais complexa . Há uma desvalorização progressiva do papel do sócio ( accionista ) e das Assembleias Gerais - progressiva redução das competências deste órgão.
A gestão das SA é hoje matéria confiada em exclusivo aos seus órgãos de administração ( Conselho de Administração ou Direcção da Sociedade ). À Assembleia Geral só resta dar voz em assuntos fundamentais para a Sociedade.
Divide-se a matéria decisória de uma empresa em: decisões fundamentais e decisões conjunturais ( são as de gestão corrente), sendo que é aos órgãos de administração que compete a matéria decisória. A Assembleia Geral vê as suas decisões reduzidas a decisões conjunturais. Só relativamente a certas matérias fundamentais é que os accionistas são chamados. Há porém situações em que não se sabe que tipo de decisão se trata - vigora o princº de acordo com o qual a cada acção corresponde uma ratio. De acordo com este princº e tendo em conta as múltiplas modalidades de concentração do poder não previstas, pode-se considerar que a outra face da moeda da concentração do poder de voto é a desvalorização ainda mais nítida da posição de alguns sócios , investidores minoritários .
Possibilidade de uma SA poder optar por uma de duas estruturas distintas ( art. 278º ):
1) Estrutura Clássica - tradicional : Conselho de Administração, Conselho Fiscal e Assembleia Geral;
2) Estrutura Complexa - germânica : Conselho Geral, Direcção e ROC, Assembleia Geral.
SNC - são o modelo mais apropriada para empresa de dimensão reduzida e sócios que tenham entre si confiança recíproca. EX: empresas familiares.
Existem hoje mecanismos jurídicos que permitem ao pequeno empresário limitar a sua responsabilidade (EIRL).
A estrutura horizontal ( todos têm uma voz igual), elimina as desvantagens de se poder organizar toda uma empresa dado que todos têm vos igual, independentemente do montante do capital - É bom para as pequenas empresas.
3.2.2-TIPOS LEGAIS ESPECIAS:
foram criados para dar resposta a necessidades empresariais específicas. São modelos que repousam sobre dois tipos legais comuns, ma têm um regime jurídico particular diferenciado do geral para dar resposta ao objecto e estrutura específica dessa sociedade.
Ex: Sociedade gestora de participações sociais só pode ter por objecto a gestão de participações noutras sociedades(holdings)como forma indirecta de exercício de uma actividade económica porque não se pode dedicar directamente a uma actividade económica.
Ex: Sociedade de capitais de risco; Sociedades gestoras de fundo de investimento; Sociedades de desenvolvimento regional; Sociedades de leasing; Sociedades correctoras e financeiras de corretagem; Sociedades mediadoras do mercado monetário.
Tudo isto tem que ver com o princº a tipicidade.
Há que olhar para os tipos que a lei define ( tipos legais especiais) , mas também para as classificações que a doutrina vem fazendo das sociedades.

3.3-TIPOS DOUTRINAIS
1º Classificação: Sociedades Comerciais e Sociedades Civis ( critério da comercilidade do objecto) - as sociedades comerciais têm força jurídica ao contrário das sociedades civis;
2º Classificação: Sociedades comerciais de pessoas –1- sociedades que se caracterizam pela importância fundamental da pessoa do sócio (“intuito persona”) que se reflecte em todo o regime jurídico destas sociedades.
Cada sócio é individualizado ( o seu nome tem de constar da firma da sociedade), cada sócio tem uma participação global, igualitária e decisiva na sociedade.
“Global”- intervém em todos os órgãos da sociedade;
“Igualitária”- a sua voz é igual à dos outros;
“Decisiva”- se o sócio sair, a sua saída pode por em causa a sobrevivência da sociedade ( pode ser dissolvida).Há um regime de responsabilidade ilimitada dos sócios, ideia de que o pacto social é intransmissível.
A entrada de novos sócios depende do consentimento unânime dos outros sócios. Estes sócios gozam de uma autonomia patrimonial imperfeita - o acervo patrimonial está sempre afecto às dívidas da Sociedade, mas por certas dívidas não responde apenas o acervo mas também os bens pessoais dos sócios. EX: SNC
Sociedades comerciais de capitais - dão importância ao capital em detrimento da pessoa do sócio(“intuito pecunia”).
Disto reflecte-se o regime jurídico destes sócios: o capital é o elemento fundamental na determinação das relações internas e externas dos sócios.
“Internas”- é em função do capital detido por cada sócio que se determina o poder de cada sócio na sociedade;
“Externa”- é em função do capital que cada um investiu que se determina a participação de cada um ; o nome dos sócios não tem de constar da firma. O que constitui menção obrigatória é o valor do capital social.
A participação dos sócios na vida social está posta em causa em virtude da separação entre a propriedade dos meios produtivos e o controlo desses meios.
A responsabilidade de cada sócio é limitada. As partes sociais são livremente transmissíveis não dependendo da sua cessão, do consentimento dos restantes sócios .
Gozam de uma autonomia patrimonial perfeita dado que os bens dos sócios respondem exclusivamente pelas dívidas da sociedade e por estas respondem exclusivamente os bens da sociedade, cujo exemplo típico é o das SA
Esta classificação não reflecte uma tipologia estanque, sendo por isso difícil compreender os tipos legais nestes tipos doutrinais: sociedades em comandita por acções: coexistem sócios cujo regime de responsabilidade é igual à dos sócios em nome colectivo (sócios comanditados) e sócios de responsabilidade limitada à semelhança das SA (comanditários); sociedades por quotas: espécie do tipo legal intermédio na classificação doutrinal porque nem é uma sociedade de pessoas nem de capital - depende de dois factores
I. O quadro legislativos concretos que nós temos - o regime das SQ anterior aproximava-se do modelo da sociedade de capitais sendo que o direito actual aproxima-o do modelo das sociedades de pessoas; referem-se ao dto de informação dos sócios, ao dto das minorias introduzindo-se a necessidade do consentimento dos sócios para que um sócio possa transmitir as sua quotas
II. Da sociedade concreta - há que ter em conta a liberdade de modelação que as partes têm, da vida da sociedade (estruturação, coligação entre os protótipo da classificação doutrinal. Nas SA podem todavia factores de personalização EX.: cláusulas que visam limitar a livre transmissibilidade das acções e até podemos estar perante SA’s que se comportam como verdadeiras sociedades pessoais: Ex. SA’s familiares de 5 pessoas.

O relevo desta distinção doutrinal é hoje, apenas meramente doutrinal, o seu anterior interesse jurídico-prático(sobretudo fiscal) perdeu-se: a tributação de todas as sociedades é feita hoje em IRC.

1- Abertas

3ª CLASSIFICAÇÃO: Sociedades Comerciais:

2- Fechadas

1-Ou com apelo à subscrição pública do respectivo capital- São no nosso direito apenas as sociedades por acções (SA’s e Sociedades em comandita por acções). As sociedades que constituem um apelo à subscrição pública estão rodeadas de grandes(Contratos) que são objecto de necessidades especiais de publicidade e transparência. Têm uma regulamentação complexa -> oferecem produtos financeiros sofisticados. Têm logicamente uma fiscalização minuciosa.

2-Ou Subscrição particular – Constituem-se através de um mecanismo de subscrição privada do respectivo capital. (Apresentam) potencialmente todos os tipos legais, mesmo as SA’s

1-de capitais públicos

4ª Classificação 2-de capitais mistos

3- de capitais privados


1 O titular da totalidade do capital é uma entidade pública
2 O estado participa na sociedade em conjunto com capitais privados
3 Composta por capitais privados

Individuais
5ª Classificação: Sociedades
Coligadas


Toda o CSC constitui logicamente um modelo legal para o nascimento, a vida e a morte de uma sociedade individualmente considerada. Mas a sociedade, logicamente, não vive isolada. Possui relações de variada natureza com outras sociedades. Fala-se de coligações de sociedades( as sociedades podem ter relações de grupo com outras). Criado todo um universo de relações que as sociedades podem ter com outras.
Para as sociedades que estão em relação de coligação, tem de existir um regime jurídico que se adapte a esta nova condição. O regime jurídico concebido para uma sociedade individual, não pode trazer a situação de uma sociedade coligada - Art. 483 e ss. - exclusivamente dedicado à matéria das sociedades coligadas.

de direito interno
6ª Classificação: Sociedades
de direito comunitário

O projecto da directiva em matéria da SA europeia(1966), tem sofrido muitas vicissitudes, mas ainda não mereceu uma regulamentação (específica). Cada sociedade está regulada pela lei do seu estado pessoal. A lei do estado pessoal é a lei da sua sede social, a estatutária, a efectiva. Se uma sociedade pretende operar a nível internacional, seria artificial limitar a sua regulamentação à lei dessa sede. Daí a ideia de criar um instrumento juridico-societário aplicável em formas internacionais: SA’s europeias.
O verdadeiro passo para a harmonização do direito das sociedades só se dará com a provação deste instrumento. As directivas criam apenas não são direitos uniformes, mas listas de força idênticas. Há que ter em conta que nem todas as legislações cumprem os textos ? para a integração desse direito na ordem interna também que a interpretação dessas directivas dada pelos tribunais.


2-ACTO DE CONSTITUIÇÃO DA SOCIEDADE: Sociedade -contrato
Fonte e Natureza Jurídica do acto Constitutivo
2.1- O Iter do Processo Constitutivo
Tem em conta a sociedade enquanto contrato e aglomerado de pessoas.
Quanto ao primeiro aspecto, ao contrário do que acontecia com o direito anterior, o C.S.C. veio admitir vários quadros jurídicos de constituição de uma sociedade. Podem dividir-se em 2 grupos:

1-Fonte geral ou comum – Negócio jurídico bilateral ou unilateral – O contrato da sociedade.
2-Fontes especiais:
I. Lei – Tem-se assistido à criação crescente de sociedades comerciais de capitais públicos por intermédio de DL. Exemplo: IPE: É uma SA que tem por função gerir a carteira de participações sociais detida pelo estado. O processo de privatização que está em curso (transformação de empresas públicas em SA’s) faz com que esse tipo de acto legislativo seja mais frequente.
II. Negócio Jurídico Unilateral: 488º (Nº 2 Al. J)
III. Deliberação Social: No caso de transformação novatória?, cisão, caso de fusão –constituição.

A questão da natureza jurídica do acto constitutivo de uma sociedade tem sido alvo de diferentes respostas. Não há uma resposta válida para todos os casos. Na doutrina tradicional fala-se de duas correntes:

Anticontratualista – Dois principais:

1 – Autores que viam no acto constitutivo da sociedade um acto colectivo e unilateral; um feixe de declarações negociais paralelas e homogéneas (visando todas o mesmo efeito jurídico)-Gertmann?
2 – GIERKE – via no acto constitutivo da sociedade um acto de fundação. As declarações de vontade dos sócios não eram importantes de per si. Eram uma manifestação antecipada da vontade de um novo ente que era a própria sociedade.

Contratualista – dominantes:

Toma como paradigma da sua reflexão o modelo da sociedade pluripessoal nascida de um contrato
1 – A sociedade seria um contrato pluripessoal.
2 – O contrato de sociedade era uma contrato de fim comum (doutrina italiana, alemã e portuguesa) ou contrato organização. É dominante. É um contrato de fim comum por oposição aos contratos (comuns) comutativos. Nos contratos comutativos o interesse da contraparte contraente é satisfeito de modo diferente. Nos contratos de sociedade existe um interesse geral ou comum: O lucro da empresa, ou seja, o interesse da máxima rentabilidade da empresa.
Ao passo que nos normais contratos comutativos a relação sinalagmática se estende a outras prestações das partes entre si, no contrato de sociedade a relação sinalagmática estabelece-se, não entre as partes contratantes mas entre a prestação do sócio e a sua participação nos lucros finais da empresa.
Nos contratos comutativos tem que existir uma equivalência das prestações das partes. No contrato de sociedade não tem que existir esta equivalência. Nos contratos comutativos a regra é a da bilateralidade. No contrato de sociedade pode haver plurilateralidade.
Nos contratos comutativos a relação extingue-se na relação sinalagmática, enquanto no contrato de sociedade há uma estrutura organizativa que resulta dessa relação sinalagmática.


Relevância para efeitos de interpretação e integração do respectivo regime jurídico

NOS CONTRATOS COMUTATIVOS VIGORA O PRINCÍPIO DA EXCEP DE NÃO CUMPRIMENTO (428º CC.): POSSO NÃO REALIZAR A MINHA PARTE SE OUTRO NÃO REALIZAR A DELE. NO CONTRATO DE SOCIEDADE NÃO POSSO DEIXAR DE REALIZAR A MINHA ENTRADA SE OS OUTROS NÃO REALIZAREM A DELES. PELO CONTRÁRIO PODE ACONTECER QUE O SÓCIO A SEJA RESPONSÁVEL PELAS ENTRADAS NÃO EFECTUADAS POR OUTROS SÓCIOS. NÃO SE PODEM TOMAR CERTAS ATITUDES OU REGRAS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS COMUTATIVOS.
A invalidade de uma das declarações negociais de um dos sócios não acarreta necessariamente a invalidade do negócio jurídico global, só a acarretará caso a declaração negocial viciada deva considerar-se como essencial para a realização do fim comum.


CONTRATO DE SOCIEDADE

É o processo normal de constituição de uma sociedade, está regulado em detalhe nos artigos 7º a 52º do CSC.. Depois, cada um dos tipos de sociedade estabelece uma regulamentação específica.
SNC – 176º a 194º; S – 199º, 265º a 269º; SA – 272º; SC por acções – 466º

O contrato sociedade não se esgota num único acto mas produz-se ao longo de uma cadeia de actos que se estende no tempo.
É um acto de formação sucessiva ou complexa, formado por uma série de actos, não é só um acto mas um processo constitutivo.
Este processo varia , sendo mais complexo nas SA, os actos do processo constitutivo têm algumas linhas gerais, assim os momentos essenciais são:
I. Celebração da escritura pública – reflecte as declarações da vontade negocial das partes
II. Registo definitivo com contrato de sociedade – o registo é condição necessária da aquisição de personalidade jurídica por parte de uma sociedade.

2.2-Requisitos de celebração do ctt

Há três tipos de requisito para a celebração de um contrato de sociedade:

A) Relativos às partes
B) Relativos ao fundo (substanciais)
C) Relativo à forma

A) Relativamente às partes temos quatro tipos:

1 – Relativo ao número de partes
Em absoluto não existe um número mínimo de partes. Durante muito tempo a doutrina considerou afastada a possibilidade da constituição de uma sociedade por um único sócio. A sociedade era uma pessoa colectiva (aglomerado de pessoas). Hoje o regime está no 7º Nº2 CSC: o número mínimo de partes é de dois excepto quando a lei exija um número superior ou permita que a sociedade seja constituída por uma só pessoa. REGRA: Exige-se duas pessoas. Pode sofrer excepções, para baixo ou para cima. Para cima: SA’s (com um mínimo de 5 sócios); sociedades em comandita por acções (com um mínimo de 6 sócios – cerca de 5 sócios comanditários). O número das partes pode ser superior a dois nos tipos legais especiais: exemplo: sociedades de desenvolvimento regional (mínimo 10 sócios).
Outras vezes a lei permite que a sociedade seja constituída apenas por um sócio: 488º CSC – vem permitir que uma sociedade de qualquer tipo (desde que de capitais) possa constituir ab initio uma SA da qual a primeira seja a única titular do capital (SA unipessoal). Aqui não existe qualquer contrato mas um negócio jurídico unilateral. Daí que não se possa falar de um mínimo de partes mas de uma regra com excepções para cima e para baixo.

2 – Relativos à natureza das partes

As partes podem ser pessoas singulares (físicas) ou colectivas (pessoas morais, jurídicas).
Historicamente a sociedade comercial foi uma entidade criada e possuída por indivíduos singulares. A participação das pessoas colectivas era um fenómeno desconhecido e uma prática proibida (considerava-se como uma anomalia). Esta perspectiva começou a mudar no início do século devido a factores económicos. A participação em sociedades começou a ser admitida e hoje aceita-se sem reservas que quaisquer pessoas colectivas possam participar no capital das sociedades comerciais (associações, fundações, pessoas colectivas de direito privado e pessoas colectivas de direito público).
Mas o legislador regulou essa participação, e há que distinguir dois casos:

1.participação das sociedades comerciais em sociedades comerciais: a participação de uma sociedade de qualquer tipo numa sociedade de responsabilidade limitada (SA e SQ ) e com um objecto social idêntico é permitida e pode ser decidida pelos órgãos. OU a participação da sociedade comercial de qualquer tipo em sociedades de responsabilidade ilimitada, em sociedades que tenham um objecto negocial diferente, ou em sociedades de tipo especial, só é permitida se e nos exactos termos em que o contrato social o permitissem.
Tanto num caso como no outro estão abrangidas as participações a título originário (um sócio adquire participações numa sociedade que se constitui) e a título derivado (uma sociedade já constituída).
Participações de uma sociedade de responsabilidade limitada numa sociedade em comandita (de responsabilidade ilimitada) – esta possibilidade está logicamente expressamente prevista na lei: 465º nº2.

Conclusão: a participação das sociedades em sociedades dá origem ao problema da coligação das sociedades, regulado de forma autónoma no 481º CSC.
Há quatro tipos de relações de coligação intersocietária:
I. de simples participação (entre 10% a 50%)
II. de participações recíprocas (há um cruzamento de participações entre as duas sociedades, de igual montante)
III. de domínio (uma sociedade tem uma possibilidade de exercer uma influencia sobre outra dominada).
IV. de grupo (de tipo especial – a lei pretende que seja uma relação de coligação interna, transformando o próprio regime jurídico).

1.Participação das demais pessoas colectivas ( que não sociedades comerciais) nas sociedades comerciais: problemática é diferente. Não se aplicam os condicionalismos até aqui referidos, mas as regras gerais relativas às pessoas colectivas: art.160º Código Civil.
A participação de uma associação ou de uma fundação numa sociedade comercial será admissível sempre que isso seja considerado um acto necessário e conveniente à prossecução dos fins da pessoa colectiva.
- As partes de um contrato de sociedade têm que ser comerciantes ou podem não ser comerciantes?
É possível que uma pessoa, singular ou colectiva, não possua capacidade para ser comerciante, mas já possua capacidade para ser sócio.
Exemplo: um menor pode participar num acto constitutivo de uma sociedade, através de representante legal;
Exemplo: o Estado ou a Misericórdia não podem ser comerciantes, mas detêm uma carteira vasta de participações. Também não é relevante a nacionalidade: partes de um contrato de sociedade podem ser nacionais ou estrangeiros, estão em pé de igualdade, embora haja algumas condições de caracter jurídico-público.

Capacidade das partes

As partes devem ter capacidade de exercício e capacidade de gozo. Os problemas dizem quase respeito à capacidade de exercício: as partes têm de ter capacidade para, por si próprias, praticar negócio jurídico ou não a tendo, possa ser suprida pelos meios legais. As incapacidades são as do Código Civil -» menoridade, interdição e inabilitação. Estes 3 incapazes, não podem, em princípio, por si próprios, celebrar um contrato de sociedade (participar na sua celebração), porque o contrato de sociedade envolve a disposição de bens para a realização de entradas e, por vezes, a assunção de responsabilidades.
Mas, há que distinguir:

. SNC ou Sociedades em comandita -> na qual o menor seria um sócio de responsabilidade ilimitada, é inadmissível a participação do menor no contrato de sociedade. A sua participação implicaria a exposição do património do menor a uma responsabilidade ilimitada pelas dívidas sociais, o que não pode ser.

.Sociedades por quotas-> também será inadmissível a participação de 1 menor no seu contrato de constituição em 2 situações:
1.enquanto o capital social não estiver integralmente liberado ( qualquer 1 dos sócios é responsável pelo cumprimento das obrigações de entrada dos sócios inadimplentes).
2.quando no próprio contrato de sociedade se tiver estabelecido obrigações de prestação suplementares.

.Sociedades anónimas-> ou de uma sociedade em comandita por acções, onde o incapaz surja na lista de sócio comanditário; já parece admissível e válida a participação do incapaz no contrato de sociedade, desde que os bens que ele levou para a compra de acções sejam bens que ele angariou nas condições referidas no art.127º,nº1,al.a) Código Civil: através do seu próprio trabalho.

Legitimidade das partes

Era discutida antes do Código das sociedades comerciais, a questão de saber se era lícita a participação dos cônjuges nas sociedades comerciais.
Hoje, a questão está resolvida -> art.8º. A participação de cônjuges em qualquer sociedade, é permitida nos seguintes termos:
1.qualquer dos cônjuges pode, por si só, constituir ou participar em qualquer tipo de sociedade comercial ( estatuto de igualdade).
2.Os dois cônjuges ( juntos) podem constituir ou participar (os dois ou com mais sócios) numa mesma sociedade por quotas, numa mesma s.a. ou numa mesma sociedade em comandita (em que um deles seja sócio comanditado).
O que não é permitido é que ambos possam constituir ou participar numa SNC ou em comandita, na qual ambos sejam sócios comanditados ( de responsabilidade ilimitada). Quando uma participação social for considerada comum aos 2 cônjuges, será considerado sócio, aquele que celebrou o contrato de sociedade ou aquele que adquiriu a participação: art.8º, nº1, Código das sociedades comerciais.

Requisitos relativos ao fundo

I. Consentimento das partes: para que exista um contrato de sociedade válido, é necessário que o consentimento dado pelas partes resulta de declarações negociais também elas válidas – formadas sem vícios e expressadas de modo coincidente com a vontade real. – Que vícios estão aqui abrangidos? Todos os vícios previstos na lei civil.
Os vícios na formação da vontade (elemento subjectivo): erro-vício, dolo coacção moral; incapacidade acidental, estado de necessidade.
Os vícios na expressão da vontade -> divergência entre a vontade real e a vontade declarada ( aspectos objectivos), divergências intencionais (simulação, reserva mental, declaração não séria) e não intencionais (falta de consciência da declaração, erro na transmissão, erro na declaração, coacção física).
Muito embora estejam aqui teoricamente abrangidos todos os vícios da lei civil ( art.2º do Código Comercial – a lei civil é uma lei subsidiária), há, na prática, muitos vícios que raramente sucedem. Só alguns se verificam. Uma excepção a esta regra será a simulação -> é importante porque está ligada à problemática das sociedades fictícias.
Vê-se que, na prática, certos contratos de sociedade são celebrados pelas partes com o intuito de celebrarem (encobrirem) outro contrato. Exemplo: contrato de venda para ter acesso a um regime fiscal mais favorável; encobrir um contrato de doação para contornar as regras sucessórias; simular um contrato de empréstimo para contornar as regras em matéria de lucro.
Muitas sociedades constituem-se para permitir ao empresário em nome individual o benefício da responsabilidade limitada. Juntam-se-lhe 2 ou 1 pessoa (testa - de – ferro) que aceitam participar na sociedade, mas apenas com o intuito de permitir a esse sujeito, o acesso ao benefício da responsabilidade limitada. A vontade declarada da parte que se associou ficticiamente diverge da sua vontade real.
Há conluio entre as partes e existe intenção de enganar. Verificam-se assim os três requisitos da simulação.
A doutrina entende que, nestes casos, o contrato de sociedade de sociedade deverá ser nulo.
Distinta desta situação é a figura da associação à parte -> é uma convenção celebrada entre um sócio de uma sociedade e um 3º, pelo qual o sócio cede ao 3º os direitos patrimoniais inerentes à sua participação social, total ou parcialmente. Esta figura não se confunde com a sociedade fictícia, dado que se trata de uma convenção válida. Relativamente a esse negócio, a sociedade e os demais sócios são alheios. O negócio produz apenas efeitos entre o sócio e o 3º (este não se torna sócio). Tal convenção, não pode ser usada para tornear as limitações da lei à entrada de novos sócios da sociedade.
O 3º só pode entrar para a sociedade, se todos os outros sócios estiverem de acordo.

Efeitos provenientes da verificação de um destes vícios: são os estabelecidos pela lei civil, com as especialidades que resultam do art.41º, 43º,45º e 46º do Código das sociedades comerciais. Estas especialidades têm em conta as especiais necessidades de protecção de terceiros de boa fé (não só os terceiros com que a sociedade contrata como os restantes sócios que não sabiam das negociações de um deles).Exemplo: normas que recuperam para as sociedades comerciais a doutrina geral do art.292º do Código Civil ( re-dução do negócio jurídico). Se se verificar uma declaração negocial viciada, o contrato, o contrato de sociedade não é inválido. Só será se a declaração for considerada essencial.
A lei tenta aproveitar ao máximo os efeitos possíveis de um contrato, mesmo que uma das declarações esteja afectada por um vício: art.40º, nº1 do Código das sociedades comerciais.

Objecto

Há que distinguir 2 sentidos desta expressão:
1.Objecto do contrato de sociedade (objecto jurídico)-> são os estatutos sociais (pacto social).
2.Objecto da própria sociedade enquanto empresa (objecto social propriamente dito): programa de actividades económicas concretas que a sociedade se propõe desenvolver. É este o segundo sentido que interessa (e que a lei utiliza).
Características que deve revestir o objecto social
Deve constar expressamente dos estatutos sociais: art.5º, nº1, al.d) e art.11º do Código das sociedades comerciais.
No caso de haver divergência entre o objecto estatutário (social) e o objecto real, o que conta é o primeiro, ou seja para ver se a sociedade é idónea, é o primeiro que conta.
O objecto social deve ser determinado e concreto ( não pode ser geral e vago). Não se pode dizer que a sociedade exercerá todas as actividades económicas. É em função desta necessidade de concretização do objecto social, que se determina a natureza da sociedade em si mesma, como civil ou comercial. Para saber se a sociedade pratica ou não actos de comércio, tem que se saber que tipo de actividade ela desenvolve.
É em função do objecto social que se determina o limite dos poderes e deveres dos órgãos de administração ( órgãos sociais em geral).
O exercício de certas actividades (seguradora, bancária) que estão sujeitas a autorização e licenciamento administrativo, exige a adopção de certos tipos especiais de sociedade. É preciso saber que tipo de actividade ela vai concretamente desenvolver.
Art.10º,nº3: a inclusão na firma da sociedade, de uma referência ao objecto social, não pode sugerir que a sociedade está a levar a cabo uma actividade económica diversa daquela que está consagrada nos estatutos.
A referência não pode ser enganosa.
Sempre que haja uma modificação substancial do objecto da sociedade, a lei equipara esta modificação a uma cessão da empresa, para efeitos fiscais o objecto deve ser idóneo->280º, nº1 do Código Civil. Deve ser física e legalmente possível. A idoneidade do objecto afere-se pelo seu objecto social estatutário, e não pelo seu objecto real.

B) Requisitos de forma

Há três requisitos de forma para a celebração do contrato de sociedade:
I. Requisitos de validade
1.Celebração por escritura pública
2.Registo
B- Requisito de eficácia
3.Publicações

1. Escritura pública: Ao contrário dos negócios jurídicos em geral (onde vigora o princípio da liberdade de forma ou da consensualidade: art.405º e 219º do Código Civil), e ao contrário do próprio princípio de sociedade em geral (art.981º do Código Civil) não se exige nenhuma forma especial. A validade do contrato de sociedade comercial está sujeita a uma forma específica; a sua celebração deve resultar de escritura pública (art.7º, nº1 do código das sociedades comerciais e 89º, al.c) do Código do Notariado).
Razão desta exigência: intenção de se promover uma ponderação mais cuidada por parte das partes quanto às suas obrigações (daquilo que vão convencionar, de melhor observar os requisitos contratuais que vimos e de facilitar os meios de prova – até para resolver as divergências entre os sócios).

O contrato de sociedade contém 2 elementos em abstracto:

I. A vontade das partes em constituírem uma entidade, uma pessoa colectiva-» contrato propriamente dito.
II. Um conjunto de normas que visam disciplinar o nascimento, o funcionamento, a administração, a dissolução e liquidação dessa pessoa colectiva que através do contrato vai nascer. É esse conjunto de normas que se denomina “pacto social” (ou contrato de sociedade).
Em certas legislações, por exemplo, anglo saxónicas, estas duas metades do contrato de sociedade estão separadas:
. memorandum of association
. articles of association
No nosso direito, esta distinção não tem uma relação jurídico-prático.
A escritura pública de um contrato de sociedade pode ser celebrado pelo notário, se previamente as partes tiverem obtido um certificado de admissibilidade da firma e a aceitação provisória de identificação da pessoa colectiva. Estes dois documentos devem ser solicitados no Registo Nacional de Pessoas Colectivas ou, no Porto, através da Conservatória do registo comercial. A falta da observância destes requisitos de forma implica a nulidade do contrato de sociedade: art. 41º e 42º do código das sociedades comerciais.
2.Registo: para que uma sociedade se constitua, é condição necessária a escritura pública, mas não é condição suficiente, é também preciso que o contrato de sociedade seja registado. De acordo com o art.5º do código das sociedades comerciais, estas sociedades só adquirem personalidade jurídica a partir da data do registo definitivo. O registo é obrigatório:art.3º al.a) C.R.C.
Deve ser promovido pelos próprios interessados no prazo de 90 dias a contar da data da escritura na Conservatória do registo comercial da área da sede estatutária da sociedade (art.15º, nº1, al.a) C.RC.) sob pena de, para além dos outros efeitos (falta de personalidade jurídica), se sujeitarem a sanções contravencionais, ou seja coimas: art.17º C. R.C.
O nosso legislador previu 2 modalidades diferentes de registo -» 2 alternativas de constituição de uma sociedade:
1.escritura pública -> registo ->publicação
2.sociedades constituídas mediante registo prévio: art.18ºC.R.C.: 1º passo – registo prévio, 2º passo – escritura, 3º passo – conversão do registo prévio em definitivo, 4º passo – publicações.
A vantagem do registo prévio é a de evitar alguns problemas de registo que podem surgir após a escritura. Evita-se que certos problemas exijam depois rectificações que envolvam encargos suplementares para as partes. Os interessados devem apresentar um requerimento próprio (art.25º C.R.C.) e também o projecto completo do contrato de sociedade (art.28º, nº1 C.R.C.) e esse projecto deve já conter as assinaturas de todos os sócios, reconhecidas através de reconhecimento notarial. Este processo constitutivo alternativo é aplicável a todas as sociedades comerciais, sejam comerciais, sejam civis em forma comercial, excepto em 2 situações:
1ª quando haja sido convencionado entradas em espécie,
2ª quando se trate de uma s.a. com apelo à subscrição pública.
A falta de registo ocasiona a inexistência da sociedade comercial -» art.5º: diz que o registo é um requisito da própria existência da sociedade enquanto pessoa jurídica.
3.Publicações: a lei exige que o contrato de sociedade seja publicado no D. R. (art.166º e 167º). As publicações são promovidas não pelos próprios interessados, mas oficiosamente pelo conservador do registo comercial, no prazo de 30 dias, deve enviar o contrato para publicação nesse D. R. As publicações têm por objecto o texto integral do contrato de sociedade e todas as menções obrigatórias que lhe forem acrescentadas pelo registo comercial.
Consequência da falta de publicações: é um requisito de eficácia, e não de validade do contrato de sociedade. Funciona como uma mera condição de oponíbilidade da constituição da sociedade a 3ºs. Uma sociedade comercial, cujo contrato social ainda não foi publicado já existe.
Art.168º, nº2 -» a falta de publicações faz com que a sociedade não possa opor a sua existência a 3ºs, que desconheciam esse facto.
Art.168º, nº1 -» já os 3ºs se podem prevalecer da existência de uma sociedade cujo contrato não está publicado. Assim, as publicações constituem condição de oponibilidade a 3ºs, mas já não constituem condição de invocabilidade por 3ºs.

2.3-Conteúdo do contrato de sociedade:Menções obrigatórias e facultativas:

O contrato de sociedade possui um conteúdo variado em termos conceituais, possui dois tipos de elementos básicos:
I. Elementos essenciais ( comuns e específicos – 9º Código das sociedades comerciais). Quanto a estes, a lei exige obrigatoriamente. Têm de figurar em qualquer contrato de sociedade, qualquer que seja o tipo de sociedade, sob pena de invalidade. São o mínimo que contrato tem de conter. Os elementos essenciais comuns a todo o tipo de sociedade estão no art. 9º do Código das sociedades comerciais. Os elementos específicos são elementos obrigatórios especiais que se vêm acrescentar a eles. Há outros elementos essenciais implícitos, que apesar de não terem sido expressamente regulados, fazem parte obrigatoriamente do próprio contrato de sociedade -» dadas as normas jurídico-societárias que sejam de natureza imperativa. Exemplo: dever de participar nos lucros e perdas da sociedade (art.28º do código das sociedades comerciais) faz sempre parte do contrato, apesar de não haver cláusula social em concreto e apesar de
poder haver cláusula social em contrário.
II. Elementos facultativos: art.15º -» duração ilimitada – o contrato de sociedade pode prever uma duração ilimitada.


2.4- Problema da irregularidade da constituição de uma sociedade: há 2 grandes grupos de irregularidades.

I. “sociedades em formação”: regime dos actos praticados em nome de uma sociedade cujo processo constitutivo está incompleto.
II. “sociedades inválidas”: regime das sociedades cujo processo constitutivo está viciado.
o problema das “sociedades em formação” é um problema muito natural. uma vez que a constituição de uma sociedade não se esgota num simples acto, mas é um processo constitutivo, composto por uma série de actos afastados no tempo, é frequente que uma sociedade inicie a sua actividade ainda antes de todo o processo constitutivo ter chegado ao fim.
é necessário saber qual o regime dos actos praticados em nome desta sociedade cujo processo constitutivo ainda não chegou ao fim. há4tipodesituações.

1.sociedades aparentes: situação em que não existe qualquer sociedade, sempre que
2 ou + indivíduos criam aparência de existir entre eles um contrato de sociedade e nada existe. o regime dos actos praticados em nome dessas sociedades aparentes é o do art.36º do código das sociedades comerciais -» esses indivíduos respondem pessoal, ilimitada e solidariamente.

2.sociedades sem escritura pública: na situação anterior não existia qualquer sociedade. nesta, existe um verdadeiro contrato de sociedade, só que sem a forma exigida. aqui, englobam-se várias situações, que se reconduzem a um regime comum:
. as partes querem formar uma sociedade, mas limitaram-se às negociações preliminares;
. já existe um projecto do contrato da sociedade;
. o projecto pode constituir ou não um contrato processo de sociedade.

Neste caso, há uma sociedade, mas não com personalidade jurídica (não é uma sociedade comercial, porque esta exige escritura pública e o registo). é uma sociedade que se vai essencialmente reger pelas normas aplicáveis às sociedades civis. o regime é o do art.36º, nº2. este artigo remete para a lei civil: art.997º e 998º do código civil-» pelos actos praticados em nome da sociedade sem escritura pública, responde em 1ª linha, a sociedade, subsidiariamente e solidariamente, os sócios. há ainda que acrescentar 2 preceitos:
art.172º -» o m.p. deve requerer a liquidação judicial da sociedade no prazo de 3 anos.
art.173º -» estabelece um regime que permite a regularização desta situação, mediante a escritura pública, o registo e as publicações desta sociedade -» são os requisitos de forma em falta.

o art. 173º em conjugação com o art.192º, nº1, al.c) permite que na escritura pública do contrato de sociedade, sejam ratificados pelos sócios todos os actos que foram praticados, em nome da sociedade, antes da celebração da escritura pública, desde que seta seja celebrada, e desde que cada um desses actos seja ratificado pela sociedade.

3.sociedades com escritura pública, mas sem registo: existe uma sociedade, mas ainda sem personalidade jurídica. o regime aplicável é o do art.37º a 40º.
I. no plano das relações internas - »art.37º: regime comum a todos os tipos de sociedade. às relações internas que ocorrem no período entre a celebração da escritura pública e o registo aplicam-se já todas as normas estatutárias e jurídico-societárias que regem uma sociedade normal, salvo aquelas que pressuponham o contrato definitivo registado ( que pressuponham a existência de uma pessoa colectiva já registada). exemplo: direito aos lucros; direito de venda.
art.37º, nº2: a transmissão das partes sociais e a alteração do contrato de sociedade exigem o consentimento unânime dos sócios (nas sociedades de capitais). em regra, exige-se apenas uma maioria qualificada. em certas sociedades, até é livre (s.a.). no art.37º, nº2, a lei estabeleceu um regime diverso do regime geral: pretende evitar que ocorra a entrada de novos sócios ou se alterem as regras dessa sociedade, antes ainda de a sociedade estar registada.
II. no plano das relações externas: art.38º a 40º. a lei estabelece um regime diferente conforme o tipo de sociedade:
SNC(art.38º) -» a lei estabelece uma responsabilidade ilimitada e solidária perante 3ºs, de todos aqueles sócios que autorizaram expressamente ou tácitamente a prática de certos actos, antes de o registo estar efectuado. o consentimento dos sócios presume-se. o ónus da prova ( de que não estava de acordo com o acto) cabe ao sócio.
SC simples (art.39º) doutrina idêntica.
SA; sociedade por quotas e sociedade por acções (art.40º): regime comum para as sociedades de capitais. aqui, o consentimento não se presume. quanto aos sócios que não autorizaram os actos, há um regime de responsabilidade limitada até ao valor das suas entradas e pelo valor do que tenha recebido a título de lucros e reservas. gerentes, administradores, directores (órgãos de administração e os sócios que autorizam), respondem ilimitadamente.

Há uma contradição da lei que não se percebe: o regime para as sociedades sem escritura pública e sem registo, é mais gravoso que para as sociedades que não tenham sequer cumprido o passo anterior. as sociedades sem escritura pública -» é uma responsabilidade solidária, mas subsidiária face à sociedade; as sociedades sem escritura pública e sem registo -» responsabilidade ilimitada e solidária directa. acaba por punir quem comete um erro menor.

Se os actos praticados em nome de uma sociedade sem registo tiverem sido praticados sob condição de futuro registo da sociedade e sob condição de a sociedade vir a assumir os efeitos dos actos praticados, diz o art. 40º, nº2 que as relações externas passarão a estar reguladas pelas normas gerais da sociedade, reguladas pelo tipo social concreto.

4.sociedades sem publicações: sociedade cujo contrato não foi publicado. sofrem limitações quanto aos efeitos dos seus actos:art.160º, nº2. a sociedade não pode opor a 3ºs a sua constituição ou qualquer outro facto derivado da sua constituição, enquanto o contrato não tiver sido publicado.
art.168º, nº3 -» estabelece um prazo razoável: durante os 16 dias posteriores à publicação, os actos são inoponíveis a 3ºs, desde que setes 3ºs provem que não estavam em condições de conhecer essa publicação.
art.168º, nº1 -» os 3ºs podem-se fazer prevalecer dos actos praticados por uma sociedade cujo contrato não esteja publicado.

“sociedades inválidas”: sociedades cujo processo constitutivo, estando completo, está viciado.
regime jurídico aplicável: os efeitos jurídicos decorrentes da existência de um vício contratual, variam consoante o momento da sua detecção: antes do registo (art.41º) e depois do registo (art.42º e 43º).
Antes do registo do contrato de sociedade, podem ser fundamente de invalidade do contrato de sociedade todas as causas gerais de invalidade do negócio jurídico (todos os requisitos de fundo, de forme e relativos às partes). ao esclarecer quais são os fundamentos, esclarece também quais são os efeitos: são também os efeitos: são também os efeitos gerais previstos na lei civil - » nulidade e anulabilidade. com as seguintes especialidades -> diferenças:
. a existência de uma invalidade relativa a uma das partes ou uma das declarações negociais, não acarretam necessariamente a invalidade do contrato de sociedade – a doutrina da redução do negócio jurídico tem aqui aplicação plena.
. embora a legitimidade e os prazos para se intentar uma acção de nulidade ou de anulabilidade se rejam pelas regras gerais, há uma diferença fundamental: a declaração de nulidade ou anulabilidade não opera retroactivamente, mas dá simplesmente lugar à dissolução e liquidação da sociedade (art.51º).
. no caso de a invalidade legal ser relativa apenas a uma das partes, existe aqui um regime especial de oponibilidade. há que distinguir 2 casos:
I. se a invalidade procede da incapacidade de uma das partes, esse vício é oponível pelo incapaz, quer aos sócios, quer a 3ºs. esta oponibilidade concretiza-se em o sócio incapaz poder recusar-se a prestar a sua entrada, ou caso a tenha já prestado poder reaver o que prestou.
quanto a 3ºs -» os 3ºs que pudessem ter qualquer direito de acção contra os sócios em geral, não o têm contra aquele sócio em concreto.
II. quanto aos restantes vícios da vontade, o art.41º, nº2 diz que o regime de oponibilidade é diferente: são apenas oponíveis aos restantes sócios, mas já não a 3ºs.

Depois do registo -» aqui o regime é diferente.
O regime diferente justifica-se pela necessidade da protecção de terceiros de boa-fé. Num momento em que a legalidade e a regularidade de uma entidade já foi afiançada por 20 dias de fé-pública ( notário e conservador).A sociedade já tem o seu processo constitutivo quase completo ( só faltam as publicações ) e já terá iniciado certamente a sua actividade e isso viria a acarretar enormes consequências.
O regime é este: só um lapso muito pequeno é que pode constituir causa de invalidade de um contrato de sociedade já registada. Só os vícios referidos no artº 42º/1 (para as SQ.,SA., e SC., sociedades de capitais) e no artº 43º/1 para as sociedades em nome colectivo e comandita são fundamento de invalidade. Artº 42º/1 são casos limite; artº 43º/1tem um leque taxativo de vícios relativamente às sociedades de pessoas. também no plano dos efeitos, há uma série de especialidades face à lei civil: ao contrário da lei civil, existem alguns vícios, 2 destes são, que podem ser sanados por deliberação dos sócios: artsº 42º/2 e 43º/3.
A acção de nulidade não pode ser proposta a todo o tempo, mas apenas no prazo de 3 anos a contar da data do registo: artº 44º. a verificação de alguma invalidade só opera ex nunc, para o futuro, abrindo caminho à dissolução ou liquidação da sociedade, artº 52º.
Existe um regime especial, art.º 45º e 47º, como nos contratos sem registo, em matéria de oponibilidade, distinguindo:
1.A causa de invalidade que é a incapacidade: artsº 45º/2 e 46º, é causa de anulabilidade do negócio só relativamente ao incapaz, é uma invalidade relativa.
2.Todos os outros vícios de vontade: a que a lei acrescenta os casos de usura, é causa de exoneração do sócio prejudicado ou atingido, artsº 45º/1+240º, preceito geral que regula o instituto de exoneração dos sócios.

Regime aplicável:

1)à anulação do negócio;
1) à exoneração do sócio atingido art.º 45º a 48º. o sócio atingido fica com o direito de reaver tudo o que prestou e não fica obrigado a realizar a sua entrada. Relativamente a terceiros não pode opor essa invalidade. Art.º 48º isto é válido relativamente não só aos sócios fundadores, mas também aos sócios posteriores.

Problema das alterações no contrato de sociedade
O contrato de sociedade constitui fundamento do nascimento de uma nova entidade, a sociedade não é apenas um ente jurídico, mas também um ente económico. Esta entidade evolui. Sucede frequentemente que esta evolução do sujeito económico venha exigir uma readaptação dos próprios contratos da sociedade, são uma espécie de carta organizacional da sociedade, no sentido de as adaptar às novas necessidades ou vissicitudes. Essa renovação está prevista nos artsº 85º a 96ºCSC. este princípio de alterabilidade do contrato de sociedade é universalmente aceite, o que pode variar é a fundamentação: uns fundamentam com a regra do artº 406ºCC, há outros que consideram que aquele preceito tem uma natureza imperativa, vale mesmo no silêncio do contrato. Se o contrato de sociedade proíbe a alteração do ctt deve considerar-se tal clausula como inexistente.

Modalidade e âmbito das alterações de que a lei fala
I. modificação de uma clausula do contrato
II. supressão de uma clausula do contrato
III. introdução de uma nova clausula
Tudo isto são alterações relevantes, quer sejam alterações de natureza relativa ao fundo ou à forma, ex. alteração da enumeração das clausulas.
Ambito: estão abrangidas todas, mas apenas as alterações convencionais e objectivas do contrato. estão abrangidas as alterações objectivas não estão abrangidas as alterações dos sujeitos ( do substracto pessoal ) do contrato. ex.: entrada de novos sócios e sua saída. são abrangidas as alterações convencionais, não são alterações, as alterações provenientes da vontade do legislador, mas só as resultantes da vontade das partes, constituindo as normas jurídico- societárias elemento do conteúdo do contrato de sociedade ( elementos implícitos), uma alteração das normas não constitui alteração do contrato de sociedade. não está coberto pelo âmbito do conceito de alteração.
assim estão abrangidas todas as alterações convencionais e objectivas. as mais frequentes:
I. alteração do capital social; pode consistir ou numa redução de capital ou num aumento de capital, são duas operações que a lei regula expressamente no artº87º
II. alteração do objecto social; normalmente não passa por uma alteração radical, mas pelo aditamento de novas actividades



III. modificação da sede social; o regime legal varia, por vezes facilita a alteração, ex.: dentro do mesmo conselho basta a simples deliberação do conselho geral; por vezes dificulta, ex.: alteração para local no estrangeiro, só pode ser aprovado por deliberação de maioria de 374 dos sócios
IV. modificação da forma da sociedade; a que a lei chama transformação, artsº 130º e ss.

Princípios, processo e forma a que obedece a alteração do contrato de sociedade
A alteração deve resultar de uma deliberação da assembleia geral, art.º 85º/1.se o contrato de sociedade constitui a expressão da vontade dos sócios fundadores, é natural que sejam eles a decidir a sua alteração .mas esta competência que é normalmente exclusiva, pode ser cumulativa em casos excepcionais, ou seja é decidida não apenas pela a.g. mas também pelo conselho de administração.
O artº 456º CSC prevê a possibilidade de um aumento de capital de uma SA. poder ser decidido pelo conselho de administração (sozinho). os sócios participam ao introduzir no contrato de sociedade a clausula que autoriza o conselho de administração a deliberar sozinho. fora deste caso excepcional, é uma atribuição da a.g., que não pode transmitir para outro órgão, nem para um órgão estranho à sociedade, nem sequer para o tribunal.
aplicam-se aqui as regras fixadas para cada tipo de sociedade em concreto: a lei afastou-se aqui da regra da unanimidade. as maiorias exigidas para a alteração são
SNC.: exige-se a unanimidade (único caso), o contrato de sociedade pode fixar a maioria qualificada, desde que seja sempre igual ou superior a ¾ dos votos;
SC: exige-se a unanimidade dos sócios comanditados e 2/3 dos sócios comanditários, artº376º;
SQ: exige-se ¾ dos votos correspondentes ao capital social, embora o contrato de sociedade possa fixar uma maioria mais exigente ou mesmo a unanimidade, artº265º/1; art.º 265º/2: o contrato de sociedade pode prever um dto especial, o favor de um sócio ( pode exigir o voto favorável de um sócio);
SA .e SC. por acções: a lei prevê uma maioria de 2/3 dos votos emitidos, são maiorias deliberativas. mas, nas SA., a lei para além de um quorum deliberativo, exige um quorum constitutivo:
1ª convocação, pelo menos um terço do capital
2ª convocação, porque……sócios artsº 386º/2 e 364º em qualquer dos casos, exige-se pelo menos 2/3 dos votos emitidos. caso estejam presentes ½ do capital, a lei permite que a deliberação da alteração seja aprovada apenas por ½.



Forma da alteração do contrato de sociedade: artº 85/2 “escritura pública”
A alteração do contrato de sociedade só produz efeitos perante terceiros após a sua escritura pública, eficácia constitutiva.a alteração do contrato de sociedade não produz efeitos retroactivos: o registo só vale para o futuro. excepcionalmente produz efeitos retroactivos se se verificarem 2 condições:
I. se os efeitos só dizem respeito ás relações internas dos sócios dos sócios
II. se tal eficácia retroactiva for a forma de conseguir? a unanimidade dos sócios, artº86/1

3-A sociedade como p.c.

1.As características da sociedade- pessoa colectiva

1.1 A capacidade:

As. pc. constitui, simultaneamente, um n.j. bilateral e uma pessoa jurídica. nasce de um n.j., geralmente um contrato, mas esse n.j. dá sempre origem a um novo sujeito, com personalidade jurídica própria e distinta dos sócios. todos os tipos de sociedade regularmente constituída, possuem personalidade jurídica a partir da data do seu registo definitivo, artº5º csc.a personalidade jurídica das sc significa que esta sociedade constitui um novo sujeito, uma nova entidade, dotada de uma esfera jurídica activa e passiva própria, distinta dos sócios, dos membros dos órgãos da administração e dos credores.
Consequências jurídicas da atribuição da personalidade jurídica às s.c.: 3 planos diferentes
I. plano da capacidade;
II. plano da responsabilidade;
III. plano do património

Plano da capacidade: a atribuição de personalidade jurídica a uma s.c. levanta desde logo, o problema da sua capacidade. atribuições normativas fundamentais da personalidade jurídica de uma sociedade são, a capacidade de gozo e de exercício de direitos.
Capacidade de gozo: constitui um status inerente à própria personalidade jurídica, artº 67º cc.


2 aspectos da capacidade de gozo da s.c.:

a)Forma :

b) ver atrás sede : local onde a sociedade se encontra situada para efeitos jurídicos, nomeadamente para determinar o domicílio da sociedade, para determinar a lei aplicável á sociedade. a sede é um dos elementos obrigatórios do próprio contrato de sociedade, sob pena de nulidade do contrato, se bem que sanável. artº 12º: deve ser estabelecido em local definido, determinado. não se pode dizer “a sede da sc será o local que a administração haja determinado”.

Acepções possíveis de sede conceito de sede estatutária :

1-Conceito de sede estatutária- local que vem designado nos estatutos sociais como sendo a sede da sociedade;
2-Conceito de sede efectiva : local onde o cérebro da sociedade funciona, local onde os órgãos ( conselho de administração, órgãos deliberativos e executivos )têm o seu centro, local onde o seu centro nevrálgico se situa.

O conceito de sede estatutária é importante para determinação do domicílio da sociedade, determinação do lugar onde devem ser realizadas certas formalidades de publicidade, artº25ºCRC.O conceito de sede efectiva é importante, nos termos do artº 3/1CSC, para efeitos de determinação da lei pessoal da sociedade, para sabermos qual a lei aplicável e reguladora de uma sociedade.


Mudança, alteração do local da sede: artº 12º/2,3,5

Hipóteses: tratando-se da alteração do local da sede para outro local dentro do mesmo concelho ou para local em outro concelho, pode a mudança levar-se a cabo por simples decisão dos administradores, se o contrato de sociedade o permitir; for a destes casos a alteração da sede envolve a alteração do contrato de sociedade, estando sujeita aos requisitos de forma: deliberação por maioria qualificada dos sócios, escritura pública e registo da alteração do contrato.

Se a alteração da sede se dá para um local fora de Portugal, uma vez que esta alteração acarreta alterações a nível jurídico, muitas vezes altera-se a lei pessoal aplicável á sociedade, artº13º/1, neste caso a lei já vem requerer nº3 e 5 requisitos muito especiais, nomeadamente uma deliberação dos sócios por uma maioria de ¾ (75%) e um direito de exoneração dos sócios dissidentes.
ex.: Suponhamos que a AS a tem estatutos em que a uma delegação? Diz que a sede da sociedade será na rua x; o conselho de administração decide que a sede deve mudar para outra rua. como pode fazê-lo? Se estiver previsto no contrato, há possibilidade de o conselho de administração proceder à alteração. Se no contrato nada estivesse previsto, teria que se reunir uma maioria de 2/3 dos votos emitidos em assembleia geral. mas para o quórum constitutivo é significativo, no caso de estarem presentes na AG½ do capital social, a lei basta-se com esses 50%, maioria simples.
A alteração da sede só produz efeitos em relação a terceiros depois da respectiva escritura pública, artº86º/1, e do respectivo registo. questão de saber se há ou não uma verdadeira nacionalidade das pc.a sua importância analisa-se em 3 planos:
I. para efeitos de certos preceitos que se aplicam a sociedades nacionais , direito dos estrangeiros, artº15ºcrp
II. para efeitos de aplicação de tratados internacionais
III. para efeitos de protecção diplomática
A nacionalidade não é decisiva nem pertinente, para efeitos de determinação da lei pessoal da sociedade, a lei que regulará essa sociedade, porque a determinação da lei pessoal da sociedade é uma consequência, não da nacionalidade, mas do local da sua sede efectiva da administração.

3 tipos de critérios para determinar qual a nacionalidade de uma sociedade

1-Países anglo-saxónicos :

A nacionalidade da sociedade é determinada pelo local de incorporação, local onde a sociedade foi constituída, independentemente da sede efectiva ou estatutária: Teoria da incorporação.
2 .Maioria dos países europeus e portugal :

A nacionalidade é determinada pela sede da sociedade ( estatutária ou efectiva, dependendo dos países)
3-Critério próprio do contrato :
A nacionalidade é determinada pelo tipo de contrato, é determinada pela nacionalidade dos accionistas que controlam a sociedade, ou seja os sócios maioritários.
Uma sociedade pode teoricamente, ter a nacionalidade de um estado e reger-se pela lei de outro estado. uma coisa é a nacionalidade (que traduz a ligação da sociedade com um estado ), e outra é o seu estatuto pessoal (é uma questão abstracta, não reflecte um vínculo concreto, trata-se de saber qual a lei que regulará uma dada sociedade em concreto).Os critérios para a determinação de um e outro aspecto são semelhantes, e, por vezes coincidentes. Em Portugal, o critério para determinar a nacionalidade é o da sede efectiva. Assim o critério de sede efectiva é o critério da lei pessoal.
EX.: se uma sociedade designar um local em território português nos estatutos, muito embora o centro de decisão da sociedade esteja no estrangeiro, não pode sujeitar, por ex. os credores que têm o direito de fazer prevalecer a aplicação da lei portuguesa. Nem sempre a lei pessoal de uma sociedade será determinada pelo local da sede efectiva. Se for mais favorável aos credores, pode aplicar-se a sede estatutária.
Essa capacidade das SC está limitada :2 tipos de limites.

1-LIMITES LEGAIS: Tal como aconteça com as P.C. a capacidade de gozo é mais restrita do que a que têm as P.S.
artº 6º/1 CSC, reproduz quase literalmente a doutrina que a lei civil fixa para as PC, artsº160º/1 e 998ºCC.Artº6º/1 : consagra o princípio da especialidade do fim. A capacidade de uma sociedade abrange apenas a prática dos actos necessários ou convenientes à prossecução do seu fim. A lei não está a pensar no fim concreto que a lei desenvolve .Quando a lei fala em fim, está a pensar num fim abstracto: a finalidade lucrativa; não está a pensar no objecto social, porque isto significaria que a alteração da capacidade de uma sociedade estaria ao dispor dos sócios. Se estes podem alterar o objecto da sociedade, também poderiam alterar o âmbito da capacidade da sociedade.

Questão : saber se as sociedades têm capacidade para praticar liberalidades -Por vezes, uma sociedade realiza liberalidades, no contexto dos seus negocios. Ex brindes se por um lado, esses actos gratuitos conflituam com os fins lucrativos por outro lado, tais actos gratuitos podem ter um fim lucrativo mediato. De facto, os brindes visam captar a atenção dos clientes para os seus produtos Daí que a lei tenha previsto no nº2 do artº6º a permissão da prática de liberalidades, sob certas condições.
Questão : também no âmbito do princípio da especialidade do fim, saber se são válidas ou não as garantias que tenham sido prestadas pela sociedade a um terceiro.
Em princípio, a prestação deste tipo de garantias não é permitido:Artº6º/3: apenas permite que a sociedade preste este tipo de garantias em favor de uma sociedade que com ela esteja numa relação de domínio ou de grupo. Ex.: cartas de ……… Nas relações de grupo, muitas vezes, a única hipótese de uma sociedade “filha” ter acesso a crédito bancário, são as declarações de garantia que a sociedade “mãe” possa prestar pelo cumprimento das dívidas da sociedade “filha” aos respectivos credores.

Outro tipo de limites legais:

A capacidade de gozo de uma sociedade não abrange os direitos que lhe estão vedados por lei, artº1484º CC, direito de uso e habitação, direito de fazer testamento. Nem os direitos que sejam inseparáveis da personalidade singular ( no contexto das relações familiares e sucessórias ). Não estão excluídos os direitos pessoais, uma sociedade pode ser titular de direitos de personalidade: o direito ao nome

2-.LIMITES CONTRATUAIS OU ESTATUTÁRIOS: há quem considere que a personalidade de uma sociedade se encontra limitada pelo seu objecto estatutário. Há quem fale, ao lado do princípio da especialidade do fim, do princípio da especialidade estatutária: a SC só teria capacidade para praticar os actos necessários e convenientes à prossecução do seu programa económico.
Teoria ultra vires( para além do objecto ): a capacidade de gozo encontra-se limitada pelo seu objecto social, pelo que todos os actos praticados para além desse objecto caem for a do âmbito da capacidade dessa sociedade e serão tidos como actos nulos, ainda que todos os sócios tenham consentido na sua prática. Cada teoria foi criticada por deixar desacautelados os interesses de terceiros, que não que aquele acto cai fora do âmbito da sociedade.
O dto. Português veio recusar esta teoria, pelo menos em parte, no artº 6º: o objecto social estatutário não constitui logo um limite à capacidade de gozo da sociedade, mas um limite aos poderes dos órgãos sociais, nomeadamente, dos órgãos da administração.
Consequências:
1- Os actos praticados fora ou para além do objecto social, continuam como actos perfeitamente válidos; a sociedade acarreta com todos os dtos. e deveres decorrentes desses actos.
I. Essas clausulas que limitam o âmbito do objecto, criam para os órgãos sociais um dever de não ultrapassar o objecto social. Os actos que violam esse dever, sendo válidos, obrigam os membros que o praticam a responder pelos prejuízos resultantes desses actos para a sociedade .Artº 72º e ss. : responsabilidade civil dos administradores, directores e gerentes. Os actos praticados fora do objecto permanecem válidos.
À doutrina geral do artº 6º/4 há que acrescentar:
SNC e SC : os actos praticados em nome da sociedade pela gerência fora do âmbito estatutário, permanecem válidos, mas a sociedade tem a possibilidade de os impugnar, caso nem todos os sócios tenham consentido .
Razão : responsabilidade ilimitada dos sócios, não era justo vincula-los às consequências de actos praticados pelos gerentes.
SA e SQ : os actos extra estatutários praticados vinculam a sociedade em qualquer caso desde que : os actos tenham sido praticados dentro de poderes que a lei confere aos seus autores ( os poderes de representação dos gerentes de uma SQ são gerais artº 260º e os poderes dos órgão da administração de uma SA são mesmo exclusivos) 409º.
A sociedade só poderá opor a terceiros as limitações decorrentes do seu objecto social estatuário, se a sociedade conseguir provar que o terceiro tinha conhecimento da natureza extra estatutária dos actos e se esses mesmos actos não foram confirmados por uma deliberação dos sócios ( condição cumulativa ).Só em hipótese académica é que os actos praticados por uma sociedade não a vinculam, ex.: SQ A celebra um ctto com B (gerente de uma sociedade, consequências, o ctto é válido, vincula a sociedade ), pelos prejuízos que decorrem desses actos, respondem pessoalmente os gerentes dessa SQ. As limitações decorrentes do objecto social estatutário, só são oponíveis a terceiros, caso ele tivesse conhecimento do objecto social estatutário, e caso não seja assumido o acto pela Ass. Geral dos sócios.
AO LADO DA CAPACIDADE DE GOZO HÁ A CAPACIDADE DE EXERCÍCIO
As SC, ao contrário das pessoas singulares, vivem numa radical incapacidade de exercício, é um puro produto do dto., é uma invenção jurídica porque as sociedades estão impossibilitadas de actuar pessoalmente no tráfico jurídico. Esta incapacidade radical pode ser motivo de uma certa insegurança para terceiros; os problemas derivados dessa incapacidade de exercício situam-se no âmbito do seguinte problema, quando o órgão que retirou em nome da sociedade não tinha poderes de representação para a pratica dos actos.




1.2-PLANO DA RESPONSABILIDADE PELOS ACTOS PRATICADOS EM NOME DA SOCIEDADE

Se a lei concedeu à sociedade essa capacidade jurídica também regulou os termos em que a sociedade pode responder pelos actos praticados em seu nome.
Tipos de responsabilidade : civil, penal e “ social ”.

1-responsabilidade civil : as SC respondem pelos prejuízos causados a terceiros por actos praticados em seu nome. A doutrina geral consagra o artº 6º/5, tem sido interpretado no sentido de abranger todos tipos de r.c. ( contratual, extra contratual e dentro desta a responsabilidade derivada de actos lícitos, por actos lícitos e pelo risco ).
Termos gerais :
a sociedade responde sempre pela conduta, positiva ou negativa, das pessoas singulares que a representam:
I. garante nas SC simples, SNC e SQ, artº 192º e 252º
II. administradores, directores e os membros do conselho geral nas SA, artº 431º e 441º
III. para as sociedades dissolvidas, os liquidatários, artº 152º
O âmbito dos poderes de representação não são sempre os mesmos, os dos gerentes nas SQ é geral, mas não é exclusivo, o dos directores das SA é exclusivo.
As sociedades respondem nos termos em que o comitente responde pelos actos do comissário. Reproduz-se a doutrina dos artsº 165º e 999º C.C. que remetem para o artº 500º, responsabilidade que não assenta na culpa do comitente. Para haver responsabilidade de uma sociedade é preciso que relativamente ao comissário se verifiquem também os requisitos.
Uma SC responde pelos actos dos seus representantes nos seguintes casos:
I. sobre o órgão ou agente recaia também a obrigação de indemnizar, artº 500º/1 C.C.
II. os actos praticados pelo órgão ou pelo agente em poderes de representação tenha sido praticado no exercício da sua função, e não apenas por ocasião dela artº 500º/2 C.C.
III. a sociedade que tiver respondido perante um terceiro por actos ou omissão de um membro de um seu órgão, terá direito de regresso contra esse órgão. Não é pelo facto de o acto praticado por um garante de uma SQ gerar uma obrigação de indemnização para a sociedade que esse acto viola o standard. Nem sempre haverá pois direito de regresso.

2-responsabilidade penal : questão de saber se as SC estão ou não sujeitas a r.p.. Vigorou durante muito tempo o principio da irresponsabilidade criminal das P.C..
Fundamentos:
I. a P.C. não pode praticar crimes, em virtude da especialidade estatutária e legal ; os actos criminais estão evidentemente for a dos actos necessários ou convenientes aos seus fins. Este argumento não é inteiramente verdadeiro, por que uma sociedade pode praticar um crime na prossecução dos seus fins.
II. A P.C. não tem vontade própria à qual se pudesse imputar um actividade criminal. Mesmo que fosse possível imputar uma conduta criminosa a uma P.C. , jamais seria possível aplicar uma sanção penal ( dizia-se ).
Mas isto não é verdade para o caso das penas pecuniárias, dos crimes e das penas não pecuniárias ( dissolução social, encerramento da linha de produção, etc.).
O nosso dto. vem, aparentemente admitir no artº 11º do Código Penal a responsabilidade penal das pessoas colectivas ( logo das sociedades). Se bem que hoje quem entenda que este artº não dá uma base forte para se retirar um princípio de responsabilização. Mas é o único meio eficaz contra abusos.

3. Responsabilidade “social” : alguns autores americanos ( década de 70 ) começaram a falar de uma responsabilidade social da empresa. Não tem nada a ver com a resp. mas antes com um conjunto de obrigações que decorrem de a sociedade comercial sobretudo a sociedade anónima ( S.A ) ter um estatuto de 1ª grandeza, e que têm reflexos mto. importantes numa série de destinatários jurídicos: sócios, directores, trabalhadores, credores, consumidores e as próprias autoridades públicas, Estado; ex. – matéria do ambiente. Ainda não existe uma consagração legal, houve alguns ensaios , nos EUA a nível de legislação para a consagração desses interesses, mas parece que não vingou. Nos dtos. europeus há algumas formas semelhantes mas mais mitigadas. Ex- na Alemanha há a participação dos trabalhadores na gestão e lucros da sociedade, sobretudo da S.A.

1.3-PLANO DO PATRIMÓNIO DA SOCIEDADE

1-(AUTONOMIA PATRIMONIAL)

A sociedade comercial ( S.C.) constitui um novo sujeito de dtos. e obrigações, o que implica que está dotado de um património próprio e distinto dos credores que nele participam: sócios e administradores.
Património social X capital social : prestação social é o conjunto de elementos activos e passivos de que uma sociedade é titular ( dtos. e deveres pecuniários avaliáveis de que uma sociedade é titular), sendo um valor de natureza real e variável, varia de acordo com o desenvolvimento da actividade da sociedade.
Capital Social – cifra contabilística representativa da soma das entradas dos sócios. É um valor de natureza não real, mas idêntico e não variável, fixo. Alteração de capital só é possível em certos casos e nos termos previstos pela lei.

Autonomia patrimonial perfeita X imperfeita : uma das consequências da atribuição da personalidade jurídica a uma S.C, é que é esta que encabeça, é titular de toda a prestação social e não os sócios, nem os directores. Se a S.C. desse origem a uma situação de compropriedade ou comunhão, os sócios seriam os titulares dos bens essenciais e co-devedores das dívidas da sociedade. Os sócios são titulares de uma posição jurídica complexa. Em face da sociedade que se designa por Participação social e recebe a sua designação específica em cada dos 4 tipos: parte, quota, acções. Essa participação social, consiste num conjunto de dtos. e deveres de que o sócio é titular em face da sociedade, de natiureza patrimonial. EX –dto. aos lucros; e de natureza extra- patrimonial , ex- dto. ao voto e dto. à impugnação.

2-AUTONOMIA PATRIMONIAL E OS SÓCIOS

Essa situação vem definir aspectos do regime jurídico dos sócios, quer no plano das relações externas, quer no plano das relações internas da sociedade.
Relações internas ( actividades do sócio para a sociedade) : há 4 consequências:
I. o sócio não possui qq dto. real sobre os bens da sociedade, porque estes pertencem em propriedade ou em qualquer outro título, à sociedade
II. o sócio não possui qualquer dto. face às respectivas entradas. As entradas valem com o acto de transição do sócio para a sociedade, e da sociedade para o sócio. Isto é importante para efeitos de distribuição dos risco, para efeitos fiscais, ex.- para saber quem paga a SISA.
III. A participação do sócio tem um valor mobiliário. Mesmo que no activo social sejam imóveis, o dto. do sócio será sempre um dto. mobiliário
IV. A transmissão da participação do sócio não envolve qq transmissão dos bens sociais, nem o desaparecimento do sócio ou da sua participação implica necessariamente a extinção da sociedade. Pelo contrário, a lei permite a unipessoalidade ??
Relações Externas ou passivas : há que distinguir consoante o tipo de sociedade:
A. Sociedade de resp. limitada – vigora uma autonomia patrimonial perfeita, os sócios não respondem pelas dívidas sociais, só os bens sociais é que respondem. Os sócios só respondem pelas obrigações de entrada.
B. Sociedade de resp. ilimitada – autonomia patrimonial imperfeita, os sócios podem vir a responder pelas dívidas sociais quando os bens sociais não cheguem.
A regra, mesmo para as sociedades de pessoas, é a de que os sócios não respondem pelas dívidas sociais. Só quando haja uma situação deficitária, é que os sócios são obrigados a pagá-las com os seus bens pessoais. A distinção entre o património dos sócios e o património da sociedade não é absoluta, na prática, tal separação pode ser real entendida por sócios e gerentes de empresas de dimensão reduzida ( quase familiar) tendendo a considerar o património da sociedade como mais um elemento do seu património social.
Os vários laços comunicativos entre o património da sociedade e o património dos sócios:
I. o sócio pode vender à sociedade bens seus a preços elevados
II. a sociedade vende ao sócio bens a preços irrisórios, etc
A lei previu vários mecanismos para prevenir estas situações de confusão do património – artº 84º CSC, de carácter legal : resp. do sócio única, se uma sociedade se vir reduzida a 1 único sócio e estiver na falência o sócio único responde directamente ( não subsidiariamente) e ilimitadamente, se se provar que não se respeitou o princípio da separação dos patrimónios.
Carácter jurisprudencial: técnica da desconsideração da personalidade jurídica. A desconsideração da personalidade jurídica é um tema genérico de referência de um activo especializado, que refere a circunstância de o tribunal ignorar a personalidade jurídica da S.C. para ver a realidade e imputar aos sócios e/ou administradores um acto que foi praticado por todos em nome da sociedade e a responsabilidade prevista desse acto. É uma válvula de escape a que o tribunal recorre para evitar os abusos que a utilização excessiva do elemento da autonomia patrimonial pode conduzir. Imputa nos sócios a responsabilidade de certos actos que forem praticados apenas formalmente em nome da sociedade.

3-AUTONOMIA PATRIMONIAL E OS CREDORES
Autonomia do património social vem definir a posição jurídica dos:
III. credores sociais: têm dto. exclusivo sobre o património social podem satisfazer os seus créditos mediante a agressão e execução dos bens sociais, sem preferência sobre todos as demais classes de credores ( sobretudo particulares) : dto. exclusivo a preferência de execução. Património social funciona como uma garantia para os credores sociais, esta garantia funciona de 2 maneiras :
A. como garantia exclusiva,
B. ou como garantia principal, não exclusiva.
S.A e S.Q ( sociedade por quotas) – têm uma autonomia patrimonial perfeita e resp. limitada. O património social constitui a garantia exclusiva dos credores sociais. Caso os bens da sociedade não cheguem para satisfazer os créditos dos credores sociais, estes não poderão agredir os bens pessoais dos sócios – Princípio da resp. limitada – artº 197º nº3 e artº 271º. É certo que os credores sociais podem exigir em nome da sociedade, aos sócios que não cumpriram as suas obrigações de entrada, que o façam – artº 30º. Mas, aqui não há uma excepção a este princípio, de que os credores só podem recorrer aos bens sociais. Os credores actuam na posição subrogatória, limitando-se a exercer dtos. da sociedade.
Excepcionalmente, o património pessoal dos sócios pode vir a responder por dívidas da sociedade e quando os próprios sócios nisso tenham consentido voluntáriamente, só pode acontecer nas SQ e mesmo assim com limitações – artº 198º. Esta responsabilidade tem que ser convencionada com um “tecto” – não é totalmente ilimitada. O sócio tem tb um dto. de regresso quanto àquilo a que tenha respondido no lugar da sociedade. Uma situação específica das sociedades unipessoais, em que o sócio único tenha transgredido o princípio da separação patrimonial – artº 84 º CSC
SNC e SC – os sócios têm uma resp. ilimitada e a sociedade goza de uma autonomia patrimonial perfeita; o património social é uma garantia dos credores sociais ( principal) mas não é a garantia exclusiva para os casos de os bens sociais não chegarem, os credores podem agredir os bens pessoais dos sócios – artº 175ºCSC.

IV. credores particulares dos sócios : não têm dto. de execução sobre o património social, sendo-lhes apenas reconhecido em certos casos 1 dto. de executar o património social do sócio devedor ( as acções que ele tem e que são do património pessoal do devedor) o que a lei pretende é afastar directamente os credores particulares do património social. – regras comuns a todos os tipos sociais.
O art 1000º do código civil espelha ter a ideia de autonomia patrimonial da sociedade. Fixa o princípio geral da incompensabilidade ( da não compensação) de débitos e créditos da sociedade e dos sócios. A lei quer manter débitos e créditos sociais & débitos e créditos pessoais perfeitamente separados. A isto soma-se um regime específico para cada tipo de sociedade:
SNC e SC ----a lei proíbe ao credor particular fazer a execução do património social do sócio devedor, reconhecendo ao credor apenas o dto. de executar o dto. aos lucros e o dto. à quota da liquidação do sócio devedor.
Artº 183ª nº1 – este regime explica-se pelo carácter “ intuito personas” deste tipo de sociedades, onde repugnaria a solução da lei que permitisse o ingresso na sociedade de 3º quando estranhos. Estas garantias ( artº 183º ) que a lei oferece ao credor particular do sócio são 1 pouco emanescentes
O dto. do credor particular de executar o dto. e os lucros do sócio devedor é um dto. que pode nem sequer se concretizar porque a lei fala de lucros distribuídos e nem sempre a sociedade distribui efectivamente os seus lucros e além disso a sociedade pode não ter lucros, ou os lucros podem ser reinvestidos na empresa.
Ainda menos substância terá o dto. do credor executar a quota da liquidação.
A penhora da quota de liquidação, só se pode chamar efectiva quando a sociedade se dissolver e liquidar, o que pode nem acontecer em vida do credor particular. E nessa matéria a liquidação pode resultar em que não há um valor positivo, mas negativo. É o que acontece quando a sociedade se dissolve por falência.
Acresce a isto um 3º aspecto que vai acentuar a emanescência destas garantias. Nos termos do artº 183º, os demais sócios da sociedade gozam o dto. de preferência na adjudicação dos dtos. referidos no artº. Logo por obedecer a estas razões, a lei vai facultar ao credor particular do sócio, que requeira a liquidação da parte social do sócio devedor. Artº 183º nº 2 – não há aqui uma agressão aos bens da sociedade. Só depois de os bens serem desafectados da sociedade é que vai ser movida a execução. A liquidação da parte social do sócio devedor não é sequer automática, depois do credor a ter pedido. A liquidação não terá lugar se a sociedade prever que o sócio devedor possui outros bens pessoais, suficientes para a satisfação da dívida – artº 183º nº3.
Além disso, a sociedade também pode evitar a liquidação do património social, caso preveja que com essa liquidação a situação líquida da sociedade iria tornar-se inferior ao montante do capital social. Nestes casos não é permitida a liquidação – artº188º?185º? – o credor poderá nesse caso, requerer a dissolução da sociedade – artº183º nº4 e parte final do nº2.
Mais uma vez é notada a defesa do estatuto personalístico deste tipo de sociedades.
Em casos de falência, os credores sociais gozam de um dto. proporcional em face dos credores particulares do sócio. Artº 216º Cód. Falência – o produto da massa falida é utilizado para pagar 1º aos credores sociais e o que resta é para os outros.
S.A e SQ _ - o regime é diferente. Embora continue a ser impossível aos credores particulares agredir o património social, a lei já possibilita a esses credores executar a parte social do sócio devedor.
SQ – os credores particulares podem executar a parte social do sócio devedor – artº 235º. Esta execução tanto pode consistir na adjudicação judicial da quota ao credor ( este torna-se sócio), ou na venda judicial da parte ( neste caso, o credor é pago com o produto da venda da quota em hasta pública ). Este dto. do credor à execução da quota não é prejudicado por outros regimes de intangibilidade das partes sociais que estejam previstos no contrato da sociedade – artº 239º nº 2.
O arttº 229º não prevê a possibilidade do contrato social estabelecer cláusulas que prevejam limites à transmissibilidade das quotas sociais .Esses eventuais artigos existentes, não se aplicam em processo executivo.
Se não se previssem que estas eventuais normas não se aplicam, as sociedades por quotas podiam tornar completamente impenhorável uma parte até significativa do seu património.
Mas a lei não deixou a sociedade, ao saber das contingências originadas em transmissão em via executiva, em homenagem aos interesses dos sócios da sociedade comercial, a lei previu 2 mecanismos que visam proteger a sociedade contra a intromissão de 3ºs estranhos à sociedade:
1-credor, quer à sociedade , quer aos demais sócios, com 1 dto. de preferência na adjudicação ou na venda judicial ( 239º nº 5 )
2-permitiu que a sociedade consagre estatutáriamente 1 dto de amortização das quotas em caso de penhora . No caso das quotas de um sócio haverem sido transmitidas em via executiva, a lei permite que a sociedade consagres estatutárias 1 dto. de amortização das quotas – art- 239º nº 2 CSC.
S. A.- os credores particulares do accionista devedor podem executar as acções do mesmo. Dado que estas partes sociais se encontram matriculadas em títulos de crédito, sem facilidades negociais.
V. penhora ou venda dessas acções, por declaração judicial, venda particular ou venda na bolsa
VI. adjudicação judicial das acções, tornando-se o o credor particular um sócio da sociedade.
Mais uma vez, este dto. do credor particular à a execução das acções não é prejudicado por eventuais limitações à transmissibilidade das acções, fixadas no contrato social – artº 328º.





4-AUTONOMIA PATRIMONIAL E OUTROS ORGÃOS DE ADMNISTRAÇÃO

(administradores, directores, gerentes)
A separação deste património social e património pessoal dos administradores existe juridicamente mas nem sempre é bem atendida e respeitada no plano das... e nos casos das pequenas sociedades familiares.
No caso das grandes S.A que têm um capital social disperso e em que os administradores assumem um protagonismo enorme são eles praticamente os donos.
Nestes 2 casos esta separação tende a ser desrespeitada. Por isso, a lei previu determinados mecanismos ( de natureza preventiva e repressiva ou sancionatória) para atenuar estas situações:
VII. mecanismos de natureza preventiva:
Artº 397º - disciplina relativa aos negócios celebrados entre os sócios e os próprios administradores. Os contratos entre os administradores e os sócios não são permitidos. Ex- uma sociedade não pode fazer-lhes empréstimos.
VIII. Mecanismos de natureza repressiva:
Disciplina geral da responsabilidade civil e penal dos administradores.


2-FINANCIAMENTO E ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE COMERCIAL ENQUANTO PESSOA COLECTIVA

2.1-Capital Social
Financiamento : capital social X património social
Património Social – constitui o conjunto dos elementos activos e passivos pecuniários avaliáveis, de que a sociedade é titular ( conjunto dos dtos. e deveres avaliáveis em dinheiro). Constitui um valor de natureza ideal e de natureza variável.

Capital Social - cifra contabilística, representativa da soma das entradas dos sócios. Constitui um valor de natureza ideal e fixa.
Esta diferença é mais acentuada se pensarmos que a coincidência entre os valores do capital social e do património social é ocasional. Podia raciocinar-se do seguinte modo: a soma das entradas dos sócios é no rol da constituição da sociedade, todo o seu cerne patrimonial. Mas tal não é exacto, a própria lei permite que a sociedade se possa constituir, mesmo que se verifique uma disparidade das entradas para o rol posterior. A lei permitiu, excepcionalmente o pagamento das prestações de entrada que consistam em dinheiro possam ser diferido com limites. Estes são aliás os casos mais frequentes
Por aqui se vê que o capital social o património social, mesmo na referência da constituição da sociedade, não coincidam. Esta diferença torna-se ainda mais nítida com o decurso da vida social.
Decorrido o 1º ano da vida social, procede-se ao balanço ou o balanço social regista lucros ou regista perdas. Se regista perdas, significa que o valor do activo desceu abaixo do valor do capital social.
Se regista lucros, jamais em princípio, pode haver igualdade do capital social e do património social. Desses lucros, há uma parte que vai ser impreterivelmente canalizada para a própria sociedade : são as reservas legais, existem sempre; as reservas estatutárias são quando o contrato as prevê.
Daí que o valor do património social será sempre diferente do valor do capital social.

2.1.2-FUNÇÕES DO CAPITAL SOCIAL – são diferentes consoante o plano:
*1-Relações internas. – são funções em 3 planos
IX. no plano da determinação da situação económica da sociedade: periódicamente, em regra 1 vez por ano, as sociedades comerciais devem proceder ao apuramento da situação económica, para averiguar a existência de lucros ou perdas da sociedade e para possibilitar aos sócios providenciar e tomar conhecimento sobre a gestão da sociedade. O capital social constitui aqui um valo de referência fundamental para este apuramento da situação económica da sociedade.
Se o valor do activo ( património líquido) da sociedade é superior a esse valor de referência ( do capital social ) há um acréscimo do fundo patrimonial então existente .Se o valor do activo lhe é inferior, foi uma perda.
X. no plano da determinação dos dtos. dos sócios ( dtos. sociais dos sócios): o capital social constitui ainda uma forma de referência fundamental, há determinação e quantificação dos dtos. sociais dos sócios, sobretudo nas sociedades de capitais. Por um lado, em qualquer tipo de sociedade há certos dtos. sociais que são determinados e qualificados em função da proporção ( fracção) do capital que é detido por cada sócio. Ex- dto. aos lucros.
O dto. aos lucros é determinado na proporção da fracção que este sócio detém no conjunto do capital social, dto. de propor acção de responsabilidade contra os órgãos da administração ( artº 77º ), dto. que só pode ser exercido mediante a detenção de uma certa fracção do capital social.
Em certos tipos sociais, em particular nas S.A , existem também vários dtos. que são determinados pela detenção do capital social :
XI. dto. de voto – S.A por cada...um voto. se : por cada 250$ de valor social de uma quota, um voto. Quanto mais capital, mais votos.( 384º, 250º )
XII. dto. de informação (251º)
XIII. dto. de requerer um inquérito judicial à sociedade ( 252º)
XIV. dto. de requerer a convocação da Assembleia Geral
XV. dto. de nomeação de um representante para o Conselho de Administração.
é um importante critério auxiliar da organização e funcionamento da sociedade: de facto, o capital social funciona como critério auxiliar no funcionamento e organização da vida social. A cifra do capital social é importante para efeitos de organização interna da própria sociedade.
A constituição de reservas legais estabelece-se em função do capital social, é um valor fundamental para a organização e funcionamento das Assembleias Gerais. Ex.- normas constituitivas, deliberativas, eleição do presidente da assembleia.
2 - RELAÇÕES EXTERNAS
Aqui, o capital merece mais atenção a função principal é a de funcionar como garantia para 3ºs. Para assegurar esse valor de garantia que o capital social representa, a lei estabelece regras imperativas:
XVI. em matéria de constituição de capital – as regras da constituição do capital social são várias . Porque o capital social constitui uma garantia para 3ºs, a lei fixou desde logo o valor mínimo para o capital de certas sociedades, das S.A –50000 euros; SC por acções – 50.000 euros; S.Q. – 5000 euros; este é o valor nominal mínimo para o capital. Mas a lei também fixou um valor nominal mínimo para as fracções eu que tal capital se compõe: 1 acção:1 cêntimo ( valor nominal mínimo) e 1 quota = 100 euros.
O valor da entrada de cada sócio deve ser , pelo menos, igual ao valor nominal da fracção social que subscreveu .
Via de regra, os 2 valores: valor nominal da acção e valor nominal da entrada são idênticos – emissão acima do par, mas nunca abaixo do par.
A lei permitiu porém, que o valor da entrada seja superior ao da parte social subscrita, mas já não permitiu que o valor da entrada seja inferior ao valor nominal da parte social.
Razão: Estaríamos a violar o capital social. Fala-se em acções acima e abaixo do par. A lei permite que o valor da subscrição seja superior ao seu valor nominal ( emissão acima do par), a lei o que não permite é que a acção tenha um valor de subscrição inferior ao seu valor nominal ( abaixo do par)
CAPITAL SUBSCRITO X CAPITAL REALIZADO
O capital subscrito é o capital que os sócios se obrigam a pagar,
O capital realizado são as partes que já foram liberadas pelos sócios, ou seja, a obrigação de pagar já foi cumprida.
A lei previu 2 tipos de mecanismos:
XVII. de natureza preventiva:
A. proibição de emissão de acções sem valor nominal;
B. proibição de emissão de acções com valor abaixo do par
C. artº 26º: obrigação geral de realização das entradas no rol da constituição da sociedade, salvo quando a lei permite o diferimento para rol posterior.
XVIII. de natureza repressiva:
A. responsabilidade do sócio inadimplente: artº 25ºnº2, 206º, 285º
B. responsabilidade dos demais sócios – quotistas e dos demais sócios de responsabilidade ilimitada: SQ – artº197, nº1 / SNC – artº 175º, nº 1 /SC simples – artº474º--175º
XIX. em matéria de conservação do capital: regras de conservação, manutenção do capital social.
Desembocam no princípio da intangibilidade do capital social. Para que o valor da garantia do capital social para 3ºs se mantenha, é importante para o capital social, depois da sua constituição, se mantenha ao longo da vida social. O capital social deve nascer bom e manter-se intacto.
Princípio da Intangibilidade: o património líquido da sociedade não pode descer abaixo da cifra do capital social. Isto não significa que a sociedade tenha que ter todo o rol nos seus cofres,valor igual ao seu capital. Não significa que a sociedade não possa registar perdas. Diz é que o património líquido não pode descer abaixo da cifra do capital social, em virtude da atribuição aos sócios de bens sociais.
Há a consagração legal deste princípio: são grupos de normas destinadas a assegurar essa intangibilidade.
1º grupo: regras que proíbem a distribuição aos sócios de valores (bens) necessários para manter intacto um fundo patrimonial líquido equivalente ao do capital social: artº 29º, 31º, 34º CSC. Ex- 32º diz que não podem ser distribuídos aos sócios, bens sociais qunado o património líquido é inferior ao capital social.
Artº 21º, nº2 – proibição dos juros intercalares a lei proíbe a existência de cláusulas colaterais que atribuam aos sócios outro tipo de retribuição ( 1 exercicio) que não os lucros.
Artº 33º - os lucros de exercício não podem ser distribuídos aos sócios, sempre que sejam necessários para cobrir prejuízos transitados ( de exercícios anteriores) ou para fazer reservas ( legais ou estatutárias ).
Nº 3 :reservas ocultas – são fundos financeiros que existem na sociedade mas clandestinamente. Resultam de uma sub-avaliação das bases da sociedade. A lei não permite a distribuição dessas reservas ocultas aos sócios.
Artº 29º - proíbe a restituição directa ou indirecta das entradas dos sócios, é proibido que a sociedade adquira aos sócios bens particulares destes, quando esta aquisição seja uma forma complexa de fazer regressar ao património pessoal desses sócios, as entradas que estes realizaram.

Uma ideia geral subjacente a certas normas : proibição da distribuição de lucros fictícios, de quantias que não correspondem, de todo em todo, a um verdadeiro acréscimo do património social.
Para reforçar este grupo de proibições, a lei estabelece um grupo de mecanismos:
XX. qualquer distribuição de lucros ( bens sociais) aos sócios depende da prévia autorização da Assembleia Geral – artº 31º, nº1.A lei faz impender sobre os órgãos da administração da sociedade, o dever de não executarem deliberações ilícitas dos sócios, sob pena de responsabilidade perante a sociedade e responsabilidade penal..
XXI. o dever dos sócios de restituírem à sociedade os bens sociais que lhes foram distribuídos indevidamente (34º). Mas, sempre que os sócios estiverem de boa fé, sempre que possam provar que não conheciam nem podiam conhecer da ilicitude da distribuição, o sócio não é obrigado a restituir. É a sociedade que tem de provar a má fé. O capital social não fica desprotegido porque este regime está compensado pela responsabilidade civil ou penal dos administradores.

2º GRUPO - normas que exigem a existência de uma dada proporção entre o capital social e o património social, sendo que, por motivo de perdas, o património liquido da sociedade deixa de corresponder a uma proporção mínima do capital social. Se o conceito de património social fosse tomado à letra ele nunca poderia descer abaixo do capital social, mas a lei apenas se preocupa com que não haja uma desproporção exagerada. A proporção que a lei considera relevante é metade do capital social. Ex. : património liquido da sociedade=2500 contos; capital social 5000 contos.
Note Bem : o capital social não se "perde", o que se perde é o património. Não é pelo facto de uma sociedade Ter perdas que está imediatamente dissolvida. Essas perdas só são relevantes se superiores a metade(50%) do capital social, e mesmo assim a lei permite seguir três caminhos, permite que os sócios, em Assembleia Geral, possam optar por : dissolver a sociedade, ou reduzir o capital social, ou realizar entradas que reponham o património social em pelo menos dois 2/3 do capital social - art. 35º.

3º GRUPO - normas que disciplinam a alteração do capital social. O Principio da intangibilidade do capital social significa aqui a imodificabilidade do capital social, pois se o capital social pudesse ser arbitrariamente alterado pelos sócios isso lesaria os interesses dos credores e dos sócios. Tal reduziria o valor da garantia do capital, daí a necessidade de maioria qualificada para reduzi-lo. Se o capital social pudesse ser livremente aumentado a posição dos sócios(actuais) também seria prejudicada, pois estes veriam desvalorizada a sua participação(na proporção do aumento). Assim se compreende que o capital social só possa ser aumentado por deliberação de maioria qualificada dos sócios.

4º GRUPO - normas que regem as auto - participações : aquisição de quotas ou acções próprias pela própria sociedade. A lei assumiu aqui também uma posição restritiva. (se estamos perante hetero-participações, por terceiros, às aquisições corresponde uma entrada de bens na sociedade, mas se se trata de uma auto-participação não há entrada de bens, mas, pelo contrário, uma saída de bens que podem perigo o valor da garantia do capital social). Essa restrição legal concretiza-se assim:
• SQ (art. 220º) - a lei proíbe a aquisição de quotas próprias que não estejam integralmente liberadas, só permite a aquisição de quotas liquidadas;
• SA (art. 316º, 317º, 324º) - o regime é complexo : a lei proíbe totalmente a subscrição originária de acções. A sociedade não pode adquiri, no momento da sua constituição, as próprias acções que está a emitir. Uma sociedade pode adquirir as suas próprias acções, mas não no momento da sua emissão e não podem exceder 10% do capital social.

5º GRUPO - normas em matéria de amortização e remissão das participações sociais (acções e quotas). AMORTIZAÇÂO : operação de redução das quotas ou acções por um acto da própria sociedade. Uma amortização só pode ser levada a cabo desde que se assegure que o valor de garantia do capital social não foi afectado. Só pode ser levada a cabo quando o pagamento da contrapartida ao sócio não afecte o valor do capital social ou das reservas legais, dado que quando se amortiza uma quota, se extingue essa quota. A amortização de acções só é possível se houver redução de capital - art. 236º; 347º.

2.2.-Participação Social :

2.2.1-A POSIÇÃO JURÍDICA DO SÓCIO
posição jurídica complexa de que um sócio é titular, posição esse que traduz a existência de uma situação de sócio, composta por direitos e obrigações, e até às vezes por ónus e expectativas jurídicas, em relação à sociedade. Esta participação social recebe o nome de parte nas Sociedades em Nome Colectivo e Sociedades em Comandita simples, quota nas Sociedades por Quotas, e acções nas Sociedades Anónimas e nas Sociedades em Comandita por acções. Se alguém é titular de uma ou mais partes, quotas ou acções é o mesmo que dizer que ela é titular de direitos e obrigações em face da sociedade, conjunto esse de dtos. E deveres que está previsto nos arts. 20º a 30º CSC.

2.2.2-ESTATUTO JURÍDICO-PASSIVO DO SÓCIO : OBRIGAÇÕES

1. Obrigação de entrada: é uma obrigação do sócio de qualquer sociedade civil ou comercial, é a obrigação de entrar para a sociedade com bens ou serviços e em contrapartida o sócio receberá a respectiva participação social. A obrigação de entrada está prevista nos arts. 980º CC, 20º,a) e 25º a 30º CSC. É uma obrigação imperativa, a prestação de entrada é uma obrigação indispensável para a existência da sociedade, pois sem a entrada é impossível constituir o património originário. A não realização, a não realização tempestiva ou a realização puramente fictícia das entradas acarreta a nulidade da sociedade. A realização fictícia das entradas pode verificar-se:
• Sempre que o objecto da entrada não pertence ao sócio;
• Sempre que o bem com que o sócio quer entrar é um bem cuja disposição está dependente da autorização de um terceiro ( nomeadamente o cônjuge), se o bem não tiver valor pecuniário(ex.: patente que já caducou), bem com valor passivo superior ao activo;
• Sempre que o bem é contrário à lei, ordem pública ou bons costumes(ex. promessa de apoio político);


NATUREZA DAS ENTRADAS: as entradas podem consistir em bens monetários(dinheiro), bens em espécie(móveis ou imóveis), ou serviços(ex. conhecimentos profissionais).
Existem regras comuns e regras específicas quanto à natureza das entradas. Seja qual for a natureza da entrada é necessário que esses bens hajam sido discriminados nos contratos sociais, o seu conteúdo e o seu valor pecuniário - art. 9º,1 g) e h).
Quanto às prestações pecuniárias ou em espécie são admitidas como entrada em qualquer sociedade, mas têm de ser susceptíveis de penhora - 20º, a) - estando excluídos aqueles bens que , nos termos da lei processual civil, sejam absoluta ou relativamente impenhoráveis, como por ex. um jazigo. Os bens podem ser transmitidos para a sociedade em propriedade, em usufruto, dto. De locação, cessão de exploração, empréstimo. Nos casos de a entrada ser em espécie, o valor que foi dado pelos sócios a esses bens deve ser confirmado por um ROC - art. 28º. A lei quis assegurar que os bens têm um valor pelo menos igual ao valor nominal das acções que o sócio subscreveu - art. 25º,1.

PRESTAÇÂO DE SERVIÇOS: dão origem à figura do sócio de indústria. As regras são diferentes: as prestações em serviços só são admissíveis nas SNC e SC. Também aqui no contrato deve ser especificado qual o valor que é atribuído a esse serviço.
Art. 25º - o valor nominal da parte, quota ou acção(participação social) não pode ser superior ao valor real da entrada, mas pode ser inferior.

Art. 26º - Momento da realização das entradas - há que distinguir :
• Sociedades civis - aqui as entradas não têm de ser realizadas no momento da constituição da sociedade(no momento da realização do contrato);
• Sociedades comerciais - O regime é diferente. As entradas devem ser realizadas no momento da outorga do contrato de sociedade. O regime diverge conforme a mudança da entrada em causa:
a) Entradas em espécie - têm que ser celebradas antes ou no momento do contrato da sociedade;
b) Entradas em dinheiro - a lei permite que possam ser diferidas para um momento posterior, mas só em dois casos:
1. Só o permite nas Sociedades Anónimas e SQ;
2. Não é permitido o deferimento em termos absolutos, há limites quantitativos e temporais.Na SQ a lei permite que o pagamento da entrada seja diferido desde que esse diferimento só abranja 50 % do valor da entrada(202º,2), o diferimento só pode ser feito para data ou factos certos(223º,1) e o prazo de diferimento nunca pode ser superior a cinco anos(203º,1). Nas Sociedades Anónimas pode-se diferir até 70% do valor da entrada(277º,2), pode ser feito o diferimento para datas ou factos incertos, embora o prazo nunca possa ser superior a cinco anos(285º,1). Na situação de diferimento há que por a hipótese de o sócio não pagar. O sócio inadimplente só está em mora depois de Ter sido interpelado pela sociedade para pagar(interpelação admonitória). Esta interpelação tem que ser feita no prazo de 30 e 60 dias, após o prazo de diferimento Ter chegado ao fim, por carta registada(SQ) ou por anúncio público - 203º,3 ou 285º,2.
As sanções a que o sócio inadimplente já interpelado podem ser de dupla natureza:
• Sanções legais - fica privado de certos direitos -384º,4;
• Sanções contratuais - o contrato pode prever outro tipo de sanções -27º e 35º;
A lei determina que cabe aos órgãos que têm poder de representação da sociedade (órgãos da administração social) procurar a cobrança das entradas não realizadas tempestivamente pelos sócios. A fim de assegurar o cumprimento deste dever funcional dos administradores o art. 509º prevê sanções para a inércia dos administradores. Na hipótese de estes não procederem à cobrança das entradas em falta a lei faculta aos credores da sociedade um mecanismo de actuação : a acção subrogatória(30º). A não realização de entradas vai fazer com que para o património da sociedade não tenham entrado os bens suficientes para cobrir o capital social. No art. 30º alei permite que os credores fiquem sub-rogados nos direitos que a sociedade tenha contra os sócios em falta e que os possam exercer em nome da sociedade. Os direito podem ser exercidos judicial ou extra-judicialmente. Os credores podem actuar sobre entradas que já se tornaram exigíveis, mas também antes de as entradas se tornarem exigíveis, desde que tal seja necessário para a conservação ou satisfação dos seus direitos. É um mecanismo com longo alcance.




1. Obrigação de participar nas perdas - 992º C.C. e 620º,b a 622º CSC

A perda é o reverso do lucro. Pode variar a natureza ou proporção da nossa participação , mas não se pode eliminá-la. A participação pode Ter uma dimensão deficitária(perdas da sociedade). A participação pode consistir na utilização de reservas livres, o que se traduz para o sócio na redução dos seus lucros.
A participação deficitária, já na sua situação mais grave, pode implicar uma redução do capital social(35º), para o nível actual do património da sociedade, sempre que a obrigação de participar nas perdas se traduz na redução uma parte de liquidez (quinhão com que cada sócio vai ficar no momento da liquidação da sociedade, vai Ter direito a uma parcela menor no termo da sociedade). Quando as perdas são muito graves podem conduzir à falência da sociedade, caso em que em certas sociedades (SNC e SC) pode implicar uma responsabilidade ilimitada por parte dos sócios. A proporção da participação dos sócios nas perdas pode variar. O art. 22º,5 fixa a mesma proporção que a lei fixa para os lucros. Assim se tenho acções representativas de 5%, participo em 5% das perdas. Excepção : art. 178º,2,3 e 4 - os sócios de indústria não respondem pelas perdas sociais nas relações internas. Podem responder perante quaisquer credores sociais (relações externas), mas têm dto. De regresso contra os outros sócios.


2. obrigação de prestações acessórias - a lei permite para certos tipos de sociedades (S. A. e SQ) que o contrato de sociedade crie, para todos ou alguns sócios dessa sociedade, a obrigação de estes realizarem outras prestações, para além das entradas - 209º,1 e 287º,2. Ex. contrato de suprimento - 243º - pode consistir num acto de empréstimo em dinheiro ou em bens fungíveis à sociedade, com o direito de restituição dessa quantia ou bem, ou então o sócio difere o prazo de vencimento de um crédito que tem sobre a sociedade.
Obrigação de prestações suplementares de capital - são prestações pecuniárias efectuadas pelos sócios, para além das suas entradas, que têm em vista reforçar o património da sociedade, são prestações facultativas (podem estar previstas no contrato ou não), não vão incorporar o capital da sociedade, vão é reforçar o património da sociedade e só podem Ter por objecto dinheiro, e não bens. Não basta que o contrato preveja essa obrigação para que ela seja exigível. É necessário uma deliberação de maioria dos sócios para que esta seja exigível. As prestações de capital devem indicar o máximo em que podem consistir, não vencem juros e podem incluir ou não direito de restituição das quantias entregues à sociedade. Este tipo de prestações só estão previstas pela lei para as SQ, no art. 211º.a ideia é realizar uma injecção de capital nas sociedades em termos rápidos, que não tenha de seguir o percurso normal, e moroso, do aumento do capital.

3. Responsabilidade - pode ser:

a) Perante terceiros - há que distinguir entre sociedades pluripessoais e unipessoais. Nas sociedades pluripessoais as responsabilidades são as que o respectivo tipo social estabelecer : nas SNC e SC a responsabilidade é ilimitada(175º), nas SQ e S. A. a responsabilidade é limitada (197º e 275º). Nas sociedades unipessoais a lei estabeleceu, para além do regime regra, um regime de excepção em caso de falência da sociedade - 84º. Regime da responsabilidade ilimitada e solidária (não subsidiária) - é um regime mais gravoso.
b) Perante a própria sociedade - ex. 23º - o sócio pode responder por actos praticados por membros de órgãos da administração ou fiscalização, sempre que o sócio tenha tido alguma intervenção - é uma culpa "In eligendo" ou "In instruendo".




2.2.3-ESTATUTO JURÍDICO DOS SÓCIOS : DIREITOS DOS SÓCIOS

A)Classificação e natureza
Os direitos dos sócios podem ser classificados tendo em conta o sujeito passivo desses direitos:
1. Direitos dos sócios perante os outros sócios - traduz a ideia de que na sociedade(sobretudo nas Assembleias Gerais), os sócios (sobretudo maioritários) têm um dever de actuar ou exercer o seu direito, mas sem que isso vá em prejuízo dos outros sócios.
2. Direitos dos sócios perante terceiros - direitos que nascem para o sócio de um negócio intercedente entre a sociedade e um terceiro; por exemplo se duas sociedades se fundem, o 97º,4 e 112º estabeleceram que os sócios da sociedade fundida que se vai extinguir, tornam-se sócios da sociedade absorvente. Têm direito a receber desta sociedade participações em troca das da outra sociedade.
3. Direito dos sócios perante a sociedade:
a) Direitos extracorporativos ou extra sociais - direitos de que um sócio é titular, perante a sociedade, independentemente da sua participação na sociedade (direitos de que é titular como credor - titular de direitos de crédito sobre a sociedade). Podem Ter duas origens.
Há uns que têm origem num pacto jurídico que nada tem que ver com a posição de sócio - ex. um sócio que vende um bem à sociedade (tem um direito de crédito sobre a sociedade).
Há outros direitos que, muito embora originados na participação do sócio, dela se autonomizaram para dar origem a um direito de crédito - ex. direitos de preferência de subscrição de uma parcela de capital já deliberado.

b) Direitos sociais ou corporativos : aqueles de que cada sócio individual é titular, perante a sociedade, que resultam mesmo dessa posição de sócio.
Podem ser individuais (aqueles de que o sócio individual é titular) ou colectivos (aqueles de que os sócios são titulares mas enquanto são parte de um grupo, são titulares um grupo de sócios e não um sócio individual). Quer dentro dos direitos individuais, quer dentro dos direitos colectivos temos direitos gerais e especiais.
I. Direitos individuais gerais - direitos de que todo e qualquer sócio é individualmente titular; são os direitos de participação na vida social ( ex. direito de voto; direito de impugnar deliberação, direito de eleger ou ser eleito para órgãos da administração, direitos de destituir os órgãos da administração e fiscalização) e direitos de participação nos lucros sociais, que se concretiza no direito aos lucros periódicos e no direito aos lucros finais.
II. Direitos individuais especiais - direitos de que são titulares apenas alguns sócios(24º). O contrato de sociedade pode conferir em favor de certos sócios individuais variados direitos que estão para além dos direitos gerais. Podem consistir na majoração dos direitos gerais, ex. direito de voto plural, direito ao lucro privilegiado, direito especial de voto e veto em matéria de



votação para os órgãos da administração. Esta distinção entre direitos individuais gerais e especiais está patente nas S. A. Quando as acções detidas pelos sócios lhes conferem direitos gerais dizem-se ordinárias. Quando os estatutos sociais conferem direitos especiais a certos sócios, as acções desses sócios formam uma categoria especial de acções - acções privilegiadas, prioritárias ou preferenciais. Ex. direito privilegiado aos lucros(341º).
A. Direitos colectivos gerais - aqueles de que são titulares certos grupos de sócios - ex. 375º,2; 392º,6; 418º.
B. Direitos colectivos especiais - aqueles de que é titular apenas um grupo de sócios que está determinado no contrato social (391º,2)

1. Direitos fundamentais para os sócios de qualquer sociedade:
a) Direito aos lucros - 21º,1,a e 22º - o fim último do contrato de sociedade é a obtenção e repartição dos lucros. O lucro é todo o incremento ou acréscimo real ao património de qualquer sociedade em virtude da actividade desenvolvida por essa sociedade. Estão excluídas do conceito de lucro todas as mais valias patrimoniais resultantes da desvalorização monetária, é um acréscimo que resulta da actividade social.
Lucros finais - lucros de exploração ou liquidação, situação liquida no momento da dissolução da sociedade. No final da sociedade procede-se ao balanço de liquidação, apura-se se o passivo excede ou não o activo da sociedade (passivo onde se inclui o património social). Excluem-se dos lucros finais : saldo positivo derivado de desvios monetários, os bens que entraram na sociedade a titulo gratuito, os ágios - 295º(203º) -, ex. prémios de emissão. O art. 25º permite que o valor real da entrada de um sócio seja superior ao valor nominal das acções que subscreveu. Sempre que o valor real seja superior ao valor nominal, essa diferença não é um lucro.
Lucro periódico ou de exercício - excedente do activo social liquido. O activo social liquido é o activo bruto da sociedade menos o seu passivo. No final de cada exercício a sociedade deve proceder às contas de exercício(balanço)
Excluem-se :
As mais valias, As mais valias não são lucros porque não resultam da actividade social, são um mero lucro virtual, potencial, mas não real. Se fosse possível qualificar essas mais valias como lucros isto abriria a porta à possibilidade de virem a ser distribuídos aos sócios dividendos fictícios, quantias que não são verdadeiros lucros, sempre que a mais valia não se venha efectivamente a verificar, aquando da alienação. As mais -valias só podem ser lucro aquando da alienação dos bens que pertencem ao activo da sociedade.
Excluem-se também as reservas(legais e estatutarias).
Também estão excluídos os lucros acumulados não distribuídos.

O fim de uma sociedade é a obtenção e repartição dos lucros, mas tal não significa que os sócios ou a sociedade estejam obrigados a distribuí-los, pois podem convencionar que não haverá distribuição dos lucros(hipótese remota) - 66º,2. Mesmo que isto não aconteça, os sócios são livres de dar aos lucros apurados no balanço, o destino que bem entenderem, nomeadamente reinvesti-lo na sociedade.




Forma através de qual os sócios podem reinvestir os lucros na empresa:
Criação de um fundo financeiro para o qual são canalizados parte ou a totalidade dos lucros periódicos apurados na sociedade. Visam assegurar a solvabilidade da sociedade.
Reservas: voluntárias legais ou ocultas:
Reservas legais - fundos financeiros que a sociedade está imperativamente obrigada a constituir. A regra é : SQ, S. A. e SC estão obrigadas a afectar pelo menos 5% dos seus lucros anuais à constituição de uma reserva legal, ou então, a quantia necessária para a sua reintegração até que essa quantia atinja 200 contos nas SQ, ou 1/5 do capital para as S. A. - 22º; 23º; 218º e 295º. A reserva legal tem como função constituir uma espécie de antecâmara do capital social. Utilização da reserva legal - 236º.

Protecção do capital social - sempre que se registem perdas sociais estas podem ser compensadas sem que a sociedade seja retirada a retirar montantes ao seu património social. Daí que a lei tenha limitado os casos em que as quantia s depositadas na reserva legal possam ser utilizadas. Só o permite em dois casos(296º) : para a cobertura de perdas legais transitadas(de anos anteriores) e para realizar aumentos de capital.

Reservas voluntárias - resultam da vontade dos sócios.
Há dois tipos: as estatutárias, cuja constituição está prevista no contrato da sociedade, e livres, cuja constituição não está prevista no contrato de sociedade, mas resulta de uma deliberação ad hoc da assembleia geral dos sócios, com 3/4 dos votos. Sendo reservas voluntárias nada impede que os sócios utilizem quantias dessa reserva para repartir dividendos entre eles, bem como para as mesmas finalidades que a lei prevê para as reservas legais (296º). Para a constituição de uma reserva livre é necessária uma maioria qualificada de 3/4 dos sócios.

Reservas ocultas - são uma espécie de fundos financeiros clandestinos. Resultam de uma subavaliação dos elementos do património social no balanço da sociedade: avalia-se por um valor inferior ao seu valor real. Esta prática, em exagero, pode ser perigosa, porque pode dissimular uma grande parte do património social e pôr em causa o direito aos dividendos dos sócios. Estes têm o direito de impugnar a deliberação da sociedade que aprovou o balanço em que essa subavaliação foi feita.
Não se podem confundir todas estas reservas com fundos financeiros vizinhos:
Fundos de amortização ou reintegração - são rubricas representativas da desapreciação actual ou previsível dos bens imobilizados na sociedade. É uma regra de boa administração que os bens não sejam desactualizados do seu preço de custo.
O valor de custo deixou de ser o valor real. No lado do activo social (do balanço), o bem adquirido é lançado ao seu preço de custo. No passivo cria-se um fundo de amortização, onde é lançado o valor previsivel da amortização.

Provisões : valores retidos na sociedade, em vista a realizar futuras despesas ou futuros investimentos.

PROBLEMA – dtº aos lucros de exercício :
Há três conceitos diferentes a distinguir: lucro apurado, lucro distribuível e lucro distribuído.
No final de cada exercício social, os órgãos de Administração são obrigados a submeter à Ass. Geral de sócios as contas de exercício, até 31 de Março do ano subsequente. Entre os elementos dessas contas de exercício, está o balanço social que tanto pode registar perdas como lucros. Os sócios podem aprovar ou não as contas de exercício.
Se o balanço registar lucros e se os sócios aprovarem as contas temos os lucros apurados.
Logo que sejam distribuídos aos sócios lucros que não correspondem a lucros apurados, a lei estabelece uma responsabilidade dos administradores por esse facto ( 22º ). É um dever de restituição dos bens indevidamente recebidos por parte dos sócios ( 34º ).
No caso de o balanço registar lucros, na mesma Ass. Geral, os sócios são ainda chamados a pronunciar-se sobre o destino a dar aos lucros.
Nem todos os lucros apurados são distribuíveis. Há uma parte desses lucros apurados q está imperativamente destinada a 2 funções:
- integrar os fundos de reserva (legal ou estatutária)
- cobrir os prejuízos (perdas) sociais transitados, ou seja, verificados em anos anteriores : 33º,1 ; 218º ; 294º ; 295º

O lucro distribuível é o lucro social apurado, deduzido das quantias afectas ou destinadas à reserva ou à cobertura das perdas sociais precedentes.
Os sócios têm apenas direito ao lucro distribuível. Mas mesmo aqui, no caso das SQ, SA e SC acções , permite a lei que os sócios não distribuam os lucros distribuíveis .
Há duas situações que se distinguem consoante a proporção dos lucros distribuíveis q os sócios pretendem reter na sociedade:

1. se os sócios pretendem reter uma proporção inferior a 50% dos lucros distribuíveis, essa decisão pode ser tomada por deliberação de maioria simples.
2. se os sócios pretenderem reter uma proporção superior a 50% dos lucros distribuíveis, inclusive a totalidade, a lei exige a maioria de ¾ dos votos correspondentes ao capital social 294º,1.
A lei quis aqui evitar (e não o evitou completamente), que os sócios minoritários da sociedade se fossem ver desapossados do seu dtº ao dividendo, por maioria simples. Estamos no domínio das reservas livres.

Uma vez apurados os lucros e decidido o destino dos lucros distribuíveis, caso se haja deliberado a sua distribuição, cada sócio passa a ser titular de um dtº de crédito em relação à sociedade, depois da deliberação  dtº aos dividendos.

Questão: determinar o quinhão q cabe aos sócios nos lucros distribuíveis :


1 – Regra Geral (supletiva) : 22º,1 ; os sócios participam nos lucros na proporção do capital social em que participam

2 – Regra imperativa : o contrato não pode excluir nenhum sócio do dtº aos dividendos; 22º,3 para as sociedades comerciais e 972º para as sociedades civis.
Proíbe-se q o critério de determinação do quinhão de cada sócio nos lucros seja estabelecido por terceiros (22º,4). O dtº do sócio ao quinhão é um dto social ou corporativo. A lei torna isto claro, dizendo q o direito se vence no prazo de 30 dias a contar da data da deliberação. Mas a sociedade pode estender esse prazo até 60 dias : 217º,3 e 294º,2.


 Dtº de Voto:
o dtº de voto é o mais importante dtº de participação na vida social (21º,1 b). Através do voto o sócio participa na formação do contrato social, na eleição e destituição dos órgãos sociais, nalgumas decisões fundamentais, pronuncia-se sobre a dissolução da sociedade.
Os critérios definidores da participação social variam consoante o tipo de sociedade em causa:
- SNC: 1 sócio, 1 voto (190º, excepção ; sócios de indústria)
- SQ, SA e SC acções : princípio censitário (não democrático) – 1 acção, 1 voto, 384º, 1 e 250º,1

O dtº de voto pode sofrer limitações legais e estatutárias:

- Legais: exº acçõese quotas próprias
A sociedade que as detém não pode exercer o voto na Ass. Geral (220º, 324º) impedimentos de um sócio individual, porque está em conflito de interesses com a matéria apreciada : 251º, 384º, 6 e 7 ; sócios em mora quanto às suas entradas não podem votar: 248º, 1 e 384º,4.

- Estatutárias: participação com voto plural ( só nas SNC e SQ ) a 1 participação dá-se mais do q 1 voto ; participação com voto limitado ( S.A ); 384º,2 e 379º, 2 ; participação social sem voto (acções sociais sem voto); 341º


 Dtº à Informação :
está genericamente consagrado no art 21º,1 CSC.
É um dtº instrumental, visando fornecer aos sócios informações sobre a vida social. Visa apenas tornar mais completos e exercitáveis os outros direitos.
O seu alcance varia consoante o tipo social.
Nas SNC tem um grande alcance, 181º ; nas SQ tem um alcance mais limitado, 214º a 216º ; nas S.A tem um alcance bastante reduzido atendendo ao elevado nº de sócios destas sociedades e devido à fácil transmissibilidade das acções. A lei só permite em condições estritas o acesso a certo tipo de informações, 288º,ss.


DL 36/2000 de 14 Março :
veio alterar certas formalidades quanto às sociedades com. e EIRL.
Na alteração do contrato de sociedade a regra é a escritura pública, 85º CSC. Se for uma alteração em que a acta da Ass. Geral dos sócios foi lavrada por notário e não for qto ao aumento capital , não é preciso escritura pública. Se for uma alteração em q a acta for lavrada pela secretária da sociedade e não for quanto ao objecto e capital não é preciso escritura pública.
Art 145º - para dissolução da sociedade, já não é preciso escritura pública.
Art 270º A ,ss – para a constituição ou transformação em sociedade unipessoal, em regra não é preciso escritura pública, a não ser q sejam entradas em bens que não dinheiro. Neste caso já é preciso escritura pública.

EIRL – também já não é preciso escritura pública, pode ser documento particular, excepto se as entradas forem bens, que não dinheiro.


DL 64 A /2000 :
trespasse e cessão de exploração de Estabelecimento Comercial, já não é preciso que seja feito por escritura pública, basta que o seja por documento particular.


N.B: art 35º CSC. Até hoje não há qualquer diploma que diga quando entra em vigor. Este artigo existe, mas não vigora. No entanto quanto às S.A podemos aplicar o art 544º que se refere ao art 35º.
Não entrou em vigor porque se temeu que com isso, muitas empresas fossem à falência